[Eletiva] Os Dias da Criação

Os seis "dias" ou tempos, que são os tantos estados sucessivos da regeneração do homem.

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“E disse Deus: ...Faça germinar a terra erva tenra”.

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Os Seis Dias da Criação
O Primeiro Dia
 

C. R. Nobre

 

No Princípio criou Deus o céu e a terra.E a terra era vácua e vazia, e [havia] escuridão sobre as faces do abismo; e o Espírito de Deus movia-se sobre as faces das águas.E disse Deus: Haja luz; e a luz foi feita. E viu Deus a luz, que [era] boa; e distinguiu Deus entre a luz e entre as trevas. E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.E houve tarde e houve manhã, o dia primeiro” ( Gênesis 1:1-5)

 

A maioria de nós, na infância, ouviu no catecismo, na escola dominical ou da leitura em casa, as histórias do primeiro capítulo de Gênesis, de como Deus criou todo o universo em seis dias.

Na simplicidade de criança, imaginamos os dias como períodos de tempoque marcamos hoje, de 24 horas, e dias da semana, segunda, terça etc.

Algumas pessoas, até teólogos eruditos no passado, tomaram como base o que é dito sobre a duração da vida dos primeiros homens, desde Adão, que foi criado no fim da primeira semana, viveu 930 anos, depois seus descendentes, e assim calcularam a idade do universo, que seria de6000 anos, mais ou menos. (6024)

Essa ideia simples sobre a criação é aceita assim mesmo por muitos,mesmo durante toda a sua vida adulta, porque não veem dificuldade alguma emcompreender literalmente os relatos do livro de Gênesis.

Mas outras pessoas, geralmente quando chegam à adolescência,começam a pensar pelas ciências que vai aprendendo, e então começam a ver um conflito entre os ensinamentos da Bíblia e os fatos científicos. E para muitos jovens e adultos, as informações científicas, tais como os achados da arqueologia e da paleontologia, especialmente as datações com o carbono 14, acabam jogam uma pá de cal nas cognições religiosas da infância a respeito da criação e, inevitavelmente, a respeito de tudo o mais nas Escrituras Sagradas.

Durante séculos, a mentalidade do homem comum deste planeta não teve capacidade de elevar seu entendimento para compreender as verdades espirituais. Foi como o Senhor disse aos discípulos em João 16:12 “Ainda tenho muitas coisas que vos dizer, masagora ainda as não podeis suportar”. ...Ex. Paulo diz alguma coisa..

Quando veio a Idade Contemporânea,em que começou a haver um maior desenvolvimento do intelecto, o naturalismo tambémcomeçou a prevalecer por causa da força das evidências científicas, em oposição à crença judaico cristã, porque esta, ao insistir na sua interpretação literalista do texto sagrado, não tinha argumentos considerados racionais para sustentar a fé. E até hoje o cristão se depara com esse dilema: fica com a sua fé simples e fecha olhos e tapa os ouvidos para a ciência, ou crê na ciência e desacredita dos ensinos da Bíblia. Não que a pessoa rejeite, necessariamente, à fé. Ela até continua crendo na criação Divina tal como está no Gênesis, mas só que ela deposita essa fé numa região especial de seu entendimento, como algo sagrado e que está acima da compreensão, enquanto adota a informação científica no pensamento cotidiano, ignorando o antagonismo entre fé e ciência.

Se a pessoa não tem problema com esse conflito, menos mal. O problema é que há pessoas que, por causa dessa divergência, concluem que a religião não oferece argumentos satisfatórios e “racionais” às suas questões, e então consideram que a fé no que a Bíblia diz é uma ingenuidade eo mesmo que acreditar em fábulas e mitologia. Em resumo, a crença nos relatos bíblicos é para uma mente inculta ou fanática. E, fazendo opção pelo que lhes parece ser aracionalidade, elasabandonam a fé.

Mas as coisas não precisam ser assim.

As obras de Swedenborgtêm um lema: “Agora é permitido entrar com o entendimento nos mistérios da fé”. Porque, quando a humanidade chegou à idade da razão, Deus abriu uma visão nova de Sua Palavra, mostrando-nosque, de fato, não existe conflito entre as cognições da fé e o conhecimento científico. O fato é existe um sentido interno ou espiritual nas Escrituras Sagradas, e por isso, em muitas de suas passagens, especialmente os onze primeiros capítulos de Gênesis, o que temos são parábolas, símbolos, aparências de verdade. O sentido literal é uma linguagem codificada, que usa tipos tomados da natureza para nos desvendar as dimensõesespirituais.

Portanto, a mensagem da Bíblia não tem o propósito de nos ensinar as ciências naturais,a criação do universo físico, mas, sim, ode nos ensinar como é formado em cada ser humano o seu universo espiritual, o micro cosmo em nós, o reino da alma, a natureza do Ser Divino, Seu Divino Amor e Sabedoria, porque, sem a revelação, esses campos de conhecimento são inacessíveis à pesquisa humana.

Assim, as histórias da criação, no começo de Gênesis, falam, na verdade, da regeneração do homem pelo Senhor, as etapas do processo do novo nascimento ou, por assim dizer, da gestação espiritual de um cidadão dos céus. Mostram como sua mente é organizada pelas verdades, como as afeições são implantadas, e assim por diante.

Para entendermos os relatos do Gênesis, especialmente os da criação, tomemos como premissa o ensinamento de que a natureza é um teatro simbólico das dimensões espirituais.“A natureza universal é um teatro representativo do reino do Senhor” (AC 3618). A coisa que representa é o objeto, a pessoa, o evento no mundo natural, como está na letra da Palavra Divina. E a coisa representada é o que se encontra no espírito, nos céus e no Divino. A relação entre uma dimensão e a outra é o que se chama de “correspondência”. Essa relação é tão bem articulada que o estudo dela é o que se chama ciência das correspondências, que é a ciência angélica. Em resumo, essa ciência revela que cada ser, objeto ou acontecimento no mundo natural é um efeito, e tem sua correspondente no mundo espiritual. Essa correspondência está presente em toda a Escritura, de Gênesis a Apocalipse, de forma constante, coerente e harmônica.

A revelação do sentido espiritual nos Escritos de Swedenborg é a chave para abrirmos a letra e desvendarmosessa linguagem espiritual, linguagem pela qual a natureza se expressa.Aberta essa porta, tomamos conhecimento de que o mundo físico e o espiritual existem numa perfeita interação, sob o governo de um único Deus e Senhor, Jesus Cristo. Aberta essa porta, o campo de pesquisa para nosso entendimento humano se amplia e se alarga ao infinito.Conhecemos a nós mesmos e começamos a conhecer o nosso Criador, e o propósito para o qual nos criou.

Vamos ter uma amostra dessa revelação nesta série de estudo, na qual tomaremos, a princípio, apenas um único capítulo, o primeiro do Gênesis, como é explicado nos“Arcanos Celestes”.

Essa obra, “Arcanos Celestes”,foia primeira publicada por Swedenborg, em 1749, e é a que primeiro mostra a natureza como imagem do reino do Senhor nos céus, na terra e no homem, ensinando que os seis dias da criação do universo são, na verdade, os seis estados da nova criação do homem. Assim lemos (6): “Os seis dias ou tempos... são... estados sucessivos da regeneração do homem”.

E o livro de Gênesis começa dizendo: “No princípio criou Deus o céu e a terra. E a terra era vácua e vazia, e [havia] escuridão sobre as faces do abismo; e o Espírito de Deus movia-se sobre as faces das águas”.

Aprendemosque o “Princípio” é o primeiro estado, quando se inicia a nova criação do homem. O “céu” significa o homem interno e a “terra”, o homem externo antes da regeneração. A “terra”, nesse período anterior à regeneração, é chamada “um vácuo” e “vazia”. O período que antecede a regeneração vai desde a época da infância até à idade adulta, quando o homem se volta para Deus e O reconhece como seu Criador e Pai.

Nesse período anterior à regeneração, sua mente externa ou natural é chamada “terra vácua” porque nada tem de bem genuíno, e de “terra vazia” porque nada tem de verdade real. O que existe, de fato, é“escuridão e demência”, além de “ignorância quanto a todas as coisas que são da fé no Senhor”, como nos informam os Arcanos.

É dito que havia “escuridão sobre as faces do abismo; e o Espírito de Deus movia-se sobre as faces das águas”. Na“terra vácua e vazia”, que é a mente do homem, como há ausência de bem e vero genuínos, há, em seu lugar, cobiças e falsidades do proprium humano. Por isso a mente do homem é comparada a um abismo, um profundo poço de escuridão de falsidades, porque ele não conhece a si mesmo, e uma massa confusa e densa de cobiças, porque sua vida consiste somente em satisfazer seus caprichos. Aliás, quando examinado do céu, o homem irregenerado aparece assim: uma massa escura que nada tem de vida (nº 8).

Contudo, acima dele está a Misericórdia de Deus. Ela é chamada aqui “Espírito”, o Espírito que se movia sobre as faces das águas. E, segundo a explicação dos Arcanos, o verbo usado aqui para expressar esta ação Divina, de “mover-se”, é, na língua hebraica, “chocar”, “como de ordinário a galinha o faz sobre os ovos”. Porque, a despeito dessa massa informe e tenebrosa de cobiças e falsidades, que é a mente humana irregenerada, a Misericórdia Divina está acima velando, agindo, insinuando algo de vivo e salvífico.

Notemos que não é dito que o Espírito de Deus estava sobre as “faces do abismo”, mas sim, que “chocava sobre as faces das águas”, porque a Misericórdia Divina não pode influirnos males e falsidades do homem, mas em algum bem e alguma verdade que ele tenha, por pouco que seja. Esse bem e verdade em que o Senhor influi, e os quais aquece como se chocasse, para lhes inspirar vida, são todas as afeições boas e todos os conhecimentos verdadeiros que o homem adquire de bom grado, em inocência, especialmente na sua infância. Essas afeições e ensinos ficam encerrados como tesouros, para que não se percam no abismo de cobiças e falsidades, e são guardados por Deus para serem revocados,trazidos à vida consciente no tempo propício, na idade adulta. Por isso as Doutrinas os chama de “relíquias” e estão representadas, aqui, pelas “faces das águas”.

Então, primeiro e o segundo versículos são entendidos assim:

“No período que antecede a regeneração, isto é, da infância até à idade de se regenerar, Deus cria o homem interno e o homem externo. O homem externo é desprovido de bens e verdades genuínos. Nada há nele senão a escuridão de falsidades sobre uma massa de cobiças. Mas a Misericórdia de Deus está acima, insinuando vida nas relíquias do bem e da verdade”. (Vide Anexo 2).

Versículos 3 e 4: “E disse Deus: Haja luz; e a luz foi feita. E viu Deus a luz, que [era] boa; e distinguiu Deus entre a luz e entre as trevas”.

Ohomem meramente natural ou externo nem ao menos sabe o que é o bem e a verdade. Chama de bem tudo aquilo que agradável e bom para ele, isto é, que favorece aos amores de seu próprio, focalizando-seem si mesmo e no mundo. Então, para que ele seja reformado e regenerado, a primeira coisa deve ser, necessariamente, saber e crer que existe, sim, um bem real, que independe de seus conceitos do que seja o bem; que existe uma Verdade única, queindepende do que ele acredita ser a verdade ou da interpretação que se possa ter dela; e que, assim, o bem e a verdade genuínos existem fora eacima do arbítrio de sua vontade e dos conceitos de seu entendimento. Ele também deduz que o mal e a falsidades são perversões desse bem e verdade, e que só o Senhor é o Bem Mesmo e a Verdade Mesma, enquanto o ser humano nada é em si mesmo.

Quando a pessoa atinge esse grau de conscientização, é como se nascessea luz para ela. “E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz”. É a iluminaçãoda mente pela Verdade Divina, e constitui o primeiro estágio da nova criação do homem,significado por “primeiro dia”.

“E viu Deus a luz, que era boa; e distinguiu Deus entre a luz e as trevas. E o chamou Deus à luz dia; e às chamou noite. E houve tarde e houve manhã, o dia primeiro.” (Vide adendo).

É dito que a luz era boa pelo fato de ela proceder do Senhor. É dito que “Deus viu”, mas isto é uma aparência, porque Deus é Onisciente. Quem realmente vê é o homem, porque agora ele reconhece e entende a verdade (vê a luz) e começa a distinguir entre “luz” e “trevas”, isto é, entre excelência da Verdade e as incertezas da ignorância e dasilusões ou conceitos falsos de seu entendimento natural.

“As trevassão coisas que existem antes que o homem seja concebido e nasça de novo. Elas pareciam luz porque então o mal parecia o bem e a falsidade parecia verdade”(AC 21).“Tarde” e “noite”, na Palavra, são o afastamento e a ausência da luz, e por isso significam, no espírito do homem, os estados em que ele está distante da verdade da fé. Ao contrário, “manhã” e “dia”, na Palavra, são a aproximação e a presença da luz, significando, portanto, o Advento do Senhor, quando então há para o homem instrução e fé.

“E houve tarde, e houve manhã, o dia primeiro”. Notemos que o termo “tarde” precede “manhã”. Seriade se esperar que fosse dito: “e houve manhã e houve tarde”, mas foi escrito assim para significar a progressão da sombra para a luz. A“tarde” precede é porque está havendo uma progressão de um estado de falsidade e de ausência de fé, para um estado de iluminação pela verdade, o começo da regeneração. “Na regeneração, a sombra da dúvida, quando há afeição de saber, gera a instrução e a luz, a “manhã”. Porque “manhã” é “todo estado seguinte, pois é um tempo de luz, ou um estado da verdade e de conhecimento da fé”.

E assim se completa o primeiro estágio da criação do novo homem. O Senhor, pela ação de Sua misericórdia, o fez progredir, de massa confusa e escura de cobiças para um estado de luz, compreensão e fé. É apenas o início de um processo, o primeiro dos seis dias da criação, mas já é alguma coisa, o primeiro estado; a sua regeneração se iniciou. Como lemos em nossa lição, a maioria das pessoas hoje vêm somente a esse primeiro estado. Mas se a regeneração foi iniciada nesta vida, ela poderá prosseguir e se desenvolver nos céus, porque nos céus a progressão na sabedoria e no amor não tem fim.

Parece pouco e insuficiente este primeiro estágio. Parece que a fé ainda é pouca. Se, todavia, ela tiver sido bastante para abrir a visão da pessoa e fazê-la mudar o rumo de sua vontade, voltando-a para uma vida de acordo com os Mandamentos Divinos, ela será uma fé salvífica, por mais fraca que seja a luz do primeiro dia. Ela crescerá como a semente de mostarda da Parábola, que, de uma pequena semente, cresce até se tornar uma árvore “e os pássaros do céu vêm abrigar-se em seus galhos”. = pensamentos dos anjos do céu.

Eis aqui, então, um ligeiro sumário desta primeira parte do capítulo 1 dos “Arcanos Celestes”, sobre o primeiro dia.

Por aí podemos ver como a abertura do sentido espiritual faz a letra da Palavra ser um livro aberto, que pode ser lido e perfeitamente compreendido, mostrando como o universo criado de fato espelha o plano espiritual, o reino do Senhor nos céus e no íntimo de cada pessoa de Sua Igreja.

Explicando esta linguagem, nos Escritos da Nova Igreja prosseguem desvendando o significado de todos os seis dias da criação e do dia de descanso, como também dos outros capítulos do livro do Gênesis, do Êxodo e, em geral, de toda a Palavra.

Esta instrução nos foi oferecida pelo Senhor quando Ele abriu o livro selado com sete selos, e pôs a Palavraaberta ao nosso alcance, no seu sentido espiritual. Somos convidados, portanto, a estudá-la para que, por esse meio, o Senhor nos conceda uma visão clara das coisas reveladas, porque elas vitais para nossa existência espiritual. Oremos para que, assim, brilhe de fato em nosso entendimento a luz da Verdade, do primeiro dia.

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Anexo 1:

 

Extrato do livro Arcanos Celestes, 1-13

 

1.        Nenhum mortal compreende, pela letra, que a Palavra do Antigo Testamento contém arcanos do céu e todas e cada uma das coisas se referem ao Senhor, ao Seu Céu, à Igreja, à fé e às coisas que são da fé. Pois, pela letra ou sentido literal, ninguém vê outra coisa a não ser aquilo que em geral se refere aos externos da Igreja Judaica, quando, todavia, há em toda parte coisas internas que nunca se manifestam nos externos, além das pouquíssimas que o Senhor revelou e explicou aos apóstolos, como, por exemplo, que os sacrifícios significam o Senhor e a terra de Canaan e Jerusalém significam o céu, pelo que este é chamado “Canaan”, “Jerusalém Celeste" e semelhantemente “Paraíso”.

2.        Mas o mundo cristão ainda ignora completamente que todas e cada uma das coisas, mesmo as mais singulares, até o menor iota, significam e envolvem coisas espirituais e celestes; por isso, também, pouco cuida do Antigo Testamento. Mas, só pelo fato de que a Palavra é do Senhor e vem do Senhor, eles podem saber que ela não poderia existir se não tivesse em seu interior coisas tais as que são do céu, da Igreja e da fé. De outro modo não pode ser chamada Palavra do Senhor e nem se pode dizer que tem em si alguma vida. Pois de onde vem a vida senão das coisas que são da vida, isto é, senão do fato de todas e cada uma das coisas se referirem ao Senhor, Que é a vida mesma? Por isso, tudo o que interiormente não se referir ao Senhor, não vive; até mesmo um vocábulo, na Palavra: se não envolvê‑Lo ou não se referir a seu modo a Ele, não é Divino.

3.        Sem uma tal vida, a Palavra é morta quanto à letra. Com efeito, a Palavra é como o homem, que, como se conhece no mundo cristão, é externo e interno. O homem externo separado do interno é o corpo e, assim, é morto; o interno é o que vive e faz o externo viver. O homem interno é a sua alma. Assim a Palavra, que, quanto à letra somente, é como um corpo sem alma.

4.        Pelo sentido da letra, só, quando a mente a ele se adere, não se pode ver em parte alguma que esse sentido contém tais coisas; como esta primeira parte de Gênesis: pelo sentido da letra não se pode em parte alguma conhecer outra coisa senão que aí se trata da criação do mundo e do jardim do Éden, que é chamado Paraíso, e, depois, de Adam como o primeiro homem criado. Quem pensa outra coisa? Mas que estas coisas contêm arcanos que ainda não foram revelados em parte alguma, pode‑se ver muito bem pelo que se segue. Que, por exemplo, o primeiro capítulo de Gênesis trata, no sentido interno, da nova criação do homem ou de sua regeneração em geral, e da Igreja Antiquíssima em particular. E, na verdade, é assim: não há o menor vocábulo que não represente, signifique e envolva [algo espiritual].

5.        Mas nenhum mortal jamais pode saber que a coisa é assim, a não ser pelo Senhor. Por isso é permitido manifestar de antemão que, pela Divina misericórdia do Senhor, foi‑me concedido estar, agora desde alguns anos, continuamente e sem interrupção, em associação com espíritos e anjos, ouvi‑los falar e falar igualmente com eles. Daí foi dado ouvir e ver coisas surpreendentes que há na outra vida, que nunca vieram ao conhecimento ou à idéia de homem algum. Lá, fui instruído sobre espíritos de diversos gêneros; sobre o estado das almas após a morte, sobre o inferno ou o estado lamentável dos infiéis; sobre o céu ou o estado felicíssimo dos fiéis; e, principalmente, sobre a doutrina da fé que é reconhecida no céu universal. Pela Divina misericórdia do Senhor, muitas coisas sobre estes assuntos serão ditas na sequência.

6.        Os seis “dias” ou tempos, que são os tantos estados sucessivos da regeneração do homem, são, quanto ao gênero, assim:

7.        O primeiro estado é o que precede, tanto o que vem desde a infância quanto o que está mais perto da regeneração, e é chamado “vácuo, vazio e escuridão”. E o primeiro movimento, que é a misericórdia do Senhor, é o “Espírito de Deus Se movendo sobre as faces das águas”.

8.        O segundo estado existe quando se faz distinção entre as coisas que são do Senhor e as que são próprias do homem. As que são do Senhor são chamadas, na Palavra, “relíquias” e aqui são principalmente as cognições da fé que o homem apreendeu desde a infância; ficam encerradas e não se manifestam antes que o homem chegue a esse estado, o qual raramente existe hoje sem tentação, infortúnio e tristeza, que fazem que as coisas do corpo e do mundo — assim, as que são do próprio — repousem e morram, por assim dizer. Assim as coisas que são do homem externo são separadas das que são do interno. No interno estão as relíquias, encerradas pelo Senhor para esse tempo e esse uso.

9.        O terceiro estado é o da penitência, no qual o homem, pelo interno, fala piedosa e devotamente e produz bens, como as obras de caridade, que, entretanto, são inanimadas, pois pensa fazê‑las de si. São chamadas “erva tenra”, depois “erva de semente” e, em seguida, “árvore de fruto”.

10.     O quarto estado é quando o homem é tocado pelo amor e iluminado pela fé. Decerto, anteriormente falou piedosamente e produziu bens, mas por um estado de tentação e de angústia e não pela fé e caridade; por esta razão, a fé e a caridade são agora acesas no homem interno, e são chamadas “dois luminares”.

11.     O quinto estado existe quando ele fala pela fé e, daí, se confirma no vero e no bem. As coisas que então produz são animadas e se chamam “peixes do mar e aves dos céus”.

12.     O sexto estado existe quando, pela fé e daí pelo amor, ele fala os veros e faz os bens. As coisas que então produz são chamadas “alma vivente e besta”. E como então começa a agir ao mesmo tempo pela fé e pelo amor, torna‑se homem espiritual, que é chamado “imagem”. Sua vida espiritual se deleita e se sustenta com as coisas que são das cognições da fé e as que são das obras de caridade, que se chamam “sua comida”. E sua vida natural se deleita e se sustenta com as coisas que são do corpo e dos sentidos, das quais vem o combate, até que o amor reina e o homem se torna celeste.

13.     Dos que estão sendo regenerados, nem todos chegam a este estado, mas alguns, e hoje a maioria, chegam somente ao primeiro; alguns apenas ao segundo; alguns ao terceiro, quarto, quinto; raramente ao sexto e quase ninguém ao sétimo.

 
Sentido Interno
14.     Na sequência, pelo SENHOR entende‑se unicamente o Salvador do mundo, JesusCristo, e é chamado “Senhor” sem outros nomes. Ele é reconhecido e adorado como o Senhor no céu inteiro, porque Ele tem todo o poder nos céus e nas terras; e também mandou, dizendo:

“Vós Me chamais Senhor; bem o dizeis, porque Eu sou” (Jo. 13:13).

E os discípulos, depois da ressurreição, O chamaram Senhor.

15.     No céu inteiro não se conhece outro Pai senão o Senhor, porque são Um, como Ele disse:

“Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ... disse Felipe: Mostra‑nos o Pai; ... Disse‑lhe Jesus: Há tanto tempo estou convosco e não Me conhecestes, Felipe? Quem viu a Mim, viu o Pai; como pois tu dizes, mostra‑nos o Pai? Não crês que Eu estou no Pai, e o Pai está em Mim? ... Crede‑Me que Eu estou no Pai e o Pai está em Mim” (Jo. 14:6, 8‑11).

16.     Vers. 1: “No princípio criou Deus o céu e a terra”. O “princípio” chama‑se o tempo antiqüíssimo; e pelos profetas, em vários lugares, “dias da antigüidade” como também “dias da eternidade”. O princípio envolve também o primeiro tempo quando o homem é regenerado, porque então nasce de novo e recebe vida. Daí é que a regeneração mesma é chamada nova criação do homem. “Criar, formar e fazer”, em quase toda parte nos profetas, significam, com diferenças, regenerar; como em Isaías:

“Todo aquele que é chamado pelo Meu nome, e para a Minha glória o criei, o formei e também o fiz” (43:7).

Por isso o Senhor é chamado Redentor, Formador desde o útero, Feitor e também Criador, como no mesmo profeta:

“Eu Jehovah, Santo vosso, o Criador de Israel, Rei vosso” (43:15);

em David (Salmos):

“O povo criado louvará JAH” (102:19).

No mesmo:

“Envias o espírito Teu, serão criados, e renovas as faces do humo” (104:30).

Que o “céu” signifique o homem interno, e a “terra” o homem externo antes da regeneração, será visto pelo que se segue.

17.     Vers. 2: “E a terra era vácua e vazia, e [havia] escuridão sobre as faces do abismo; e o Espírito de Deus Se movia sobre as faces das águas”. O homem, antes da regeneração, é chamado “terra vácua e vazia” e também “humo” no qual nada é semeado de bem e vero. O “vácuo” é onde nada há de bem e o “vazio” é onde nada há de verdade. Daí vem a escuridão ou a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no Senhor, por conseguinte, de todas as que são da vida espiritual e celeste. Tal homem é descrito pelo Senhor em Jeremias:

“Tolo é o Meu povo; [eles] não Me conheceram. São filhos estultos e não inteligentes. Sábios para fazer o mal e não sabem fazer o bem. Vi a terra, e eis, vácua e vazia; e os céus, e não tinham sua luz” (4:22,23).

18.     “As faces do abismo” são as suas cobiças e daí as falsidades pelas quais e nas quais está inteiramente. E como não possui luz alguma, é como o abismo ou uma coisa confusa e obscura, chamada, em muitos lugares na Palavra, profundezas do mar e abismos, que são secos ou devastados antes de o homem ser regenerado; como em Isaías:

“Desperta como nos dias da antiguidade, nas gerações das eternidades... Não és Tu que secas o mar, as águas do abismo grande, e fazes das profundezas do mar um caminho, para que passem os redimidos? ... Os redimidos de Jehovah voltarão” (51:9‑11).

Tal homem também, quando examinado do céu, mostra‑se semelhante a uma massa negra que nada tem de vital. As mesmas expressões envolvem em geral a vastação do homem, que é referida em muitas passagens nos profetas e que precede a regeneração. Porque antes que o homem possa saber o que é o vero e ser tocado pelo bem, as coisas que impedem e se opõem devem ser removidas. Assim, o velho homem deve morrer antes que o novo possa ser concebido.

19.     Pelo “Espírito de Deus” se entende a misericórdia do Senhor, da qual se diz “chocar”, como de ordinário a galinha o faz sobre os ovos; aqui, sobre as coisas que o Senhor esconde no homem e que são chamadas “relíquias” em vários lugares na Palavra. São as cognições do vero e do bem, que nunca vêm à luz antes que as coisas externas sejam devastadas. Aqui, essas cognições são chamadas “faces das águas”.

20.     Vers. 3: “E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz”. O primeiro estado existe quando o homem começa a saber que o bem e o vero são em alguma coisa superiores. Os homens inteiramente externos nem mesmo sabem o que é o bem e o vero, pois pensam ser boas todas as coisas que são do amor de si e do amor do mundo, e pensam ser veros todas as que favorecem a esses amores; assim, não sabem que esses bens são males e esses veros são falsidades. Quando, todavia, é concebido de novo, o homem começa a saber pela primeira vez que os seus bens não são bens. E quando entra ainda mais na luz, começa a saber que o Senhor é, e que o Senhor é o bem e o vero mesmos. Que se deva saber que o Senhoré, Ele mesmo o disse em João:

“Se não crerdes que Eu sou, morrereis em vossos pecados” (8:24).

Além disso, que o Senhor seja o bem mesmo, ou a vida, e o vero mesmo, ou a luz, e, assim, que não exista bem e vero senão pelo Senhor, também é dito em João:

“No princípio era o Verbo [Palavra], e o Verbo estava em Deus, e Deus era o Verbo... todas as coisas foram feitas por ele e sem ele nada foi feito do que se fez; nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens, mas a luz aparece nas trevas; ... Ele era a luz verdadeira que ilumina todo homem que vem ao mundo” (1:1,3, 4,9).

21.     Vers. 4 e 5: “E viu Deus a luz, que [era] boa; e separou Deus entre a luz e entre as trevas. E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite”. A “luz” é dita boa porque vem do Senhor, que é o bem mesmo. As “trevas” são as coisas que existem antes de o homem ser concebido e nascer de novo. Pareciam‑se com a luz, porque o mal parecia o bem, e o falso parecia o vero; mas são trevas e são os próprios do homem, que permanecem. Todas as coisas que são do Senhor são comparadas ao “dia”, porque são da luz; e todas as que são próprias do homem são comparadas à “noite”, porque são da escuridão. Assim é dito muitas vezes na Palavra.

22.     Vers. 5: “E houve tarde, e houve manhã, o dia primeiro”. Daí já se pode saber o que é a “tarde” e o que é a “manhã”. “Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do Senhor, como se vê pelo que foi dito por David:

“O Espírito de Jehovah falou em mim, e o Seu discurso esteve sobre a minha língua. Disse o Deus de Israel, a mim falou a Pedra de Israel. ...Ele é como a luz da manhã quando nasce o sol, manhã sem nuvens, quando, pelo  esplendor, pela chuva, a erva tenra sai da terra” (II Sam. 23: 2,3,4).

Pois que a “tarde” é quando não há fé, e a “manhã” quando há fé, o Advento do Senhor ao mundo foi chamado “manhã”, e o tempo em que Ele vem, porque então não há fé alguma, é chamado “tarde”, como em Daniel:

“O Santo me disse: Até a tarde, quando se faz a manhã, dois mil e trezentos” (8:14,26).

Semelhantemente, a “manhã” na Palavra é compreendida como todo advento do Senhor; assim, é um vocábulo que se refere à nova criação.

23.     Nada há de mais comum na Palavra do que o “dia” ser entendido como o tempo mesmo, como em Isaías:

“Próximo está o dia de Jehovah... Eis, o dia de Jehovah vem... O céu moverei, e tremerá a terra de seu lugar... no dia do ardor de Minha ira ... Próximo a vir está o Seu tempo, e os dias não serão alongados” (13:6,9,13, 22).

E, no mesmo profeta:

“Nos dias da antiguidade a antiguidade sua ... E sucederá naquele dia que Tiro será posta em esquecimento por setenta anos, como os dias de um rei” (23:7,15).

Como o “dia” está em lugar do tempo, também é tomado pelo estado desse tempo, como em Jeremias:

“Ai de nós, porque o dia declinou, porque se estenderam as sombras da tarde” (6:4);

e no mesmo profeta:

“Se fizerdes vã a Minha aliança do dia e a Minha aliança da noite, de modo que não haja o dia e a noite em seu tempo” (23:20,25);

depois:

“Renova os nossos dias, como os dos antigos” (Lam. 5:21).

 

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Leituras adicionais:

Lições:Gênesis 1; Salmo 8; João 1

 


 

Anexo 2:

No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo.A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele. E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 


 

Anexo3:

 

Traduções de Gên. 1:4 -  “E viu Deus a luz, que era boa”

Hebraico:

טוב
כי
האור
את
אלהים
וירא
BOA
QUE
LUZ
A
ELOHIM
VIU E
 

Swedenborg, Arcanos:                       “Et vidit Deus Lucem, quod bona”

Arcanos em português:                     “E viu Deus a luz, que (era) boa”.

King James:                                        “And God saw the light that it was good”

Kempton:                                           “And God saw the light, that it was good”

Espanhola, Ferrara 1553:                  “Y vido el dio ala luz þ buena”

~~~~~~~~~~~~~~

Vulgata:                                             “Et vidit Deus lucem quod esset bona”

Soc. Bíblica Britânica:                                   “Viu Deus a luz que era boa”

~~~~~~~~~~~~~~

Espanhola, Reina, 1569:                    “Y vido Dios que la luz era buena”

Reina atual:                                       “Y vió Dios que la luz era buena”

Port., A. P. Figueiredo, 1885:             “E vio Deus que a luz era boa”

ACF (A. Corrigida Fiel):                      “E viu Deus que era boa a luz”

AR (A. Revisada (IB)):                        “E viu Deus que a luz era boa”

ARA (A. Revista e Atualizada):           “E viu Deus que a luz era boa”

ARC (A. Revista e Corrigida):            “E viu Deus que era boa a luz”

NAA (Nova A. Atualizada):                 “E Deus viu que a luz era boa”

Nova Versão Internacional:               “Deus viu que a luz era boa”

O Livro:                                              “E a luz apareceu. Deus ficou satisfeito”

 

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2do Dia da Criação {VÍDEO]
E disse Deus: ...Haja separação entre águas e águas Aula gratuita!

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Gênesis
Os Seis Dias da Criação
O Segundo Dia
 

C. R. Nobre

 

“E disse Deus: Haja uma expansão no meio das águas e haja distinção entre as águas para as águas. E fez Deus a expansão; e separou entre as águas que estavamabaixo da expansão e entre as águas que estavamacima da expansão. E assim se fez. E chamou Deus à expansão, céu. E houve tarde, e houve manhã, o dia segundo.”-Gênesis 1:6

 

Vimos na semana passada que os seis dias da criação significamseis estados da regeneração ou novo nascimento espiritual do homem.

Vimos, também, que a criação da luz no primeiro dia significa o estado em que a pessoa tem o primeiro esclarecimento sobre Deus, e compreende pela primeira vez “que o Senhor é, e que o Senhor é o bem mesmo e a verdade mesma, e que não há bem e verdade se não vêm do Senhor”.

Vimos, ainda, que esse primeiro estado só é possível porque a Misericórdia Divina estava influindo nas relíquias do espírito, avivando e estimulando o que havia de bem e verdade, procedentes d’Ele, com o homem. Portanto, o primeiro estado é quando se dá a primeira luz da verdadeira fé no entendimento humano.

No segundo dia da criação, Deus cria uma amplidão de espaço no meio das águas, e separa as águas em dois grandes ajuntamentos, um abaixo e outro acima da expansão. A essa grande expansão Ele dá o nome de “céu”.

Devemos observar que o texto fala em “águas” e “céu”, mas não diz que as águas são criadas nesse dia. Somente o céu é criado. As águas são citadas como se já estivessem lá, como se já existissem e precisassem apenas ser ordenadas, uma parte sendo distinta da outra, uma abaixo e outra acima da expansão. Se este fosse um relato literal da criação, já teríamos aqui a primeira dificuldade: se o elemento água não foi criado por Deus, como já existia? Se foi criado, porque o texto não fala? E notem que, já antes de ser criada a luz, as faces das águas estavam lá, sob a ação do Espírito de Deus. Mas não precisamos lidar com essa dificuldade do texto, porque, como vimos, aqui se trata não do universo físico, mas do universo espiritual em cada indivíduo no qual as águas representam as verdades.

Então, o significado espiritual desse relato é que osegundo estado existe quando o homem passa a perceber que ele tem uma mente interna, além da interna; ou, o homem interno ou espiritual, além do homem externo ou natural. Porque até então ele não sabia que havia tal distinção, e nem ao menos sabia que havia um homem interno. Os “Arcanos” dizem que o homem não regenerado está envolvido demais nas coisas corporais e mundanas, e por isso não entende as coisas espirituaisou as confunde, e “faz, de coisas distintas entre si, uma unidade confusa e obscura” (AC 24). É como também escreveu o apóstolo Paulo aos Coríntios: “Mas o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe sãoloucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente.”(1Co. 2:14). E como só agora o homemcomeça a saber que existe um homem interno, por isso é dito que este é criado. “O homem interno chama-se ‘expansão’” (AC 24).

“Expansão” ou “céu” são os termos empregados na Palavra para significar o homem interno porque dão a ideia de uma grande extensão de espaço, uma vastidão, um universo, pois o homem interno ou o espírito do homem é, de fato, esse universo em si, como já foi reconhecido por muitos na antiguidade.

Dentro desse imenso espaço que é o espírito humano, a primeira coisa salvífica que se organizam na regeneração são os conhecimentos e as cognições. Os conhecimentos são representados pelas “águas debaixo da expansão”, que são os conhecimentos que estão no homem externo, na mente externa. Já as cognições são representadas pelas “águas acima da expansão” e, portanto, pertencem ao homem interno, sendo provenientes do Senhor.

Quanto aos termos aqui usados, “conhecimentos” e “cognições”, representados pelas águas de baixo e de cima, respectivamente, temos de admitir que é difícil compreender com clareza a distinção que há entre os dois vocábulos empregados nos “Arcanos”. A definição dos dicionários não nos ajuda muito. A dificuldade é que todas as explicações a respeito de “cognição” também servem para “conhecimento”, e às vezes ambos são empregados numa mesma explicação. Nós traduzimos os dois termos assim porque são distintos, embora não entendamos exatamente como. Em resumo, são dois tipos de conhecimento mencionados nos “Arcanos Celestes”.Mas, de modo geral, o conhecimento é toda informação recebida pelos sentidos, e a cognição é um conhecimento mais elevado por causa de sua origem na Palavra, por tem algo vivo no íntimo, assim como o ovo inseminado difere de um ovo não inseminado ou estéril.

Tanto o conhecimento quanto a cognição são representados pelas águas. E, talvez, a dificuldade de percebermos a distinção é porque a composição química da água é uma só e a mesma, esteja ela embaixo, na terra, ou acima, nas nuvens. Sendo assim, a diferença mais perceptível seria quanto ao lugar onde os conhecimentos estão, na mente do homem natural ou na mente do homem espiritual.

Deixando um pouco de lado os vocábulos, pensemos na correspondência das águas que estão abaixo do céu e as que estão no céu, aságuas de um rio e as águas nas nuvens. A distinção entre elas é marcante; não apenas porque umas estão abaixo e outras acima, mas também porque umas estão próximas às impurezas que são do solo e por aí contaminadas, ao passo que as outras foram sublimadas, purificadas pela evaporação, por assim dizer, e agora se acham bem alto. Ali estão como que armazenadas para fluir na terra, no lugar certo e no tempo propício.

As“águas abaixo do céu” são, portanto, os conhecimentos do homem externo, que estão próximos ao seunível corporal ou dos sentidos. Sendo assim, são verdadesnaturais misturadas às ilusões e às fantasias próprias da mente natural. São as verdades do indivíduo, que têm a cor, o odor e o gosto do solo do aprendizado e da experiência de onde elas vieram, por onde passaram e onde se depositam. E, além disso, essas verdades ou fatos do pensamento e da memória são estimuladas e movidas pelas afeições do indivíduo, tanto as boas quanto as más e as cobiças daí derivadas.

Já as cognições do homem interno são conhecimentos ou verdades de outra natureza: são águas puras, porque vêm do Altíssimo. E quando descem e chegam à mente, como chuva na terra, vêm diretamente da Palavra, em forma de percepção acerca do que é correto fazer. E, se fazemos, algo de vivo é produzido em nosso homem externo. Como diz o Salmo 147 (1,8): “Louvai ao Senhor... que cobre o céu de nuvens, que prepara a chuva para a terra, que faz produzir erva sobre os montes”.

Além de fluírem diretamente da Palavra na nossa mente, como chuva na terra, as cognições do homem interno também influem na memória, o ajuntamento das águas chamado mar, e chegam ao pensamento consciente em uma sequência ininterrupta, em ondas que chegam à praia do mar.

Por isso é que ofluxo do pensamento não está sob o controle da mente externa, porque vem do calor oriundo das afeições do amor, no interno. As afeições são os princípios dos pensamentos, como lemos em outra obra de Swedenborg, o Diário Espiritual, n. 3127.

Mas, mesmo quando as cognições descem da expansão do céu, do homem interno através da memória, elas chegam ao nosso pensamento modificadas pelo calor e pelo sal de nossas afeições recentes e antigas.Assim como a água salgada do mar, os conhecimentos oriundos da memória por si sós não servem pararegar a terra e produzir vida, como acontece com a chuva, que é transformada em rios.

Assim, segundo estágio da regeneração, ou o segundo dia, é aquele em que homem passa a saberque existe uma distinção entre os conhecimentos dele mesmo, armazenados em sua memória, adquiridos por motivos próprios e terrenos, e as cognições da verdade e do bem, que são do Senhor, só.

O homem, reconhecendo sua insignificância diante do Amor e da Sabedoria Divinas, humilha-se e reconhece que ele mesmo nada é e nada sabe, e que só o Senhor é bom, e por isso todo bem e toda verdade têm de ser atribuídos ao Senhor, pois vêm d’Ele, somente. A aceitação deste fato é parte o início da implantação da verdadeira consciência no homem e a preparação para o começo de uma nova vida.

É interessante notar que, mesmo os conhecimentos do homem interno, ou seja, as concepções chamadas “águas acima da expansão”, têm de ser adquiridos por via externa; precisam vir através dos sentidos da visão e da audição, especialmente. O homem deve procurar em sua religião, lendo na Palavra, ouvindo as pregações e as doutrinações, o que é realmente o bem e a verdade, porque nenhuma informação dessa espécie pode vir diretamente do íntimo dele homem, pela via do seu espírito.

A correspondência disso é com a evaporação da água. Porque assim como toda água contida nas nuvens subiu da terra, como efeito de evaporação, assimtambémtoda concepção do homem interno foi antes um conhecimento da verdade, adquirido pelos sentidos externos. Há, portanto, um ciclo perpétuo das águas ou verdades também na mente humana, de evaporação e condensação. A instrução da Palavra que a pessoa recebe com amor pela verdade vai para uma região superior de sua mente, onde vai formar a consciência, e de lá descerá novamente como chuva, como um ditame Divino que pode gerar vida espiritual no homem abaixo.

Sem a instrução da revelação Divina, a mente humana é um deserto, que é estéril porque raramente recebe chuva, e não recebe chuva porque não há água para evaporação e condensação de nuvens.

Precisamos adquirir as verdades da fé pela Palavra porque é nelas, somente, que o Senhor, o Sol do mundo espiritual, pode influir, para formar em nós a consciência que vai nos guiar nas escolhas da vida.

É certo que, antes de ser regenerado, o homem busca o conhecimento por outros motivos que não os da vida eterna. Mas o Senhor, mesmo assim, permite que o homem adquira conhecimento, até mesmo por vaidade e para parecer sábio e inteligente, porque, a despeito dos motivos, os conhecimentos poderão vir a ser úteis mais tarde, quando o homem mudar seus motivos, e depois, na eternidade.

Na realidade, antes de ser regenerado, o homem nada busca para si a não ser o que pode satisfazer seu egoísmo, sua vaidade, suas ambições, cobiças, etc., etc. No número 1486 dos “Arcanos” lemos o seguinte: “Assim é com os conhecimentos que pertencem somente ao homem externo; ...são buscados por causa das coisas terrenas e mundanas por meio de impressões dos sentidos, a fim de poderem servir ao homem interior ou racional, e este ao homem espiritual, e este ao Senhor. ...Todo conhecimento deve ser por causa de algum uso e esta é a sua utilidade”.

A ordem da criação é que as águas abaixo da expansão vêm antes, e depois as que estão acima. Quer dizer, primeiro o homem busca o conhecimento, pelo desejo de fazer o que é justo e bom, e só depois se estabelecem nele as águas acima da expansão. As cognições do homem interno, verdades que foram sublimadas pela afeição de pô-las em prática na vida, começarão a formar a consciência e inspirar um novo padrão de vida, que começará a existir no terceiro dia da criação, como veremos.

Outra coisa interessante a observar é que o Senhor, no início, aproveita tudo o que é possível no coração do homem para a regeneração. Ele utiliza mesmo os motivos egoísticos comuns ao homem, e faz isso porque, na realidade, o homem então não tem outras coisas a oferecer. Em Sua Sabedoria e Sua misericórdia, o Senhor não dissipa de uma vez os conhecimentos falhos, os conceitos gastos de uma razão pretensamente ilustrada, o acúmulo de falsidades e erros; tampouco Ele expele de uma vez do coração humano as iniquidades e as cobiças, pois, de uma forma ou de outra, é disso que o homem não regenerado se nutre, são essas as molas que o impulsionam antes da regeneração. É como está nos profetas: “A cana pisada não quebrará, nem apagará o pavio que fumega; com verdade produzirá o juízo”. O que é assim explicado pelos Escritos: “Ele não quebra as ilusões nem apaga as cobiças, mas as direciona para a verdade e para o bem...” (AC 25).

Assim como em todos os outros estados da regeneração,“houve tarde e houve manhã”, isto é, a partir de um estado de sombra e de egoísmo, o homem vem a um estado de luz e verdadeiro amor. E, no “dia segundo”, começa a saber que existe um homem interno, que existe nele um espírito que se alimenta dos bens e verdades do Senhor e, por outro lado, existe o seu homem externo em completa carência de tudo o que é verdadeiramente bom e salvífico. Mas sabe, também, que é nas verdades e bens que fluem agora do seu espírito desde o Senhor, que ele encontrará sua nova vida e sua salvação.

 

Leituras AC 24; Salmo 147

 


 

 

Arcanos Celestes 24-26

24.     Vers. 6: “E disse Deus: Haja uma expansão no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas”. Depois que o Espírito de Deus ou a misericórdia do Senhor produziu no dia as cognições do vero e do bem e deu a primeira luz que o Senhor é, e que o Senhor é o bem mesmo e o vero mesmo, e que não existe bem e vero senão pelo Senhor, então distingue entre o homem interno e externo, assim, entre as cognições que estão no homem interno e os conhecimentos que são do homem externo. O homem interno é chamado “expansão”; as cognições que estão no homem interno são chamadas “águas acima da expansão”; e os conhecimentos do homem externo são chamados “águas debaixo da expansão”. O homem, antes de ser regenerado, nem mesmo sabe que existe o homem interno, ainda menos o que é o interno; pensa que não são distintos, porque está imerso nas coisas corporais e mundanas. Também imergiu nestas as coisas que são do homem interno e, de coisas distintas, fez uma unidade confusa e obscura. Por esta razão, primeiro se diz “haja uma expansão no meio das águas”, depois, “haja separação para as águas entre as águas”, mas não “separação das águas entre as águas”. Logo depois é dito assim (Vers. 7,8:): “E fez Deus a expansão, e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão e entre as águas que estavam acima da expansão; E assim se fez E chamou Deus à expansão céu”.

[2] A segunda coisa, pois, que o homem observa, quando é regenerado, é que começa a saber que existe um homem interno, ou que as coisas que estão no homem interno são bens e verdades, que são do Senhor, só. O homem externo, quando está sendo regenerado, é tal que sempre pensa que os bens que pratica, os pratica por si mesmo, e os veros que diz, por si os diz. E como é tal, ele é por esse modo conduzido pelo Senhor a praticar o bem e a falar o vero como se por si próprio. Por isso precede a separação das coisas que estão abaixo da expansão, e segue a das que estão acima da expansão. É também um arcano celeste que o homem, por meio dos próprios — tanto pelos enganos dos sentidos quanto pelas cobiças — seja conduzido e direcionado pelo Senhor para as coisas que são verdadeiras e boas, e, assim, que todos e cada um dos momentos da regeneração procedam da tarde para a manhã, como do homem externo para o interno, ou da terra para o céu. Por isso, agora a expansão ou homem interno é chamada “céu”.

25.     “Expandir a terra, e estender os céus” é locução habitual nos profetas onde se trata da regeneração do homem, como em Isaías:

“Assim disse Jehovah, Redentor teu e Formador teu desde o útero: Eu, Jehovah, que faço todas as coisas, que estendo os céus só, e que expando a terra por Mim mesmo” (44:24);

depois, onde se trata do advento do Senhor, diz‑se claramente:

“A cana esmagada não quebrará, e o pavio quefumega não apagará; em verdade produzirá o juízo;”

isto é, Ele não dissipa os enganos nem extingue as cobiças, mas direciona para o vero e o bem; assim segue‑se:

“DeusJehovah cria os céus e os estende, expande a terra e as suas produções; dá alma ao povo sobre ela, e espírito aos que nela andam” (42:3‑5).

Além do que é mencionado algumas vezes em outros lugares.

26.     Vers. 8: “E houve tarde, e houve manhã, o dia segundo”. O que é “tarde”, o que é “manhã” e o que é “dia”, vide acima, no vers. 5.


 

1º dia
Criação da luz;

separação entre a luz e as trevas, dia e noite
A verdade da fé brilha e mostra a distinção entre as coisas do homem e as de Deus
2º dia
Criação da expansão ou o céu;

separação entre as águas acima e abaixo
Noção de que existe um homem interno;

distingue entre as coisas do Senhor e as suas
3º dia
Ajuntamento das águas,

aparece o seco;terra e mares;

a terra faz germinar a erva, a erva de semente e a árvore dando fruto
O homem começa a falar a partir das verdades da fé e faz algum bem, mas pensa que fala e agepor si mesmo
4º dia
Luminares na expansão; o grande para dominar no dia e o menor, na noite, parem darem luz sobre a terra
A caridade e a fé são implantadas no homem interno
5º dia
As águas fazem produzir o réptil, a alma vivente; a ave voe sobre a terra e sobre as faces da expansão;

as baleias grandes e todo réptil
Fala pela fé e se confirma no bem;
6º dia
A terra produz alma vivente, a besta e o movente;

a fera, a besta

o homem, macho e fêmea, para dominar sobre a terra;
Fala e age pelo bem
Sabbath
O Senhor descansa
As lutas da regeneração do homem cessam, e o Senhor não precisa mais combater por ele.

 
 


 

 

Primeiro Dia

 
No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo. A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele. E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 


 

 

Segundo Dia
E disse Deus: Haja uma expansão
O homem interno é chamado “expansão”
no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas
Ordem para que se faça distinção entre os conhecimentos do homem externo e as cognições do homem interno
E fez Deus a expansão,
O homem interno é aberto
e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão
os conhecimentos do homem externo são vistos como distintos
e entre as águas que estavam acima da expansão;
das cognições do homem interno

“acima da expansão” = acima do homem interno, oriundas da Palavra
E assim se fez. E chamou Deus à expansão céu
O homem interno reconhecido
E houve tarde, e houve manhã,
A progressão da sombra da ignorância ou falsidade para a claridade da instrução na verdade
o dia segundo
O segundo estado da regeneração
 

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3er Dia da Criação [VÍDEO]
“E disse Deus: ...Faça germinar a terra erva tenra”. Aula gratuita!

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Os Seis Dias da Criação
O Terceiro Dia
 

C. R. Nobre

 

“E disse Deus: Ajuntem-se as águas abaixo do céu em um único lugar, apareça o seco. E foi feito assim. E chamou Deus ao seco, terra; e ao ajuntamento das águas chamou mares; e viu Deus que era bom. E disse Deus: Faça germinar a terra a erva tenra; a erva dando semente; a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie, na qual esteja sua semente, sobre a terra. E foi feito assim. E produziu a terra erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual estava a sua semente, segundo a sua espécie. E viu Deus que era bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia terceiro.” (Gên.1:9-12)

Entramos agora no terceiro dia ou estado sucessivo da nova criação.

Os Arcanos Celestes nos dizem que nesse terceiro estado começa o que se chama de penitência, que é o afastamento ou abstenção dos males. No primeiro e no segundo estados,começoua haver uma mudança no modo de pensar, o que ocorre no entendimento. Mas no terceiro dia começa a se fazer a mudança no modo de agir, na área da vontade, o próprio ser da pessoa, porque a vontade ou o amor é a pessoa mesma, enquanto o entendimento ou a razão é a forma externa da vontade ou amor.

A mudança no modo de pensar é relativamente fácil, mas a mudança no modo de agir é mais difícil, porque envolve os hábitos, os costumes e as afeições, que são o amor mesmo da pessoa. É por isso que no terceiro dia têm início o combate da penitência, a luta entre o homem externo e o homem interno, com vista à regeneração.

O ajuntamento de águas em um só lugar faz aparecer a porção seca, a terra, que é a mente externa. Aqui se trata da distinção entre a memória e o pensamento, ambos na mente externa do homem. A porção seca aparece quando a pessoa começa a ter realmente noção do que se passa nessa mente, quando começa a analisar os seus pensamentos e refletir sobre a qualidade e a origem deles, e descobre, entre outras coisas, que os pensamentos são provenientes de afeições de sua vontade. Quando a pessoa examina seus pensamentos, é como se elaexaminassede outro pensamento, de cima, um pensamento vendo e analisando o outro, porque, de fato, conforme nos ensinam os Escritos de Swedenborg,temos um pensamento exterior e um interior:o exterior, que pensa, e o interior, que julga o que estamos pesando.

As águas assim reunidas num só lugar, ou os conhecimentos recebidos, reunidos e classificados na memória, são chamadas“mares”, no relato da criação. É da memória que nos chegam as ondas contínuas de pensamento, como já vimos na vez passada.

Ainda que assim pareça, essas ondas de pensamento não nos chegam aleatoriamente ou do nada, massão emanações de nossas afeições, as quais, por sua vez, recebem o influxo de anjos e espíritos no mundo espiritual, e estes o recebem do Senhor, como o Sol do mundo espiritual. Assim, todo sentimento, toda sensação, toda afeição ou todo amor, foi, em sua origem, uma emanação do Divino Amor do Criador, mas cada um recebe e retransmite em conformidade com a sua própria natureza. E os Escritos fazem uma ilustração muito apropriada disso com o reino vegetal, pois o sol natural influi em todas as plantas com igual luz e calor, mas cada planta recebe o influxoà sua maneira e produz conforme a sua espécie.

“E disse Deus: Faça germinar a terra a erva tenra; a erva dando semente; a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie, na qual esteja sua semente, sobre a terra. E foi feito assim.”

No terceiro dia é a terra que começa a produzir algo. Ora, se a “terra” é o homem externo, vê-se claramente que essas produções, as ervas, a árvore e seu fruto, são as primeiras obras que a pessoa começa a praticar como por si mesmo quando está sendo regenerada pelo Senhor.Porque, ao ser inspirado pelos conhecimentos acerca da religião (os “mares” ou “águas ajuntadas em um único lugar”), o homem natural começa a pensar com mais retidão sobreseu próximo e sobreDeus, e leva isso em conta nas coisas que ele faz e deixa de fazer. Esses pensamentos mais elevados são as sementes de uma nova vida, uma nova vontade, que será criada e implantada gradativamente.  É um processo,cujas etapas são representadas aqui pelo que a terra produz: a erva tenra, a erva dando semente e a árvore de fruto.

Nesse estado, do terceiro dia, as obras são praticadas por mera obediência ao que foi aprendido. As ações e atitudes procedem ainda de uma obediência intelectual, de um senso de dever para com Deus, e nãosão, ainda, os bens da caridade, porque não provêm de alguma vontade, pois avontade nova ainda não foi implantada. Na realidade, a vontade que está ativa é ainda a velha vontade, o velho homem. Essa velha vontade, quando se vê contrariada pelo novo modo de agir, resiste à mudança e põe obstáculos à obediência da fé. É essa oposição da velha vontade que resulta num combate entre o novo e o velho na pessoa. Por isso é que se diz que o terceiro dia é o estado de penitência, que é uma batalha mental para se abster dos males.

O que se passa com o homem nesse terceiro estado é o seguinte: as obras que ele então começa a praticar, significadas pelaerva tenra, a erva dando semente e a árvore de fruto, são motivadaspelo amor irregenerado, que é o amor a si mesmo acima do amor a Deus e ao próximo.

Mas, se o homem persiste, luta contra essa resistência e obedece aos ditames de sua fé, então ele é como a terra que começa a produzir o vegetal. Nessa fase, porém, ele pensa e sente que faz tais bens e fala tais verdades por si mesmo, por seu próprio esforço, sua própria bondade e honestidade. E aqui acontece algo interessante: o bemque a pessoa praticapor obediência lhe traz um sentido de realização, uma alegriadiferente, nova, por ter agido bem, pela caridade e pela fé, e ele considera ser esse contentamento um sinalde que tem amor ao próximo e a Deus. O prazer em ser útil tem si, essa gratificação. É então que o homem percebe em si uma afeição como se fosse celeste, fruto do seu novo nascimento.

Todavia, o caso não é bem assim. Vejamos como realmente se passa no terceiro dia. E, para isso, vamos tomar uma ilustração tomada do livro do Êxodo.

Lemos que, quando o povo de Israel saiu do Egito, bem antes de chegarem à terra prometida, Moisés enviou espiões para ver comoseria aquela terra à frente deles. Esses espiões foram lá e, depois de quarenta dias, voltaram com uma notícia dupla: disseram que era, sim, uma terra que manava leite e mele de lá trouxeram como provas um cacho de uvas tão grande que dois homens a tinham de transportar, além de romãs e figos. Mas disseram,também, que naquela terra habitavam inimigos terríveis,gigantes, a ponto de eles se sentirem como gafanhotos, comparados a eles. O povo teve medo dos inimigos. No entanto, por causa dos bons frutos que viram, foram animados porJosué e Calebe a seguirem em frente.

Pois bem, esse prazer celestial que a pessoa sente no terceiro dia, quando obedece na vida diária os princípios da fé, são como os frutos da terra que mana leite e mel. São as amostras da alegria do céu que o Senhor dáàquele que está sendo preparado pela regeneração. Não são prazeres celestes mesmos, mas uma amostra, que os Escritos chamam de inefável, porque vem do íntimo, desde o Divino Amor..

E por que os atos do homem, no terceiro estado, são simbolizados pelos vegetais?Porque como os vegetais, esses atostêm algo de vivo, mas são ainda inanimados. E por que são inanimados? Porque nessa fase da regeneração os motivos próprios o homem ainda são centrados em si mesmo. Ele ainda tem em vista o mérito nas obras que pratica. Por exemplo, como agora está vivendo na bondade prescrita pela religião, pensa que tem direito ao galardão do céu, por merecimento, e Deus lhe deve obrigatoriamente levá-lo o céu e dar-lhe todas as bem-aventuranças na vida presente e futura. Mas os Arcanos Celestes dizem, neste ponto, “quem pensa que o bem e a verdade vêm de si mesmo, não tem ainda a vida da verdadeira fé, a qual pode vir a receber, porém, mais tarde.” (29).

Veremos depois, no quarto dia, que serão criados o Sol e a Lua. Estes representam o verdadeiro amor e a verdadeira fé implantados no homem. Enquanto isso, enquanto não age pelo verdadeiro amor espiritual, a pessoa age e deve agir pela obediência. Por isso os frutos de sua fé ainda não são realmente vivos, mas também não sãoa morte. Porque, neste estado, o homem “está no estado de preparação para receber a vida da fé... que ele pode vir a receber mais tarde” (29). O fato é que, no terceiro dia, o homem espiritual ainda não nasceu, e sua vida é semelhante à vida do embrião ou do feto no útero.

As obras que a pessoa pratica no terceiro dia, significadas pelos vegetais, têm como motivação as afeições naturais, como a ambição, o orgulho e o medo. Ambição pelo céu, baseada no merecimento da salvação como recompensa da própria justiça e, também, do galardão celeste. O orgulho da própria bondade ou, até, da própria fé, por se achar “escolhido” ou por pensar que tem intimidade com Deus e Deus vai lhe dar tudo o que ele pedir com fé. E o medo é o terrordo fogo do inferno, da condenação eterna. Essas coisas estão no íntimo ou naintenção de todos osatosno começo. Espiritualmente falando, a pessoa é como a criança que é ensinada a obedecer por causa da recompensa ou do castigo.

A despeito dessa noção obscura e dessas ações ainda egoísticas,o Senhor, não obstante, não rejeita o homem, mas o está direcionando cada vez mais da tarde para a manhã,para uma fée vida verdadeiras, como veremos pelo que está representado no quarto, quinto e sexto dias da criação.

O fato é que na nossa jornada espiritual ou nossa gestação de nosso novo nascimento, o Senhormuda gradualmente os nossos motivos. Ele tira os enganos, as vãs ambições e o medo, e implanta em nós o amor verdadeiro para com o próximo. E o amor verdadeiro tem três características: altruísmo, comunhão e utilidade, conforme veremos no quarto dia. Sem qualquer um desses três, o amor não é genuíno.

O Senhor tira o vazio de nossas vidas, e nos dá um alvo, um sentido à nossa existência, que é a vida de usos, porque fomos criados neste mundo para sermos preparados para o céu, e o reino dos céus é o reino dos usos. Mas Ele não pode promover essa transformação instantaneamente. Porque não pode extirpar de uma só vez as más inclinações, os sentimentos negativos e maléficos, pois eles fazem parte da identidade, da experiência, da personalidade do indivíduo, e isso seria anular ou aniquilar o ser mesmo da pessoa. Mas, com mão branda, porémpoderosa, nosso Criador muda quase imperceptivelmente os rumos de nossa caminhada espiritual, sem constranger nossa liberdade, e reforma nosso entendimento, regenera nossa vontade. Quanto mais nos voltarmos para Ele e nos esforçarmos para obedecê-Lo, mais enxergaremos a luz, a luz que alumia nossas almas, que dissipa as trevas da ignorância e nos faz enxergar a real natureza de nosso ser.

Notamosbem a progressão, nesse estado daregeneração,na ordem em que os vegetais são citados: primeiro, a erva tenra; depois, a erva dando semente; enfim, a árvore frutífera dando fruto. Isto vem de que, mesmo que as obras que o homem então faz sejam espiritualmente inanimadas, como, porém, o Senhor o está guiando, esses atos vão se tornando cada vez mais vivos e úteis, e isso na mesma proporção que o homem combate, como por si mesmo, as concupiscências no seu externo irregenerado.

Nessa progressão, a “erva tenra” são as primeiras concepções da fé que ele adquire em seu externo, os primeiros doutrinais em que acredita porque viu que são verdades do Senhor. A “erva dando semente” são essas verdades, mas agora visando um uso (AC 57), as quais ele toma como princípios para a sua vida. E a “árvore dando fruto, no qual está a sua semente” é, finalmente, um bem útil, algum uso que então passa a desempenhar em favor do próximo e do Senhor, mesmo que o homem não seja, ainda, movido pelo amor e fé genuínos.

É importante salientar que essa progressão, desde a erva até o fruto da árvore, só acontece quando a pessoa combate a letargia de seu comodismo com os prazeres naturais e corpóreose se esforça para vencer a força oposta dentro dele mesmo. A resistência opostaé alimentada por maus espíritos, que não querem que tal progressão aconteça, pois eles não querem perder sua moradia nas coisas egoísticas e impuras que há na mente e no coração da pessoa.

Então, para alcançar progresso nesse estado, o homem tem de constranger a si mesmo, tomar o leito em que se deita acomodado em sua paralisia espiritual e, mediante a ordem do Senhor, levantar e andar.

Por conseguinte, a pessoa nunca deve esperar ter vontade de fazer a penitência, nunca esperar ter vontade para se instruir na Palavra e nas Doutrinas, nunca esperar ter o amor genuíno, pois, no começo, essa vontade não existe e nunca virá, pois o amor que reina ainda é contrário. Notemos que o amor genuíno só existirá no quarto estágio da regeneração, quando são criados o sol e a lua em seu espírito. E o quarto estágio só existe quando é passado o terceiro. E o terceiro é o de penitência, de luta contra o mal, de luta contra si mesmo, como o Senhor disse: “Quem quiser vir após mim, tome a cada dia a sua cruz, e siga-Me”.

“E produziu a terra erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual estava a sua semente, segundo a sua espécie. E viu Deus que era bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia terceiro.”

 

Leituras:Gênesis 1:9-11; Lucas 6:32-35


 

 

Arcanos Celestes

29.    Vers. 11, 12: “E disse Deus: Faça germinar a terra a erva tenra, a erva dando semente, a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie, no qual [esteja] a sua semente, sobre a terra. E assim se fez E produziu a terra a erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual [estava] a sua semente, segundo a sua espécie. E viu Deus que [era] bom.” Quando a terra – ou o homem –– foi assim preparada para que pudesse receber do Senhor as sementes celestes e produzir alguma coisa do bem e do vero, então o Senhor faz primeiro germinar alguma coisa tenra que é chamada “erva tenra”; depois, alguma coisa mais útil que se semeia de novo e é chamada “erva dando semente”; enfim, algum bem que frutifica e é chamado “árvore dando fruto no qual [está] a sua semente”, cada um “segundo a sua espécie”. A princípio, o homem que está sendo regenerado é tal que pensa que o bem que faz vem de si mesmo, e o vero que diz vem de si mesmo, quando todavia a coisa se passa assim: todo bem e todo vero vêm do Senhor. Por isso, quem pensa que essas coisas vêm de si mesmo não tem ainda a vida da verdadeira fé, que pode todavia receber depois. Com efeito, ainda não pode crer que o bem e o vero vêm do Senhor, porque está no estado de preparação para receber a vida da fé. Este estado é representado aqui pelas coisas inanimadas, e o estado da vida da fé é representado depois pelas coisas animadas. [2]Que o Senhor seja o Semeador, a “semente” seja a Palavra Mesma e a “terra” seja o homem, Ele Mesmo Se dignou a dizê‑lo em Mateus 13: 19‑24; 37‑39; Marcos 4:14‑21; Lucas 8:11-16. Também o descreve de modo semelhante:

“O reino de Deus é assim como se um homemlançasse a semente à terra, e dormisse e se levantasse de noite e de dia; e a semente brotasse e crescesse, não sabendo ele como, porque a terra por si mesma frutifica, primeiro a erva, depois a espiga e em seguida o grão cheio na espiga” (Mc. 4:26‑28).

Pelo “reino de Deus” se entende, num sentido abrangente, o céu universal; num sentido menos abrangente, a verdadeira Igreja do Senhor; num sentido particular, todo aquele que está na verdadeira fé ou é regenerado pela vida da fé, pelo que é também chamado “céu”, porque no céu está, e “reino de Deus” porque o reino de Deus está nele. É o que o Senhor mesmo ensina em Lucas:

“Jesus, interrogado pelos fariseus: Quando vem o reino de Deus?, respondeu‑lhes e disse: O reino de Deus não vem com visível aparência, nem dirão: Ei‑lo aqui, ou, Ei‑lo ali; porque eis que o reino de Deus está dentro de vós” (17:20,21).

Este é o terceiro estado sucessivo da regeneração do homem e o seu estado de penitência; procede, semelhantemente, da sombra para a luz, ou da tarde para a manhã; por isso se diz no versículo 13: “E houve tarde, e houve manhã, o dia terceiro”.

 

Nova Jerusalém e Sua Doutrina Celeste, 150-157

Do Mérito
150.          Os que fazem o bem a fim de merecer não fazem bem pelo amor do bem, mas pelo amor da recompensa, pois quem quer ter mérito quer ser retribuído. Os que fazem assim visam o prazer e o põem na recompensa e não no bem, pelo que não são espirituais, mas naturais.

151.          Fazer o bem que é bem deve vir do amor do bem, assim, por causa do bem. Os que estão nesse amor não querem ouvir falar de mérito, pois amam fazer e nisso sentem felicidade, e, ao contrário, ficam contristados se se crê que o fazem por algo de si. Essas coisas são mais ou menos como o caso dos que fazem o bem aos amigos por causa da amizade, aos irmãos por causa da fraternidade, à esposa e aos filhos por causa da esposa e dos filhos, à pátria por causa da pátria, assim, por amizade e por amor. Os que pensam bem até dizem e se persuadem de que os beneficiam não por causa de si mesmos, mas por causa dos outros.

152.          Os que fazem o bem por causa de recompensa não fazem o bem pelo Senhor, mas por si mesmos, porque visam primeiro a si mesmos, pois visam o seu próprio bem, e não visam o bem do próximo – que é o bem do concidadão, da sociedade humana, da pátria e da igreja – senão como um meio para o fim. Daí é que no bem do mérito se encerra o bem do amor de si e do mundo, e esse bem vem do homem e não do Senhor, e todo bem que vem do homem não é bem; de fato, é um mal na proporção que houver aí o que é de si e do mundo.

153.          A genuína caridade e a genuína fé são desprovidas de todo mérito, pois o prazer da caridade é o bem mesmo, e o prazer da fé é o vero mesmo. Por isso, os que estão nessa fé e nessa caridade sabem o que é o bem não meritório, mas não os que não estão na caridade e na fé.

154.          Que o bem não deva ser feito por causa de recompensa o Senhor mesmo ensina em Lucas:

“Se... amardes os que vos amam, que graça há para vós?... porque... os pecadores fazem o mesmo. ...Amai antes os vossos inimigos, e fazei-lhes bem, e dai muito, sem nada esperardes; então será grande a vossa recompensa, e [sereis] filhos do Altíssimo” (Lc. 6:32-25).

Que o homem não possa de si mesmo fazer o bem que é bem o Senhor também ensina em João:

“O homem nada pode tomar, a menos que lhe seja dado do céu” (Jo. 3:27);

e, em outra passagem:

Jesus disse: “Eu sou a Videira, vós os ramos;” ...”como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim tampouco vós, se não permanecerdes em Mim... Quem permanece em Mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois sem Mim nada podeis fazer” (Jo. 15:4-8).

155.          Visto que todo bem e vero procede do Senhor e nada do homem, e visto que o bem oriundo do homem não é o bem, segue-se que nenhum homem tem mérito, mas o Senhor, somente. O mérito do Senhor é que pelo próprio poder Ele salve o gênero humano, e também salva aqueles que fazem o bem por Ele. Daí é que na Palavra se chama ‘justo’ aquele a quem são adjudicados o mérito e a justiça do Senhor, e ‘injusto’ aquele a quem são adjudicados a própria justiça e o seu mérito.

156.          O prazer mesmo que há no amor de fazer o bem sem o fim de retribuição é a recompensa que permanece na eternidade, pois nela são insinuados pelo Senhor o céu e a felicidade eterna.

157.          Pensar e crer que vão ao céu os que fazem o bem, e também que se deve fazer o bem para ir ao céu, não é esperar recompensa como fim, nem, portanto, pôr mérito nas obras, pois assim pensam e creem também aqueles que fazem o bem pelo Senhor. Mas os que assim pensam, creem e fazem, e não estão no amor do bem por causa do bem, esses esperam e põem [mérito nas obras].

 

 

 

1º dia
Criação da luz;

separação entre a luz e as trevas, dia e noite
A verdade da fé brilha e mostra a distinção entre as coisas do homem e as de Deus
2º dia
Criação da expansão ou o céu;

separação entre as águas acima e abaixo
Noção de que existe um homem interno;

distingue entre as coisas do Senhor e as suas
3º dia
Ajuntamento das águas,

aparece o seco; terra e mares;

a terra faz germinar a erva, a erva de semente e a árvore dando fruto
O homem começa a falar a partir das verdades da fé e faz algum bem, mas pensa que fala e age por si mesmo
4º dia
Luminares na expansão; o grande para dominar no dia e o menor, na noite, parem darem luz sobre a terra
A caridade e a fé são implantadas no homem interno
5º dia
As águas fazem produzir o réptil, a alma vivente; a ave voe sobre a terra e sobre as faces da expansão;

as baleias grandes e todo réptil
Fala pela fé e se confirma no bem;
6º dia
A terra produz alma vivente, a besta e o movente;

a fera, a besta

o homem, macho e fêmea, para dominar sobre a terra;
Fala e age pelo bem
Sabbath
O Senhor descansa
As lutas da regeneração do homem cessam, e o Senhor não precisa mais combater por ele.

 
 


 

 

Primeiro Dia

 
No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo. A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele. E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 


 

 

Segundo Dia
E disse Deus: Haja uma expansão
O homem interno é chamado “expansão”
no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas
Ordem para que se faça distinção entre os conhecimentos do homem externo e as cognições do homem interno
E fez Deus a expansão,
O homem interno é aberto
e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão
os conhecimentos do homem externo são vistos como distintos
e entre as águas que estavam acima da expansão;
das cognições do homem interno

“acima da expansão” = acima do homem interno, oriundas da Palavra
E assim se fez. E chamou Deus à expansão céu
O homem interno reconhecido
E houve tarde, e houve manhã,
A progressão da sombra da ignorância ou falsidade para a claridade da instrução na verdade
o dia segundo
O segundo estado da regeneração
 


 

TerceiroDia
E disse DEUS: Faça germinar a terra a erva tenra,
Quando a terra – ou o homem –– foi assim preparada para que pudesse receber do SENHOR as sementes celestes e produzir alguma coisa do bem e do vero, então o SENHOR faz primeiro germinar alguma coisa tenra que é chamada “erva tenra”
a erva dando semente,
”; depois, alguma coisa mais útil que se semeia de novo e é chamada “erva dando semente”;
a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie,
enfim, algum bem que frutifica e é chamado “árvore dando fruto no qual [está] a sua semente”, cada um “segundo a sua espécie”
no qual [esteja] a sua semente, sobre a terra. E assim se fez E produziu a terra a erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual [estava] a sua semente, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom.”
A princípio, o homem que está sendo regenerado é tal que pensa que o bem que faz vem de si mesmo, e o vero que diz vem de si mesmo, quando todavia a coisa se passa assim: todo bem e todo vero vêm do SENHOR. Por isso, quem pensa que essas coisas vêm de si mesmo não tem ainda a vida da verdadeira fé, que pode todavia receber depois. Com efeito, ainda não pode crer que o bem e o vero vêm do SENHOR, porque está no estado de preparação para receber a vida da fé. Este estado é representado aqui pelas coisas inanimadas, e o estado da vida da fé é representado depois pelas coisas animadas.
 

 

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4to Dia da Criação {VÍDEO]
“E disse Deus: ...Haja luminares na expansão dos Céus” Aula gratuita!

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Os Seis Dias da Criação
O Quarto Dia
 

C. R. Nobre

 

Nas últimas semanas temos estudado o sentido espiritual do relato da criação no livro de Gênesis, conforme os Escritos teológicos de Swedenborg e vimos que os seis dias da criação representam seis estados sucessivos do novo nascimento ou regeneração do homem.

O primeiro dia, da criação da luz, é o primeiro estado, quando ele pela primeira vez percebe a realidade Divina e espiritual acima de suas limitadas concepções da vida.

O segundo dia, quando é criado o céu ou a expansão, éo estado em que ele passa a saber que tem um homem interno, o qual, por issoé como se fosse criado. Esse homem interno é o seu ouranos, ou céu. Nesse dia, faz-se distinção entre as águas acima, que são as cognições da fé, nohomem interno, e as águas abaixo, os conhecimentos e fatos no pensamento e na memória externa.

No terceiro dia o homem começa a se compelir a obedeceràscognições que adquiriu. Isso foi representado no fato de a terra produzir a série de vegetais. Essas primeiras obras ele pratica porobediência aos ensinamentos da fé; não vêm de sua vontade, pois ela se opõe afazer o que a verdade ensina. E mesmo quando elevence a resistência da vontade e pratica a fé,ele crê que as obras da obediência vêm dele mesmo. Sendo assim, essas obras do terceiro dia são inanimadas, porque ele as atribui a si mesmo, à sua bondade e justiça.

Mas, se ele persevera na obediência, passa da sombra da tarde, da ignorância, para a clara luz da manhã, da instrução, e então entra no quarto dia, quando são implantados nele o verdadeiro amor e a verdadeira fé.

“E disse DEUS: Haja luminares na expansão dos céus, para distinção entre o dia e entre a noite. E serão para sinais, e para tempos determinados e para dias e anos. E serão por luminares na expansão dos céus, para dar luz sobre a terra. E foi feito assim. E fez DEUS dois luminares grandes; o luminar grande para dominar o dia, e o luminar menor para dominar a noite, e as estrelas. E pô-los DEUS na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra. E para dominar no dia, e na noite, e para distinguir entre a luz e entre as trevas. E viu Deus que era bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia quarto.”

Conforme lemos nos Arcanos Celestes, o “luminar maior ou sol” significa o amor e, por derivação, a caridade, porque a caridade é a forma como o homem sente e recebe na sua vontade o Divino Amor; e o“luminar menor ou lua” significa a verdade e, assim, a fé, que é como o homem vê e recebe no seu entendimento a Divina Sabedoria. As estrelas são “os conhecimentos da verdade e do bem”. Portanto, a criação do sol e da lua significa, no sentido interno, a implantação da caridade e da fé no espírito do homem, e a criação das estrelas significa a multiplicação dos conhecimentos sobre a verdade e o bem.

Em toda parte na Palavra, o sol significa o amor, por causa do calor e da luz que dele emana, e esse calor e essa luz geram a vida no mundo. E a lua significa a fé, que é verdadeira quando procede do amor; porque assim como a lua não tem luz própria, mas reflete a luz do Sol, assim também a fé, só ilumina a mente se proceder da caridade.

Até o terceiro dia o homem se achava no estado de auto compulsão, de se constranger para fazer aquilo que a fé ensina, e contrariavaa vontade oposta em si. E mesmo se fizessealgo de bom grado, o que o impulsionava erasomente o seu amor ou sua disposição natural. Por isso o terceiro dia é um estado de combate entre obedecer à fé ou se render à vontade própria.

Mas agora, no quarto dia, o Senhor começa a implantar no homem a caridade ou amor espiritual; agora o homem começa a ser guiado pela caridade e iluminado pela fé.A fé é implantada em seu entendimento, os conhecimentos em sua memória, mas a caridade é estabelecida não na vontade mesma do homem, mas no seu entendimento, e no começo ela aparece como consciência. Se o homem perseverar em agir de acordo com essa consciência da verdade, ela se tornará a nova vontade, que será seu homem novo e regenerado. Portanto, a consciência é como se fosse uma nova vontade, a caridade espiritual, segundo a qual o homem passa agora a querer e a agir.

“A fé e a caridade são agora acesas no homem interno, e são chamadas ‘luminares’”. Fé e caridade nunca podem ser separadas, pois a caridade é a essência da fé, e a fé é a forma da caridade. São como corpo e alma; se uma for separada da outra, as duas perecem. Não devemos deve crer numa verdade e viver diferentemente do que a verdade ensina, pois assim estaremos aniquilando em nossa mente tanto a fé quanto a caridade. E como fé e a caridade constituem uma só coisa, e por isso é que, na criação dos dois luminares, Deus pronunciou o verbo no singular: “Sit” [haja] luminares, e não “Sint”, no plural.

O amor e a fé no homem interno são como o calor e a luz no corpo e no mundonatural. “A vida da fé sem o amor é como a luz do sol sem o calor, como sucede no inverno, quando nada cresce mas todas as coisas ficam entorpecidas e mortas. Mas a fé que procede do amor é como a luz do sol no tempo da primavera, quando todas as coisas crescem e florescem, porque é o calor do sol que as produz. Sucede semelhantemente nas coisas espirituais e celestes, que são comumente representadas na Palavra pelas coisas que estão no mundo e sobre a terra.” (AC 34 )

É dito que os luminares “serão para sinais e para tempos determinados, e para dias e para anos”. Os Arcanos Celestesnos explicam que, assim como o sol, a lua e as estrelas têm a finalidade de marcar a duração do tempo ou das partes do dia, do mês, das estações e, por conseguinte, dos anos, também no espírito humanoos estados de amor e a fé marcam os períodosou alternâncias espirituais, de maior ou menor intensidade e grau de afeição do bem, de clareza de entendimento.

A vida humana, do homem, do espírito e até do anjo, tem essas variações ou alternâncias, como ciclos ou movimentos de respiração e pulsação, como tudo na vida.Por isso a pessoa às vezes se sente mais inspirada e tem umamormais intenso pelas coisas boas e verdadeiras, mas, outras vezes, tem períodos em que se sente desanimada, entorpecida e fria, distante da luz e do calor espirituais. Esses estados são normais se repetem a determinados intervalos, e são chamados “vicissitudes” e “estatutos” na Palavra. Essas mudanças de estadode amor e fé é que marcam os períodos espirituais, porque o tempo material não existe para o espírito.

Mas, na verdade, é uma mera aparência que o sol marca os tempos, porque quem faz isso é realmente o globo terrestre. São os seus movimentos de rotação e translação, que fazem existir os dias, os meses e os anos. Então, a origemdas alternações não está no Sol, mas na Terra mesma. Assim também acontece com nosso espírito. O Senhor é o Sol dos céus, e Ele é imutável. Masnós, quanto ao nosso espírito, passamos por estados em que buscamos mais as coisas de Deus, e assim sentimos mais de perto o calor e a luz d’Ele, ou nos voltamos para o outro lado, nosso eu, nossas afeições naturais e mundanas, e por isso sentimos a frieza espiritual e a escuridão das dúvidas. Mas o Senhor está sempre influindo da mesma maneira, em todos os homens e anjos, o tempo todo, como é dito em Mateus, “Ele faz que o Seu Sol se levante sobre maus e bons” (5:45).

Em outra obra, a Verdadeira Religião Cristã, temos mais ensinamentos sobre esse amor que o Senhor implanta no homem. Aprendemos que existe uma grande diferença entre o amor natural da pessoa e esse que é implantado no quarto dia, diferença essa que pode ser resumida assim: enquanto o amor natural do homem é centrado em si mesmo e no mundo, o amor implantado no quarto dia é imagem do amor de Deus. E, quando Escritos descrevem o amor de Deus, não utilizam adjetivos nem expressões poéticas, dizendo, por exemplo, que o amor de Deus é incomparável, insondável etc. Em vez disso, explicam em que consiste a essência do Divino amor de modo bastante específico, citando três verbos ou três atividades que o caracterizam, que são: amar os outros fora de si;querer ser um com eles;fazê-los felizes por si mesmos.

O primeiro essencial: amar os outros fora de si, deve ser entendido como amar os outros independentemente de qualquer interesse ou vantagem nesse amor, ou, em outras palavras, sem a intenção de recompensa ou de retorno do amor. É fazer o bem a outrem por causa do bem mesmo, e não por causa de si mesmo. É a forma mais perfeita do altruísmo. Esse essencial do amor de Deus se manifesta no fato de Deus criar e amar o homem, que está fora d’Ele. Ao contrário do que aprendemos, Deus não criou o homem para receber louvor, pois Deus não necessita de louvores nem de celebrações; seria uma finalidade egoística.

Mas Deuscriou o homem para que o homem fosse recipiente de Seu amor e fosse beneficiado por isso. O homem é o fim em si da criação, e não Deus mesmo. Esta é a primeira característica do Amor Divino e é também a primeira qualidade que o diferencia do amor humano natural, já que a principal característica do amor humano é ser condicional, isto é, ama enquanto é amado, ou enquanto obtém algum benefício no relacionamento.O amor humano natural consiste em amar os outros por causa de si, enquanto, na regeneração, o amor se torna cada vez mais imagem desse essencial do amor Divino, amar os outros independentemente de si, ou fora de si.

O segundo essencial é: querer ser um com os que são amados. Este essencial é o que produz a conjunção ou a comunhão. Em Deus, essa característica se mostrou no fato de Deus ter criado o céu, onde o ser humano pudesse estar conjunto a Ele eternamente. Porque, quando de fato se ama, existe o prazer com a presença, convivência ou proximidade das pessoas amadas. E as Doutrinas Celestes definem esse essencial do amor de uma forma simples e ao mesmo tempo objetiva: “O amor é uma forte atração”. E a atração é diretamente proporcional à veracidade e à intensidade do amor.

Existe uma esfera do Divino Amor procedendo Senhor e se estendendo a todos no universo, mas cada ser criado recebe a seu modo, conforme sua disposição. Essa esfera é que inspira uma força conjuntiva em todos os amores, força essa que vem do segundo essencial do amor de Deus. É por causa desse segundo essencial que se sente o prazer em se estar na companhia dos amigos, na congregação dos irmãos de uma mesma fé, num mesmo grupo de trabalho com objetivos comuns. Mas onde este aspecto do amor se manifesta de forma mais expressiva ou mais visível é no amor conjugal e, em seguida, no amor para com os filhos, especialmente no amor materno.

O terceiro essencial é fazê-los felizes por si. Esta, então, é a razão de ser dos dois essenciais anteriores: Deus ama o homem e quer se conjuntar a ele parafazê-lo feliz. A bem-aventurança do homem na vida eterna é a realização e a prova do terceiro essencial.

Além disso, esta terceira característica, fazê-los felizes por si, que é o propósito, deve-nos servir de parâmetro para distinguirmosentre o amor genuíno e um amor falso ou o egoísmo. Porque o propósito de qualquer relacionamento humano não deve ser o benefício próprio, mas o bem de outrem,econtribuir para isso, ou, se não for possível, pelo menos não ser obstáculo para a felicidade alheia.“O terceiro essencial do amor de Deus, que é torná-los felizes por si, é reconhecido pela vida eterna, que é a ventura, a beatitude e a felicidade sem fim que Deus dá aos que recebem em si Seu Amor.” (VRC 43).

Quando cada um ama si mesmo em primeiro lugar, todos têm como prioridade sua própria satisfação, e o resultado é a desagregação, o conflito, pois o egoísmo humano é tal que nunca deixa espaço para o segundo lugar. Mas, ao contrário, quando cada um busca pôr o amor ao próximo acima de seu interesse, e todos fazem isso, então cada um é amado por todos os outros, pois existe o amor mútuo, a união, a comunhão e o benefício de todos.

Assim, o amor espiritual ou a caridade é uma imagem do Divino Amor quanto aos três essenciais: “ama os outros fora de si”, que é o verdadeiro altruísmo; “quer ser um com eles”, que é o prazer da fraternidade ou da comunhão; e quer “fazê-los por si” que é a utilidade, ou o uso que se tem a prestar para favor do próximo, da sociedade, da pátria e do reino de Deus. Portanto, altruísmo, comunhão e uso. Esta é a essência da caridade, a imagem do Divino Amor, que o Senhor implanta no homem no quarto estágio da regeneração. E quando existe a caridade no homem interno, também existirá a iluminação espiritual no homem externo.

“E pô-los DEUS na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra.”“E para dominar no dia, e na noite, e para distinguir entre a luz e entre as trevas; e viu DEUS que era bom”. Pelo “dia” se entende o bem, pela “noite” o mal; por isso os bens são chamados obras do dia, e os males obras da noite. Pela “luz” se entende o vero e pelas “trevas” o falso”.

Que o “sol e a lua deviam dominar o dia e a noite” quer dizerque a caridade e a fé agora implantadas no homemteriam supremacia sobre o mal e as cobiças provenientes do homem irregenerado. Porque, à proporção que o homem combate resolutamente as suas próprias perversões e desumanidades, porque essas coisas são pecados contra Deus, elas são gradualmente removidas para as periferias de seu espírito, até serem finalmente afastadas e remidas pelo Senhor. Embora não possam ser completamente separadas do homem, ficarão como que dormentes, não o infestando mais como faziam antes.

Então, o centro de sua vontade será o novo amor implantado, o amor ao Senhor e para com o próximo. Depois e abaixo deste estarão, subordinados, os amores do mundo e o amor de si, que agora são tidos como instrumentais e serviçais necessários do amor ao Senhor que então reina, e por isso é que se diz que o Sol e a Lua dominarão no dia e na noite.

“E houve tarde, e houve manhã, o dia quarto”.

Concluindo, estas são apenas algumas poucas coisas das que se acham explicadas nos “Arcanos Celestes” e nos demais Escritos a respeito da regeneração ou criação espiritual do homem.

Muito mais poderia ser dito, pois muitíssimas outras coisas foram reveladas pelo Senhor e estão à disposição de todo aquele que se interessar, nas Doutrinas Celestes para a Nova Jerusalém.


Arcanos Celestes, 30 - 38

 

30.     Vers. 14‑17: “E disse Deus: Haja luminares na expansão dos céus, para separação entre o dia e entre a noite. E serão para sinais, e para tempos determinados, e para dias e anos. E serão por luminares na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra. E assim se fez. E fez Deus dois luminares grandes: o luminar grande para dominar no dia, e o luminar menor para dominar na noite, e as estrelas. E os pôs Deus na expansão dos céus para darem luz sobre a terra”. Não se pode compreender bem o que são os “luminares grandes” se não se sabe primeiro qual é a essência da fé e, então, qual é a sua progressão nos que são criados de novo. A essência mesma e a vida da fé é o Senhor, só, pois aquele que não crê no Senhor não pode ter a vida, como Ele mesmo disse em João:

“Quem crê no Filho tem a vida eterna, quem porém não crê no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus permanecerá sobre ele” (3:36).

[2]A progressão da fé nos que são criados de novo dá‑se assim: primeiro não há neles vida alguma, pois a vida não está no mal e no falso, mas no bem e no vero. Depois eles recebem do Senhor a vida pela fé; primeiro, pela fé da memória, que é a fé do conhecimento; depois, pela fé do entendimento, que é a fé intelectual; finalmente, pela fé do coração, que é a fé do amor ou salvífica. A fé do conhecimento e intelectual foi representada pelas coisas inanimadas desde o vers. 3 até o 13. A fé vivificada pelo amor é representada pelas coisas animadas desde o vers. 20 até o 25. Por isso, agora se trata, aqui, pela primeira vez, do amor e da fé que vem do amor, que são chamados “luminares”. O amor é o “luminar grande” que domina de dia, e a fé que vem do amor é o “luminar menor” que domina de noite. E como eles fazem um, se diz deles no singular sit [haja], e não sint[no plural] luminares. [3] O amor e a fé no homem interno são como o calor e a luz no externo corpóreo; por isso aqueles são representados por estes. Daí também foi dito que os luminares foram postos na expansão dos céus, ou no homem interno; o luminar grande em sua vontade e o menor em seu entendimento. Mas aparecem na vontade e no entendimento somente como a luz do sol nos objetos. É só a misericórdia do Senhor que, pelo amor, toca a vontade e pela verdade, ou fé, o entendimento.

31.     Que os “luminares grandes” signifiquem o amor e a fé, e que também sejam denominados sol, lua e estrelas, vê‑se em vários lugares nos profetas, como em Ezequiel:

“Cobrirei os céus, quando te tiver apagado, eobscurecerei suas estrelas; o sol cobrirei com uma nuvem e a lua não fará luzir sua luz; todos os luminares de luz nos céus escurecerei sobre ti, e darei trevas sobre a terra” (32:7,8),

onde se trata de Faraó e do Egito, pelos quais se entende na Palavra as coisas dos sentidos e dos conhecimentos; aqui, que tinham extinguido o amor e a fé pelas coisas dos sentidos e dos conhecimentos. Em Isaías:

“O dia de Jehovah... para pôr a terra em desolação;... pois as estrelas dos céus e as suas constelações não farão luzir sua luz; o sol se escurecerá ao levantar e a lua não fará resplandecer sua luz” (13:9, 10).

Em Joel:

“Vem o dia de Jehovah, dia de trevas e de escuridão; diante dele treme a terra, os céus são abalados, o sol e a lua enegrecem e as estrelas retiram seu esplendor” (2:2,10).

Em Isaías, onde se trata do Advento do Senhor e da iluminação das nações, assim, de uma Igreja nova, e, em particular, de cada um dos que estão nas trevas e recebem a luz e são regenerados:

“Levanta‑te, e sê iluminada, porque vem a tua luz. Eis, as trevas cobrem a terra, e a escuridão os povos; e sobre ti Se levantará Jehovah, e as nações andarão à tua luz, e os reis ao esplendor de teu levantar. Jehovah te será por luz de eternidade; não mais se porá o teu sol, nem se recolherá tua lua, porque Jehovah te será por luz de eternidade” (60:1‑3,19, 20).

Em David (Salmos):

“Jehovah faz os céus em inteligência ... expande a terra sobre as águas... faz os grandes luminares ... o sol para dominar no dia ... e a lua e as estrelas para dominarem na noite” (136:5-9).

E no mesmo:

“Glorificai Jehovah, sol e lua; glorificai‑O, todas as estrelas de luz; glorificai‑O, céus dos céus, e vós, águas que estais acima dos céus” (Sal. 148:3,4).

[2]Em todos estes lugares, os luminares significam o amor e a fé. Como os luminares representavam e significavam o amor e a fé no Senhor, ordenou‑se na Igreja Judaica que se acendesse um luminar perpétuo desde a tarde até a manhã, pois tudo o que foi ordenado àquela Igreja era representativo do Senhor. Deste luminar se diz assim:

“Manda aos filhos de Israel que recolham o óleo para o luminar, para fazer arder a lâmpada continuamente. Na tenda da congregação, fora do véu que está sobre o testemunho, ali o porão Arão e seus filhos, desde a tarde até a manhã, diante de Jehovah” (Êx. 27:20,21).

Que estas coisas signifiquem o amor e a fé que o Senhor acende e faz luzir no homem interno e, por meio do homem interno, no homem externo, será mostrado em seu lugar, pela Divina misericórdia do Senhor.

32.     O amor e a fé são chamados, a princípio, os “luminares grandes”; depois, o amor o “luminar grande” e a fé o “luminar menor”; e se diz do amor que ele “dominará no dia” e, da fé, que ela “dominará na noite”. Como estas coisas são arcanos e estão ocultas, sobretudo neste fim dos dias, é permitido, pela Divina misericórdia do Senhor, revelar como são. Se estão ocultas, sobretudo neste fim dos dias, é porque agora é a consumação do século, e o amor é quase nulo e por conseguinte a fé, como o próprio Senhor predisse nos Evangelistas, nestas palavras:

“O sol se escurecerá, e a lua não dará luz, e as estrelas cairão do céu, e as virtudes do céu serão abaladas” (Mt. 29:25).

Pelo “sol” entende‑se aqui o amor que será “escurecido”; pela “lua” a fé que não dá luz; pelas “estrelas”, as cognições da fé que caem do céu, as quais são as “virtudes e os poderes dos céus”. A Igreja Antiquíssima não reconheceu outra fé senão o amor mesmo. Os anjos celestes também não reconhecem outra fé exceto a que é do amor; o céu universal é do amor, pois nos céus não existe outra vida exceto a vida do amor. Daí vem toda felicidade, que é tanta, que nenhuma coisa dela pode ser descrita nem pode ser compreendida por alguma ideia humana. Os que estão no amor amam o Senhor de coração, mas sabem, dizem e percebem que todo amor, assim toda vida que é do amor, só, e, assim, toda felicidade, vêm unicamente do Senhor, e que, por si próprios, eles não têm nada do amor, da vida e da felicidade. Que o Senhor seja Aquele de Quem procede todo amor, isso foi também representado pelo “grande luminar”, ou o sol, quando Ele foi transfigurado, pois:

“Sua face resplandeceu como o sol e as vestes tornaram‑se como a luz” (Mt. 17:2).

Pela “face” são significados os íntimos, e pelas “vestes” as coisas que procedem dos íntimos; assim pelo “sol”, o Divino do Senhor ou o Amor, e pela “luz” o Seu Humano ou a sabedoria que procede do amor.

33.     Qualquer um pode saber muito bem que não existe jamais a vida sem algum amor, e que não existe jamais a alegria exceto aquela que procede do amor; de fato, tal é o amor, tal é a vida e tal é a alegria. Se removesses os amores, ou, o que é o mesmo, as cobiças — porque elas são do amor — cessaria logo o pensamento e serias como morto. Isto me foi mostrado por experiência viva. Os amores de si e do mundo apresentam certa semelhança com a vida e a alegria, mas porque são inteiramente contrários ao verdadeiro amor, o qual é que se deve amar o Senhor acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, pode‑se ver que eles são, não amores, mas ódios. Pois quanto mais alguém ama a si mesmo e ao mundo, mais odeia o próximo e, assim, o Senhor. Por isso, o verdadeiro amor é o amor ao Senhor, a verdadeira vida é a vida do amor que vem do Senhor, e a verdadeira alegria é a alegria desta vida. Só pode haver um único Amor verdadeiro; por conseguinte, só pode haver uma única vida verdadeira, de onde procedem as verdadeiras alegrias e as verdadeiras felicidades, como as dos anjos nos céus.

34.      O amor e a fé nunca podem ser separados, porque constituem uma só e mesma coisa. Por isso, no princípio, quando se trata dos luminares, eles são tomados por um só, e se diz: “Haja (sit) luminares na expansão dos céus”. É permitido referir coisas admiráveis a este respeito. Os anjos celestes, porque estão pelo Senhor em um tal amor, estão por este amor em todas as cognições da fé, e pelo amor, em uma tal vida e em uma tal luz de inteligência, que dificilmente se poderia descrever. Por sua vez, os espíritos que estão no conhecimento dos doutrinais da fé, sem o amor, estão em uma vida tão fria e em uma luz tão escura, que nem podem aproximar‑se da primeira entrada do átrio dos céus sem fugir para trás. Dizem terem de certo modo acreditado no Senhor, mas não viveram como Ele ensinou. O Senhor fala deles assim, em Mateus:

“Nem todo aquele que Me diz: Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a Minha vontade;muitos Me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, por Teu Nome não profetizamos?” (E as coisas que se seguem) (7:21,22).

[2]Por aí se vê que aqueles que estão no amor também estão na fé e, assim, na vida celeste, mas não os que dizem estar na fé e não estão na vida do amor. A vida da fé sem o amor é como a luz do sol sem o calor, como sucede no inverno, quando nada cresce, mas todas as coisas ficam entorpecidas e mortas. Mas a fé que procede do amor é como a luz do sol no tempo da primavera, quando todas as coisas crescem e florescem, porque é o calor do sol que as produz. Sucede semelhantemente nas coisas espirituais e celestes, que são comumente representadas na Palavra pelas coisas que estão no mundo e sobre a terra. A ausência da fé, e a fé sem o amor, são também comparadas pelo Senhor ao inverno, onde Ele predisse a consumação do século, em Marcos:

“Orai para que vossa fuga não se dê no inverno, pois aqueles serão dias de aflição” (13:18,19).

A “fuga” é o último tempo também para todo homem que morre. O “inverno” é a vida sem nenhum amor e os “dias de aflição” são o seu estado miserável na outra vida.

35.     Há no homem duas faculdades: a vontade e o entendimento. Quando o entendimento é governado pela vontade, então estas faculdades constituem, ambas, uma mente só, assim uma só vida, pois, então, o que o homem quer e faz, ele também o pensa e a isso se aplica. Mas, quando o entendimento está em desacordo com a vontade, como nos que dizem ter a fé mas vivem de modo diferente, a unidade da mente então está dividida em duas partes: uma quer elevar‑se ao céu, a outra tende para o inferno. E, como a vontade faz tudo, o homem inteiro se precipitaria no inferno, se o Senhor não Se compadecesse dele.

36.     Os que separaram a fé do amor não sabem o que é a fé. Quando estão na idéia da fé, alguns dentre eles não sabem outra coisa senão que é um mero pensamento; outros, que é um pensamento no Senhor; e poucos, que é a doutrina da fé. Mas a fé é não somente o conhecimento e o reconhecimento de tudo o que a doutrina da fé abrange, mas é, principalmente, a obediência a tudo que esta doutrina ensina. A primeira coisa que ela ensina e a que se deve obedecer é o amor ao Senhor e o amor ao próximo, e quem não está nesses amores não está na fé. Isso o Senhor ensina assim, em Marcos, de um modo tão claro que é impossível duvidar:

“O primeiro de todos os preceitos é: Escuta, Israel, o Senhor nosso Deus é um só Senhor; por isso amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de toda a tua mente, e de todas as tuas forças; é este o primeiro preceito. E o segundo, semelhante a este: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro preceito maior que estes” (12:28‑32).

Em Mateus, Ele o chama “o primeiro e grande mandamento”, e diz que “a lei e os profetas dependem desses mandamentos” (22:34 a 40). A “lei e os profetas” são a doutrina universal da fé e toda a Palavra.

37.     É dito que os luminares “serão para sinais e para tempos determinados, e para dias e para anos”. Estas palavras contêm mais arcanos do que podem ser ditos no momento, ainda que nenhum apareça no sentido da letra. Por ora, basta dizer que, em relação às coisas espirituais e celestes, há, no universal e nos singulares, sucessões que são comparadas às sucessões nos dias e anos. As sucessões nos dias são: da manhã ao meio‑dia, daí à tarde e, pela noite, à manhã. As dos anos são semelhantes: da primavera ao verão, daí ao outono e, pelo inverno, à primavera. São as alternações de calor e luz, e também as das frutificações da terra. Com essas alternações se comparam as das coisas espirituais e celestes. A vida sem tais alternações e diversidades seria uniforme e, por conseguinte, nula. E não seria possível discernir, distinguir e ainda menos perceber o bem e o vero. Essas alternações são chamadas “estatutos” na Palavra, como em Jeremias:

“Disse Jehovah, que dá o sol para luz do dia, e os estatutos da lua e das estrelas para a luz da noite: ... Estes estatutos não se retirarão de diante de Mim” (31: 35,36)

E no mesmo profeta:

“Assim disse Jehovah: Se não estabeleci Minha aliança de dia e de noite, os estatutos do céu e da terra...” (33:25)

Mas, pela Divina misericórdia do Senhor, tratar‑se‑á destas coisas no capítulo 8, vers. 22, do Gênesis.

38.     Vers. 18: “E para dominar no dia, e na noite, e para separar entre a luz e entre as trevas; e viu Deus que era bom”. Pelo “dia” se entende o bem, pela “noite” o mal; por isso os bens são chamados obras do dia, e os males obras da noite. Pela “luz” se entende o vero e pelas “trevas” o falso, como o Senhor fala:

“Os homens amaram mais as trevas do que a luz... quem pratica a verdade vem para a luz” (Jo. 3:19‑21).

Vers. 19: “E houve tarde, e houve manhã, o dia quarto”.


 

 

1º dia
Criação da luz;

separação entre a luz e as trevas, dia e noite
A verdade da fé brilha e mostra a distinção entre as coisas do homem e as de Deus
2º dia
Criação da expansão ou o céu;

separação entre as águas acima e abaixo
Noção de que existe um homem interno;

distingue entre as coisas do Senhor e as suas
3º dia
Ajuntamento das águas,

aparece o seco; terra e mares;

a terra faz germinar a erva, a erva de semente e a árvore dando fruto
O homem começa a falar a partir das verdades da fé e faz algum bem, mas pensa que fala e age por si mesmo
4º dia
Luminares na expansão; o grande para dominar no dia e o menor, na noite, parem darem luz sobre a terra
A caridade e a fé são implantadas no homem interno
5º dia
As águas fazem produzir o réptil, a alma vivente; a ave voe sobre a terra e sobre as faces da expansão;

as baleias grandes e todo réptil
Fala pela fé e se confirma no bem;
6º dia
A terra produz alma vivente, a besta e o movente;

a fera, a besta

o homem, macho e fêmea, para dominar sobre a terra;
Fala e age pelo bem
Sabbath
O Senhor descansa
As lutas da regeneração do homem cessam, e o Senhor não precisa mais combater por ele.

 
 


 

 

Primeiro Dia

 
No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo. A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele. E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 


 

 

Segundo Dia
E disse Deus: Haja uma expansão
O homem interno é chamado “expansão”
no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas
Ordem para que se faça distinção entre os conhecimentos do homem externo e as cognições do homem interno
E fez Deus a expansão,
O homem interno é aberto
e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão
os conhecimentos do homem externo são vistos como distintos
e entre as águas que estavam acima da expansão;
das cognições do homem interno

“acima da expansão” = acima do homem interno, oriundas da Palavra
E assim se fez. E chamou Deus à expansão céu
O homem interno reconhecido
E houve tarde, e houve manhã,
A progressão da sombra da ignorância ou falsidade para a claridade da instrução na verdade
o dia segundo
O segundo estado da regeneração
 


 

TerceiroDia
E disse DEUS: Faça germinar a terra a erva tenra,
Quando a terra – ou o homem –– foi assim preparada para que pudesse receber do SENHOR as sementes celestes e produzir alguma coisa do bem e do vero, então o SENHOR faz primeiro germinar alguma coisa tenra que é chamada “erva tenra”
a erva dando semente,
”; depois, alguma coisa mais útil que se semeia de novo e é chamada “erva dando semente”;
a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie,
enfim, algum bem que frutifica e é chamado “árvore dando fruto no qual [está] a sua semente”, cada um “segundo a sua espécie”
no qual [esteja] a sua semente, sobre a terra. E assim se fez E produziu a terra a erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual [estava] a sua semente, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom.”
A princípio, o homem que está sendo regenerado é tal que pensa que o bem que faz vem de si mesmo, e o vero que diz vem de si mesmo, quando todavia a coisa se passa assim: todo bem e todo vero vêm do SENHOR. Por isso, quem pensa que essas coisas vêm de si mesmo não tem ainda a vida da verdadeira fé, que pode todavia receber depois. Com efeito, ainda não pode crer que o bem e o vero vêm do SENHOR, porque está no estado de preparação para receber a vida da fé. Este estado é representado aqui pelas coisas inanimadas, e o estado da vida da fé é representado depois pelas coisas animadas.
 

 

 

 


 

QuartoDia
E disse DEUS: Haja luminares na expansão dos céus, para separação entre o dia e entre a noite.

 
O amor e a fé são chamados, a princípio, os “luminares grandes”; depois, o amor o “luminar grande” e a fé o “luminar menor”;
E serão para sinais, e para tempos determinados, e para dias e anos. E serão por luminares na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra. E assim se fez. E fez DEUS dois luminares grandes: o luminar grande para dominar no dia, e o luminar menor para dominar na noite, e as estrelas.

E pô-los DEUS na expansão dos céus para darem luz sobre a terra”.

 
É dito que os luminares “serão para sinais e para tempos determinados, e para dias e para anos”. Estas palavras contêm mais arcanos do que podem ser ditos no momento, ainda que nenhum apareça no sentido da letra. Por ora, basta dizer que, em relação às coisas espirituais e celestes, há, no universal e nos singulares, sucessões que são comparadas às sucessões nos dias e anos. As sucessões nos dias são: da manhã ao meio‑dia, daí à tarde e, pela noite, à manhã. As dos anos são semelhantes: da primavera ao verão, daí ao outono e, pelo inverno, à primavera. São as alternações de calor e luz, e também as das frutificações da terra. Com essas alternações se comparam as das coisas espirituais e celestes. A vida sem tais alternações e diversidades seria uniforme e, por conseguinte, nula. E não seria possível discernir, distinguir e ainda menos perceber o bem e o vero. Essas alternações são chamadas “estatutos” na Palavra
“E para dominar no dia, e na noite, e para separar entre a luz e entre as trevas; e viu DEUS que era bom”.

 
Pelo “dia” se entende o bem, pela “noite” o mal; por isso os bens são chamados obras do dia, e os males obras da noite. Pela “luz” se entende o vero e pelas “trevas” o falso.
 

 

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5to Dia da Criação [VÍDEO]
"E disse DEUS: Façam as águas rastejar o réptil, a alma vivente..." [TEXTO] Aula gratuita!

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Os Seis Dias da Criação
O Quinto Dia
 

C. R. Nobre

 

Estamos estudando a história da criação relatada no livro de Gênesis segundo a explicação da obra “Arcanos Celestes” e temos visto que ela representa o processo em que o Senhor reforma e regenera o homem e o torna espiritual.

Vimos que o primeiro estado vai desde antes da regeneração, da ausência de caridade e fé ou de vida espiritual, até o momento em que se dá na alma o clarão da luz, a conscientização a respeito de Deus e da vida eterna. O segundo estado é quando a pessoa passa a fazer distinção entre as suas próprias convicções como coisas inferiores, e a revelação Divina como superiores na sua mente. Isto é representado pela separação das águas acima e abaixo da expansão dos céus. A pessoa passa a saber que tem umeu interno ou espiritual, representado pelo céu, e por isso é dito que o céué criado.

O terceiro estado é o da penitência. Instruída nos conhecimentos, a pessoa se compele a agir de acordo com a verdade e a praticar as obras, deixando de fazer o mal e aprendendo a fazer o bem. Entretanto, nesta fase ela ainda é guiada por suas próprias afeições e ideias, e por isso as obras que então pratica ainda não são vivas, sendo comparadas aos vegetais que a terra – o homem externo – produz.

E, persistindo em afastar-se dos males por serem pecados contra Deus e dedicando-se com fidelidade ao seu uso, a pessoaé levada ao quarto estado, quando o Senhor implanta nela o verdadeiro amor, em forma de caridade (a criação do Sol), e a verdadeira sabedoria, em forma de fé (a criação daLua), além dos conhecimentos, representados pelas estrelas.

Os “Arcanos” dizem que é então que “o homem começa pela primeira vez a viver. Antes, mal se pode dizer que vivesse, pois o bem que ele fez, pensou que o fizera por si mesmo; e o vero que falou, que de si mesmo o dissera. E, como o homem é morto em si e nele nada há senão o mal e o falso, por isso, tudo o que ele produz por si mesmo não é vivo, ao ponto de não poder por si mesmo fazer o bem que em si é o bem... O bem não pode vir senão da Fonte mesma, que é única, como também diz: “Ninguém é bom, exceto um, Deus” (Lucas 18:19).”

Agora chegamos ao quinto dia. “E disse DEUS: Façam as águas rastejar o réptil, a alma vivente. E a ave voe sobre a terra, sobre as faces da expansão dos céus. E criou Deus as baleias grandes e toda alma vivente que rasteja, que as águas fizeram rastejar, segundo a sua espécie; e toda ave de asas, segundo a sua espécie. E viu Deus que (era) bom. E os abençoou Deus, dizendo: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei as águas nos mares; e a ave será multiplicada na terra. E houve tarde, e houve manhã, o dia quinto”. (Gen. 1:20-23).

As águas fazem rastejar os répteis, que são, literalmente, os que rastejam, mas aí estão incluídos os peixes. Notemos que quem produz agora é a água, não mais a terra.

Já sabemos que a terra representa a mente natural, e as águas representam os conhecimentos da fé,que agora constituem um entendimento novo,por assim dizer, chamado consciência. A verdadeira consciência é uma espécie de ditame interno que se adquire da instrução das Escrituras Sagradas. É a voz do Senhor nos falando por meio das verdades. Quanto mais damos ouvido a esse ditame, mais se torna vivo e mais nossa mente é esclarecida pela luz da verdade. É esse entendimento reformado que fará produziro réptil e o peixe, que significam, na Palavra, os conhecimentos que pertencem ao homem externo. São todos os ensinamentos, todos os doutrinais que a pessoa agora conhece e nos quais crê. Estão na memória e, daí, no pensamento consciente ou externo.

Também foi dito: “A ave voe sobre a terra, sobre as faces da expansão dos céus”. É interessante observar que não foi ordenado às águas que produzissem a ave. Isto parece bastante óbvio, mas observemos o seguinte: se o réptil e o peixe são conhecimentos que pertencem à memória, a ave, ao aparecer voando na expansão do céu, indica algo que vem do espírito.  Lemos nos “Arcanos” que as aves representam “coisas racionais e também intelectuais, estas últimas pertencendo ao homem interno”.

Acontece o seguinte: no homem que está sendo regenerado o Senhor forma um nível novo na mente, chamadoracional, e esse racional passa a seruma região intermediária, entre a mente natural e a espiritual. É como se fosse um mezanino entre dois andares. Esse racional criado na regeneração não deve ser confundido com a racionalidade, que é a faculdade de compreender a verdade, quando a vir. Liberdade e racionalidade são inerentes ao ser humano, enquanto o racional verdadeiro é formado na regeneração como um elo entre a mente natural e a mente espiritual.

É pelo racional que a luz dos céus chega à mente natural como uma percepção. Essa percepção é representadaaqui pela ave, pois a ave tanto voano céu como desce à terra e pousa nas árvores, conforme aquela parábola do Senhor: “O Reino dos céus é semelhante ao grão da mostarda, que o homem, tomando-o, o semeou em seu campo. O qual, em verdade, é a menor de todas as sementes; mas, crescendo, é a maior de todas as hortaliças; e faz-se tamanha árvore, que vêm as aves do céu e se aninham em suas ramas.” (Mat. 13:31, 32).

Temos aí, portanto, duas classes de conhecimentos que agora se encontram no homem: na mente natural (no pensamento consciente e na memória), os répteis ou peixes, que são os conhecimentos acerca das coisas da fé, recebidos pelos sentidos externos; e na mente espiritual, as aves, que são as percepções oriundas dos céus e que chegam através do espírito até o racional do homem.

Os conhecimentos representados pelos répteis eos peixes são adquiridos quando a pessoa, no gozo de sua liberdade e sua razão, busca na Palavra o conhecimento da verdade. O Senhor pode então influir nesse conhecimento e vivificá-lo. Essa espécie de conhecimento natural, o réptil e o peixe, é a própria base do pensamento do homem; “o homem pensa a partir deles”, dizem os Arcanos (991).

Quanto à outra espécie de conhecimento, aqui representado pelas aves, chega por uma via interna, porque são coisas “interiores, não vêm tanto à percepção ou ao sentido do homem antes de ele se despir do corpo e entrar na outra vida” (AC 991). Em outras palavras, as percepções, representadas pelas aves que surgem voando nos céus,são conhecimentos mais elevados, mas podemos entender como sendo intuições ou ideias que aparecemem nosso pensamento, não como resultado de um encadeamento lógico que tenhamos feito. É uma luz que se acende sem a gente mesmo ter acendido, um pássaro que veio do céu e pousou no ramo da árvore. Vimos o pássaro pousando, mas não vimos de onde tinha vindo.

Continuando no Gênesis: “E criou Deus as baleias grandes e toda alma vivente que rasteja, que as águas fizeram rastejar, segundo a sua espécie; e toda ave de asas, segundo a sua espécie. E viu Deus que (era) bom”.

Os“Arcanos” explicam que, assim como os peixes significam os conhecimentos, agora animados pela fé que vem do Senhor, as baleias ou cetáceos significam na Palavra os conhecimentos gerais, sob os quais e pelos quais existem os particulares. “Nada há no universo que não esteja sob algum geral a fim de que exista e subsista”.

O peixe em abundância significa, portanto, o acúmulo de conhecimento ou a inteligência do homem regenerado.  É de acordo com esta correspondência que o profeta Ezequiel falou sobre a inteligência do homem regenerado:“O Senhor JEHOVAH disse a mim:... sucederá que toda alma vivente que rastejar por onde quer que venha a água dos rios, viverá. E haverá peixe em quantidade mui grande, porque ali chegarão estas águas. E sararão, e tudo viverá por onde vier o rio. E sucederá que estarão de pé sobre eles pescadores desde Engedi até En-Eglaim; estarão com redes estendidas. Seu peixe será segundo a sua espécie, como o peixe do grande mar, em mui grande quantidade “ (47:8 a 10).

E pela mesma razão falou o profeta Isaías sobre a triste sorte da Igreja devastada ou do homem impenitente: “Por Minha repreensão farei secar o mar, tornarei os rios em deserto. Fétido será o seu peixe, por não haver água, e morrerá de sede. Vestirei os céus de negridão” (50:2,3).

Como os peixes são os conhecimentos da fé, por isso os pescadores, na Palavra, representam aqueles que procuram na Palavra as verdades para nutrimento do espírito. Não foi por outra razão que os discípulos eram pescadores.

Também os pássaros têm suas significações variadas, conforme os seus gêneros e espécies. Aqui, eles são chamados aves do céu, porque representam as ideias racionais e as percepções próprias do homem interno, como se falou. Mas, na Palavra, eles têm correspondências conforme o contexto em que são citados e os nomes que recebem: “ave”, “alado”, “volátil”, “pássaro”, etc. Os “pássaros dos céus” são as verdades intelectuais e os pensamentos, mas, quando citados num sentido negativo, representam os enganos e falsidades que destroem as verdades.“O Senhor mesmo compara as fantasias e as persuasões do falso às “aves” quando diz: “A semente que caiu sobre o caminho batido...vieram as aves, e comeram-na” (Mt.13:4) (AC 778). E, no n. 866: “As verdadeiras coisas intelectuais são descritas pelas aves mansas, belas e limpas; mas as falsas pelas aves ferozes, feias e imundas e, de fato, conforme as espécies de verdade e falsidade.”

Essa significação dos seres criados ou que aparecem no quinto dia, répteis, peixes e aves, parece um pouco mais abstrata do que a significação das coisas dos dias anteriores. É porque essascoisasse passam na mente num estado avançado da regeneração, ao passo que nossa mente natural é limitada pelas duas dimensões de tempo e espaço. Todo pensamento, toda ideia, qualquer que seja, em nossa mente natural, se apresenta numa forma de corpo, num espaço e num ambiente que a envolve; mesmo que seja em forma de uma palavra, ou um som, sempre ocorre dentro das duas dimensões. Por outro lado, as ideias espirituais transcendem essas limitações. Porque o sentido espiritual é para os espíritos e anjos, e nós, enquanto estivemos no mundo, ainda que sejamos espíritos, estamos engaiolados, por assim dizer, pelo pensamento natural. E aprendemos (AC 1594) que “a vista externa não pode ver de modo algum o que é a vista interna”, mas o contrário, sim, quer dizer, “o intelectual e o racional podem perceber o que é do conhecimento e qual é a sua qualidade, mas o recíproco não acontece”.

Daí a dificuldade de compreendermos além do que está dito, e daí a razão pela qual o sentido espiritual da Palavra nos parece às vezes abstrato, mesmo depois de muito estudo. Enquanto vivermos no corpo, tudo o que podemos ter são vislumbres ou noções muito gerais das coisas celestes, e não as particularidades mesmas. Muitas outras particularidades ficam por comentar. As coisas mais gerais que estamos vendo aqui são somente as “baleias”, os conhecimentos gerais sobre a regeneração; mas as particularidades desses conhecimentos são os “peixes”, que podemos recolher em abundância à medida que nossa afeição pela verdade nos levar a avançar nesse universo de conhecimento que se abriu diante de nós.

Realmente, nosso entendimento natural a respeito das coisas celestes é imperfeito e muito limitado, por isso, e por ora, é bastante saber que no quinto dia os peixes grandes são conhecimentos gerais da fé, os peixes menores são as particularidades, e os pássaros que aparecem (não diz que são criados) no céu são as percepções que chegam à mente no quinto estágio da regeneração.

Essas representações vêm do mundo espiritual, porque, no espírito do homem, todas as coisas da caridade e da fé, que procedem do Senhor, são animadas e vivas e, no mundo espiritual elas até se manifestam à vista assim, em forma de animais, répteis e aves, conforme a qualidade do pensamento ou afeição no interior dos espíritos e anjos que ali estão. Os Arcanos Celestes (41) dizem: “E - o que talvez pareça incrível mas é bem verdadeiro - cada palavra, cada ideia e cada uma das mínimas coisas do pensamento de um espírito angélico são vivas. Em seus singularíssimos há uma afeição que procede do Senhor, Que é a vida mesma. Por isso, as coisas que vêm do Senhor têm vida em si, porque têm a fé em si, e são significadas aqui pela “alma vivente”. Também têm uma espécie de corpo aqui significada por “aquele que se move” ou “que rasteja”. Contudo, estas coisas ainda são arcanos para o homem, mas são aqui lembradas só porque aqui se trata da alma vivente e do movente” (AC 41).

Lemos nos Escritos que “quando os anjos estão conversando sobre conhecimentos, ideias e influxo, aparecem no mundo dos espíritos aves formadas de acordo com o assunto da conversação. Daí é que as “aves” na Palavra significam as coisas racionais ou que pertencem ao pensamento” (AC 3219).

Mas, quando começam existir as percepções, ou as aves, as coisas racionais, isto significa que o Senhor está começando a dotar o homem regenerado da verdadeira inteligência, pois o racional é a inteligência do homem externo (AC 1588).

Na história do nascimento dos filhos de Jacó, por exemplo, encontramos o relato da regeneração do homem exposto de outro ângulo, ou em outra série. Na história da marcha do povo de Israel pelo deserto até à terra de Canaan, a entrada nessa terra e as batalhas contra os diversos inimigos até à completa conquista, encontramos novamente a história da regeneração do homem, agora exposta em diferente ponto de vista. E assim acontece em muitas outras histórias da Palavra, de sorte que, ao tomarmos conhecimento de umas e outras, vamos, aos poucos, compreendendo melhor as coisas, enxergando particulares que não tínhamos visto antes, entendendo detalhes que não tínhamos entendido em outra série. E esses detalhes, essas particularidades são como “peixes” menores que virão nadar no mar de nossa memória.

Os conhecimentos gerais da doutrina, ou as “baleias” são fáceis de serem vistos e apreendidos. Mas os conhecimentos particulares ou “peixes” precisam ser procurados com mais trabalho, precisam ser pescados. Como discípulos do Senhor que somos, temos também a obrigação de nos tornarmos pescadores espirituais. E o que é um pescador espiritual? É o homem que investiga e ensina verdades naturais e espirituais de uma maneira racional.

Devemos ler, ouvir e meditar nos conhecimentos da Palavra armazenados em nossa memória, pois as verdades Divina são o alimento da vida espiritual, nossa e do nosso próximo. E na medida em que formos adquirindo a luz, devemos levar essa luz aos que estão na escuridão, pois assim seremos,como os discípulos do Senhor, pescadores espirituais.


 

Arcanos Celestes, 39-43

39.     Vers. 20: “E disse Deus: Façam as águas produzir abundantemente o réptil, a alma vivente. E a ave voe sobre a terra, sobre as faces da expansão dos céus”. Depois que os grandes luminares foram acesos e postos no homem interno, e daí o externo recebeu luz, então, o homem começa pela primeira vez a viver. Antes, mal se pode dizer que vivesse, pois o bem que fez, pensou que o fizera por si mesmo; e o vero que falou, que de si mesmo o dissera. E, como o homem é morto em si e nele nada há senão o mal e o falso, por isso, tudo o que ele produz por si mesmo não é vivo, a ponto de não poder por si mesmo fazer o bem que em si é o bem. Que o homem por si mesmo não possa sequer pensar no bem nem querê‑lo, e por conseqüência fazê‑lo, a não ser que seja pelo Senhor, qualquer um vê pela doutrina da fé, porque o Senhor diz em Mateus:

“Quem semeia a boa semente é o Filho do Homem” (13:37).

O bem não pode vir senão da Fonte mesma, que é única, como também diz:

“Ninguém é bom, exceto um, Deus” (Luc. 18:19).

Contudo, sempre que o Senhor ressuscita o homem à vida ou o regenera, permite a princípio que ele pense assim, pois, então, o homem não pode compreender de outro modo, nem pode de outro modo ser conduzido a crer e daí a perceber que todo bem e todo vero vêm do Senhor, só. Enquanto pensou assim, seus veros e bens foram comparados à “erva tenra”, depois à “erva dando semente” e em seguida à “árvore de fruto”, coisas que são inanimadas. Mas, agora, quando é vivificado pelo amor e pela fé e crê que é o Senhor Quem opera nele todo bem que faz e todo vero que diz, então, é comparado primeiro aos “répteis das águas” e às “aves que voam sobre a terra”, e depois às bestas, que são, todas, coisas animadas e chamadas “almas viventes”.

40.     Pelos “répteis” que as águas produzem são significados os conhecimentos que pertencem ao homem externo. Pelas “aves” em geral, as coisas racionais e também as intelectuais, estas últimas pertencendo ao homem interno. Que “os répteis das águas ou peixes” signifiquem os conhecimentos, vê‑se em Isaías:

“Vim, e nenhum varão. Por Minha repreensão farei secar o mar, tornarei os rios em deserto. Fétido será o seu peixe, por não haver água, e morrerá de sede. Vestirei os céus de negridão” (50:2,3).

[2]É ainda mais claro em Ezequiel, onde o Senhor descreve o novo templo ou uma nova Igreja em geral e o homem da Igreja ou regenerado, pois todo aquele que é regenerado é um templo do Senhor. Assim se diz:

“O SenhorJehovah disse a mim: Estas águas que sairão para o limite em direção ao Oriente... e virão ao mar, no mar conduzidas, e sãs tornar‑se‑ão as águas.

“E sucederá que toda alma vivente que rastejar por onde quer que venha a água dos rios, viverá. E haverá peixe em quantidade mui grande, porque ali chegarão estas águas. E sararão, e tudo viverá por onde vier o rio.

“E sucederá que estarão de pé sobre ele pescadores desde Engedi até En‑Eglaim; estarão com redes estendidas. Seu peixe será segundo a sua espécie, como o peixe do grande mar, em mui grande quantidade” (47:8 a 10).

Os “pescadores desde Engedi até En‑Eglaim com redes estendidas” significam aqueles que ensinam as verdades da fé ao homem natural. [3]           Que as “aves” signifiquem as coisas racionais e intelectuais, isto consta nos Profetas, como em Isaías:

“...Que chama do oriente o pássaro [volucrem], da terra longínqua o varão do Meu conselho” (46:11).

Em Jeremias:

“Vi, e eis, nenhum homem, e todas as aves dos céus fugiram” (4:25).

Em Ezequiel:

“Plantarei um rebento de um alto cedro, e ele produzirá ramo e dará fruto, e tornar‑se‑á um cedro magnífico, e debaixo dele habitarão todas as aves de todas as asas; à sombra de seus ramos habitarão” (17:23).

E em Oséias, onde se trata da Nova Igreja ou do regenerado:

“E farei por eles uma aliança, naquele dia, com a fera do campo, e com a ave dos céus, e com tudo o que se move no humo” (2:18).

Que a “fera” não signifique uma fera nem a “ave” uma ave, qualquer um pode ver, porquanto o Senhor firma uma aliança nova com eles.

41.     Tudo o que é próprio do homem não tem vida em si e, quando se manifesta à vista, mostra‑se duro como um osso e negro. Ao contrário, tudo o que é do Senhor tem vida, é espiritual e celeste em si e, quando se manifesta à vista, mostra‑se humano e vivo. E — o que talvez pareça incrível, mas é bem verdadeiro — cada palavra, cada idéia e cada uma das mínimas coisas do pensamento de um espírito angélico são vivas. Em seus singularíssimos há uma afeição que procede do Senhor, Que é a vida mesma. Por isso, as coisas que vêm do Senhor têm vida em si, porque têm a fé em si, e são significadas aqui pela “alma vivente”. Também têm uma espécie de corpo aqui significada por “aquele que se move” ou “que rasteja”. Todavia, estas coisas ainda são arcanos para o homem, mas são aqui lembradas só porque aqui se trata da alma vivente e do movente.

42.     Vers. 21: “E criou Deus as baleias grandes e toda alma vivente que rasteja, que as águas fizeram rastejar, segundo a sua espécie; e toda ave de asas, segundo a sua espécie. E viu Deus que [era] bom”. Como foi dito, os “peixes” significam os conhecimentos, agora animados pela fé que vem do Senhor e, assim, vivos. As “baleias” significam as coisas gerais dos conhecimentos, sob os quais e pelos quais existem os particulares. Nada há no universo que não esteja sob algum geral a fim de que exista e subsista. Os cetáceos ou baleias são algumas vezes nomeados nos Profetas e ali significam as coisas gerais dos conhecimentos. Faraó, rei do Egito, por quem é representada a sabedoria ou inteligência humana, isto é, a ciência em geral, é chamado “a grande baleia”, como em Ezequiel:

“Eis‑Me contra ti, Faraó, rei do Egito, grande baleia deitada no meio dos teus rios, que disse: Meu é o rio, eu o fiz para mim” (29:3).

[2]E em outro lugar:

“Levanta uma lamentação sobre Faraó, rei do Egito, e dize‑lhe: ...E tu [foste] como uma baleia nos mares, e avançaste em teus rios, e conturbaste as águas com teus pés” (32:2);

por tais coisas são significados aqueles que querem entrar nos mistérios da fé por meio dos conhecimentos, assim por si próprios. Em Isaías:

“Naquele dia, Jehovah visitará com sua espada dura, e grande, e forte, sobre o Leviatã, a serpente alongada, e sobre o Leviatã, a serpente tortuosa, e matará as baleias que estão no mar” (27:1);

por “matar as baleias no mar” é significado que nem mesmo as coisas gerais eles sabem. Em Jeremias:

“Devorou‑me, conturbou[‑me] Nebuchadenezzar, rei de Babel; tornou‑me vaso vazio, engoliu‑me como baleia; encheu seu ventre de minhas delícias, lançou‑me fora” (51:34),

isto é, ele, assim, tragou as cognições da fé, que aqui são as “delícias”, como a baleia fez com Jonas, onde a “baleia” é tomada pelos que possuem os gerais das cognições da fé como conhecimentos e, assim, agem.

43.     Vers. 22: “E os abençoou Deus, dizendo: Frutificai e multiplicai‑vos, e enchei as águas nos mares; e a ave será multiplicada na terra”. Tudo o que tem em si a vida procedente do Senhor frutifica e se multiplica imensamente, não tanto durante o tempo em que o homem vive no corpo, mas de um modo admirável na outra vida. “Frutificar”, na Palavra, se diz das coisas que são do amor, e “multiplicar” das que são da fé. O fruto, que é do amor, tem a semente pela qual se multiplica tanto. A bênção do Senhor também significa, na Palavra, frutificação e multiplicação, porque estas procedem dela.

Vers. 23: “E houve tarde, e houve manhã, o dia quinto”.


 

O primeiro capítulo de Gênesis, no sentido espiritual

1º dia
Criação da luz;

separação entre a luz e as trevas, dia e noite
A verdade da fé brilha e mostra a distinção entre as coisas do homem e as de Deus
2º dia
Criação da expansão ou o céu;

separação entre as águas acima e abaixo
Noção de que existe um homem interno;

distingue entre as coisas do Senhor e as suas
3º dia
Ajuntamento das águas,

aparece o seco; terra e mares;

a terra faz germinar a erva, a erva de semente e a árvore dando fruto
O homem começa a falar a partir das verdades da fé e faz algum bem, mas pensa que fala e age por si mesmo
4º dia
Luminares na expansão; o grande para dominar no dia e o menor, na noite, parem darem luz sobre a terra
A caridade e a fé são implantadas no homem interno
5º dia
As águas fazem produzir o réptil, a alma vivente; a ave voe sobre a terra e sobre as faces da expansão;

as baleias grandes e todo réptil
Fala pela fé e se confirma no bem;
6º dia
A terra produz alma vivente, a besta e o movente;

a fera, a besta

o homem, macho e fêmea, para dominar sobre a terra;
Fala e age pelo bem
Sabbath
O Senhor descansa
As lutas da regeneração do homem cessam, e o Senhor não precisa mais combater por ele.

 
 

 

O Primeiro Dia

 
No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo. A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele. E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 

 

O Segundo Dia
E disse Deus: Haja uma expansão
O homem interno é chamado “expansão”
no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas
Ordem para que se faça distinção entre os conhecimentos do homem externo e as cognições do homem interno
E fez Deus a expansão,
O homem interno é aberto
e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão
os conhecimentos do homem externo são vistos como distintos
e entre as águas que estavam acima da expansão;
das cognições do homem interno

“acima da expansão” = acima do homem interno, oriundas da Palavra
E assim se fez. E chamou Deus à expansão céu
O homem interno reconhecido
E houve tarde, e houve manhã,
A progressão da sombra da ignorância ou falsidade para a claridade da instrução na verdade
o dia segundo
O segundo estado da regeneração
 


 


 

O TerceiroDia
E disse DEUS: Faça germinar a terra a erva tenra,
Quando a terra – ou o homem –– foi assim preparada para que pudesse receber do SENHOR as sementes celestes e produzir alguma coisa do bem e do vero, então o SENHOR faz primeiro germinar alguma coisa tenra que é chamada “erva tenra”
a erva dando semente,
”; depois, alguma coisa mais útil que se semeia de novo e é chamada “erva dando semente”;
a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie,
enfim, algum bem que frutifica e é chamado “árvore dando fruto no qual [está] a sua semente”, cada um “segundo a sua espécie”
no qual [esteja] a sua semente, sobre a terra. E assim se fez E produziu a terra a erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual [estava] a sua semente, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom.”
A princípio, o homem que está sendo regenerado é tal que pensa que o bem que faz vem de si mesmo, e o vero que diz vem de si mesmo, quando todavia a coisa se passa assim: todo bem e todo vero vêm do SENHOR. Por isso, quem pensa que essas coisas vêm de si mesmo não tem ainda a vida da verdadeira fé, que pode todavia receber depois. Com efeito, ainda não pode crer que o bem e o vero vêm do SENHOR, porque está no estado de preparação para receber a vida da fé. Este estado é representado aqui pelas coisas inanimadas, e o estado da vida da fé é representado depois pelas coisas animadas.
 


 

O QuartoDia
E disse DEUS: Haja luminares na expansão dos céus, para separação entre o dia e entre a noite.

 
O amor e a fé são chamados, a princípio, os “luminares grandes”; depois, o amor o “luminar grande” e a fé o “luminar menor”;
E serão para sinais, e para tempos determinados, e para dias e anos. E serão por luminares na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra. E assim se fez. E fez DEUS dois luminares grandes: o luminar grande para dominar no dia, e o luminar menor para dominar na noite, e as estrelas.

E pô-los DEUS na expansão dos céus para darem luz sobre a terra”.

 
É dito que os luminares “serão para sinais e para tempos determinados, e para dias e para anos”. Estas palavras contêm mais arcanos do que podem ser ditos no momento, ainda que nenhum apareça no sentido da letra. Por ora, basta dizer que, em relação às coisas espirituais e celestes, há, no universal e nos singulares, sucessões que são comparadas às sucessões nos dias e anos. As sucessões nos dias são: da manhã ao meio‑dia, daí à tarde e, pela noite, à manhã. As dos anos são semelhantes: da primavera ao verão, daí ao outono e, pelo inverno, à primavera. São as alternações de calor e luz, e também as das frutificações da terra. Com essas alternações se comparam as das coisas espirituais e celestes. A vida sem tais alternações e diversidades seria uniforme e, por conseguinte, nula. E não seria possível discernir, distinguir e ainda menos perceber o bem e o vero. Essas alternações são chamadas “estatutos” na Palavra
“E para dominar no dia, e na noite, e para separar entre a luz e entre as trevas; e viu DEUS que era bom”.

 
Pelo “dia” se entende o bem, pela “noite” o mal; por isso os bens são chamados obras do dia, e os males obras da noite. Pela “luz” se entende o vero e pelas “trevas” o falso.
 

 

 

 

O Quinto dia

“E disse DEUS: Façam as águas produzir abundantemente o réptil, a alma vivente. E a ave voe sobre a terra, sobre as faces da expansão dos céus”.
Pelos “répteis” que as águas produzem são significados os conhecimentos que pertencem ao homem externo. Pelas “aves” em geral, as coisas racionais e também as intelectuais, estas últimas pertencendo ao homem interno.
“E criou DEUS as baleias grandes e toda alma vivente que rasteja, que as águas fizeram rastejar, segundo a sua espécie; e toda ave de asas, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom”.
Como foi dito, os “peixes” significam os conhecimentos, agora animados pela fé que vem do SENHOR e, assim, vivos. As “baleias” significam as coisas gerais dos conhecimentos, sob os quais e pelos quais existem os particulares. Nada há no universo que não esteja sob algum geral a fim de que exista e subsista. Os cetáceos ou baleias são algumas vezes nomeados nos Profetas e ali significam as coisas gerais dos conhecimentos.
E os abençoou DEUS, dizendo: Frutificai e multiplicai vos, e enchei as águas nos mares; e a ave será multiplicada na terra”.
Tudo o que tem em si a vida procedente do SENHOR frutifica e se multiplica imensamente, não tanto durante o tempo em que o homem vive no corpo, mas de um modo admirável na outra vida. “Frutificar”, na Palavra, se diz das coisas que são do amor, e “multiplicar” das que são da fé. O fruto, que é do amor, tem a semente pela qual se multiplica tanto. A bênção do SENHOR também significa, na Palavra, frutificação e multiplicação, porque estas procedem dela.
 

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6to Dia da Criação - Parte I [VÍDEO]
“E Deus os abençoou, dizendo: Frutificai, e multiplicai-vos...” Aula gratuita!

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Os Seis Dias da Criação
O Sexto Dia – primeira parte
 

C. R. Nobre

 

Estamos estudando o primeiro capítulo de Gênesis à luz dos Arcanos Celestes, e vimos que os dias da criação representam os estados da regeneração do homem, estados esses que “se dividem em seis e se chamam os dias de sua criação, pois, gradualmente, de não-homem que era, ele se torna... ‘imagem’.”

Vimos que o primeiro dia é o estado que precede a regeneração até quando o homem vê a luz da verdade. O segundo estado é quando ele distingue entre as suas convicções humanas e as verdades eternas do Senhor. O terceiro estado é quando começa a fazer o bem da religião. No quarto estado ele é tocado pelo amor (o sol) e iluminado pela fé (a lua), que são acesos em seu homem interno. No quinto estado ele age pela fé e assim se confirma no bem. As criaturas desse dia, os peixes, répteis e aves significam conhecimentos e percepções, coisas intelectuais em sua mente. Mas agora, no sexto dia, tratam-se das afeições, que pertencem à vontadee são significadas pelos animais.

Dividiremosa explicação dos Arcanos em duas partes: a primeira, a criação dos animais; e, asegunda, a criação do homem.

“E disse DEUS: Produza a terra alma vivente segundo a sua espécie; a besta e o que se move; e a fera desta terra segundo a sua espécie. E foi feito assim. E fez DEUS a fera da terra segundo a sua espécie; e a besta segundo a sua espécie; e todo réptil dohúmus, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom. Gênesis 1:24-25

Lemos nos Arcanos que no sexto dia “o homem age pelo amor e fala pela fé. Por isso as suas ações são comparadas agora à “alma vivente e besta”. “E como agora...começa a agir... pelo amor, torna-se homem espiritual” e é chamado “imagem” de Deus.Portanto, é somente no sexto dia que o homem se torna espiritual.

Nessa fase do novo nascimento são implantadas no homem certas afeições,significadas pelos animais, quesão mencionados duas vezes, sendo três tipos cada vez“alma vivente que a terra produz”, a “besta e o que rasteja” e a “fera desta terra”; e, em seguida, “a fera da terra segundo a sua espécie; e a besta segundo a sua espécie; e todo réptil do húmus, segundo a sua espécie”.

Em toda parte na Palavra se faz distinção muito clara entre essas categorias de animais: ser vivente, fera da terra, besta etc.Mas, como o sentido espiritual envolve muito mais coisas do que é possível expor à nossa compreensão natural, a significação de cada gênero e espécie de animalé dada somente de uma forma geral, mas é suficiente para entendermos que eles representam vários tipos de afeições que são provenientes das várias classes de amor, natural ou espiritual.

Já vimos que a vontade foi criada para serreceptáculo do amor ou caridade, e o entendimento parareceptáculo da verdade ou da fé. Mas é a vontade que constitui o ser de uma pessoa, e o entendimento é um acessório. A vontade é a casa onde vivemos, e o entendimento é a varanda, a parte que se comunica com a rua. E como é a vontade que constitui propriamente o homem, por isso é que, somente agora, no sexto dia, quando são implantadas afeições espirituais na vontade, se diz que o homem se torna homem, a saber, homem espiritual, e é chamado “imagem de Deus”.

Diferentemente das criaturas do quinto dia são, que vieram das águas e do céu, significando coisas intelectuais, os animais do sexto dia são produzidos pela terra. A terra significa a mente ou homem externo, e os animais aí significam afeições boas. Os Escritos definem afeições como continuidades do amor. Elas são como o calor que procede do fogo, e é pelas afeições que o amor se faz sentir na vontade. Como o amor (o sol) foi implantado no homem interno no quinto dia, agora surgem afeições boas na mente consciente, que é a terra, no sexto dia.

Asações da pessoa, nessa fase da regeneração, são impulsionadas pelas boas afeições agora implantadas. É dito que a terra ou o homem as produz, mas são, de fato, produzidas pelo Senhor, esão feitas pelo homem somente em aparência. O Senhor é o agente e o homem é o reagente, um cooperadorconsciente do que faz.No sexto dia, apessoapratica as boas obras como se fosse por si mesma, por sua decisão, sua volição, seu empenho, seu esforço, sua habilidade, mas, como ela tem a luz da verdade desde o quarto dia, ela sabe, e crê, que é o Senhor quem lhe dá o querer e o poder realizar; que por si mesma nada pode, e nenhum fruto bom pode produzir, pois todo bem vem do Senhor. “Não há ninguém há bom senão um, Deus.” Mediante essa fé, a pessoa exerce a verdadeira caridade, que consiste em afastar-se do mal e agir com zelo, honestidade e fidelidade no dever de sua função, para o bem do próximo, da pátria e do Senhor.

Enquanto faz isso, ela está no pleno gozo de suas escolhas e ações, porque não sente influxo algum do céu. Não sente absolutamente a mão Divina a impulsionando nesta ou naquela direção, para agir com retidão. E essaaparência de que age por si mesmaé necessária, para que eladefina em liberdade a vida que quer para si na eternidade.

Mas, se no momento mesmo do exercício do bema pessoa não sentia a ação Divina, pelo menos depois, ela deve reconhecer que o poder atuante veio de Deus, e por isso ela atribui a Deus a honra e o poder pelo querer e pelo fazer. Em consequência disso, ela não cai mais no engano de que vive, age, tem poder e é boa por si mesma, até porque, a essa altura da regeneração, a Luz clara da verdade mostra exatamente como as coisas de fato são. E a verdade é que o Senhor é o Oleiro e nós somos meramente vasos para receber e transferir aos outros os bens e veros que procedem d’Ele.

O Senhor atua no homem de duas maneiras: imediatamente e mediatamente. Imediatamente, por Seu Divino Amor e Sabedoria, influindo na vontade e no entendimento e fazendo que existam nesses receptáculos a caridade e a fé. E o Senhor atua mediatamente quando age por intermédio dos anjos. Porque, conforme lemos nos Arcanos Celestes e em outros Escritos de Swedenborg, junto a cada ser humano existem pelo menos dois espíritos maus e dois espíritos angélicos. Pelos espíritos maus ou diabólicos a pessoa recebe influência vinda do inferno, e pelos espíritos angélicos ela recebe o influxo celeste. A atuação desses dois influxos, simultâneos e na mesma intensidade resulta na liberdade do indivíduo, porque, quando as forças opostas estão em equilíbrio, quem está no meio pode livremente se voltar para um lado ou outro.

“Enquanto não é regenerado, o homem é dirigido de modo diferente do que quando é regenerado. Quando não é regenerado, há nele espíritos maus que dominam sobre ele de tal modo, que os anjos, ainda que presentes, quase nada podem fazer senão apenas conduzi-lo, para que não se precipite num mal extremo, e desviá-lo para algum bem; e isto eles fazem mesmo pelas próprias cobiças dele, para desviá-lo ao bem, e pelos enganos dos sentidos, para desviá-lo ao vero. Então ele tem comunicação com o mundo dos espíritos pelos espíritos que nele estão, mas não tanto com o céu, porque os espíritos maus dominam e os anjos somente o desviam.”

Os espíritos maus e os anjos se identificam com a pessoa pelas afeições presentes na vontade. Os maus são atraídos pelas afeições más e as compartilham com a pessoa, enquanto os anjos inspiram e estimulam as afeições boas. Afeições são ímãs espirituais. Os espíritos e anjos não veem a pessoa mesma, nem seus pensamentos, mas sentem as afeições compatíveis, infernais ou celestes.

Se o amor preponderante da pessoa em determinado momento for um amor do mal, as afeiçõesprovenientes desse amor serão corporais e no nível dos sentidos, e são representadas na Palavra pelos animaisferozes e imundos. Se o amor for bom, as afeições terão vida espiritual e são representadas na Palavra por animais mansos e limpos, como ovelhas e bois.

Os espíritos não têm mais base material de pensamento e sensação, por isso dependem das sensações ou afeições e memória do indivíduo com quemestão associados. Os maus espíritos se deleitam com os males que a pessoa pratica como se eles mesmos os estivessem praticando. Assim se forma um vínculo infernal de prazeres impuros, num círculo vicioso em que um alimenta os outros.  Toda vaidade, inveja, soberba, rancore sentimentos assim que a pessoa conserva na sua vontade são como alimentos imundos que ela guarda na despensa de sua mente. E os maus espíritos, atraídos por essas afeições más, as estimulam e trazem à memória da pessoa, ou para a pessoa praticá-las com o corpo ou para se deleitar com elas nas fantasias da mente. Qualquer que seja a forma, os maus espíritos se deleitam juntamente com a pessoa. Quando a pessoa dá vazão às afeições más e impróprias é como ela estivessepreparando e pondo à mesa alimentosimundos que esses espectros do inferno compartilharão com ela. O prazer na prática do mal faz que haja uma identificação cada vez maior entra a pessoas e esses seres demoníacos que se nutrem daquele prazer.Podemos crer ou não, mas o fato é que, em toda ação má, praticada com afeição, no corpo ou apenas no pensamento, como fantasia, a pessoa nunca está sozinha, porque tem a companhia de seres infernais que estão nessa afeição com ela.

Muito ao contrário, os bons espíritos, ou anjos, inspiram e estimulam na pessoa as afeições boas guardadas no coração e na memória (as relíquias de que falamos no primeiro dia). E os anjos compartilham do prazer celeste que a pessoa sente em todas as afeições boas, como a compaixão, a misericórdia, a empatia, a mansidão, a benevolência, porque essas afeições são oriundas do amor ao próximo e a Deus, e são overdadeiro e salvífico alimento para a alma. São elas que o Senhor cria no homem que está sendo regenerado, no sexto dia, e são representadas pelos vários gêneros e espécies de animais citados no texto. É dito que a terra as produz, porque a aparência é que o homem é que está fazendo isso tudo, como vimos há pouco.

“Nos Profetas, e constantemente na Palavra do Antigo Testamento, semelhantes coisas são representadas pelos gêneros de animais. As bestas são de duplo gênero: há as más, porque são nocivas, e há as boas, porque são mansas. As coisas más que estão no homem foram significadas pelas bestas más, como os “ursos, lobos e cães”; as coisas que são boas e agradáveis o foram pelas bestas mansas e também pelos “bezerros, ovelhas e cordeiros”. Aqui, como se trata daqueles que devem ser regenerados, as bestas são boas e mansas e significam as afeições. As coisas que são inferiores e tiram mais do corpóreo são chamadas “feras dessa terra” e são as cobiças e volúpias.” (AC 45).

E uma vez que nesse estado avançado da regeneração as afeições do homem foram subordinadas ao amor ao Senhor e o amor ao próximo, por isso se diz em Oséias: “Farei por eles uma aliança, naquele dia, com a fera do campo, e com a ave dos céus, e com o réptil da terra” (2:18). “Glorificai JEHOVAH todos os Seus anjos, glorificai-O da terra, ó baleias, árvore frutífera, fera e toda besta, o réptil e a ave de asa” (Sal. 148:2-4, 7-9, 10);“aqui, exatamente as mesmas coisas são nomeadas, como as “baleias, a árvore frutífera, a fera, a besta, o réptil e a ave”. Nunca se poderia dizer a elas que “glorificassem JEHOVAH” a menos que por elas fossem significadas coisas no homem. (AC 46).

Antes de concluir esta parte do Gênesis, é preciso fazer um adendo muito importante. Nessas etapas da nova criação do homem, não é possível saber em que estado estamos, se no primeiro, segundo ou sexto. Não podemos olhar para nossa vida e dizer o quanto estamos regenerados ou se atingimos este ou aquele estado. O Senhor falou com o fariseu Nicodemos, sobre o novo nascimento, dizendo: “O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito” (João 3:8), significando que ao homem não é concedido conhecer o status de seu novo nascimento, e isto por vários motivos: primeiro, porque a regeneração, uma vez iniciada no mundo, prosseguirá eternamente. Os anjos são eternamente aperfeiçoados e nunca se pode dizer que são perfeitos. Segundo, para que a pessoa não esmorecesse e deixasse de combater por sua transformação espiritual, se soubesse o quanto tem ainda para aprender e para mudar. Os anjos mais altos são justamente os que conhecem melhor o quanto o ser humano é imperfeito. E, terceiro, para que o homem, achando que está regenerado, não se ensoberbeça por causa de sua pretensa santidade e bondade e assim caia no mal do orgulho.

Por issotudo , não podemos nos avaliar e pensar que estamos regenerados, nem considerar que os outros já estejam ou não estejam. E essa ignorância isto é saudável e necessária. Nesse caminho, não podemos nos comparar com os outros, colocando-nos à frente ou atrás dos outros, tampouco devemos achar que temos ou menor grau de fé e caridade do que outros. Quem achar que já está regenerado ainda não entendeu o que é a regeneração, e talvez ainda esteja na escuridão de antes do primeiro dia. Mesmo o apóstolo Paulo, depois de pregar e sofrer pelo Evangelho, disse, a respeito de seu estado espiritual: “Não que já tenha alcançado ou que seja perfeito; mas prossigo para alcançar aquilo para o que fui também preso por Cristo Jesus.  Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam e avançando para as que estão diante de mim, prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.” Fil. 2:12-14.

Como sabemos, então, se estamos sendo regenerados? Confiamos no Senhor que sim. Esperamos que sim. Mas, o quanto já fomos, e em que grau, isso não nos convém saber. Basta lidarmos com as questões espirituais quando elas se nos forem apresentando. Basta a cada dia o seu mal.

Na continuação, veremos então o que é significado pelos versículos seguintes:“E disse DEUS: Façamos o homem à Nossa imagem, segundo a Nossa semelhança. E dominarão sobre os peixes do mar, e sobre a ave dos céus, e sobre a besta, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que rasteja sobre a terra. E criou DEUS o homem à sua imagem, à imagem de DEUS o criou; macho e fêmea os criou”.


 

Arcanos Celestes, 44-48

 

44.      Vers. 24 e 25: “E disse Deus: Produza a terra alma vivente segundo a sua espécie; a besta e o que se move, e a fera desta terra segundo a sua espécie. E, assim, foi feito. E fez Deus a fera da terra segundo a sua espécie, e a besta segundo a sua espécie, e tudo o que rasteja no humo segundo a sua espécie. E viu Deus que [era] bom”. O homem, como a “terra”, nada pode produzir de bem se antes não forem semeadas nele as cognições da fé pelas quais saiba o que deve crer e fazer. Pertence ao entendimento o ouvir a Palavra e à vontade o praticá‑la. Ouvir a Palavra e não praticá‑la é dizer que se crê e, todavia não viver de acordo [com a crença]. Tal indivíduo separa essas duas coisas e divide a mente, e é chamado “insensato” pelo Senhor:

“Todo aquele que ouve as Minhas palavras e as pratica, comparo‑o ao varão prudente que edificou a sua casa sobre a rocha; mas todo aquele que ouve as Minhas palavras e não as pratica, comparo‑o ao varão insensato que edificou a sua casa sobre a areia” (Mt. 7:24, 26).

Como se mostrou, as coisas que pertencem ao entendimento foram significadas pelos “répteis, que as águas fizeram rastejar, e pela ave sobre a terra e sobre as faces da expansão”. As que pertencem à vontade são significadas aqui pela “alma vivente que a terra produz”, pela “besta e o que rasteja” e, depois, pela “fera desta terra”.

45.      Os que viveram nos tempos antiquíssimos assim designaram as coisas que pertencem ao entendimento e as que pertencem à vontade. Daí é que nos Profetas, e constantemente na Palavra do Antigo Testamento, semelhantes coisas são representadas pelos gêneros de animais. As bestas são de duplo gênero: há as más, porque são nocivas, e há as boas, porque são mansas. As coisas más que estão no homem foram significadas pelas bestas más, como os “ursos, lobos e cães”; as coisas que são boas e agradáveis o foram pelas bestas mansas e também pelos “bezerros, ovelhas e cordeiros”. Aqui, como se trata daqueles que devem ser regenerados, as bestas são boas e mansas e significam as afeições. As coisas que são inferiores e tiram mais do corpóreo são chamadas “feras dessa terra” e são as cobiças e volúpias.

46.      As “bestas” significam as afeições no homem — as más nos maus e as boas nos bons— o que se pode ver por muitas passagens na Palavra, como em Ezequiel:

“Eis, Eu estou convosco, e Me voltarei para vós para serdes lavrados e semeados; e multiplicarei sobre vós o homem e a besta, e serão multiplicados e frutificarão; e vos farei habitar segundo as vossas antiguidades” (36:9‑11);

onde se trata da regeneração. Em Joel:

“Não temais, bestas do Meu campo, porque ervosas se tornam as moradas do deserto” (2:22).

Em David:

“Eu, tolo... como besta fui perante Deus” (Sal. 73:22).

Em Jeremias:

“Eis, dias virão, e semearei a casa de Israel e a casa de Jehudah com semente de homem e semente de besta... e velarei sobre eles para edificar e plantar” (31:27, 28);

aí se trata da regeneração. [2] Que a “fera” signifique coisas semelhantes, vê‑se em Oséias:

“Farei por eles uma aliança, naquele dia, com a fera do campo, e com a ave dos céus, e com o réptil da terra” (2:18);

emJó:

“Da parte da fera da terra nada temerás, pois com as pedras do campo [é] a tua aliança, e a fera do campo te será pacífica” (5:22, 23);

emEzequiel:

“Firmarei convosco uma aliança de paz e farei cessar da terra a fera má, para que habitem no deserto confiantemente” (34: 25);

em Isaías:

“A fera do campo Me honrará, porque dei águas no deserto” (43:20);

emEzequiel:

“Em seus ramos fizeram ninho todas as aves dos céus, e sob os seus ramos geraram todas as feras do campo, e em sua sombra habitaram todas as grandes nações” (31:6),

tratando‑se, assim, da Assíria, pela qual é significado o homem espiritual, que é comparado ao Jardim do Éden. Em David:

“Glorificai Jehovah todos os Seus anjos, glorificai‑O da terra, ó baleias, árvore frutífera, fera e toda besta, o réptil e a ave de asa” (Sal. 148:2-4, 7-9, 10);

aqui, exatamente as mesmas coisas são nomeadas, como as “baleias, a árvore frutífera, a fera, a besta, o réptil e a ave”. Nunca se poderia dizer a elas que “glorificassem Jehovah” a menos que por elas fossem significadas coisas no homem. [3] Nos Profetas se distingue muito bem entre “bestas” e “feras da terra” e entre “bestas” e “feras do campo”. De tal modo os bens são chamados “bestas” que aqueles que no céu estão mais perto do Senhor são chamados “animais”, tanto em Ezequiel como em João:

“Todos os anjos estavam ao redor do trono, e os anciões, e os quatro animais; e caíram perante o trono sobre as suas faces, e adoraram o Cordeiro” (Apoc. 7:2; 19:4).

São chamadas, também, “criaturas” às quais o Evangelho deve ser pregado, porque devem ser criadas de novo:

“Ide por todo o mundo, e pregai o evangelho a toda criatura” (Mc. 16:15).

47.      Estas palavras contêm arcanos da regeneração; isto se pode ver também pelo que foi dito no versículo anterior, que “a terra produzisse a alma vivente, a besta e a fera da terra”, e no versículo seguinte, em outra ordem, que “Deus fez a fera da terra e depois a besta”. Com efeito, primeiro o homem produz como por si próprio, e também depois, até se tornar celeste. E, como a regeneração começa do homem externo e progride para o interno, por isso aqui há outra ordem e os externos precedem.

48.      Por aí se pode ver agora o que é o quinto estado, em que o homem fala pela fé que é do entendimento e daí se confirma no vero e no bem; as coisas que ele então produz são animadas e se chamam “peixes do mar” e “aves dos céus”. E o que é o sexto estado, quando fala os veros e faz os bens pela fé que é do entendimento e daí pelo amor que é da vontade; as coisas que ele então produz se chamam “alma vivente e besta”. E, como agora começa a agir pela fé ao mesmo tempo em que pelo entendimento, e também a agir pelo amor, torna‑se homem espiritual, que é chamado “imagem”, de que agora se tratará.


 

O primeiro capítulo de Gênesis, no sentido espiritual

1º dia
Criação da luz;

separação entre a luz e as trevas, dia e noite
A verdade da fé brilha e mostra a distinção entre as coisas do homem e as de Deus
2º dia
Criação da expansão ou o céu;

separação entre as águas acima e abaixo
Noção de que existe um homem interno;

distingue entre as coisas do Senhor e as suas
3º dia
Ajuntamento das águas,

aparece o seco; terra e mares;

a terra faz germinar a erva, a erva de semente e a árvore dando fruto
O homem começa a falar a partir das verdades da fé e faz algum bem, mas pensa que fala e age por si mesmo
4º dia
Luminares na expansão; o grande para dominar no dia e o menor, na noite, parem darem luz sobre a terra
A caridade e a fé são implantadas no homem interno
5º dia
As águas fazem produzir o réptil, a alma vivente; a ave voe sobre a terra e sobre as faces da expansão;

as baleias grandes e todo réptil
Fala pela fé e se confirma no bem;
6º dia
A terra produz alma vivente, a besta e o movente;

a fera, a besta

o homem, macho e fêmea, para dominar sobre a terra;
Fala e age pelo bem
Sabbath
O Senhor descansa
As lutas da regeneração do homem cessam, e o Senhor não precisa mais combater por ele.

 
 

 

O Primeiro Dia

 
No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo. A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele. E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 

 

O Segundo Dia
E disse Deus: Haja uma expansão
O homem interno é chamado “expansão”
no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas
Ordem para que se faça distinção entre os conhecimentos do homem externo e as cognições do homem interno
E fez Deus a expansão,
O homem interno é aberto
e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão
os conhecimentos do homem externo são vistos como distintos
e entre as águas que estavam acima da expansão;
das cognições do homem interno

“acima da expansão” = acima do homem interno, oriundas da Palavra
E assim se fez. E chamou Deus à expansão céu
O homem interno reconhecido
E houve tarde, e houve manhã,
A progressão da sombra da ignorância ou falsidade para a claridade da instrução na verdade
o dia segundo
O segundo estado da regeneração
 



 

O TerceiroDia
E disse DEUS: Faça germinar a terra a erva tenra,
Quando a terra – ou o homem –– foi assim preparada para que pudesse receber do SENHOR as sementes celestes e produzir alguma coisa do bem e do vero, então o SENHOR faz primeiro germinar alguma coisa tenra que é chamada “erva tenra”
a erva dando semente,
”; depois, alguma coisa mais útil que se semeia de novo e é chamada “erva dando semente”;
a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie,
enfim, algum bem que frutifica e é chamado “árvore dando fruto no qual [está] a sua semente”, cada um “segundo a sua espécie”
no qual [esteja] a sua semente, sobre a terra. E assim se fez E produziu a terra a erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual [estava] a sua semente, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom.”
A princípio, o homem que está sendo regenerado é tal que pensa que o bem que faz vem de si mesmo, e o vero que diz vem de si mesmo, quando todavia a coisa se passa assim: todo bem e todo vero vêm do SENHOR. Por isso, quem pensa que essas coisas vêm de si mesmo não tem ainda a vida da verdadeira fé, que pode todavia receber depois. Com efeito, ainda não pode crer que o bem e o vero vêm do SENHOR, porque está no estado de preparação para receber a vida da fé. Este estado é representado aqui pelas coisas inanimadas, e o estado da vida da fé é representado depois pelas coisas animadas.
 


 

O QuartoDia
E disse DEUS: Haja luminares na expansão dos céus, para separação entre o dia e entre a noite.

 
O amor e a fé são chamados, a princípio, os “luminares grandes”; depois, o amor o “luminar grande” e a fé o “luminar menor”;
E serão para sinais, e para tempos determinados, e para dias e anos. E serão por luminares na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra. E assim se fez. E fez DEUS dois luminares grandes: o luminar grande para dominar no dia, e o luminar menor para dominar na noite, e as estrelas.

E pô-los DEUS na expansão dos céus para darem luz sobre a terra”.

 
É dito que os luminares “serão para sinais e para tempos determinados, e para dias e para anos”. Estas palavras contêm mais arcanos do que podem ser ditos no momento, ainda que nenhum apareça no sentido da letra. Por ora, basta dizer que, em relação às coisas espirituais e celestes, há, no universal e nos singulares, sucessões que são comparadas às sucessões nos dias e anos. As sucessões nos dias são: da manhã ao meio‑dia, daí à tarde e, pela noite, à manhã. As dos anos são semelhantes: da primavera ao verão, daí ao outono e, pelo inverno, à primavera. São as alternações de calor e luz, e também as das frutificações da terra. Com essas alternações se comparam as das coisas espirituais e celestes. A vida sem tais alternações e diversidades seria uniforme e, por conseguinte, nula. E não seria possível discernir, distinguir e ainda menos perceber o bem e o vero. Essas alternações são chamadas “estatutos” na Palavra
“E para dominar no dia, e na noite, e para separar entre a luz e entre as trevas; e viu DEUS que era bom”.

 
Pelo “dia” se entende o bem, pela “noite” o mal; por isso os bens são chamados obras do dia, e os males obras da noite. Pela “luz” se entende o vero e pelas “trevas” o falso.
 

 

 

 

O Quinto dia

“E disse DEUS: Façam as águas produzir abundantemente o réptil, a alma vivente. E a ave voe sobre a terra, sobre as faces da expansão dos céus”.
Pelos “répteis” que as águas produzem são significados os conhecimentos que pertencem ao homem externo. Pelas “aves” em geral, as coisas racionais e também as intelectuais, estas últimas pertencendo ao homem interno.
“E criou DEUS as baleias grandes e toda alma vivente que rasteja, que as águas fizeram rastejar, segundo a sua espécie; e toda ave de asas, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom”.
Como foi dito, os “peixes” significam os conhecimentos, agora animados pela fé que vem do SENHOR e, assim, vivos. As “baleias” significam as coisas gerais dos conhecimentos, sob os quais e pelos quais existem os particulares. Nada há no universo que não esteja sob algum geral a fim de que exista e subsista. Os cetáceos ou baleias são algumas vezes nomeados nos Profetas e ali significam as coisas gerais dos conhecimentos.
E os abençoou DEUS, dizendo: Frutificai e multiplicai vos, e enchei as águas nos mares; e a ave será multiplicada na terra”.
Tudo o que tem em si a vida procedente do SENHOR frutifica e se multiplica imensamente, não tanto durante o tempo em que o homem vive no corpo, mas de um modo admirável na outra vida. “Frutificar”, na Palavra, se diz das coisas que são do amor, e “multiplicar” das que são da fé. O fruto, que é do amor, tem a semente pela qual se multiplica tanto. A bênção do SENHOR também significa, na Palavra, frutificação e multiplicação, porque estas procedem dela.
 


 

 

O Sexto dia

 

“E disse DEUS: Produza a terra alma vivente segundo a sua espécie; a besta e o que se move, e a fera desta terra segundo a sua espécie.

 
O homem, como a “terra”, nada pode produzir de bem se antes não forem semeadas nele as cognições da fé pelas quais saiba o que deve crer e fazer.
E, assim, foi feito. E fez DEUS a fera da terra segundo a sua espécie, e a besta segundo a sua espécie, e tudo o que rasteja no humo segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom”.
Como se mostrou, as coisas que pertencem ao entendimento foram significadas pelos “répteis, que as águas fizeram rastejar, e pela ave sobre a terra e sobre as faces da expansão”. As que pertencem à vontade são significadas aqui pela “alma vivente que a terra produz”, pela “besta e o que rasteja” e, depois, pela “fera desta terra”.

As “bestas” significam as afeições no homem — as más nos maus e as boas nos bons  — o que se pode ver por muitas passagens na Palavra
 

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6to Dia da Criação - Parte II [VÍDEO]
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Os Seis Dias da Criação
O Sexto Dia – segunda parte
 

C. R. Nobre

 

 

E disse DEUS: Façamos o homem à Nossa imagem, segundo a Nossa semelhança. E dominarão sobre os peixes do mar, e sobre a ave dos céus, e sobre a besta, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que rasteja sobre a terra.

E criou DEUS o homem à sua imagem, à imagem de DEUS o criou; macho e fêmea os criou. E os abençoou DEUS;e  disse-lhes  DEUS: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e subjugai-a. E dominai sobre os peixes do mar e sobre a ave dos céus, e sobre todo [ser] vivo que rasteja sobre a terra. E disse DEUS: Eis, dou-vos toda erva dando semente, que [há] sobre as faces de toda a terra, e toda árvore em que [há] fruto. A árvore que produz semente vos serápara comida. E a toda fera da terra, e a toda ave dos céus, e a tudo o que rasteja sobre a terra, em que [há] alma vivente, todo verde da erva, para alimento. E foi feito assim. E viu DEUS tudo o que fez, e eis, muito bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia sexto.” -Gênesis 1:24-31

 

 

Vimos as etapas da regeneração do homem desde o começo, quando se acendeu para ele a luz fé, em seguida, quando fez distinção em sua mente entre seus conhecimentos e as verdades de Deus, e passou a ter noção de seu homem interno. Depois, quando começou a praticar as obras da fé por obediência e com lutas; em seguida, quando perseverou na obediência até serem implantados nele o amor e a fé. Depois disso é que os atos que ele praticouforam vivos, porque eram feitos por Deus através dele. Finalmente, as afeições boas foram insinuadas em sua mente, quando chegou ao sexto estado, conforme começamos a ver na semana passada.

Na continuação do sexto estado, lemos: “E disse DEUS: Façamos o homem à Nossa imagem, segundo a Nossa semelhança.” Já mencionamos que o verbo no plural, aqui, “façamos”, tem ocasionadodiversas interpretações. Mas, conforme já vimos também, há duas razões para isso: a primeira é porque o sujeito, citado logo no primeiro versículo,éo plural de “Deus”, no hebraico, “Eloim”. Daí alguns deduziram que se está referindo aos“três deuses”, o Pai, o Filho e Espírito Santo. Mas a razão e o bom senso rejeita a ideia de três deuses, como absurda em si mesma. Então, a razão real do “façamos” está no sentido espiritual: é que o Senhor regenera o homem por intermédio dos anjos, que são chamados de “deuses” porque recebem as coisas de Deus. Os anjos participam desse trabalho Divino acompanhando, direcionando, protegendo e inspirando o homem em todo o processo.

O primeiro capítulo de Gênesis que acabamos de ver, entendido no sentido literal, fala da criação física do universo, o céu, a terra, os vegetais, o sol, a lua, os peixes, as aves, e os animais,até o sexto dia, e somente no fim do sexto dia é que fala da criação do ser humano, “façamos o homem”. Isto é o sentido literal. Mas, no sentido espiritual, o entendimento é outro: tudo o que é mencionado, desde o primeiro dia, se refere unicamente ao homem, pois todas aquelas coisas e seres citados até aqui fazem parte do espírito do humano. Sendo assim, quando chegamos aqui e lemos “façamos o homem”, devemos entender não que o processo de criação do homem vai se iniciar, mas que está se concluindo. Desde o começo até aqui o homem estava sendo gradativamente criado espiritualmente, e agora a regeneração se completa.Mas o homem não é mencionado antes disso porque ele só se torna de fato homem após receber do Divino a vida espirituale se tornar uma imagem de Deus, o Único e Verdadeiro Homem.

Lemos, então, que Deus criou o homem, “macho e fêmea”. Também aqui, os termos “macho e fêmea”, entendidos no sentido literal, dizem exatamente isso, que Deus criou o ser humano com um ou outro gênero, masculino ou feminino. Mas, no sentido espiritual, os arcanos encerrados nesses dois termos, “macho e fêmea” não se referem à característica física do indivíduo, mas à constituição do seu espírito, porque “macho” significa o entendimento do homem espiritual, e “fêmea” significa a vontade desse homem, e essas duas faculdades foram criadas para serem uma só mente. Então, o que se entende aqui é que, quando o processo de criação espiritual do ser humano se completa, no sexto dia, o Senhor finalmente forma neleuma nova vontade, ou “fêmea”, e um entendimento novo, ou “macho”. Todo o processo da criação das etapas anteriores culmina nisso, que o ser humano tenha essas duas faculdades refeitas por Deus de tal maneira que elas constituam harmonicamente uma só mente, ou um só ser humano, seja ele homem ou mulher. Quando atinge esse ponto, pelo novo nascimento, a vontade nova está pronta para receber o amor de Deus e o entendimento, para receber a sabedoria, em forma de caridade e fé, respectivamente. A caridade e a féfazem, por conseguinte, com que o homem se torne imagem de seu Criador.

E sobre esses dois aspectos da mente, os Arcanos Celestes nos falam que, quando a vontade e o entendimento agem em consonância mútua, como se dá no sexto estado,eles formam uma espécie de casamento, casamento esse que é também a imagem da união Divina no Senhor, entre o Divino Amor e a Divina Sabedoria. E mais, é por causa desse casamento Divino que todas as coisas criadas no universo se referem ao bem e à verdade.

Esse casamento no universo não é tão visívelà nossa observação natural, mas éplenamente manifesto em toda parte na Palavra, onde sempre encontramos essa dualidade ou pares de expressões que se casam, uma se referindo ao bem, outra à verdade.

Lemos na obra “Doutrina da Escritura Santa”: “Alguns vocábulos e nomes se atribuem ao bem, alguns ao vero e alguns incluem um e outro”....Como existe tal casamento em cada coisa da Palavra, por isso há, muitas vezes, expressões duplas que parecem ser repetições de uma mesma coisa. Não são, todavia, repetições, mas uma se refere ao bem e a outra ao vero, sendo que uma e outra tomadas juntamente fazem a conjunção dos dois, assim, uma só coisa.

“Vem daí, também, a Divindade da Palavra e a sua santidade, porque em toda obra do Senhor o bem é conjunto ao vero e o vero é conjunto ao bem”. Onde está o casamento do Senhor e da igreja, aí também está o casamento do bem e do vero, porque este vem daquele. Porque, quando a igreja ou o homem da igreja está nos veros, então o Senhor influi com o bem em seus veros e os vivifica. Ou, o que é a mesma coisa, quando a igreja ou o homem da igreja está na inteligência por meio dos veros, então o Senhor, pelo bem do amor e da caridade, influi em sua inteligência e, assim, introduz ali a vida....

“Em todo homem existem duas faculdades da vida, que se chamam entendimento e vontade.... Esses dois constituem um só, para que o homem seja homem da igreja. Mas fazem um quando o homem forma o entendimento com os veros genuínos, e isso se faz aparentemente como se por ele mesmo; e é feito pelo Senhor quando a sua vontade se enche do bem do amor. Assim há, no homem, a vida do bem e do vero, a vida do vero no entendimento proveniente da vontade, e a vida do bem na vontade por meio do entendimento. Este é o casamento do vero e do bem no homem, portanto, o casamento do Senhor e da igreja nele.” (80-83).

“E os abençoou Deus, e disse-lhes Deus: “Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e subjugai-a. E dominai sobre os peixes no mar, e sobre a ave dos céus, e sobre todo [ser] vivo que rasteja sobre a terra”“.

Uma vez que a conjunção do entendimento e da vontade renovados forma um casamento, por isso, o que resulta dessa união se chama frutificação e multiplicação. Frutificação em referência ao bem e multiplicação em referência à verdade. O bem frutifica e a verdade se multiplica. A capacidade dos frutos e das sementes de se multiplicarem ao infinito tem sua origem nessa união e prolificação Divinas do Amor e da Sabedoria. Lemos em outra obra que as sementes têm, potencialmente, a possibilidade de se multiplicar a tal ponto que todo o globo terrestre não bastaria para contê-las, por sua abundância, o que é uma imagem da infinidade Divina. Assim também acontece com os bens e verdades com os anjos; esses bens e verdades frutificam e se multiplicam na infinidade de usos que eles prestam nos céus, sem nunca se esgotarem, e com os usos eles têm regozijo e felicidade eternamente.

Desde os primeiros estudos, já vimos também que o homem natural ou externo foi significado pela “terra” na história da criação, e o homem interno foi representado pelo céu. O propósito da regeneração é que o homem interno ou espiritual domine ou controle o homem externo ou natural. Mas esse domínio só é alcançado por meio das lutas da tentação, quando as inclinações más e as maldades ativas do indivíduo, que são como feras nocivas,sãovencidas, afastadase os bens são implantados em seu lugar. Portanto, é esse combate do homem espiritual e sua dominação sobre o natural que é aqui representado pelo que foi dito: “subjugai a terra”, e “dominai”. Porque o homem regenerado finalmente adquire controle sobre as cobiças e paixões de sua mente natural, e as mantém em sujeição aos princípios elevados do amor a Deus e ao próximo.

“E disse DEUS: Eis, dou-vos toda erva dando semente, que [há] sobre as faces de toda a terra, e toda árvore em que [há] fruto”. A árvore que produz semente vos será para comida. A“erva dando semente” é todaverdade que se refere a um uso.

A “árvore na qual [há] fruto” é o bem da fé. O “fruto” é o que o Senhor dá ao homem celeste, mas a “semente”, da qual vem o fruto, é o que Ele dá ao homem espiritual. Por isso se diz: “a árvore que produz semente vos será para comida”. Que a comida celeste se chame “fruto da árvore” vê-se pelo capítulo seguinte, onde se trata do homem celeste.

“E a toda fera da terra, e a toda ave dos céus, e a tudo o que rasteja sobre a terra, em que [há] alma vivente, toda erva verde, para alimento. E assim foi feito”.

Aqui é descrito, em resumo, nutrimento do homem regenerado. Nós já vimos alguma coisa sobre isso quando tratamos aqui das afeições como alimentos espirituais, as boas, o alimento celeste, e as más, o alimento infernal. De acordo com a qualidade de afeição que cultivamos, de que nos nutrimentos espiritualmente, nosso espírito ou é vivificado ou definha e morre espiritualmente. E tanto os anjos como os maus espíritos se associam a nós conforme as nossas afeições, pois dependem dela como bases naturais, uma vez que o gênero humano no mundo natural é o sustentáculo do gênero humano no mundo espiritual.

Mas não vamos entrar mais nessas considerações por ora, porque há muito mais coisas a serem ditas do que podemos abordar no momento. As ideias que brotam dos ensinamentos da Palavra Divina, quando é vista no seu sentido interno, são essa multiplicação de verdades em abundância tão grande, que nossa mente natural não poderia abarcar, assim como a terra não poderia conter a multiplicação das sementes.E esse assunto, a nutrição espiritual, envolve tantas ideias e trazem tantos ensinamentos que poderíamos nos estender por muito tempo sobre isso sem nunca esgotarmosos pontos mais gerais. Portanto, basta que saibamos que durante todo o processo de regeneração do homem, o Senhor provê afeições celestes, o alimento adequado para sustento e renovação da vida espiritual. Porque também o corpo espiritual precisa do nutrimento saudável que é provido pelo Senhor, em substituição ao alimento contaminado e pecaminoso de que o homem natural se nutria antes e que o fazia adoecer e definhar. Em resumo, basta-nos saber que é esse alimento da alma humana que está descrito nessa parte final do capítulo.

“E viu Deus tudo o que fez, e eis, muito bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia sexto”.

“Aqui se diz “muito bom” e nos versículos anteriores somente “bom”, porque agora as coisas que são da fé fazem um com as coisas que são do amor”. Assim é feito o casamento entre as coisas espirituais e as celestes.São chamadas espirituais todas as coisas que são das cognições da fé, e celestes todas as que são do amor ao Senhor e para com o próximo; estas pertencem à vontade e aquelas ao entendimento do homem.

Durante todo esse tempo da regeneração o homem enfrentou percalços, barreiras e dificuldades. Parecia ao homem que ele combatia sozinho, quando lutava contra suas tendências naturais, contra a supremacia do egoísmo, a preponderância do orgulho, o desprezo pelos que não eram semelhantes a ele, a inveja e toda sorte de malicia do coração humano. Mas o homem não estava só nesse labor de transformação de sua vida, porque o Senhor combatia continuamente por ele, contra os males e falsos, e pelos combates confirmava o homem cada vez mais na verdade e no bem. Na verdade, o homem combatia só em aparência como se fosse por ele mesmo, mas sabia que era o Senhor que, de fato, estava combatendo por ele.

Nesse tempo de regeneração, que é um trabalho espiritual do Senhor no indivíduo, o Senhor operou em todas as circunstâncias, a cada segundo, sem parar, a favor do homem, e “por isso o regenerado é chamado, nos Profetas, “obra dos dedos de Deus”; “Ele não descansa antes de o amor tornar-se o principal; então cessa o combate.”

 

“E viu DEUS tudo o que fez, e eis, muito bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia sexto.”

“Quando a obra chega ao ponto de a fé ser conjunta ao amor, então se chama “muito bom”, porque então o Senhor o conduz como “semelhança” Sua. No fim do sexto dia cessa a obra da nova criação do homem espiritual. Cessa nele o combate entre o bem e o mal.

Depois dos seis dias de labor, é dito que o Senhor descansa, porque Ele não necessita mais combater pelo homem que se tornou regenerado até esse grau. É quando o homem se torna celeste e é chamado “sábado”,ou sétimo dia.

 

O objetivo de nosso estudo foi o ver como os Arcanos Celestes nos explicam o primeiro capítulo do livro de Gênesis no sentido espiritual, e o primeiro capítulo termina no sexto dia. O sétimo dia é mencionado no segundo capítulo, que trata, no sentido interno, do homem celeste. É assunto para outro estudo.

 

Concluindo, então, nossa série, queremos citar o que dizem os Arcanos Celestes (13), sobre o sexto dia: “Dos que estão sendo regenerados, nem todos chegam a este estado, mas alguns, e hoje a maioria, chegam somente ao primeiro; alguns apenas ao segundo; alguns ao terceiro, quarto, quinto; raramente ao sexto e quase ninguém ao sétimo.”

 

Arcanos Celestes, 49-66:

 

49.      Vers. 26: “E disse Deus: Façamos o homem à Nossa imagem, segundo a Nossa semelhança. E dominarão sobre os peixes do mar, e sobre a ave dos céus, e sobre a besta, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que rasteja sobre a terra”. Na Igreja Antiquíssima, com cujos membros o Senhor falava face a face, Ele lhes aparecia como Homem. Muitas coisas podem ser referidas sobre isto, mas ainda não é o momento. Daí, a ninguém chamavam “homem” exceto a Ele e às coisas que a Ele pertencessem. Nem a si próprios chamavam “homem”, mas somente às coisas que percebiam ter tido pelo Senhor, como todo bem do amor e todo vero da fé, coisas estas que diziam ser “do homem” por serem do Senhor. [2] Daí é que, nos Profetas, pelo “Homem“ e pelo “Filho do Homem” se entende, no sentido supremo, o Senhor, e no sentido interno a sabedoria e a inteligência, e daí todo aquele que é regenerado, como em Jeremias:

“Vi a terra, e eis, vácua e vazia; e os céus, e, eis, não havia a sua luz... vi, e eis, nenhum homem; e todas as aves dos céus fugiram” (4:23, 25).

Em Isaías, onde pelo “homem”, no sentido interno, se entende o regenerado, e, no sentido supremo, o Senhor mesmo, como Um só:

“Assim disse Jehovah, o Santo de Israel e Formador seu: Eu fiz a terra, e o homem sobre ela Eu criei; Minhas mãos estenderam os céus, e todo o exército deles comandei” (45:11, 12).

[3]       Por isso um Homem era visto pelos profetas, como Ezequiel:

“... Acima da expansão como que em aparência de pedra safira, [havia] uma semelhança de trono, e acima da semelhança de trono, uma semelhança como a aparência de homem, acima, no alto” (1:26).

E ao ser visto por Daniel foi chamado “Filho do Homem” ou “Homem”, o que é o mesmo:

“Vi, e eis, com as nuvens do céu, como um Filho do Homem que vinha, e chegou até o Ancião de dias; e fizeram‑No aproximar‑Se até Ele, e foi‑Lhe dado o domínio, e a glória, e o reino. E todos os povos, e nações e línguas O servirão. O Seu domínio [será] um domínio eterno, que não passará, e o Seu reino, [um reino] que não perecerá” (Dan. 7:13, 14).

[4] O Senhor também muitas vezes Se chama “Filho do Homem” ou “Homem”; e, como em Daniel, predisse Seu advento em glória:

“Verão o Filho do Homem vindo nas nuvens do céu com poder e glória” (Mt. 24:30);

as “nuvens do céu” são o sentido literal da Palavra; “poder e glória”, o sentido interno da Palavra, o qual se refere unicamente ao Senhor e ao Seu reino, em todas e cada uma das coisas, sentido do qual vêm poder e glória.

50.      As coisas que as pessoas da Igreja Antiquíssima entenderam por “imagem de Deus“ são tantas que não podem ser descritas. O homem ignora inteiramente que ele é dirigido pelo Senhor por meio de anjos e espíritos, e que, com todo homem, há pelo menos dois espíritos e dois anjos. Pelos espíritos, faz‑se a comunicação do homem com o mundo dos espíritos, e, pelos anjos, com o céu. Sem a comunicação do homem com o mundo dos espíritos pelos espíritos e com o céu pelos anjos, ele não poderia de maneira alguma viver. A sua vida depende inteiramente desta conjunção; pereceria num instante se os espíritos e anjos se retirassem. [2] Enquanto não é regenerado, o homem é dirigido de modo diferente do que quando é regenerado. Quando não é regenerado, há nele espíritos maus que dominam sobre ele de tal modo que os anjos, ainda que presentes, quase nada podem fazer senão apenas conduzi‑lo, para que não se precipite num mal extremo, e dirigi‑lo para algum bem; e isto eles fazem mesmo pelas próprias cobiças dele, para dirigi‑lo ao bem, e pelos enganos dos sentidos, para dirigi‑lo ao vero. Então ele tem comunicação com o mundo dos espíritos pelos espíritos que nele estão, mas não tanto com o céu, porque os espíritos maus dominam e os anjos somente o desviam. [3] Quando, porém, é regenerado, os anjos então dominam e lhe inspiram todas as coisas boas e verdadeiras, bem como o horror e temor pelos males e falsidades. É verdade que os anjos conduzem, mas somente administram, pois só o Senhor é Quem dirige o homem por meio dos anjos e espíritos. E, visto que isto se faz pelo ministério dos anjos, aqui se diz primeiro no plural: “façamos o homem à Nossa imagem”. Mas porque é sempre o Senhor quem dirige e ordena, no versículo subsequente se diz no singular: “criou‑o Deus à Sua imagem”. É o que o Senhor diz claramente também em Isaías:

“Assim disse Jehovah, Redentor teu e Formador teu desde o útero: Eu, Jehovah, faço todas as coisas, estendo os céus só, expando a terra por Mim mesmo” (44:24).

Os próprios anjos confessam que nenhum poder há neles, mas que agem só pelo Senhor.

51.      No que se refere à “imagem“, ela não é semelhança, mas “segundo a semelhança”, pelo que é dito: “façamos o homem à Nossa imagem, segundo a Nossa semelhança”. O homem espiritual é “imagem”, mas o homem celeste é “semelhança“ ou efígie. Neste capítulo se trata do homem espiritual e no seguinte do celeste. O homem espiritual, que é a imagem, é chamado pelo Senhor de “filho da luz”, como em João:

“Quem anda nas trevas não sabe para onde vai; enquanto tendes luz, crede na luz, para que filhos da luz sejais” (12:35, 36).

Também é chamado “amigo”:

“Vós sois Meus amigos se fizerdes tudo o que Eu vos mando” (Jo. 15:14, 15).

Mas o homem celeste, que é a “semelhança”, é chamado “filho de Deus” em João (1:12, 13):

“A todos os que receberam, deu‑lhes o poder de se tornarem filhos de Deus, aos que creem em Seu nome, que nasceram não dos sangues [sanguinibus], nem da vontade da carne, nem da vontade do varão, mas de Deus”.

52.      Enquanto o homem é espiritual, o seu domínio procede do homem externo para o interno, assim como se diz aqui: “dominarão sobre os peixes do mar, e sobre a ave dos céus, e sobre a besta, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que rasteja sobre a terra”. Quando, porém, se torna celeste e age pelo bem do amor, então o domínio procede do homem interno para o externo, como o Senhor descreve a Si mesmo e assim, ao mesmo tempo, descreve o homem celeste que é a Sua semelhança, em David:

“Fizeste‑O dominar sobre as obras de Tuas mãos, todas as coisas puseste sob os Seus pés, o rebanho e toda a manada, e também as bestas dos campos, e a ave dos céus, e os peixes do mar, o que passa pelas veredas dos mares” (Sal. 8:6‑8).

Por isso, aqui se diz, primeiro, “bestas”, em seguida “aves”, depois “peixes do mar”, porque o homem celeste procede do amor que é da vontade. É diferente, porém, com o homem espiritual, em quem precedem os “peixes” e as “aves”, que pertencem ao entendimento que é da fé, e em seguida vêm as “bestas”.

53.      Vers. 27: “E criou Deus o homem à Sua imagem, à imagem de Deus o criou”. Aqui se diz duas vezes “imagem”; isto é porque a fé, que é do entendimento, é chamada “Sua imagem”, porém o amor, que é da vontade, é chamado “imagem de Deus”, que no homem espiritual vem depois, mas no homem celeste vem antes.

54.      “Macho e fêmea os criou”. O que se entende por “macho e fêmea” no sentido interno foi coisa bem conhecida pela Igreja Antiquíssima. Todavia, foi o contrário com os seus descendentes, quando pereceu o sentido interior da Palavra e também este arcano. Os casamentos eram as suas maiores felicidades e delícias, e comparavam aos casamentos todas as coisas que a eles podiam ser comparadas, para daí perceberem a felicidade do casamento. E, como eram homens internos, deleitavam‑se somente nos internos; viam as coisas externas somente com os olhos, mas pensavam sobre as coisas que elas representavam, a fim de que as coisas externas nada fossem, mas apenas algo pelo qual pudessem refletir sobre as internas, das internas sobre as celestes e, assim, sobre o Senhor, que era tudo para eles, e, por consequência, sobre o casamento celeste, do qual percebiam vir a felicidade dos seus casamentos. Por isso chamavam “macho” o entendimento no homem espiritual, e “fêmea” a vontade; e quando estas duas faculdades agiam como uma diziam haver o casamento. Dessa Igreja veio a forma que se tornou habitual de chamar a Igreja mesma, por causa da afeição do bem, de “filha” e “virgem”, como “virgem de Sião”, “virgem de Jerusalém” e também “esposa”. Mas, sobre este assunto, vide o capítulo seguinte, versículo 23, e o capítulo 3, versículo 15.

55.      Vers. 28: “E os abençoou Deus, e disse‑lhes Deus: Frutificai e multiplicai‑vos, e enchei a terra, e subjugai‑a. E dominai sobre os peixes no mar, e sobre a ave dos céus, e sobre todo [ser] vivo que rasteja sobre a terra”. Como os antiquíssimos chamavam a conjunção do entendimento e da vontade, ou da fé e do amor, “casamento”, tudo o que este casamento produzia de bem eles chamavam “frutificações”, e tudo o que produzia de vero, “multiplicações”. Daí, ocorre de modo semelhante nos Profetas, como em Ezequiel:

“Multiplicarei sobre vós o homem e a besta, e eles se multiplicarão e frutificarão, e vos farei habitar conforme as antiguidades vossas, e vos farei mais bem do que em vossos princípios, e conhecereis que Eu [sou] Jehovah; e farei andar sobre vós o homem, povo Meu, Israel” (36:8‑11);

por “homem” entende‑se aqui o homem espiritual, que é também chamado “Israel”; pelas “antiguidades” entende‑se a Igreja Antiquíssima; pelos “princípios”, a Igreja Antiga de após o dilúvio; o fato de vir antes a “multiplicação”, que é do vero, e depois seguir a “frutificação”, que é do bem, é porque se trata daquele que deve ser regenerado, não do que já foi regenerado. [2] Quando o entendimento é unido à vontade, ou a fé ao amor, o homem é chamado pelo Senhor de “terra casada”, como em Isaías:

“Não se dirá mais à tua terra: Devastada; mas tu serás chamado: Meu beneplácito nela, e a tua terra: Casada, porque Jehovah se agradará de ti, e tua terra será casada” (62:4).

Por conseguinte, os frutos que pertencem ao vero são chamados “filhos”, e os frutos que pertencem ao bem são chamados “filhas”, e isto muito freqüentemente na Palavra. [3]     A terra está “cheia” quando há muitos veros e bens. Com efeito, quando o Senhor abençoa e diz, isto é, quando Ele opera, o bem e o vero crescem imensamente, como Ele diz:

“O reino dos céus é semelhante ao grão de mostarda que o homem, tendo tomado, semeou em seu campo; ele é, na verdade, a menor de todas as sementes, mas quando cresce é a maior de todas as hortaliças e se torna árvore, de sorte que vêm as aves do céu e se aninham em seus ramos” (Mt. 13:31, 32).

O “grão de mostarda” é o bem do homem antes de ser espiritual, que é “a menor de todas as sementes” porque o homem pensa que faz o bem por si mesmo. O que ele faz por si mesmo nada é senão o mal; mas, como está em estado de regeneração, há algum bem, mas é o menor de todos. Quando, enfim, a fé se conjunge ao amor, torna‑se maior, e “hortaliça”. Finalmente, quando é conjunta, torna‑se “árvore” e, então, “as aves dos céus”, que, aqui também, são os veros ou as coisas do entendimento, “aninham‑se” em “seus ramos”, que são os conhecimentos. Quando o homem é espiritual, do mesmo modo que quando se torna espiritual, ele está em combate, e por isso se diz “subjugai a terra”, e “dominai”.

56.      Vers. 29: “E disse Deus: Eis, dou‑vos toda erva dando semente, que está sobre as faces de toda a terra, e toda árvore na qual [há] fruto; a árvore que produz semente vos será para comida”. O homem celeste se deleita unicamente com as coisas celestes que, como convêm à sua vida, são chamadas “comidas celestes”. O homem espiritual se deleita com as coisas espirituais que, como convêm à sua vida, são chamadas “comidas espirituais”. O homem natural, semelhantemente, se deleita com as coisas naturais que, como são de sua vida, são chamadas “comidas” e são, em primeiro lugar, os conhecimentos. Aqui, como se trata do homem espiritual, suas comidas espirituais são descritas por representativos: as espirituais pela “erva dando semente” e pela “árvore na qual [há] fruto”, que, em geral, se chama “árvore que produz semente”. As suas comidas naturais são descritas no versículo seguinte.

57.      A “erva dando semente” é todo vero que se refere a um uso. A “árvore na qual [há] fruto” é o bem da fé. O “fruto” é o que o Senhor dá ao homem celeste, mas a “semente”, da qual vem o fruto, é o que Ele dá ao homem espiritual. Por isso se diz: “a árvore que produz semente vos será para comida”. Que a comida celeste se chame “fruto da árvore” vê-se pelo capítulo seguinte, onde se trata do homem celeste. Aqui se relatará somente o que o Senhor falou por meio de Ezequiel:

“Junto ao rio eleva‑se, sobre a sua margem, aquém e além, toda árvore de comida; a sua folha não cairá e não será consumido o seu fruto; em seus meses renasce, porque as suas águas saem do santuário; e seu fruto será para comida, e sua folha para remédio” (47:12).

As “águas que saem do santuário” significam a vida e a misericórdia do Senhor, que é o “Santuário”; o “fruto”, a sabedoria, que lhes serve de comida; a “folha” é a inteligência, que para eles existe por causa do uso e é chamada “remédio”. Que, porém, a comida espiritual seja chamada “erva”, é dito por David:

“... Meu Pastor, nada me faltará; em pastos de erva [Tu] me fazes deitar” (Sal. 23:1, 2).

58.      Vers. 30: “E a toda fera da terra, e a toda ave dos céus, e a tudo o que rasteja sobre a terra, em que [há] alma vivente, [dou] todo verde da erva, para alimento. E, assim, foi feito”. Aqui é descrita a comida natural deste mesmo homem. O seu natural é aqui significado pela “fera da terra” e pela “ave dos céus” aos quais foram dados a hortaliça e o verde da erva para alimento. De uma e de outra comida, tanto da natural como da espiritual, assim se diz em David:

“Jehovah faz germinar a grama para a besta e a erva para o serviço do homem, para fazer sair pão da terra” (Sal. 104: 14),

onde a “besta” está em lugar da fera da terra e da ave dos céus ao mesmo tempo, sendo ambas nomeadas ali nos vers. 11 e 12.

59.      Que somente o verde da erva e a hortaliça sejam aqui o alimento do homem natural, o caso é este: quando o homem está sendo regenerado e se torna espiritual, está continuamente em combate; por isso a Igreja do Senhor é chamada “combatente”. Pois antes as cobiças dominavam, porque o homem todo se compõe de meras cobiças e das falsidades daí provenientes. Quando está sendo regenerado, suas cobiças e falsidades não podem ser abolidas num só instante, pois isto seria destruir todo o homem, porquanto não adquiriu outra vida para si. Por isso é que os espíritos maus permanecem muito tempo com ele, para que excitem suas cobiças e, assim, elas sejam dissipadas por meios inumeráveis e, mesmo, para que possam ser conduzidas pelo Senhor para o bem e, assim, o homem possa ser reformado. No tempo do combate, os maus espíritos, que têm o maior ódio por tudo o que é bom e verdadeiro, isto é, tudo o que pertence ao amor e à fé no Senhor, que são unicamente os bens e veros porque estes têm em si a vida eterna, nenhum outro alimento deixam ao homem senão o que é comparado à hortaliça e ao verde da erva. Mas o Senhor lhe dá também a comida que é comparada à erva dando semente e à árvore na qual há fruto, as quais pertencem à tranquilidade e à paz com suas alegrias e felicidades, e isto por intervalos. [2] Se o Senhor não protegesse o homem a todo momento, mesmo o menor de todos, ele pereceria imediatamente, pois reina no mundo dos espíritos um ódio tão destruidor contra as coisas que são do amor e da fé no Senhor, que é impossível descrevê‑lo. Posso asseverar com certeza que a coisa é assim, porque já há alguns anos tenho estado na outra vida com os espíritos, ainda que estivesse também no corpo, e fui cercado pelos maus, até pelos piores, e, algumas vezes, por milhares, aos quais foi permitido derramar os seus venenos e me infestar de todos os modos que pudessem. Contudo, não puderam fazer mal a um fio de cabelo sequer, tão protegido que fui pelo Senhor. Por tantos anos de experiência, fui instruído muito bem sobre o mundo dos espíritos, sua natureza e, também, sobre os combates que aqueles que estão sendo regenerados não podem deixar de suster para que alcancem a felicidade da vida eterna. Mas, como ninguém pode ser instruído por essa descrição geral de modo que tenha uma fé isenta de dúvida, os particulares sobre esses assuntos serão relatados na sequência, pela Divina misericórdia do Senhor.

60.      Vers. 31: “E viu Deus tudo o que fez, e eis, muito bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia sexto”. Aqui se diz “muito bom” e nos versículos anteriores somente “bom”, porque agora as coisas que são da fé fazem um com as coisas que são do amor. Assim é feito o casamento entre as coisas espirituais e as celestes.

61.      São chamadas espirituais todas as coisas que são das cognições da fé, e celestes todas as que são do amor ao Senhor e para com o próximo; estas pertencem à vontade e aquelas ao entendimento do homem.

62.      Os tempos e os estados da regeneração do homem, em geral e em particular, se dividem em seis e se chamam os dias de sua criação, pois, gradualmente, de não‑homem que era, ele se torna a princípio alguma coisa, mas pouca; depois, mais, até o sexto dia, em que se torna “imagem”.

63.      Durante esse tempo o Senhor combate continuamente por ele contra os males e falsos, e pelos combates o confirma no vero e no bem. O tempo do combate é o tempo da operação do Senhor; por isso o regenerado é chamado, nos Profetas, “obra dos dedos de Deus”; Ele não descansa antes de o amor tornar‑se o principal; então cessa o combate. Quando a obra chega a ponto de a fé ser conjunta ao amor, é chamada “muito boa”, porque, então, o Senhor o conduz como “semelhança” Sua. No fim do sexto dia, os maus espíritos se afastam e são substituídos pelos bons, e o homem é introduzido no Céu ou Paraíso celeste, do qual se tratará no capítulo seguinte.

64.      Eis aqui, então, o sentido interno da Palavra, a sua vida mesma, que não se manifesta jamais pelo sentido da letra. Mas os arcanos são em tão grande número que volumes não bastariam para explicá‑los. Aqui foram ditas somente umas pouquíssimas coisas, tais que possam confirmar que se trata da regeneração e esta procede do homem externo para o interno. Assim os anjos percebem a Palavra. Eles nada absolutamente sabem o que é da letra, nem mesmo um único vocábulo que tenha significado mais próximo, ainda menos os nomes das terras, das cidades, dos rios, das pessoas, que ocorrem tantas vezes nos livros históricos e proféticos. Têm somente a ideia das coisas significadas pelos vocábulos e pelos nomes; por “Adam” no Paraíso percebem a Igreja Antiquíssima, não, porém a Igreja, mas a fé da Igreja Antiquíssima no Senhor; por “Noach” [Noé], a Igreja remanescente com os descendentes até os tempos de Abraham; por “Abraham”, não aquele que viveu, mas a fé salvífica que ele representou; e, assim, por diante. Desse modo, eles percebem as coisas espirituais e celestes inteiramente separadas dos vocábulos e dos nomes.

65.      Quando eu lia a Palavra, alguns espíritos foram elevados à primeira entrada do Céu e dali falaram comigo. Diziam que não entendiam a mínima coisa de uma palavra ou de uma letra ali, mas somente as coisas que elas significavam no sentido interior mais próximo, as quais eles diziam ser tão belas, estar numa sequência tão organizada e os tocar tanto que as chamavam “glória”.

66.      Quanto ao gênero, há quatro estilos na Palavra: o primeiro, o que foi da Igreja Antiquíssima. O modo de eles se expressarem era tal que, quando nomeavam coisas terrestres e mundanas, pensavam sobre as coisas espirituais e celestes que elas representavam. Por isso, não só se exprimiam por meio de representativos, mas também os compunham em uma espécie de série histórica, por assim dizer, para lhes dar mais vida, o que lhes era muito deleitável. É esse estilo que foi entendido quando Ana profetizou, dizendo:

“Falai o que é alto, alto; saia o que é antigo de vossa boca” (I Sam. 2:3).

Esses representativos se chamam, em David, “enigmas da antiguidade” (Sal. 78:2‑4). É dos descendentes da Igreja Antiquíssima que Moisés obteve os relatos da Criação, desde o Jardim do Éden até os tempos de Abraham. [2] O segundo estilo é o histórico, que está nos livros de Moisés — desde os tempos de Abraham e depois — e em Josué, Juízes, Samuel e Reis, nos quais os relatos históricos são absolutamente tais como estabelecidos no sentido da letra, não obstante todas e cada uma das coisas conterem coisas inteiramente diferentes no sentido interno, do que se tratará em sua ordem na sequência, pela Divina misericórdia do Senhor. [3] O terceiro estilo é o profético, que nasceu do estilo da Igreja Antiquíssima, o qual eles muito veneravam. Mas esse não é contínuo nem está em aparência histórica como o dos antiquíssimos, mas é disperso, quase nunca inteligível exceto no sentido interno, onde profundos arcanos se acham dispostos seguindo uma ordem conexa e se referem ao homem externo e interno, aos vários estados da Igreja, ao Céu mesmo e, nos íntimos, ao Senhor. [4] O quarto estilo é o dos Salmos de David, que é intermediário ao profético e à linguagem comum. Ali, sob a pessoa de David como rei, trata‑se, no sentido interno, do Senhor.


O primeiro capítulo de Gênesis, no sentido espiritual

1º dia
Criação da luz;separação entre a luz e as trevas, dia e noite
A verdade da fé brilha e mostra a distinção entre as coisas do homem e as de Deus
2º dia
Criação da expansão ou o céu;separação entre as águas acima e abaixo
Noção de que existe um homem interno;

distingue entre as coisas do Senhor e as suas
3º dia
Ajuntamento das águas,aparece o seco; terra e mares;a terra faz germinar a erva, a erva de semente e a árvore dando fruto
O homem começa a falar a partir das verdades da fé e faz algum bem, mas pensa que fala e age por si mesmo
4º dia
Luminares na expansão; o grande para dominar no dia e o menor, na noite, parem darem luz sobre a terra
A caridade e a fé são implantadas no homem interno
5º dia
As águas fazem produzir o réptil, a alma vivente; a ave voe sobre a terra e sobre as faces da expansão;as baleias grandes e todo réptil
Fala pela fé e se confirma no bem;
6º dia
A terra produz alma vivente, a besta e o movente;a fera, a bestao homem, macho e fêmea, para dominar sobre a terra;
Fala e age pelo bem
Sabbath
O Senhor descansa
As lutas da regeneração do homem cessam, e o Senhor não precisa mais combater por ele.

 
 

 

O Primeiro Dia

 
No princípio
Princípio = o primeiro tempo , antes de o homem ser regenerado ou nascer de novo. A regeneração mesma é chamada nova criação do homem.
criou Deus o céu
Deus forma o homem interno ou mente interna. (Ou, a pessoa passa a ter noção de que tem um homem interno)
e a terra
E o homem externo ou mente externa (Ou, ela passa a distinguir entre sua mente externa e interna)
E a terra era vácua e vazia,
O homem externo, antes da regeneração= desprovido de bem (terra vácua) e verdade (terra vazia) reais.
e [havia] escuridão
a demência e a ignorância a respeito de todas as coisas que são da fé no SENHOR e da vida espiritual e celeste.
sobre as faces do abismo
as cobiças do homem e as falsidades oriundas delas, nas quais o homem está inteiramente imers; um abismo ou caos; visto do céu, é uma massa negra, confusa, que nada tem de vital.
e o Espírito de Deus
A misericórdia de Deus
Se movia
no original, “chocava”, como a galinha faz com os ovos, ou vivificava
sobre as faces das águas
as coisas boas e verdadeiras  implantadas na mente desde a infância, chamadas “relíquias”
E disse Deus: Haja luz; e foi feita a luz.
O primeiro estado da regeneração começa: quando o homem se concientiza de que o bem e a verdade são coisas superiores a ele.  E começa a saber que “o Senhor é”, o Senhor é o bem e a verdade, ao passo que o homem nada é, em si.

 
E viu Deus a luz, que [era] boa;
A luz é boa porque vem do Senhor; é a verdade oriunda do bem. (É dito que “Deus vê”, mas isto é uma aparência, pois Deus sempre viu e vê tudo. De fato, é o homem que começa a ver (entender) a verdade pela primeira vez.

 
e separou Deus entre a luz e entre as trevas.
Em humilde reconhecimento, o homem percebe a grande distinção que há entre as coisas de Deus (luz) e as suas próprias (trevas)
E chamou Deus à luz, dia; e às trevas chamou noite.
Todas as coisas do Senhor são chamadas dia, porque são da luz, e todas as do homem, noite, porque são da escuridão. Esse reconhecimento vem da humilhação do homem perante o Divino.
E houve tarde, e houve manhã;
“Tarde” é todo estado precedente, porque é de sombra ou de falsidade e ausência da fé. “Manhã” é todo estado seguinte ou de verdade e das cognições da fé. A “tarde” significa em geral todas as coisas que são próprias do homem; mas a “manhã” significa todas as que são do SENHOR,

 
o dia primeiro
completa-se o primeiro estado da criação espiritual ou novo nascimento do homem
 

 

O Segundo Dia
E disse Deus: Haja uma expansão
O homem interno é chamado “expansão”
no meio das águas e haja separação entre as águas para as águas
Ordem para que se faça distinção entre os conhecimentos do homem externo e as cognições do homem interno
E fez Deus a expansão,
O homem interno é aberto
e separou entre as águas que estavam debaixo da expansão
os conhecimentos do homem externo são vistos como distintos
e entre as águas que estavam acima da expansão;
das cognições do homem interno

“acima da expansão” = acima do homem interno, oriundas da Palavra
E assim se fez. E chamou Deus à expansão céu
O homem interno reconhecido
E houve tarde, e houve manhã,
A progressão da sombra da ignorância ou falsidade para a claridade da instrução na verdade
o dia segundo
O segundo estado da regeneração
 



 

O Terceiro Dia
E disse DEUS: Faça germinar a terra a erva tenra,
Quando a terra – ou o homem –– foi assim preparada para que pudesse receber do SENHOR as sementes celestes e produzir alguma coisa do bem e do vero, então o SENHOR faz primeiro germinar alguma coisa tenra que é chamada “erva tenra”
a erva dando semente,
”; depois, alguma coisa mais útil que se semeia de novo e é chamada “erva dando semente”;
a árvore de fruto dando fruto, segundo a sua espécie,
enfim, algum bem que frutifica e é chamado “árvore dando fruto no qual [está] a sua semente”, cada um “segundo a sua espécie”
no qual [esteja] a sua semente, sobre a terra. E assim se fez E produziu a terra a erva tenra, a erva dando semente, segundo a sua espécie, e a árvore dando fruto, no qual [estava] a sua semente, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom.”
A princípio, o homem que está sendo regenerado é tal que pensa que o bem que faz vem de si mesmo, e o vero que diz vem de si mesmo, quando todavia a coisa se passa assim: todo bem e todo vero vêm do SENHOR. Por isso, quem pensa que essas coisas vêm de si mesmo não tem ainda a vida da verdadeira fé, que pode todavia receber depois. Com efeito, ainda não pode crer que o bem e o vero vêm do SENHOR, porque está no estado de preparação para receber a vida da fé. Este estado é representado aqui pelas coisas inanimadas, e o estado da vida da fé é representado depois pelas coisas animadas.
 


 

O Quarto Dia
E disse DEUS: Haja luminares na expansão dos céus, para separação entre o dia e entre a noite.

 
O amor e a fé são chamados, a princípio, os “luminares grandes”; depois, o amor o “luminar grande” e a fé o “luminar menor”;
E serão para sinais, e para tempos determinados, e para dias e anos. E serão por luminares na expansão dos céus, para darem luz sobre a terra. E assim se fez. E fez DEUS dois luminares grandes: o luminar grande para dominar no dia, e o luminar menor para dominar na noite, e as estrelas.

E pô-los DEUS na expansão dos céus para darem luz sobre a terra”.

 
É dito que os luminares “serão para sinais e para tempos determinados, e para dias e para anos”. Estas palavras contêm mais arcanos do que podem ser ditos no momento, ainda que nenhum apareça no sentido da letra. Por ora, basta dizer que, em relação às coisas espirituais e celestes, há, no universal e nos singulares, sucessões que são comparadas às sucessões nos dias e anos. As sucessões nos dias são: da manhã ao meio‑dia, daí à tarde e, pela noite, à manhã. As dos anos são semelhantes: da primavera ao verão, daí ao outono e, pelo inverno, à primavera. São as alternações de calor e luz, e também as das frutificações da terra. Com essas alternações se comparam as das coisas espirituais e celestes. A vida sem tais alternações e diversidades seria uniforme e, por conseguinte, nula. E não seria possível discernir, distinguir e ainda menos perceber o bem e o vero. Essas alternações são chamadas “estatutos” na Palavra
“E para dominar no dia, e na noite, e para separar entre a luz e entre as trevas; e viu DEUS que era bom”.

 
Pelo “dia” se entende o bem, pela “noite” o mal; por isso os bens são chamados obras do dia, e os males obras da noite. Pela “luz” se entende o vero e pelas “trevas” o falso.
 


 

 

O Quinto dia

“E disse DEUS: Façam as águas produzir abundantemente o réptil, a alma vivente. E a ave voe sobre a terra, sobre as faces da expansão dos céus”.
Pelos “répteis” que as águas produzem são significados os conhecimentos que pertencem ao homem externo. Pelas “aves” em geral, as coisas racionais e também as intelectuais, estas últimas pertencendo ao homem interno.
“E criou DEUS as baleias grandes e toda alma vivente que rasteja, que as águas fizeram rastejar, segundo a sua espécie; e toda ave de asas, segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom”.
Como foi dito, os “peixes” significam os conhecimentos, agora animados pela fé que vem do SENHOR e, assim, vivos. As “baleias” significam as coisas gerais dos conhecimentos, sob os quais e pelos quais existem os particulares. Nada há no universo que não esteja sob algum geral a fim de que exista e subsista. Os cetáceos ou baleias são algumas vezes nomeados nos Profetas e ali significam as coisas gerais dos conhecimentos.
E os abençoou DEUS, dizendo: Frutificai e multiplicai vos, e enchei as águas nos mares; e a ave será multiplicada na terra”.
Tudo o que tem em si a vida procedente do SENHOR frutifica e se multiplica imensamente, não tanto durante o tempo em que o homem vive no corpo, mas de um modo admirável na outra vida. “Frutificar”, na Palavra, se diz das coisas que são do amor, e “multiplicar” das que são da fé. O fruto, que é do amor, tem a semente pela qual se multiplica tanto. A bênção do SENHOR também significa, na Palavra, frutificação e multiplicação, porque estas procedem dela.
 


 

 

O Sexto dia

 

“E disse DEUS: Produza a terra alma vivente segundo a sua espécie; a besta e o que se move, e a fera desta terra segundo a sua espécie.

 
O homem, como a “terra”, nada pode produzir de bem se antes não forem semeadas nele as cognições da fé pelas quais saiba o que deve crer e fazer.
E, assim, foi feito. E fez DEUS a fera da terra segundo a sua espécie, e a besta segundo a sua espécie, e tudo o que rasteja no humo segundo a sua espécie. E viu DEUS que [era] bom”.
Como se mostrou, as coisas que pertencem ao entendimento foram significadas pelos “répteis, que as águas fizeram rastejar, e pela ave sobre a terra e sobre as faces da expansão”. As que pertencem à vontade são significadas aqui pela “alma vivente que a terra produz”, pela “besta e o que rasteja” e, depois, pela “fera desta terra”.

As “bestas” significam as afeições no homem — as más nos maus e as boas nos bons  — o que se pode ver por muitas passagens na Palavra
“E disse DEUS: Façamos o homem à Nossa imagem, segundo à Nossa semelhança. E dominarão sobre os peixes do mar, e sobre a ave dos céus, e sobre a besta, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que rasteja sobre a terra”.
Aqui se diz duas vezes “imagem”; isto é porque a fé, que é do entendimento, é chamada “Sua imagem”, porém o amor, que é  da vontade, é chamado “imagem de DEUS”, que no homem espiritual vem depois mas no homem celeste vem antes.

 
E criou Deus o homem à Sua imagem, à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou.

E os abençoou Deus; e disse lhes Deus: Frutificai e multipli-cai vos, e enchei a terra, e subjugai a. E dominai sobre os peixes do mar e sobre a ave dos céus, e sobre todo [ser] vivo que rasteja sobre a terra.

E disse Deus: Eis, dou vos toda erva dando semente, que [há] sobre as faces de toda a terra, e toda árvore em que [há] fruto. A árvore que produz semente vos será para comida.

E a toda fera da terra, e a toda ave dos céus, e a tudo o que rasteja sobre a terra, em que [há] alma vivente, [dou] todo verde da erva, para alimento. E assim se fez

E viu Deus tudo o que fez, e eis, [era] muito bom. E houve tarde, e houve manhã, o dia sexto.
O sexto estado existe quando, pela fé e daí pelo amor, ele fala os veros e faz os bens. As coisas que então produz são chamadas “alma vivente e besta”. E como então começa a agir ao mesmo tempo pela fé e pelo amor, torna se homem espiritual, que é chamado “imagem”. Sua vida espiritual se deleita e se sustenta com as coisas que são das cognições da fé e as que são das obras de caridade, que se chamam “sua comida”. E sua vida natural se deleita e se sustenta com as coisas que são do corpo e dos sentidos, das quais vem o combate, até que o amor reina e o homem se torna celeste.
 

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O Sétimo Dia
 

C. R. Nobre

 

Concluímos, na semana passada,o estudo sobre os seis da criaçãono primeiro capítulo de Gênesis, de acordo com a explicação da obraArcanos Celestes, de Swedenborg.

Está claro que o relato de Gênesis não pode ser compreendido ao pé da letra, porque assim teríamos vários paradoxos. O fato é que a Bíblia consiste tanto de história real quanto de parábolas, compostas por tipos simbólicos a fim de transmitir de modo um inteligível a realidade espiritual, que de outra maneira seria abstrata. Esse estilo, de parábola, e não de história, é como foram escritos os onze primeiros capítulos de Gênesis, incluindo a história da criação, a queda do homem, o dilúvio e a torre de Babel. Cada evento desses descreve, de fato, estados de formação, progressão ou degeneração do homem quanto ao seu espírito e, por conseguinte, da religiosidade ou igreja de cada época.

No caso da criação, tivemos a oportunidade de ver quecada dia significa uma fase da regeneração, com seus símbolos tomados do universo natural. E essas fases vão se sucedendoem ordem, gradativamente, pois o nascimento espiritual não é instantâneo, nem é operado por Deusindependentemente da pessoa, porqueleva em conta asua liberdade, racionalidade, hereditariedade, suas ações más e boas, em resumo, tudo o que compõe a sua personalidade, que não pode ser violada nem mudada a não ser lentamente. O fim dessa obra Divina éque a pessoa adquira a vida espiritual ao receber a caridade e a fé, e se torne aimagem de Deus,  conforme é descrito no sexto dia.

Continuando o nosso estudo no capítulo 2 do Gênesis, lemos: “E foram acabados os céus e a terra, e todo o exército deles. E acabou Deus no dia sétimo a obra Sua, que fez. E descansou no dia sétimo de toda a obra Sua, que fez. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou, porque nele descansou de toda a obra Sua, que criou Deus fazendo. Estas são as natividades dos céus e da terra, quando os criou, no dia em que Jehovah Deus fez a terra e os céus. E nenhum rebento do campo havia ainda na terra, e nenhuma erva do campo ainda germinava, porque Jehovah Deus não fizera chover sobre a terra, e homem nenhum para cultivar o humo.” (Vers. 1 a 5).

Parece que há uma repetição aqui: criação dos céus, vegetais e o homem, mas a semelhança é porque se trata também de uma formação, mas agora do homem celeste, seu conhecimento, sua vida e sua inteligência. “Ohomem, quando de morto se torna espiritual, de espiritual se torna celeste” ... “O seu conhecimento e o seu racional são descritos pelo ‘rebento e pela erva do humo regado pelo vapor’; ... Sua vida é descrita pela ‘inspiração de uma alma de vidas’...Depois, a sua inteligência é descrita pelo “’jardim em Éden para o oriente’, no qual as ‘árvores desejáveis à vista’ são as percepções do vero, e ‘as árvores boas para comida’ são as percepções do bem. O amor é descrito pela ‘árvore de vidas’ e a fé pela ‘árvore da ciência’...” (AC 73-77)

O homem se torna celeste quando o amor se torna o principal e a fé, o secundário (vide AC 84). “Quando a obra chega a ponto de a fé ser conjunta ao amor, é chamada “muito boa”, porque, então, o Senhor o conduz como “semelhança” Sua. O homem celeste é representado pelo “sábado”, o sétimo dia, no qual se diz que o Senhor descansa, porque não precisa combater pelo homem que triunfou sobre os males. “No fim do sexto dia, os maus espíritos se afastam e são substituídos pelos bons, e o homem é introduzido no Céu ou Paraíso celeste, do qual se tratará no capítulo seguinte”.

Acontece que, no final da nossa última palestra, nós tínhamos lido a seguinte passagem (13) nos Arcanos: “Dos que estão sendo regenerados, nem todos chegam a este estado, mas alguns, e hoje a maioria, chegam somente ao primeiro; alguns apenas ao segundo; alguns ao terceiro, quarto, quinto; raramente ao sexto e quase ninguém ao sétimo.” Quer dizer, em nossa época, quase ninguém se torna homem celeste mais. Se for assim, porque se fala desse homem no segundo capítulo de Gênesis? Quem é ou quem são os que se tornam homem celeste? Aprendemos nos Escritos de Swedenborg que em nossa Terra, num passado remotíssimo, a raça humana tinha características diferentes da de hoje, tinha outra relação com o Criador e podia ser regenerada até o grau celeste, quando se tornavam homens e mulheres celestes.

Essa raça antiquíssima, homens e mulheres,é representada por Adão, ou Homem, e a inteligência daquelas pessoas é simbolizada pelo jardim do Éden e todas as coisas que são mencionadas no jardim: rios, árvores e pedras preciosas. Isto foi na chamada Idade de Ouro,citada por alguns sábios do passado. Então, o capítulo 2 do Gênesis fala da formação espiritual, da vida e da inteligência da raça adâmica. Adão, termo que quer dizer simplesmente, “homem”, no hebraico, é o gênero humano masculino e feminino, pois no capítulo anterior foi dito: “macho e fêmea os criou”.

A raça antiquíssimatinha outro tipo de respiração e podia falar normalmente com os anjos e ser instruído por eles. Não tinham uma revelação escrita, mas oral. Tinham, além disso, a percepção, e podiam ver nos objetos da natureza a representação das coisas do céu. O indivíduonascia natural e corpóreo, mas não era corrompido pelos males. E no processo de sua formação se torna espirituale, finalmente, celeste.

Não sabemos o quanto durou essa era, se milhares ou milhões de anos, mas durante esse tempo o homem estava na inocência e na integridade e era conduzido por Deus em todas as coisas até ser levado aos céus. Todavia, por causa do livre arbítrio, chegou um tempo em que aquelas pessoas começaram a olhar para si mesmas e desejaram ter alguma vida própria, algo que fosse delas e não deDeus. Essa mudança é contada simbolicamente na história da criação da mulher, na ultima parte do capítulo 2. E é óbvio que “mulher”, ali, não é o ser humano feminino, pois ela já existia  e foi criada com o masculino, “macho e fêmea os criou”. A “mulher”, formada da costela do homem, significa aí o proprium, o ‘ego’ do indivíduo, seja ele homem ou mulher. Representa essa sensação de individualidade, pertencente a si mesmo, sua vida como se estivesse nele e fosse dele, e não do Senhor. Isto se chama de “proprium”, e daí é que vem a sensação de que a vida está em nós, independentemente do Criador. Então, a criação desse sentimento, representado pela criação da mulher, foi um desvio da integridade primitiva dos antiquíssimos, mas não chegava a ser, em si, um mal.

Mais tarde, porém, por causa do abuso dessa independência, o proprium do homem se deixou seduzircada vez mais pelos raciocínios e pelas ilusões dos sentidos, e quis se tornarpor si mesmo,  à parte da sabedoria de Deus. Isto é representado pela sedução da serpente e pelo ato de comer do fruto da árvore da ciência do bem e do mal. E então o homem caiu, isto é, perdeusua integridade e sua sabedoria angélica, o que foi representado pela expulsão do Éden.

Todo esse relato está descrito, no sentido interno, no capítulo 3, e nós estamos falando do 2. Mas a antecipação é necessária para mostrarquem é, ou quem foi, basicamente, esse homem celeste cuja formação é descrita no capítulo 2.

Para explicarmelhor a natureza do homem celeste, os Arcanos fazem uma comparação entre o homem antes da regeneração (chamado “morto”), o homem espiritual (do fim dos seis dias) e o homem celeste (o sétimo dia), dizendo que há grande diferença entre eles.

O homem chamado morto só reconhece a verdade que se refere ao corpo e ao mundo. O homem espiritual reconhece a verdade e o bem espirituais e celestes, mas pela fé. Já o homem celeste crê na verdade e no bem espirituais e celestes, e os percebe.

O homem morto não luta contra os males, ou, se luta, quase sempre é vencido por eles; “os males e falsos governam nele, e ele é o servo”. Os únicos vínculos que o refreiam são vínculos externos, como o temor da lei, da perda da vida, da riqueza, dos proveitos e da reputação. O homem espiritual está em luta e sempre vence. Seus vínculos, pelos quais age, são os internos e da consciência. O homem celeste não está em luta, já venceu os males e falsos e não tem vínculosa não ser as percepções do bem e da verdade.

O homem espiritual age pela consciência, o celeste age pela percepção. A consciência é formada pelas verdades que a pessoa aprende e obedece; ela se forma, portanto, pela via externa, ao passo que a percepção éuma intuição que vem do Senhor, por via interna, uma espécie de sensação interna que diz se algo é uma verdade e se é um bem. Assim, enquanto o espiritual tem de aprender as verdades, o celeste é instruído imediatamente pela percepção. Já o homem morto não tem sequer consciência, “e a maior parte das pessoas não sabe o que é consciência e ainda menos o que é percepção.”

Além disso, no homem espiritual, o Senhor influi pela fé em suas coisas intelectuais, enquanto no homem celeste o Senhor influi pelo amor e pela fé do amor, em suas coisas intelectuais. (AC 99)

Mesmo enquanto o homem é espiritual, ainda há conflito entre sua mente externa e a interna. Mas quando as afeições más são subjugadas e a mente externa é reduzida à obediência, o homem externo serve ao interno, e o conflito cessa.O homem celeste é chamado o “sábado”,ou repouso, porque cessa a luta. “Os maus espíritos se afastam e os bons se aproximam e, então, vêm os anjos celestes. Quando estes estão presentes, os maus espíritos não podem ficar, mas fogem para longe. E, como não foi o homem mesmo quem lutou, mas o Senhor, só, pelo homem, diz‑se que “o Senhor descansou”. Daí vem a tranquilidade espiritual, que “é significada pela “chuva” e pelo “vapor”... Essa tranquilidade, que pertence à paz, produz as coisas que são chamadas “rebento do campo” e “erva do campo”, que são particularmente as coisas racionais e os conhecimentos de uma origem celeste espiritual.

“E formou JehovahDeus o homem, pó do humo; e soprou em suas narinas fôlego de vidas; e o homem tornou‑se alma vivente”. “Formar o homem, pó do humo” é a formação do homem externo no homem celeste. “Soprar em suas narinas fôlego de vidas” é dar‑lhe a vida da fé e do amor. “Por “vidas”, no plural, são entendidos o Amor e a Sabedoria, que ambos são essencialmente Deus, porque quanto mais o homem recebe e aplica estes dois essenciais da vida, que procedem continuamente de Deus, e influem continuamente nas almas dos homens, mais ele se torna almas viventes; porque a vida é a mesma coisa que Amor e Sabedoria” (Coronis 25). “O homem se tornou alma vivente” é que o homem externo também tornou‑se vivo.

“E plantou JehovahDeus um jardim em Éden para o Oriente, e pôs ali o homem a quem formou”. Pelo “jardim” é significada a inteligência; pelo “Éden”, o amor; pelo “Oriente” o Senhor. Assim, pelo “jardim em Éden para o Oriente” é significada a inteligência do homem celeste que flui do Senhor por meio do amor.

 “E JehovahDeus fez brotar do humo toda árvore desejável à vista e boa para comida; e a árvore de vidas no meio de jardim; e a árvore da ciência do bem e do mal”. “Árvore” significa percepção; “árvore desejável à vista”, a percepção do vero; “árvore boa para comida”, a percepção do bem; “árvore de vidas”, o amor e a fé procedente do amor; “árvore da ciência do bem e do mal”, a fé que vem dos sentidos ou dos conhecimentos.

“A ‘árvore de vidas’ é o amor e a fé que procede do amor; “no meio do jardim” é na vontade do homem interno.” No homem celeste, o amor e a fé estão no íntimo doseu ser, o meio do jardim, ou na vontade, que “na Palavra se chama ‘coração’”. Porém, depois da queda, a vontade do homem irregenerado se tornou um acúmulo de cobiças, uma massa caótica, “a terra era vácua e vazia, e a escuridão sobre as faces do abismo.”

“E tomou JEHOVAH DEUS o homem e pô-lo no jardim do Éden para cultivá-lo e para guarda-lo”. Pelo “jardim do Éden” são significadas todas as coisas que estão no homem celeste, das quais se trata aqui; por “cultivá-lo e guarda-lo” é significado que lhe foi concedido fruir de todas essas coisas, mas não possuí-las como suas, porquanto são do SENHOR.

 “E JehovahDeus ordenou ao homem a respeito dele, dizendo: De toda árvore do jardim, comendo comerás”. “Comer de toda árvore” é conhecer e saber, pela percepção, o que é o bem e o vero, pois, como foi dito, a percepção é a “árvore”. Como a raça adâmica tinha a percepção vinda de Deus e por ela podiam receber a sabedoria angélica, eles não tinha necessidade de outra fonte de instrução.

“Mas da árvore da ciência do bem e do mal, não comerás dela, porque no dia em que comeres dela, morrendo morrerás”. Essas expressões, bem como as anteriores, significam que é permitido, por toda percepção vinda do Senhor, conhecer o que é a verdade e o bem, mas não por si mesmo e pelo mundo, ou inquirir os mistérios da fé pelas coisas dos sentidos e dos conhecimentos, pelo que o celeste do homem morre.”“Comer da árvore da ciência do bem e do mal” é querer ser sábio por seu próprio meio, pelos conhecimentos vindos pelos sentidos e não pela instrução Divina. Este foi a razãoda quedado raça antiquíssima, Adão, ou da Igreja daquele tempo.

Por aí vemos como é ingênua a interpretação que se faz, geralmente, desse relato, a respeito da tentação pela serpente, a sedução da mulher, o fruto – que acham ser maçã – e a queda do homem, no que as pessoas se acostumaram a colocar uma conotação sexual.

Mas comer da árvore da ciência é priorizar os conhecimentos dos sentidos em detrimento da revelação. É quando o homem condiciona a crença aos seus princípios, quando só crê naquilo que vê e compreende, e com isso rejeita tudo o que se opõe ao que ele entende ser verdadeiro.A continuação desse caminho leva ao ateísmo, porque ele não vê Deus ou as operações de Deus na natureza. “Quanto mais deseja saber por esse meio, mais se cega, até o ponto de não crer em mais nada, nem mesmo que exista algum espiritual ou a vida eterna. Isso vem do princípio que adotou. É isto que é ‘comer da árvore da ciência do bem e do mal’”; quanto mais ele come dessa árvore, mais fica morto.”

A atitude saudável, espiritualmente falando, é, em primeiro lugar, reconhecermos com humildade que existe um Deus, uma Verdade Divina, e que ela está acima de nossos conceitos humanos do que seja a verdade e o bem. Em segundo lugar, que precisamos aprender essa Verdade e saber como ela se aplica à nossa vida. Por último, que pautemosnossas vidas pelo que a Verdade ensina, porque o propósito dela é nosso bem, nossa felicidade, sobretudo na vida eterna.

“Eis aqui, então, o sentido interno da Palavra, a sua vida mesma, que não se manifesta jamais pelo sentido da letra. Mas os arcanos são em tão grande número que volumes não bastariam para explica-los. Aqui foram ditas somente umas pouquíssimas coisas, tais que possam confirmar que se trata da regeneração e esta procede do homem externo para o interno”.


 

 

Arcanos Celestes, 67 - 130

Gênesis
Capítulo Segundo

 

67.             Como, pela Divina misericórdia do Senhor, me foi dado saber o sentido interno da Palavra — sentido no qual se acham encerradas coisas secretíssimas que nunca antes chegaram ao conhecimento de ninguém, nem podem chegar a não ser que se saiba como são as coisas na outra vida, pois os muitíssimos assuntos que estão no sentido interno da Palavra consideram, relatam e envolvem tais coisas — foi‑me concedido expor o que tenho ouvido e visto há alguns anos, por me ter sido dado estar associado a espíritos e anjos.

68.             Não ignoro que muitos irão dizer que ninguém pode falar com espíritos e anjos enquanto vive no corpo; e muitos dirão que são fantasias; outros, que eu terei transmitido essas coisas para captar a fé; outros dirão o mesmo de modos diferentes. Mas nada disso me detém, porque vi, ouvi e senti.

69.             O homem foi criado pelo Senhor de tal modo que pudesse falar ao mesmo tempo com espíritos e anjos, enquanto vivesse no corpo, como também sucedeu nos tempos antiquíssimos, pois sendo um espírito envolto em um corpo, o homem é um com eles. Como, porém, no transcurso do tempo, os homens se imergiram nas coisas corporais e mundanas de tal forma que quase não se ocupam de outras coisas, o acesso foi, por conseguinte, fechado. Mas, logo que se afastam as coisas corpóreas nas quais se está imerso, o caminho se abre e se está entre os espíritos e se associa a sua vida com eles.

70.             Como é permitido revelar as coisas que durante alguns anos tenho ouvido e visto, será dito aqui, em primeiro lugar, o que se passa com o homem quando é ressuscitado, ou de que maneira ele, da vida do corpo, entra na vida da eternidade. E, para que eu soubesse que os homens vivem após a morte, foi‑me dado falar e conversar com muitos que conheci na sua vida do corpo, e, de fato, não por um dia ou uma semana, mas por meses e quase um ano, com os quais falei e conversei como no mundo. Ficaram muito admirados pelo fato de que, quando viveram no corpo, eles e muitos outros estivessem em uma incredulidade tal que pensavam que não viveriam após a morte, quando o fato é que, após a morte do corpo, passam‑se apenas alguns dias antes que se esteja na outra vida, pois há uma continuação da vida.

71.             Mas como essas revelações seriam esparsas e desconexas se fossem interpostas nas que estão no texto da Palavra, é permitido, pela Divina misericórdia do Senhor, acrescentá‑las em certa ordem e fazê‑las preceder e seguir qualquer dos capítulos, além de outras que serão intercaladas aqui e ali.

72.             Assim, no fim deste capítulo é permitido dizer de que maneira o homem é despertado dos mortos e entra na vida da eternidade.

 

Gênesis
Capítulo Segundo
 

1.      E foram acabados os céus e a terra, e todo o exército deles.

2.      E acabou Deus no dia sétimo a obra Sua, que fez. E descansou no dia sétimo de toda a obra Sua, que fez.

3.      E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou, porque nele descansou de toda a obra Sua, que criou Deus fazendo.

4.      Estas são as natividades dos céus e da terra, quando os criou, no dia em que Jehovah Deus fez a terra e os céus.

5.      E nenhum rebento do campo havia ainda na terra, e nenhuma erva do campo ainda germinava, porque Jehovah Deus não fizera chover sobre a terra, e homem nenhum para cultivar o humo.

6.      E fez subir um vapor da terra, e regou todas as faces do humo.

7.      E formou Jehovah Deus o homem, pó do humo; e soprou em suas narinas respiração de vidas; e o homem tornou‑se alma vivente.

8.      E plantou Jehovah Deus um jardim em Éden para o oriente, e pôs ali o homem a quem formou.

9.      E Jehovah Deus fez brotar do humo toda árvore desejável à vista e boa para comida; e a árvore de vidas no meio do jardim; e a árvore da ciência do bem e do mal.

10.    E um rio saindo do Éden para regar o jardim; e daí era dividido e tornava‑se em quatro cabeças.

11.    O nome do primeiro, Pishon, o que circunda toda a terra de Havilah, onde há ouro.

12.    E o ouro desta terra é bom; ali há o bdélio e a pedra shoham[1].

13.    E o nome do segundo rio, Gichon, o que circunda toda a terra de Cush.

14.    E o nome do terceiro rio, Hiddeklel [2], o que vai orientalmente para Asshur[3]; e o quarto rio, ele é Phrath[4].

15.    E tomou Jehovah Deus o homem e pô‑lo no jardim do Éden para cultivá‑lo e para guardá‑lo.

16.    E Jehovah Deus ordenou ao homem a respeito dele, dizendo: De toda árvore do jardim, comendo comerás[5].

17.    Mas da árvore da ciência do bem e do mal, não comerás dela, porque no dia em que comeres dela, morrendo morrerás[6].

Conteúdo
 

73.             O homem, quando de morto se torna espiritual, de espiritual se torna celeste, do qual agora se trata; versículo 1.

74.             O homem celeste é o “sétimo dia no qual o Senhor descansa”; versículos 2,3.

75.             O seu conhecimento e o seu racional são descritos pelo “rebento e pela erva do humo regado pelo vapor”; versículos 5,6.

76.             Sua vida é descrita pela “inspiração de uma alma de vidas”; versículo 7.

77.             Depois, a sua inteligência é descrita pelo “jardim em Éden para o oriente”, no qual as “árvores desejáveis à vista” são as percepções do vero, e as árvores boas para comida” são as percepções do bem. O amor é descrito pela “árvore de vidas” e a fé pela “árvore da ciência”; versículos 8,9.

78.             A sabedoria é descrita pelo “rio no jardim”, e daí por “quatro rios”, dos quais o primeiro é o bem e o vero; o segundo é a cognição de todas as coisas que pertencem ao vero e ao bem, ou ao amor e à fé, as quais são do interno do homem; o terceiro é a razão, o quarto é a ciência, que são do externo do homem. Todos procedem da sabedoria, e esta procede do amor e da fé no Senhor; versículos 10‑14.

79.             O homem celeste é um tal jardim. Mas como este pertence ao Senhor, é‑lhe concedido usufruir de todas estas coisas, mas não possuí-las como suas; versículo 15.

80.             E lhe é permitido conhecer, por toda percepção que vem do Senhor, o que é o bem e o vero, mas não por si mesmo e pelo mundo, ou inquirir os mistérios da fé por meio das coisas dos sentidos e dos conhecimentos, pelas quais o seu celeste morre; versículos 16,17.

 

Sentido Interno
 

81.             Neste capítulo se trata do homem celeste; no capítulo precedente tratou‑se do homem que, de morto, tornou‑se espiritual. Mas, como hoje se ignora o que é o homem celeste, mal se sabe o que é o espiritual e o que é o morto, pode‑se descrever brevemente qual é um e qual é outro, para que se saiba quais são as diferenças. Primeiro: o homem morto não reconhece outro vero e bem além daquele que é do corpo e do mundo, e também o venera. O homem espiritual reconhece o vero e o bem espirituais e celestes, todavia, pela fé,  pela qual também ele age e não assim pelo amor. O homem celeste crê no vero e no bem espirituais e celestes e os percebe; não reconhece outra fé a não ser aquela que procede do amor, pelo qual ele também age. [2] Segundo: o fim do homem morto visa somente à vida do corpo e do mundo; não sabe o que é a vida eterna e o que é o Senhor, e, se sabe, não crê. O fim do homem espiritual visa à vida eterna e, assim, ao Senhor. O fim do homem celeste visa ao Senhor e, assim, ao Seu reino e à vida eterna. [3] Terceiro: o homem morto, quando está em luta, quase sempre sucumbe; e, quando não está em luta, os males e falsos governam nele, e ele é o servo. Seus laços são externos, como o temor da lei, da perda da vida, da riqueza, dos proveitos e da reputação, por causa dessas coisas mesmas. O homem espiritual está em luta, mas sempre vence. Seus laços, pelos quais age, são internos e são chamados laços da consciência. O homem celeste não está em luta; e, se os males e falsos o assaltam, ele os despreza. Por isso é também chamado “vencedor”. Não tem laços aparentes pelos quais age, mas é livre; os laços, que não aparecem, são as percepções do bem e do vero.

82.             Vers. 1: “E foram acabados os céus e a terra, e todo o exército deles”. Por estas palavras se entende que o homem agora se tornou espiritual, a ponto de ser o “sexto dia”. O “céu” é o seu homem interno e a “terra” é o externo. O “exército deles” são o amor, a fé e as cognições do amor e da fé que antes foram significados pelos “grandes luminares e as estrelas”. Que o homem interno se chame “céu” e o externo “terra” pode-se ver pelas passagens da Palavra citadas no capítulo precedente. Permite-se acrescentar o que se diz em Isaías:

“Farei o varão mais raro do que o ouro sólido, e o homem mais do que o ouro precioso de Ofir; por causa disso, ferirei de terror os céus, e a terra será sacudida de seu lugar” (13:12,13);

e em outro lugar:            

“Terás esquecido Jehovah o feitor teu, Que estende os céus e funda a terra;... mas porei Minhas palavras em tua boca, e na sombra da [Minha] mão... te esconderei, para estender o céu e fundar a terra” (51:13,16);

pelo que é evidente que o “céu” e a “terra” são predicados do homem. Na verdade, aí se trata da Igreja Antiquíssima, ,mas as coisas interiores da Palavra são tais que tudo o que é dito sobre a Igreja, aplica‑se a todo membro da Igreja, o qual, se não fosse uma Igreja, não poderia ser parte dela, assim como o que não é um templo do Senhor não pode ser o que é significado pelo “templo”, que é a Igreja e o céu. É daí que a Igreja Antiquíssima também se chama “homem” no singular.

83.             Diz‑se que “os céus e a terra e todo o exército deles” “foram acabados”, quando o homem se torna o “sexto dia”, pois, então, a fé e o amor fazem um; e, quando fazem um, o amor, e não a fé, começa a ser o principal, isto é, o celeste, e não o espiritual, começa a ser o homem celeste.

84.             Vers. 2 e 3: “E acabou Deus no dia sétimo a obra Sua, que fez. E descansou no dia sétimo de toda a obra Sua, que fez. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou, porque nele descansou de toda a obra Sua, que criou Deus fazendo”. O homem celeste é o “sétimo dia”; como ele foi elaborado pelo Senhor durante seis dias, é chamado “Sua obra”. E, porque então cessa a luta, diz‑se do Senhor que “descansou de toda a obra Sua”. Por isso o sétimo dia é santificado e chamado “sábado”, de “descanso”. E, assim, o homem foi criado, formado e feito. É o que se percebe claramente por essas palavras.

85.             Que o homem celeste seja o “sétimo dia” e que o sétimo dia tenha sido por isso santificado e chamado sábado, de “descanso”, são arcanos ainda não revelados. Isso vem também de se ter ignorado o que é o homem celeste e de poucos saberem o que é o espiritual que, por causa dessa ignorância, foi confundido com o celeste, quando a verdade é que existe muita diferença entre eles, como se vê no n.º 81. Quanto ao que concerne ao sétimo dia e ao homem celeste que é o “sétimo dia” ou sábado, vê‑se pelo fato de o próprio Senhor ser o sábado; por isso Ele disse também:

“O Filho do Homem é o Senhor do sábado” (Marcos 2:28),

palavras que envolvem que o Senhor é o Homem Mesmo e o Sábado Mesmo. Seu reino nos céus e nas terras é daí chamado “sábado” ou a eterna paz e o repouso. A Igreja Antiquíssima, de que se trata aqui, era o “sábado” do Senhor mais do que as Igrejas que a seguiram. [2]  Toda Igreja seguinte e íntima do Senhor é também o “sábado”, assim como todo regenerado, quando se torna celeste, porque é a semelhança do Senhor. Precedem seis dias de luta ou de labor. Essas coisas foram representadas na Igreja Judaica pelos dias de labor e pelo sétimo que era o “sábado”, pois tudo o que foi instituído naquela Igreja era representativo do Senhor e de Seu reino. O mesmo foi também representado pela “arca, quando se punha a caminho e quando repousava”; pelas “suas marchas no deserto” eram representadas as lutas e tentações; pelo “repouso”, o estado de paz. Por isso, quando ela se punha a caminho, Moisés dizia:

“Levanta‑Te, Jehovah, e sejam dispersos os inimigos Teus, e fujam os que Te odeiam de diante de Tuas faces. E quando repousava, dizia: Volta, Jehovah, aos miríades de milhares de Israel” (Núm. 10:35,36);

a respeito da arca, foi dito ali que

“partia da montanha de Jehovah para lhes buscar descanso” (Ibidem, 33).

O descanso do homem celeste é descrito pelo “sábado” em Isaías:

“Se desviares do sábado o teu pé, de fazer o teu desejo no dia da Minha santidade; e chamares as coisas que pertencem ao sábado delícias ao Santo Jehovah, honradas; e o honrares, não seguindo teus caminhos; nem buscares o teu desejo e falares [tua] palavra, então serás delicioso a Jehovah, e te farei transportar sobre as alturas da terra, e te alimentarei com a herança de Jacob” (58:13,14).

O homem celeste é tal que age não pelo seu desejo, mas pelo beneplácito do Senhor, que é o desejo para ele. Goza, assim, de paz e felicidade internas, que aqui são expressas por “ser elevado sobre as alturas da terra”, e, ao mesmo tempo, de tranquilidade e prazer externos, que são significados por “ser alimentado com a herança de Jacob”.

86.             Quando o homem espiritual que se tornou o “sexto dia” começa a se tornar celeste — do qual se trata aqui em primeiro lugar — é a “véspera do sábado”, o que foi representado na Igreja Judaica pela santificação do “sábado” a partir da tarde. O homem celeste é a “manhã”; dele se tratará logo a seguir.

87.             Que o homem celeste seja o “sábado” ou descanso, é também porque cessa a luta, quando ele se torna celeste. Os maus espíritos se afastam e os bons se aproximam e, então, vêm os anjos celestes. Quando estes estão presentes, os maus espíritos não podem ficar, mas fogem para longe. E, como não foi o homem mesmo quem lutou, mas o Senhor, só, pelo homem, diz‑se que “o Senhor descansou”.

88.             Quando se torna celeste, o homem espiritual é chamado “obra de Deus”, pois que só o Senhor lutou por ele e o criou, formou e fez. Por isso se diz aqui: “Deus acabou no dia sétimo a Sua obra”, e se repete: “descansou de toda a Sua obra”. Nos Profetas, ele é frequentemente chamado “obra das mãos e dos dedos de Jehovah”, como em Isaías, onde se trata do regenerado:

“Assim disse Jehovah, o Santo de Israel e Formador seu: Sinais pedi‑Me... acerca de Meus filhos; e acerca das obras de Minhas mãos ordenai‑Me. Eu fiz a terra, e o homem sobre ela criei. Eu, as Minhas mãos estenderam os céus, e a todo o exército deles ordenei... Porque, assim, disse Jehovah, que cria os céus, Ele, o Deus que forma a terra e que a faz; Ele, que a firma, não a criou vazia: para ser habitada a formou. Eu, Jehovah... e não há outro Deus além de Mim” (45:11,12, 18, 21);

daí se vê que a nova criação ou regeneração é obra do Senhor, só. Os vocábulos “criar” “formar” e “fazer” são empregados bem distintamente, como aqui em Isaías: “...que cria os céus, forma a terra e a faz”, e, depois, em outro lugar:

“...Todo o que é chamado pelo Meu nome, e para a Minha glória o criei, o formei e também o fiz” (Isa. 43:7).

Dá-se de modo semelhante no capítulo precedente e neste, como aqui: “descansou de toda a obra Sua, que criou Deus fazendo”; e isto sempre com uma ideia distinta no sentido interno. Bem como onde o Senhor é chamado Criador, ou Formador e Feitor.

89.             Vers. 4: “Estas são as natividades dos céus e da terra, quando os criou, no dia em que JehovahDeus fez a terra e os céus”. “Natividades dos céus e da terra” são as formações do homem celeste. Que agora se trate de sua formação, vê‑se claramente de cada um dos exemplos que se seguem, como: que “nenhuma erva ainda tinha germinado”, “nenhum homem para cultivar o humo”, e também que “JehovahDeus tenha formado o homem” e, em seguida, “toda besta e a ave dos céus”; e, entretanto, a formação desses fora tratada no capítulo precedente. Por isso, aqui se trata de um outro homem, o que é ainda mais claro pelo fato de se dizer agora, pela primeira vez, “JehovahDeus”. No que precedeu, onde se tratou do homem espiritual, foi dito somente “Deus”. E, também pelo fato de agora se dizer “humo” e “campo”, e, no que precedeu, apenas “terra”. E ainda pelo fato de que neste versículo o céu é posto primeiro, antes da terra, e depois a terra antes do céu. A causa disto é que a “terra” significa o homem externo e o “céu” o interno. No homem espiritual, a reforma começa da terra ou do homem externo, mas aqui, onde se trata do celeste, começa do homem interno ou do céu.

90.             Vers. 5 e 6: “E nenhum rebento do campo havia ainda na terra, e nenhuma erva do campo ainda germinava, porque JehovahDeus não fizera chover sobre a terra, e homem nenhum para cultivar o humo. E fez subir um vapor da terra, e regou todas as faces do humo”. Pelo “rebento do campo” e pela “erva do campo” se entendem, em geral, tudo o que seu homem externo produz. A “terra” é o homem externo quando era espiritual; o “humo”, assim como o “campo”, é o homem externo quando se torna celeste; a “chuva”, que logo depois é chamada “vapor”, é a tranquilidade da paz, quando cessa a luta.

91.             Mas, se não se conhece o estado do homem quando de espiritual se torna celeste, de modo nenhum se pode perceber o que estas coisas envolvem, porque são mais secretas. Quando é espiritual, o homem externo ainda não quer prestar obediência ao interno ou servi‑lo, pelo que há a luta. Quando, todavia, se torna celeste, então, o homem externo começa a obedecer e a servir ao interno, pelo que cessa a luta e há a tranquilidade (vide n.º 87). Essa tranquilidade é significada pela “chuva” e pelo “vapor”, pois é como um vapor que vem do interno e rega e banha o externo. Essa tranquilidade, que pertence à paz, produz as coisas que são chamadas “rebento do campo” e “erva do campo”, que são particularmente as coisas racionais e os conhecimentos de uma origem celeste espiritual.

92.             Ninguém pode conhecer a qualidade da paz do homem externo, quando cessa a luta, ou o desassossego proveniente das cobiças e falsidades, exceto aquele que conhece o estado de paz. Esse estado é tão prazeroso que excede toda ideia de prazer. Não é somente a cessação da luta, mas a vida provindo de uma paz interior, afetando o homem externo de tal modo, que é impossível descrever. Os veros da fé e os bens do amor então nascem, derivando a sua vida do prazer da paz.

93.             O estado do homem celeste, agraciado com a tranquilidade da paz, recreado pela chuva e liberto da servidão do mal e do falso, é assim descrito pelo Senhor através de Ezequiel:

“Firmarei com eles uma aliança de paz, e farei cessar a fera má da terra, e habitarão seguramente no deserto, e dormirão nos bosques; e lhes darei, e aos contornos de Minha colina, bênção; e farei descer a chuva em seu tempo, chuvas de bênção serão. E a árvore do campo dará o seu fruto, e a terra dará a sua produção; e estarão sobre o seu humo em segurança, e saberão que Eu sou Jehovah, quando tiver rompido as correias do seu jugo, e os tiver libertado da mão dos que os fazem servir... Vós sois Meu rebanho, rebanho do Meu pasto; homem sois vós, Eu sou vosso Deus” (34:25‑27,31).

E se diz em Oséias que isso se faz no terceiro dia, que na Palavra significa a mesma coisa que o sétimo:

“Vivificar‑nos‑á depois de dois dias, no dia terceiro nos erguerá, e viveremos diante d`Ele; e conheceremos, e prosseguiremos em conhecer Jehovah, como a aurora preparada para a Sua saída; e virá a nós como chuva, como chuva serôdia que rega a terra” (6:2,3).

E isso é comparado ao germe do campo por Ezequiel, onde se trata da Igreja Antiga:

“Como germe do campo te tornei, e cresceste, e aumentaste, e te tornaste ornamento dos ornamentos” (16:7);

depois:

“Ao broto das plantações, e às obras das mãos de JehovahDeus” (Isa. 60:21).

94.             Vers. 7: “E formou JehovahDeus o homem, pó do humo; e soprou em suas narinas fôlego de vidas; e o homem tornou‑se alma vivente”. “Formar o homem, pó do humo” é formar o seu homem externo, que antes não era homem; pois é dito no vers. 5 que não havia homem para cultivar o humo. “Soprar em suas narinas fôlego de vidas” é dar‑lhe a vida da fé e do amor. “O homem se tornou alma vivente” é que o homem externo também tornou‑se vivo.

95.             Aqui se trata da vida do homem externo; nos dois versículos anteriores tratou‑se da vida de sua fé ou do entendimento, neste se fala da vida de seu amor ou da vontade. Anteriormente, o homem externo não queria obedecer e servir ao interno, mas continuamente lutava contra ele; por isso o externo não era, então, homem. Agora, porém, depois que se tornou celeste, o externo começa a prestar obediência e servir ao interno, e, assim, se torna homem também e isso pela vida da fé e pela vida do amor. A vida da fé o prepara e a vida do amor faz que seja homem.

96.             Foi dito que JehovahDeus “soprou pelas narinas”. A coisa assim se passa: na antiguidade e na Palavra, pelas “narinas” se entendia tudo o que era agradável por causa do odor, que significa a percepção. Por isso, frequentemente se lê a respeito de Jehovah que Ele “cheirou o cheiro de repouso” dos holocaustos e das coisas que O representavam e ao Seu reino. E, pelo fato de serem as coisas que são do amor e da fé muito agradáveis a Ele, é dito que “soprou pelas narinas fôlego de vidas”. Daí vem que o Ungido de Jehovah, ou o Senhor, Se chama “sopro das narinas” (Lam. 4:20). E Ele mesmo significava isso quando soprou sobre os discípulos, em João:

“Soprou e disse: Recebei o Espírito Santo” (20:22).

97.             Que a vida seja descrita pelo sopro e pelo fôlego, a razão é também que os homens da Igreja Antiquíssima percebiam os estados do amor e da fé por meio dos estados da respiração, estados esses que foram sucessivamente mudados em seus descendentes. Ainda não se pode dizer coisa alguma sobre essa respiração, porque hoje são coisas inteiramente ocultas. Os antiquíssimos conheceram bem isso, assim como os que estão na outra vida, mas nesta terra não há mais ninguém que o saiba. Daí é que assemelham o espírito ou a vida ao vento. Também o Senhor, quando falou da regeneração do homem, disse em João:

“O vento [spiritus] sopra onde quer; e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem ou para onde vai; assim é todo o que é gerado pelo espírito” (3:8).

Semelhantemente, em David:

“Pela palavra de Jehovah os céus foram feitos; e pelo espírito [ou sopro] de Sua boca, todos os seus exércitos” (Sal. 33:6);

e, no mesmo:

“Recolhes o espírito deles, expiram e ao seu pó retornam; envias o Teu espírito, são criados e renovas as faces do humo” (Sal. 104:29, 30).

Que o “fôlego” seja tomado em lugar da vida do amor, vê‑se em Jó:

“O espírito está no homem, e o fôlego de Shaddai os faz entender” (32:8);

e depois, no mesmo:

“O espírito de Deus me fez, e o fôlego de Shaddai me vivificou” (33:4).

98.             Vers. 8: “E plantou JehovahDeus um jardim em Éden para o Oriente, e pôs ali o homem a quem formou”. Pelo “jardim” é significada a inteligência; pelo “Éden”, o amor; pelo “Oriente” o Senhor. Assim, pelo “jardim em Éden para o Oriente” é significada a inteligência do homem celeste que flui do Senhor por meio do amor.

99.             No homem espiritual, a vida ou a ordem da vida é tal que o Senhor influi, realmente, pela fé em suas coisas intelectuais, racionais e dos conhecimentos. Mas, como o seu homem externo luta com o interno, parece que a inteligência não flui do Senhor, mas de si próprio, pelas coisas dos conhecimentos e racionais. No homem celeste, porém, a vida ou a ordem da vida é que o Senhor influi pelo amor e pela fé do amor em suas coisas intelectuais, racionais e dos conhecimentos. E como não há luta, percebe‑se que, assim, é. Em consequência, a ordem, que ainda está invertida no espiritual, é restabelecida no celeste. Essa ordem ou esse homem chama‑se “jardim em Éden para o Oriente”. [2] No sentido supremo, o “Jardim plantado por JehovahDeus em Éden para o Oriente” é o Senhor mesmo. No sentido íntimo, que também é o sentido universal, é o reino do Senhor e o céu, no qual o homem é colocado, quando se torna celeste. Seu estado consiste, então, em estar com os anjos no céu e ser como se fosse um entre eles. Pois o homem foi criado de modo que, durante o tempo em que vive na terra, esteja ao mesmo tempo no céu. Então se abrem todos os seus pensamentos e as ideias dos pensamentos, até as palavras e as ações, em que estão os celestes e espirituais e se manifestam até o Senhor. Pois em cada um há a vida do Senhor, o que faz que se tenha a percepção.

100.          Que o “jardim” signifique a inteligência e “Éden” o amor, é evidente também em Isaías:

“Jehovah consolará Sião; consolará todas as suas devastações, e fará seu deserto como o Éden e a sua solidão como o jardim de Jehovah; contentamento e alegria se acharão nela, confissão e voz de canto” (51:3),

onde “deserto, contentamento e confissão” são vocábulos que exprimem, no profeta, as coisas celestes da fé ou que pertencem ao amor; “solidão, alegria e voz de canto”, todavia, significam as coisas espirituais da fé, que também pertencem ao entendimento. Aquelas se referem ao “Éden”, estas ao “jardim”. Porque nesse profeta ocorrem pares de expressões sobre a mesma coisa, das quais uma significa coisas celestes e a outra espirituais. Além disso, ver‑se‑á no vers. 10 o que é o “jardim em Éden”.

101.          Que o Senhor seja o “Oriente”, vê‑se também em várias passagens na Palavra, como em Ezequiel:

“Conduziu‑me à porta, a porta que olha o caminho do oriente, e eis, a glória do Deus de Israel veio do caminho do oriente; e Sua voz era como voz de muitas águas; e a terra resplandecia de Sua glória” (43:1,2,4).

Como o Senhor é o Oriente, daí vinha o santo costume, na Igreja representativa Judaica, antes da edificação do templo, de voltarem a face para o oriente quando oravam.

102.          Vers. 9: “E JehovahDeus fez brotar do humo toda árvore desejável à vista e boa para comida; e a árvore de vidas no meio de jardim; e a árvore da ciência do bem e do mal”. “Árvore” significa percepção; “árvore desejável à vista”, a percepção do vero; “árvore boa para comida”, a percepção do bem; “árvore de vidas”, o amor e a fé procedente do amor; “árvore da ciência do bem e do mal”, a fé que vem dos sentidos ou dos conhecimentos.

103.          Que as “árvores” signifiquem aqui percepções, é porque se trata do homem celeste. É diferente quando se trata do espiritual, porque tal é o sujeito, tal o predicado.

104.          Mas hoje se ignora o que é a percepção. É uma espécie de sensação interna que, vindo unicamente do Senhor, diz se uma coisa é um vero e se é um bem. A percepção era bem conhecida na Igreja Antiquíssima. Para os anjos, é tão manifesta, que por ela sabem o que é vero e o bem, sabem o que vem do Senhor e o que vem deles próprios e também conhecem a natureza de alguém que deles se aproxima, por uma só das suas ideias. No homem espiritual não há percepção, mas consciência; no homem morto não há sequer a consciência, e a maior parte das pessoas não sabe o que é consciência e ainda menos o que é percepção.

105.          A “árvore de vidas” é o amor e a fé que procede do amor; “no meio do jardim” é na vontade do homem interno. O que o Senhor possui primeiro no homem e no anjo é a vontade, que na Palavra se chama “coração”. Mas, como ninguém pode fazer o bem por si mesmo, a vontade ou o coração não pertence ao homem, embora seja atribuída ao homem. O que pertence ao homem é a cobiça, que ele chama vontade. Como a vontade está no meio do jardim, onde se acha a “árvore de vidas”, e no homem a vontade nada mais é senão cobiças, por isso a “árvore de vidas” é a misericórdia do Senhor, de Quem procedem todo amor e toda fé, por conseguinte toda vida.

106.          Mas, no que se segue se dirá em maior número de vezes o que é “árvore do jardim” ou percepção, o que é “árvore de vidas” ou amor e a fé procedente do amor, e o que é a “árvore da ciência” ou a fé dos sentidos e do conhecimento.

107.          Vers. 10: “E um rio saindo do Éden para regar o jardim; e daí era dividido, e tornava‑se em quatro cabeças”. “Um rio saindo do Éden” significa a sabedoria procedendo do amor, que é o “Éden”; “regar o jardim” é dar inteligência; por conseguinte, “ser dividido em quatro cabeças” é a descrição da inteligência pelos quatro rios, como se segue.

108.          Quando os antiquíssimos comparavam o homem a um jardim, também comparavam a sabedoria e as coisas que pertencem à sabedoria a rios. E não só comparavam, mas as chamavam assim, pois tal era a sua linguagem. Sucedeu de modo semelhante mais tarde, nos Profetas, que ora comparavam, ora nomeavam assim. Como em Isaías:

“Levantar‑se‑á nas trevas a tua luz, e a tua escuridão será como a luz do dia... e serás como um jardim regado, e como uma fonte de águas cujas águas não faltarão” (58:10,11),

onde se trata daqueles que recebem a fé e o amor. Depois:

“Como vales são plantadas, como jardins junto ao rio; como sândalos Jehovah plantou, como cedros junto às águas” (Núm. 24:6),

onde se trata dos regenerados. Em Jeremias:

“Bem‑aventurado o varão que confia em Jehovah... será como árvore plantada junto às águas, e sobre o ribeiro estende suas raízes” (17:7,8).

Elas não são comparadas ao jardim e à árvore em Ezequiel, mas assim referidas:

“As águas fizeram‑na crescer, a profundeza das águas a exaltou; um rio corria ao redor de sua planta, e seus canais de água enviou a todas as árvores do campo... tornou‑se bela em sua grandeza, no comprimento dos seus ramos, porque sua raiz era para muitas águas. Os cedros não a obscureciam no jardim de Deus, os abertos não igualavam os seus ramos e os plátanos não eram como seus galhos. Nenhuma árvore no jardim de Deus lhe era igual em sua beleza; bela a fiz na multidão de seus ramos, e invejavam-na todas as árvores do Éden, que estavam no jardim de Deus” (31:4,7‑9).

Por aí se vê que os antiquíssimos, quando comparavam o homem ou, o que é o mesmo, as coisas que estão no homem, a um jardim, também ajuntavam as águas e os rios que o irrigavam, e pelas “águas e os rios” entendiam as coisas que o fazem crescer.

109.          Que a sabedoria e a inteligência, como foi dito, pertençam somente ao Senhor ainda que apareçam no homem, isto é dito claramente, por meio de semelhantes representativos, em Ezequiel:

“Eis, águas que saem de debaixo do limiar da casa para o Oriente, porque a face da casa é o Oriente... e disse: Estas águas que saem para o limite do lado do Oriente e descem sobre a planície, e vêm para o mar, no mar [serão] conduzidas e sararão as águas.

“E sucederá que toda alma vivente que rasteja, por toda a parte onde vier a água dos rios, viverá ... E junto ao rio se eleva sobre sua margem, aquém e além, toda árvore para comida; não murchará seu ramo, e não será consumido o seu fruto; em seus meses renascerá. Porque as suas águas saem do Santuário; e daí seu fruto será para comida e sua folha para remédio” (47:1,8,9,12);

aqui, o Senhor é significado pelo “Oriente” e pelo “Santuário de que vêm as águas dos rios”. Semelhantemente em João:

“Mostrou‑me um rio puro de água da vida, brilhante como cristal, saindo do trono de Deus e do Cordeiro. No meio de sua praça, e do rio, aquém e além, a árvore da vida dando doze frutos, segundo cada mês dando o seu fruto, e a folha da árvore era para remédio das nações” (Apoc. 22:1,2).

110.          Vers. 11 e 12: “O nome do primeiro, Pishon, o que circunda toda a terra de Havilah, onde há ouro. E o ouro dessa terra é bom; ali há o bdélio e a pedra shoham”. O primeiro rio ou “Pishon” significa a inteligência da fé pelo amor; a “terra de Havilah”, a mente; o “ouro”, o bem; “bdélio” e “shoham”, o vero. A razão pela qual o “ouro” foi citado duas vezes é que o ouro significa o bem do amor e o bem da fé que procede do amor. E foram citados “bdélio” e “shoham” porque um significa o vero do amor e o outro o vero da fé que procede do amor. Tal é o homem celeste.

111.          Dificilmente se pode dizer, todavia, como são essas coisas no sentido interior, porque são coisas hoje desconhecidas, como o que é a fé que procede do amor ou o que é a sabedoria e o que é a inteligência que dela procede. Pois os homens externos mal conhecem outra coisa além dos fatos do conhecimento [scientia], aos quais chamam inteligência, sabedoria e fé. Nem mesmo sabem o que é o amor, e muitos não sabem o que é a vontade e o entendimento, e que estes constituem uma só mente, quando, todavia, cada uma dessas coisas é distinta e até muito distinta, e todo o céu é distintamente ordenado pelo Senhor segundo as diferenças do amor e da fé, que são inumeráveis.

112.          Mas saiba‑se que não existe sabedoria alguma a não ser a que procede do amor, assim, do Senhor; nem jamais inteligência alguma a não ser a que procede da fé, assim, também, do Senhor; e não existe jamais bem algum a não ser pelo amor, assim, pelo Senhor; e não existe jamais vero algum a não ser pela fé, assim, pelo Senhor. As coisas que não procedem do amor e da fé, por conseguinte, do Senhor, são chamadas por nomes semelhantes, mas são espúrias.

113.          Nada é mais comum na Palavra do que o bem da sabedoria ou do amor ser representado pelo ouro. Todo o ouro na arca, no templo, na mesa de ouro, no candelabro, nos vasos, sobre as vestes de Arão, significava e representava o bem da sabedoria ou do amor. É semelhante nos Profetas, como em Ezequiel:

“Em tua sabedoria e em tua inteligência fizeste para ti riquezas, e puseste ouro e prata em teus tesouros” (28:4),

onde se diz claramente que da sabedoria e da inteligência vêm ouro e prata, ou o bem e o vero, pois “prata” aí significa o vero, como também a prata na arca e no templo. Em Isaías:

“Multidão de camelos te cobrirá, dromedários de Midiã e de Ephah, todos eles de Sheba virão, ouro e incenso trarão e os louvores de Jehovah anunciarão” (60:6).

Como também os sábios do oriente que vieram a Jesus quando Ele nasceu:

“E prostraram‑se e O adoraram; e abriram os seus tesouros e Lhe ofereceram dádivas: ouro, incenso e mirra” (Mt. 2:11),

onde, também, o “ouro” significa o bem; “incenso e mirra”, as coisas que são agradáveis, porque procedem do amor e da fé, e daí se chamam “louvores de Jehovah”. Por isso se diz em David:

“...Viverá, e lhe dará do ouro de Sheba, e rogará por ele perpetuamente; todo dia o abençoará” (Sal. 72:15).

114.          Também o vero da fé, na Palavra, é significado e representado pelas pedras preciosas, como no peitoral do juízo e sobre os ombros do éfode de Aarão. No peitoral, o ouro, o jacinto, a púrpura, o escarlate duplamente tinto e o linho fino [xylino] representavam as coisas que pertencem ao amor; as pedras preciosas representavam as coisas que pertencem à fé procedente do amor. Semelhantemente as duas pedras do memorial sobre os ombros do éfode, que eram shoham circundadas por fundos de ouro (Êx. 28:9-22). É o que está dito claramente em Ezequiel, onde se trata do homem que possui as riquezas celestes, a sabedoria e a inteligência:

“Cheio de sabedoria, e perfeito em beleza, estiveste no Éden, o jardim de Deus; de toda pedra preciosa era tua cobertura, rubi, topázio e diamante; tarshish, shoham e jaspe; safira, crisópraso, esmeralda; e ouro, obra dos teus tambores e das tuas flautas, estava em ti; no dia em que foste criado, eles foram preparados; perfeito foste em teus caminhos, desde o dia em que foste criado” (28:12, 13, 15).

Qualquer um pode ver que tais expressões significam as coisas celestes e espirituais da fé e não pedras. Mesmo cada uma das pedras representava algum essencial da fé.

115.          Quando nomeavam as terras, os antiquíssimos entendiam as coisas que elas significavam. É como os que hoje têm a ideia de que a “terra de Canaan” e o “Monte Sião” significam o céu: esses, quando falam esses nomes, nem mesmo pensam na terra ou no monte, mas somente nas coisas que esses significam. Assim é aqui, com a “terra de Havilah” que também é mencionada em Gênesis 25:18, onde se trata dos filhos de Ismael, “que habitavam desde Havilah até Shur, que estava junto às faces do Egito ao que vem a Asshur”. Os que estão na ideia celeste não percebem, por essa expressão, outra coisa a não ser a inteligência e as coisas que fluem da inteligência. Como também por “circundar” — no que foi dito que o rio Pishon circunda toda a terra de Havilah — eles percebem “influir”. É como o fato de a pedra shoham que estava sobre os ombros do éfode de Arão ser circundada por um fundo de ouro (Êx. 28:11), no que eles percebem que o bem do amor influi no vero da fé. O mesmo acontece muitas vezes em outras passagens.

116.          Vers. 13: “E o nome do segundo rio, Gichon, o que circunda toda a terra de Cush”. O “segundo rio”, que é chamado “Gichon”, significa a cognição de todas as coisas que são do bem e do vero ou do amor e da fé; a “terra de Cush” significa a mente ou faculdade. A mente é constituída pela vontade e pelo entendimento. As coisas relacionadas com o primeiro rio se referem à vontade e as relacionadas com o segundo, ao entendimento, ao qual pertencem as cognições do bem e do vero.

117.          A terra de Cush ou Etiópia abundava também em ouro, pedra preciosa e produtos aromáticos que, como foi dito, significam o bem, o vero e as coisas agradáveis que pertencem ao bem e vero, tais como as das cognições do amor e da fé. Isso se pode ver pelas passagens citadas acima, no n.º 113, em Isaías 60:6,Mateus 2:1,11, David [Salmo] 72:15. Por “Cush” ou Etiópia, assim como por “Sheba”, entendem‑se coisas semelhantes na Palavra. Isto se vê nos Profetas, como em Sofonias, onde também se nomeiam os rios de Cush:

“De manhã, Seu juízo dará por luz... porque então Me voltarei para povos de lábio claro, para que invoquem, todos eles, o nome de Jehovah, para que O sirvam de um só ombro... d'além dos rios de Cush, os adoradores Meus... trarão Minha oferta” (3:5,9,10).

E em Daniel, onde se trata do rei do norte e do sul:

“Dominará sobre os tesouros [recondita] de ouro e de prata, e sobre todas as coisas desejáveis do Egito; e os líbios e egípcios estarão sob seus passos” (11:43).

Em Ezequiel:

“Os mercadores de Sheba e de Raama, eles [eram] os teus mercadores nos primeiros de todos os aromáticos, e em toda pedra preciosa, e em ouro” (27:22),

que significam igualmente as cognições da fé. Em David, onde se trata do Senhor, por conseguinte do homem celeste:

“Nos dias dEle florescerá o justo e [haverá] abundância de paz até que não haja mais lua... os reis de Tarshish e das ilhas levarão ofertas; os reis de Sheba e de Seba trarão dons” (Sal. 72:7,10);

pelas coisas que antecedem e seguem, vê‑se que essas expressões significam coisas celestiais da fé. Coisas semelhantes são significadas pela rainha de Sheba, que veio a Salomão, propôs‑lhe enigmas e trouxe‑lhe produtos aromáticos, ouro e pedras preciosas (I Reis 10:1‑3), pois todas as coisas  que estão nos históricos da Palavra, bem como nos Profetas, significam, representam e envolvem arcanos.

118.          Vers. 14: “E o nome do terceiro rio, Hiddekel, o que vai orientalmente para Asshur; e o quarto rio, ele é Phrath”. O “rio Hiddekel” é a razão ou a perspicácia da razão; “Asshur” é a mente racional; que o rio vá “orientalmente para Asshur” significa que a clareza da razão vem do Senhor, pelo homem interno, à mente racional, que pertence ao homem externo. “Phrath” ou “Eufrates” é o conhecimento, que é o último ou o termo.

119.          Que “Asshur” signifique a mente racional ou o racional do homem, vê‑se claramente nos Profetas, como em Ezequiel:

“Eis, Asshur [era] um cedro no Líbano, de ramos formosos, de bosque umbroso e alta estatura; e entre espessos [ramos] estava o seu broto. As águas fizeram‑na crescer, a profundeza das águas a exaltou, um rio corria ao redor de sua planta” (31: 3,4).

O racional é chamado “cedro no Líbano”; o “broto entre [ramos] espessos” significa os conhecimentos da memória, que são assim. Em Isaías é ainda mais claro:

“Naquele dia haverá uma vereda do Egito para Asshur, e virá Asshur ao Egito, e o Egito a Asshur, e os egípcios servirão a Asshur. Naquele dia, Israel será o terceiro com o Egito e Asshur, bênção no meio da terra, que Jehovah Zebaoth abençoará, dizendo: Bendito o meu povo, o Egito, e a obra de Minhas mãos, Asshur, e a Minha herança, Israel” (19:23‑25);

aí e em outros lugares, pelo “Egito” é significado o conhecimento; por “Asshur”, a razão; por “Israel”, a inteligência.

120.          Como o Egito, o Eufrates também significa a ciência ou os conhecimentos, bem como as coisas dos sentidos das quais provêm os conhecimentos. É o que se vê pela Palavra nos Profetas, como em Miquéias:

“Diz a inimiga: Onde está Jehovah teu Deus?... [No] dia em que Ele edificará as tuas muralhas; nesse dia, longe estará o estatuto; nesse dia, e até ti Ele virá de Asshur, e até às cidades do Egito e até o rio [Eufrates]” (7:10‑12);

assim falaram a respeito do Advento do Senhor, Que vai regenerar o homem para fazê‑lo semelhante ao celeste. Em Jeremias:

“Que há para ti no caminho do Egito, para beber as águas de Schichor? E que há para ti no caminho de Asshur, para beber as águas do rio [Eufrates]? (2:18),

onde o “Egito” e o “Eufrates” são tomados semelhantemente pelos conhecimentos e “Asshur” pelos raciocínios daí derivados. Em David:

“Fizeste sair uma vide do Egito, expulsaste as nações e a plantaste; ...estendeste a sua ramagem até o mar, e até o rio (Eufrates) os seus ramos” (Salmo 80:9,11),

onde também o rio Eufrates é tomado pelas coisas dos sentidos e dos conhecimentos. Com efeito, o Eufrates era o limite entre Asshur e os domínios de Israel, como o conhecimento da memória é o limite da inteligência e da sabedoria do homem espiritual e celeste. A mesma coisa é significada por estas palavras que foram ditas a Abraham:

“À tua semente darei esta terra, desde o rio do Egito até o rio grande, o rio Eufrates” (Gên. 15:18);

estes dois limites significam coisas semelhantes.

121.          Por esses rios pode‑se ver qual é a ordem celeste ou como procedem as coisas que pertencem à vida, a saber: procedem do Senhor, que é o Oriente. D'Ele vem a sabedoria, pela sabedoria a inteligência e pela inteligência a razão; assim, pela razão são vivificados os conhecimentos, que são da memória. Esta é a ordem da vida; tais são os homens celestes. Como os anciões de Israel representavam os homens celestes, por isso foram chamados “sábios, inteligentes e entendidos” (Deut. 1:13, 15). Semelhantemente se disse a respeito de Bezaleel, que construiu a arca,

“que era cheio do espírito de Deus, em sabedoria, em inteligência e em conhecimento [scientia], e em toda obra” (Êxodo 31:3, 35:31, 36:1,2).

122.          Vers. 15: “E tomou JehovahDeus o homem e pô-lo no jardim do Éden para cultivá‑lo e para guardá‑lo”. Pelo “jardim do Éden” são significadas todas as coisas que estão no homem celeste, das quais se trata aqui; por “cultivá‑lo e guardá‑lo” é significado que lhe foi concedido fruir de todas essas coisas, mas não possuí‑las como suas, porquanto são do Senhor.

123.          Que todas e cada uma das coisas sejam do Senhor, o homem celeste reconhece porque o percebe. O homem espiritual também o reconhece, todavia de boca, porque o sabe pela Palavra. O homem mundano e corpóreo não o reconhece nem o admite, mas diz que são suas todas as coisas que estão nele e pensa que pereceria  inteiramente, se as perdesse.

124.          Que a sabedoria, a razão e o conhecimento [scientia] não sejam do homem, mas do Senhor, vê‑se claramente pelo que Ele o ensinou, como em Mateus, onde Se compara ao Pai de família que plantou uma vinha, circundou‑a com uma sebe e arrendou‑a a agricultores (21:33). Em João:

“O Espírito da verdade vos conduzirá em toda a verdade; pois não falará por si mesmo, mas tudo o que ouvir, falará; ...ele Me glorificará, porque receberá do que é Meu, e vos anunciará” (16:13,14);

depois, no mesmo livro:

“Não pode o homem tomar coisa alguma a não ser que lhe seja dada do céu” (3:27).

Aquele a quem foi dado saber pelo menos uns poucos arcanos do céu, esse sabe que, assim, é.

125.          Vers. 16: “E JehovahDeus ordenou ao homem a respeito dele, dizendo: De toda árvore do jardim, comendo comerás”. “Comer de toda árvore” é conhecer e saber, pela percepção, o que é o bem e o vero, pois, como foi dito, a percepção é a “árvore”. As pessoas da Igreja Antiquíssimatinham, por meio de revelações, cognições da verdadeira fé, pois falavam com o Senhor e com os anjos. Também eram instruídas por visões e sonhos que lhes eram agradabilíssimos e paradisíacos. Tinham continuamente uma percepção vinda do Senhor, que era tal que, quando pensavam pelas coisas que eram da memória, logo percebiam se eram ou não conforme o vero e o bem, a ponto de que, quando o falso se apresentava, não só se desviavam, mas também lhe tinham horror. Tal é também o estado dos anjos. Mas, em lugar da percepção da Igreja Antiquíssima, sucedeu depois a cognição do vero e do bem pelas coisas reveladas antes, por conseguinte pelas coisas reveladas na Palavra.

126.          Vers. 17: “Mas da árvore da ciência do bem e do mal, não comerás dela, porque no dia em que comeres dela, morrendo morrerás”. Essas expressões, bem como as anteriores, significam que é permitido, por toda percepção vinda do Senhor, conhecer o que é o vero e o bem, mas não por si mesmo e pelo mundo, ou inquirir os mistérios da fé pelas coisas dos sentidos e dos conhecimentos, pelo que morre o celeste do homem.

127.          A vontade das pessoas de inquirir os mistérios da fé por meio das coisas dos sentidos e dos conhecimentos foi a causa da queda não só da Igreja Antiquíssima, isto é, de sua posteridade — de que se tratará no capítulo seguinte — mas também é a causa da queda de toda Igreja, pois daí procedem não só as falsidades, mas também os males da vida.

128.          O homem corpóreo e mundano diz em seu coração: “Se eu não for instruído a respeito da fé e das coisas que pertencem à fé, por meio dos sentidos para que eu veja, ou pelos conhecimentos para que eu entenda, não crerei”; e confirma‑se em que as coisas naturais não podem ser contrárias às espirituais. Por isso, quer instruir‑se pelos sentidos a respeito das coisas celestes e Divinas, o que, todavia, é tão impossível quanto um camelo passar pelo fundo de uma agulha. Quanto mais deseja saber por esse meio, mais se cega, até o ponto de não crer em mais nada, nem mesmo que exista algum espiritual ou a vida eterna. Isso vem do princípio que adotou. É isto que é “comer da árvore da ciência do bem e do mal”; quanto mais ele come dessa árvore, mais fica morto. Aquele, todavia, que não quer saber pelo mundo mas pelo Senhor, esse diz em seu coração que se deve crer no Senhor, isto é, nas coisas que o Senhor falou na Palavra porque são verdades, e, por este princípio, ele pensa. Ele se confirma pelas coisas racionais, científicas, sensuais e naturais, e as que não são confirmatórias, ele as separa.

129.          Qualquer um pode saber que os princípios adotados, até os mais falsos, governam o homem, e que todo conhecimento e todo raciocínio favorecem esses princípios, pois inúmeros assentimentos lhe ocorrem e, assim, ele se confirma nos falsos. Por isso, aquele cujo princípio é não crer em coisa alguma antes que veja e entenda, nunca pode crer, pois não vê as coisas espirituais e celestes com os olhos nem as compreende pela imaginação. Mas a ordem verdadeira é que a pessoa saiba pelo Senhor, isto é, pela Palavra; então todas as coisas sucedem e ela é esclarecida também nas coisas racionais e dos conhecimentos. Porquanto jamais se proibiu instruir‑se pelos conhecimentos, pois eles são úteis à vida e deleitáveis, e nem se proibiu aos que estão na fé pensar e falar como os eruditos do mundo, mas por este princípio: que creia na Palavra do Senhor e confirme as verdades espirituais e celestes pelas verdades naturais, tanto quanto possível em termos familiares ao mundo erudito. Portanto, o princípio será procedente do Senhor, não de si mesmo. Esta é a vida, mas aquela é a morte.

130.          Aquele que quer saber pelo mundo, seu “jardim” são as coisas do sentido e do conhecimento; seu “Éden” é o amor de si e do mundo; seu “oriente” é o ocidente ou ele mesmo; seu “rio Eufrates” é todo o seu conhecimento, que é condenado; o “outro rio”, onde está “Asshur”, é o raciocínio insensato e daí as falsidades; o “terceiro rio”, onde está “Cush” são os princípios do mal e do falso daí derivados, que são as cognições de sua fé; o “quarto” é a sabedoria derivada daí, que na Palavra se chama magia; por isso o “Egito”, que significa a ciência depois de esta ter‑se tornado magia, significa uma tal pessoa, e mesmo pelo fato de ela querer saber por si mesma, do que se fala em várias passagens na Palavra. Desses, assim se diz em Ezequiel:

“Assim disse o Senhor Jehovih: Eis que Eu estou contra ti, Faraó, rei do Egito, baleia grande, que se deita no meio de seus rios, que disse: Meu, o meu rio, e eu o fiz para mim; ...e estará a terra do Egito em solidão e devastação; e conhecerão que Eu sou Jehovah, por causa do que disse: Meu rio, e eu o fiz” (29:3,10).

Tais pessoas são também chamadas “árvore do Éden no inferno” no mesmo profeta, onde também se trata de Faraó ou do Egito, nestas palavras:

“...Quando o tiver feito descer ao inferno, com os que descem à cova... A quem te tornaste semelhante em glória e em grandeza entre as árvores do Éden? Quando tiveres de descer com as árvores do Éden à terra inferior, no meio dos incircuncisos, com os traspassados à espada. Este é Faraó e toda a sua turba” (31:16,18),

onde as “árvores do Éden” estão em lugar dos conhecimentos e das cognições provenientes da Palavra que, assim, profanam pelos raciocínios.

 



[1]     Shoham ou Schoham é, talvez, o mesmo que ônix.
[2]     Hiddekel ou Hidekkel= o mesmo que Tigris.
[3]     Asshur= Assíria.
[4]     Phrath= Eufrates.
[5]     Literalmente do hebraico = 'akolto'kel, repetição enfática do verbo comer que Swedenborg traduz para o latim como edendoedas.
[6]     Literalmente do hebraico = mothtamuth, ênfase do verbo morrer que Swedenborg traduz  moriendomorieris.

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A Criação da Mulher [VÍDEO]
“E JEHOVAH DEUS edificou a costela, que tomou do homem, em mulher, e a trouxe para o homem.” Aula gratuita!

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C. R. Nobre

 

Apósconquistarem a terra de Canaan, os filhos de Israel tiveram líderes ocasionais,chamados juízes, e um deles era também sacerdote e profeta. Ele se chamava Samuel. Como sacerdote, servia no tabernáculo; como profeta, transmitia ao povo as respostas de Deus e,como juiz,os liderava nas guerras. Assim, através da instrução e da liderança deSamuel, Deus mesmo era quem de fato governava o povo naqueles tempos.

Mas, quando Samuel envelheceu, os anciãos do povo vieram até ele, em Ramá, e disseram: “Dá-nos um rei, para que nos governe” (1Sm. 8:6). Eles tinham visto que as nações canaanitas ao redor tinham seus reishumanos, ao passo que eles tinham um governanteinvisível. Divino, sim, mas invisível, e não queriam mais essa forma de governo. Somente eles eram assim. Não queriam mais ser diferentes, e por isso pediram um rei.

Isso desagradou muito a Samuel, porémo Senhorlhe disse: “Atende à voz do povo em tudo quanto te diz, pois não te rejeitou a ti, mas a Mim, para Eu não reinar sobre ele.” (1Sm 8:7). O povo foi aindaalertado quanto aos pesares eas desvantagens que um rei humano lhe traria, mas insistiu no seu desejo. Então Samuel ungiu a Saul como o primeiro rei de Israel.

Naquele tempo Israel ainda estava na sua fase de infância como nação. Isto nos lembra do que sucede com os nossos filhos. Quando são ainda bebês, nós os carregamos no colo ou no carrinho. Assim que aprendem a andar, querem descer ao chão, e então caminhamconoscodocilmente, de mãos dadas. Mais um pouco, porém, quando já sentem firmeza nas perninhas, querem se soltar de nossas mãos e correr na frente, com o risco de ficarem perdidos.

Pois bem. No relato da criação da mulher aconteceu algo semelhante a isso. A princípio, nos primórdios da humanidade neste planeta, o povo antiquíssimo, homens, mulheres e crianças, estavamna suainocência e sabedoria,sendorepresentados pelo Homem, ou Adão, no Jardim do Éden. Mas passou-se o tempo e os descendentes se inclinaram a outra direção e já não queriam mais estar na primitiva integridade. Lemos no Gênesis:

E disse Jehovah Deus: Não é bom que o homem esteja só; far‑lhe‑ei um auxílio como se [estivesse] nele [tanquam apud illum].E formou Jehovah Deus, do humo, toda besta do campo, e toda ave dos céus, e (os) trouxe para o homem, para ver como lhes chamaria; e tudo o que o homem chamava a uma alma vivente, isso era o seu nome. E o homem chamava pelos nomes a toda besta, e à ave dos céus, e a toda fera do campo. E para o homem não se achou um auxílio como se [estivesse] nele.

Já temos visto e mostrado que os relatosbíblicos da criaçãonão podem ser entendidos literalmente. Assim também é o caso aqui, no relato da criação da mulher. Temos uma contradição se entendermos que a ‘mulher’ aqui éuma pessoa do sexo feminino, porquelemos que no fim do sexto diaambos os gêneros já tinham sido criados, pois Deus criou o homem “macho e fêmea”.

Outra razão por que não podemos interpretar literalmente o que está dito aqui é que seria estranho, até um absurdo, o fato de que Deus, em Sua infinita sabedoria, não soubesse que entre as espécies de animais e aves não se poderia encontrar um que pudesse servir de par adequado para o homem. Então, assim como nos relatos anteriores, a criação da mulher, aqui,é uma alegoria que envolve um significado espiritual

Já vimos que o “homem”, ou “adam”, em hebraico, significa ahumanidade ou raça antiquíssima, tanto homens como mulheres e crianças, e a religiosidade deleschamamosde Igreja Antiquíssima. A sabedoria daquela raçafoi representada pelo paraíso ou Jardim do Éden e tudo o que havia no Jardim. No princípio, aquele povo ou aquela igreja vivia em integridade, sem males hereditários ou ativos, e eram guiados em tudo por Deus, desde a inocência ignorância em que até a inocência da sabedoria, quando se tornavam anjos celestes.

Tinham percepção Divina, isto é, o Senhor lhes ensinava as verdades internamenteou os instruía por meio dos anjos. A instrução perceptiva foi representada pela árvore de vidas, da qual podiam comer.  Como eles na ordem da vida e na inocência, eramcomo crianças sábias guiadas por seu Pai celestial, assim como são os anjos dos céus mais altos.

Mas,diferentementedo animal irracional, o ser humano foi dotado da racionalidade, que é a capacidade de compreender a verdade e por esse modoser capaz de elevaro seu entendimento até a luz do céu; e teve a liberdade ou livre arbítrio, pelo qual faz a escolha de ser elevado ao céu ou permanecer homem corpóreo.  E é por causa do livre arbítrio que o ser humano é criado na Terra e não já no céu, pois assim ele pode ou não responder ao propósito Divino. Se quiser se deixar conduzir pelo Criador, ela participa desse propósito e, ao receber a vida celeste, ela a sente como sua e não como se lhe fosse imposta. 

E é evidente, também, que criar o ser humano dotado de livre-arbítrio implicava num risco: o risco de que o homem rejeitasse essepropósito Divino. Mas não havia alternativa.Ou o homem teria essas duas condições, racionalidade e liberdade, ainda que abusasse delas, ou as não teria, mas, nesse caso seria como um ser irracional ou um autômato. Então, a possibilidade de o homem vir a abusar do livre arbítrio e fazer opção pelo mal era um risco calculado e foi previsto, caso contrário a liberdade humana seria uma falácia. E quando dizemos que foi previsto, não significa que era desejável, mas, sim, inevitável. Tudo o que Deus fez e faz é bom, mas o homem criou e faz o mal. E, por causa do livre arbítrio, Deus permite o mal, mas, em Sua misericórdia, Ele impõe uma condição: o mal só é permitido se daí se puder tirar um bem que supere o mal.

E foi isso, então, que aconteceu. Não sabemos se se passaram milhares ou milhões de anos, até que aquele povo, no uso e abuso do livre arbítrio, enjoou, por assim dizer, daquela vida de integridade de seus ancestrais, e acabaram fazendo como os filhos de Israel iriam fazer mais tarde: queriam outra forma de governo. Ou como faz uma criancinha de três anos, quando quer se soltarda mão do pai e ir sozinha adiante, mesmo sem saber ainda para onde.

Pois lemos que a criação da mulher significa “o proprium que foi concedido ao homem”, porque o ser humano se tornoutal que não se contentava mais em ser conduzido pelo SENHOR, mas desejava guiar-se também por si mesmo e pelo mundo, ou pelo proprium. Esse termo, “proprium” é utilizado nos Escritos de Swedenborg para indicaro ser mesmo do indivíduo ou seu ego.

Essa descendência da raça antiquíssima, não se contentando mais com o fato de que neles tudo era do Divino, desejoucada vez mais asensação de que tinha uma vida independente da Divina, como se a vida estivesse nelese não em Deus, ou não somente em Deus.

Essa inclinação ou ambição por terem a vida como sua está descritana frase: “Não é bom que o homem esteja só”. É dito assim, como se Deus estivesse falando, porque é comum, na Palavra, que sentimentos e palavras do homem sejam atribuídos a Deus, para que possamos compreender o que se passa no íntimo do indivíduo. “Não é bom estar só” quer dizer que o homem não achava mais tão bom estar a sós com Deus. Porque, no começo, a raça antiquíssima estava só, por assim dizer, porque era somente o homem falando com seu Deus, sem algo do ego humano se interpondo. Era como o povo de Israel, antes de desejar ter um rei. Naquele tempo, o profeta antigo Balaão, contemplando o acampamento israelita, disse: “Vejo Israel... Eis que é povo que habita só e não será reputado entre as nações.” (Núm. 23:9). Agora, porém, para aquela descendência, o “habitar só com Deus” já não parecia mais tão desejável. Não queriam mais ser em tudo dirigidos pelo Criador.

“E disse Jehovah Deus: Não é bom que o homem esteja só; far‑lhe‑ei um auxílio como se [estivesse] nele.” Então, assim como Deus concedeu o desejo dos filhos de Israel e lhes ungiu um rei, assim também Ele concedeu ao homem antiquíssimo essa sensação de vida própria, como se a vida estivesse nele.

Neste ponto, as traduções da Bíblia trazem muitas variações, nem uma sendo igual à outra: “far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea”, “far-lhe-ei uma adjutora que esteja como diante dele”, “farei para ele alguém que o ajude e a ele corresponda”, e assim por diante. Mas Swedenborg traduz literalmente o hebraico, que é: “far-lhe-ei um auxílio como se nele”, porque é assim exatamente que o propriumé para o homem, uma sensação tal como se a vida estivesse nele.

Lemos que Deus trouxe os animaise o homem pôs nomes em cada um deles, mas não se achou um que fosse esse auxílio. Isto, também, é uma alegoria, porque as criaturas irracionais, conforme já vimos, significam na Palavra coisas do entendimento e da vontade. Os animais significam as afeições da vontade, e as aves e peixes, os conhecimentos e fatos do entendimento. “Nomear os animais” significa conhecer a qualidade das afeições e dos conhecimentos.

Quer dizer que os antiquíssimos tinham autoconhecimento e percebiam os estados interiores de sua mente, as afeições e os pensamentos oriundos delas, mas, ao mesmo tempo, sentiam que todos aquelessentimentos e ideias eram coisas Divinas, e, portanto, não davam ao homem antiquíssimo a sensação de vida própria.  E lemos (AC 146): “Embora lhe fosse concedido conhecer a sua qualidade quanto às afeições do bem e aos conhecimentos do vero, ele, porém, ainda ambicionava um proprium. Com efeito, os que são tais que desejam um proprium começam a desprezar as coisas que são do SENHOR, de qualquer modo que elas lhes sejam representadas e demonstradas.”.

“E JEHOVAH DEUS fez cair um sono profundo sobre o homem, e este adormeceu. E tomou uma das costelas dele, e cerrou a carne em seu lugar”.“Pela “costela”, que é o osso do peito, se entende o proprium do homem, em que há pouca coisa de vital”. A mulher feita de um osso, da costela, quer dizer que o proprium é relativamente morto, porque a vida não é inerente ao homem, mas vem de fora. Só existe e só pode existir uma única origem e Fonte de vida, a vida Divina, e todas as criaturas no universo são recipientes dessa Vida única.

Lemos nos Arcanos: “Quando visto do céu, o proprium do homem aparece inteiramente como alguma coisa óssea, inanimada e muito disforme, portanto morta em si mesma. Mas, vivificado pelo SENHOR, mostra se como carne. Pois o proprium do homem não é outra coisa senão o que é morto em si mesmo, ainda que lhe pareça ser alguma coisa e, de fato, como se fosse tudo. Tudo o que vive nele, vive pela vida do SENHOR, a qual, se fosse retirada, ele cairia morto como uma pedra, pois ele é só um órgão de vida; mas tal é o órgão, tal é a afeição da vida. Somente o SENHOR tem um Proprium; pelo Proprium Ele redimiu o homem e pelo Proprium Ele salva o homem. O Propriumdo SENHOR é a Vida; pelo proprium do SENHOR é vivificado o proprium do homem, que é morto em si.”

A“carne” ser fechada no lugar da costela tiradasignificaque o Senhor, por Sua misericórdia,vivifica o propriumdo homem lhe dá algo de vital, que é a sensação de que tem a vida em si. E é uma sensação tão forte que o homem não crê outra coisa senão que a vida é dele. Essa ilusão de vida inerente a si é representada pelo“sono profundo”,em que o homem foi posto, porque, enquanto o homem tem essa aparência de que vive por si mesmo, independentemente de Deus, é como se ele dormisse. Quando, porém, se torna espiritual e percebe que toda vida vem da Vida mesma, que é Divina, é como se despertasse para a realidade.

“E JEHOVAH DEUS edificou a costela, que tomou do homem, em mulher, e a trouxe para o homem.”Aquela descendência dos antiquíssimos ambicionava um proprium, e este lhe foi concedido.

“E disse o homem: Esta, agora, é osso dos meus ossos e carne da minha carne; por causa disso será chamada esposa, porque do varão ela foi tomada. Por isso deixará o varão seu pai e sua mãe, e ligar‑se‑á à sua esposa, e serão uma [só] carne.”

Notemos que essas palavras foram ditas pelo homem. Ele diz que a mulher vem dos ossos dele e da carne dele, mas, de fato, delefoi tomadosomente o osso, que é o proprium. A carne não veio dele, mas foi provida pelo Senhor, porque a “carne” significa que esse propriumdo homem foi de algum modo vivificado por Deus. Veio,portanto, do Proprium Divino, a “Carne” Divina, que simboliza o Seu Divino Amor. Por isso na Santa Ceia o Senhor chama o Seu amor e a Sua sabedoria de Sua carne e Seu sangue.

Em resumo, essa sensação que a pessoa tem de que a vida lhe é inerente e que lhe dá personalidade, caráter, desejos etc., é o tal proprium, que em si é morto como um osso. Quando, porém, o homem é regenerado e aprende que ele nada é e que deve sua vida ao Senhor, então o Senhor reveste o seu ser, o seu ego, com uma vontade nova, a caridade, que vem do amor Divino, e, embora o homem conserve a sua natureza, por causa dos atributos Divinos que ele recebe, ele se torna uma forma humana celeste, tão bela e agradável que é representada neste relato pela beleza de uma mulher.

O nome dado à mulher “Eva”, “Havah”, quer dizer “aquela que dá a vida”, como uma mãe, porque o proprium dá ao homem essa sensação de vida, como se a vida estivesse nele e não em Deus. 

“E estavam ambos nus, o homem e a esposa dele, e não se envergonhavam.”A nudez dessa descendência,sem que se envergonhassem disso ,significa que aquela descendência, apesar de se ter inclinado para um próprio, não era, contudo, má, mas ainda era boa. A nudez deles representa o estado de inocência, não tanto como a dos antiquíssimos, seus antepassados, mas ainda inocência, a qual o Senhor insinuou no proprium, para torná-lo mais agradável. Esse abrandamento ou essa suavização do proprium foirepresentado, portanto, pela beleza da forma feminina.

“Caridade e inocência são coisas que não só desculpam o proprium, ou o mal e o falso no homem, mas o anulam, por assim dizer. É como qualquer um pode ver pelas crianças: quando elas se amam mutuamente e aos pais, e, ao mesmo tempo a inocência infantil brilha, então os males e falsos mesmos não só não se mostram, mas também são agradáveis.

Daí se pode saber que ninguém pode ser admitido no céu a não ser que tenha alguma inocência... Que a “nudez de que não se envergonhavam” signifique a inocência, vê se claramente pelas coisas que se seguem; quando eles se afastaram da integridade e da inocência, então se envergonharam da nudez e ela lhes pareceu opróbrio, pelo que se esconderam".

O desvio do gênero para o mal vai ocorrer mais tarde, na história da tentação e queda do homem, no capítulo seguinte.

Concluindo, lemos nos Arcanos: “Estas são as coisas que a Palavra contém neste capítulo, mas as que foram expostas são poucas. E, como se trata do homem celeste, que hoje quase ninguém conhece, estas poucas coisas não podem deixar de parecer um tanto obscuras.Mas, se alguém soubesse quantos arcanos estão contidos em cada versículo, ficaria espantado. São tantos os arcanos ali contidos que seria impossível contá-los. Isso se manifesta muito pouco na letra.” (AC 166, 167).


 

Arcanos Celestes,131 a 167

 

18.   E disse Jehovah Deus: Não é bom que o homem esteja só; far‑lhe‑ei um auxílio como se [estivesse] nele [tanquam apud illum].

19.   E formou Jehovah Deus, do humo, toda besta do campo, e toda ave dos céus, e (os) trouxe para o homem, para ver como lhes chamaria; e tudo o que o homem chamava a uma alma vivente, isso era o seu nome.

20.   E o homem chamava pelos nomes a toda besta, e à ave dos céus, e a toda fera do campo. E para o homem não se achou um auxílio como se [estivesse] nele.

21.   E Jehovah Deus fez cair um sono profundo sobre o homem e este adormeceu. E tomou uma das costelas dele, e cerrou a carne em seu lugar.

22.   E Jehovah Deus edificou a costela que tomou do homem em mulher, e a trouxe para o homem.

23.   E disse o homem: Esta, agora, é osso dos meus ossos e carne da minha carne; por causa disso será chamada esposa, porque do varão ela foi tomada.

24.   Por isso deixará o varão seu pai e sua mãe, e ligar‑se‑á à sua esposa, e serão uma [só] carne.

25.   E estavam ambos nus, o homem e a esposa dele, e não se envergonhavam.


 

Conteúdo
131.        Trata‑se da descendência da Igreja Antiquíssima, que ambicionava um proprium.

132.        Aqui se trata do proprium que foi concedido ao homem, porque ele é tal que não se contenta em ser conduzido pelo Senhor, mas deseja guiar‑se também por si mesmo e pelo mundo, ou pelo proprium; vers. 18.

133.        Primeiramente lhe é dado conhecer as afeições do bem e as cognições do vero concedidas a ele pelo Senhor, mas ainda ambiciona um proprium; vers. 19 e 20.

134.        Por isso, é posto no estado do proprium e lhe é dado um proprium, que é descrito pela costela edificada em mulher, vers. 21 a 23.

135.        Então a vida espiritual e celeste é adjunta a um proprium, para que pareçam um; vers. 24.

136.        E a inocência é insinuada pelo Senhor no proprium para que não fosse sempre desagradável; vers. 25.

 

Sentido Interno
137.        Em três capítulos de Gênesis se trata em geral da Igreja Antiquíssima, que é chamada “homem”, desde seu primeiro tempo até o último, quando pereceu. Na parte precedente deste capítulo tratou‑se de seu estado mais florescente, quando era homem celeste; aqui e agora se trata dos seus descendentes, que ambicionavam um proprium.

138.        Vers. 18: “E disse JehovahDeus: Não é bom que o homem esteja só; far‑lhe‑ei um auxílio como se [estivesse] nele [tanquam apud illum]”. Por “estar só” é significado que ele não se contentava mais em ser conduzido pelo Senhor, mas desejava sê‑lo por si mesmo e pelo mundo. Pelo “auxílio como se [estivesse] nele” é significado o proprium que, na sequência, também é chamado “costela edificada em mulher”.

139.        Nos tempos antigos, “habitar sós” se dizia dos que eram conduzidos pelo Senhor, como o eram os homens celestes, porque os males ou maus espíritos não mais os infestavam. Isso também foi representado na Igreja Judaica pelo fato de os judeus habitarem sós, depois de haverem expulsado as nações. Por isso, algumas vezes se diz na Palavra, sobre a Igreja do Senhor, que ela é só, como em Jeremias:

“Levantai‑vos, subi a uma nação sossegada, que habita em segurança... não tem portas, e não tem ferrolhos; sós eles habitam” (49:31).

Na profecia de Moisés:

“Israel habitará seguro, só” (Deut. 33:28);

o que está ainda mais claro na profecia de Bileam [Balaão]:

“Eis o povo; só habita, e entre as nações não é contado” (Núm. 23:9),

onde as “nações” estão em lugar dos males. Essa descendência da Igreja Antiquíssima não quis habitar só, isto é, não quis ser homem celeste ou ser conduzida pelo Senhor como o homem celeste, mas quis estar entre as nações, como a Igreja Judaica. E como teve esse desejo, é dito: “não é bom que o homem esteja só”; porque já está no mal aquele que o deseja, e isso lhe é concedido.

140.        Que pelo “auxílio como se [estivesse] nele” seja significado o proprium, pode‑se ver pela natureza do proprium e pelo que se segue. Mas como esse homem da Igreja, do qual agora se trata, era de boa índole, foi‑lhe concedido um proprium, mas um tal que parecesse seu; por isso é dito “auxílio como se [estivesse] nele”.

141.        A respeito do proprium, podem‑se dizer inúmeras coisas, a saber, como é o proprium no homem corpóreo e mundano, como é no homem espiritual e como no homem celeste. No homem corpóreo e mundano, o proprium é tudo o que lhe pertence, pois ele não conhece outra coisa senão o proprium; se perdesse o proprium — como foi dito — pensaria ter perecido. No homem espiritual, também aparece um proprium semelhante, pois ele, ainda que saiba que o Senhor é a vida de todos, que Ele dá a sabedoria e a inteligência, por conseguinte o pensar e o agir, e que sempre diga isto, todavia não crê assim. O homem celeste, porém, reconhece que o Senhor é a vida de todos, que Ele dá o pensar e o agir, pois percebe que, assim, é; e nunca deseja um proprium; e, ainda que não deseje tal, contudo o Senhor lhe dá um proprium que foi conjunto com toda percepção do bem e do vero e a toda felicidade. Os anjos estão em um tal proprium e, portanto, em suprema paz e tranquilidade, porque no proprium deles há as coisas que são do Senhor, Quem dirige esse proprium deles, ou os dirige por meio do proprium. Esse proprium é o celeste mesmo;  o proprium do homem, todavia, é corpóreo e infernal. A respeito do proprium, porém, serão ditas mais coisas no que se segue.

142.        Vers. 19 e 20: “E formou JehovahDeus, do humo, toda besta do campo, e toda ave dos céus, e (os) trouxe para o homem, para ver como lhes chamaria; e tudo o que o homem chamava a uma alma vivente, isso era o seu nome. E o homem chamava pelos nomes a toda besta, e à ave dos céus, e a toda fera do campo. E para o homem não se achou um auxílio como se [estivesse] nele.”  Pelas “bestas” são significadas as afeições celestes; pelas “aves do céu”, as espirituais; ou, pelas “bestas” as coisas que são da vontade, e pelas “aves” as que são do entendimento; “trazer para o homem para ver como lhes chamaria os nomes” é dar‑lhe a conhecer a qualidade delas; e que os tenha “chamado pelos nomes” é que ele conheceu a qualidade delas. E embora soubesse quais eram as afeições do bem e as cognições do vero dadas pelo Senhor, ainda assim ambicionava um proprium, o que é expresso, do mesmo modo que antes, por “não se achou um auxílio como se [estivesse] nele”.

143.        Hoje, pode parecer estranho que pelas “bestas” e pelos “animais” se designaram, na antiguidade, afeições e coisas semelhantes no homem. Mas, porque então as pessoas se achavam na ideia celeste, e como também essas coisas são representadas por animais no mundo dos espíritos, e, na verdade, por animais aos quais elas são semelhantes, por essa razão eles não entendiam outra coisa quando falavam assim. Na Palavra, em toda parte em que se nomeiam as bestas, quer em geral, quer em particular, não se entendem outras coisas. Toda a Palavra profética está repleta de expressões semelhantes. Por isso, quem não sabe o que cada besta significa em particular não pode jamais  entender o que a Palavra contém no sentido interno. Mas, como foi dito antes, as bestas são de dois gêneros: as más, por serem nocivas, e as boas, por serem inofensivas. Pelas boas, como as ovelhas, os cordeiros e os pombos, são significadas as afeições do bem; aqui é semelhante, porque se trata do celeste ou do homem celeste e espiritual. Que as “bestas” em geral signifiquem as afeições é o que já foi confirmado por algumas passagens da Palavra, como foi visto anteriormente nos nºs 45 e 46, de modo que não há mais necessidade de confirmá‑lo.

144.        Que “chamar pelo nome” signifique conhecer a qualidade: saiba ‑se que pelo “nome” os antigos não entendiam outra coisa senão a essência da coisa, e por “ver e chamar pelo nome” entendiam conhecer a qualidade. Era por essa razão que davam aos seus filhos e filhas nomes em conformidade com as coisas que eram significadas, pois cada nome encerrava alguma coisa singular da qual e pela qual conheciam a origem e a qualidade, como também se verá pelas coisas que se seguem, onde se tratará, pela Divina misericórdia do Senhor, dos doze filhos de Jacob. Como, pois, os nomes encerravam a origem e a qualidade, por “chamar pelo nome” não entendiam outra coisa. Essa locução lhes era familiar, e quem a não compreende fica admirado de que tais coisas sejam significadas.

145.        Na Palavra também, pelo “nome” é significada a essência da coisa, e por “ver e chamar pelo nome” é significado conhecer a qualidade, como em Isaías:

“Dar‑te‑ei os tesouros das trevas, e as riquezas escondidas dos ocultos, para que saibas que Eu sou Jehovah, que te chamo pelo teu nome, Deus de Israel, Meu eleito, e chamei‑te pelo teu nome, pus‑te sobrenome, e não Me conheceste” (45:3,4);

aí, por “chamar pelo nome” e “pôr sobrenome” é significado saber de antemão a qualidade. No mesmo profeta:

“Chamar‑te‑ás por um nome novo, que a boca de Jehovah declarará” (62:2);

isto é, que se tornaria outro, como se vê pelo que ali antecede e se segue. No mesmo:

“Ó Israel, não temas, pois te redimi, chamei‑te por teu nome, tu és Meu” (43:1),

isto é, que Ele conhecia a qualidade. Novamente, no mesmo:

“Erguei para o alto os vossos olhos e vede quem criou estas coisas, que faz sair em número o exército deles, chamará a todos pelo nome” (40:26),

isto é, que Ele conhece a todos. No Apocalipse:

“Tens uns poucos nomes em Sardes que (não) contaminaram suas vestes... O que vencer será revestido de vestes brancas, e não riscarei o seu nome do livro da vida, e confessarei o seu nome diante de Meu Pai, e diante dos Seus anjos” (3:4,5).

Em outro lugar:

“Aqueles cujos nomes não foram escritos no Livro da Vida do Cordeiro” (13:8).

Nestas passagens, pelos “nomes” não se entendem nomes, mas qualidades; nem é o nome de alguém jamais conhecido no céu, mas a sua qualidade.

146.        Por aí se pode ver a conexão das coisas que são significadas: no versículo 18 é dito que “não é bom que o homem esteja só; far‑lhe‑ei um auxílio como se [estivesse] nele” e logo depois se trata das bestas e aves, das quais, entretanto, se falara precedentemente, e se diz o mesmo imediatamente a seguir, que “para o homem não se achou um auxílio como se [estivesse] nele”. Isto significa que, embora lhe fosse concedido conhecer a sua qualidade quanto às afeições do bem e aos conhecimentos do vero, ele, porém, ainda ambicionava um proprium. Com efeito, os que são tais que desejam um propriumcomeçam a desprezar as coisas que são do Senhor, de qualquer modo que elas lhes sejam representadas e demonstradas.

147.        Vers. 21: “E JehovahDeus fez cair um sono profundo sobre o homem, e este adormeceu. E tomou uma das costelas dele, e cerrou a carne em seu lugar”. Pela “costela”, que é o osso do peito, se entende o proprium do homem, em que há pouca coisa de vital, e, na verdade, um proprium que lhe é caro; pela “carne em lugar da costela” se entende o proprium em que há o vital; pelo “sono profundo” se entende esse estado em que o homem foi posto, para que lhe parecesse ter um proprium, estado esse que é semelhante ao sono, porque nesse estado não sabe outra coisa senão que vive, pensa, fala e age; quando, todavia, começa a saber que isso é falso, então acorda como de um sono e está em vigília.

148.        Que o proprium do homem, e, na verdade, um proprium que lhe é caro, seja designado pela costela, que é o osso do peito, é porque entre os antiquíssimos o peito significava a caridade, pois que ali se acham o coração e os pulmões. E os “ossos” significavam as coisas que têm menos valor, porque neles há um mínimo de vital. A “carne”, porém, significava coisas que têm algum vital. A causa dessas significações é um profundo arcano conhecido dos antiquíssimos do qual se falará na sequência, pela Divina misericórdia do Senhor.

149.        Na Palavra, também, o proprium é significado pelos “ossos”, e mesmo um proprium vivificado pelo Senhor, como em Isaías:

“Jehovah... saciará nas sequidões a tua alma, e mesmo teus ossos fortificará; e serás como um jardim irrigado” (58:11).

No mesmo:

“Então vereis, e alegrar‑se‑á o vosso coração, e os vossos ossos germinarão como a erva” (66:14).

Em David:

“Todos os meus ossos dirão: Ó Jehovah, quem é como Tu?” (Sal. 35:10).

É ainda mais evidente em Ezequiel onde se diz que os ossos receberiam carne e neles seria introduzido um espírito:

“A mão de Jehovah... me pôs no meio do vale, e ele estava cheio de ossos... e disse‑me: Profetiza sobre estes ossos, e dize ‑lhes: Ó ossos secos, ouvi a Palavra de Jehovah; assim diz o SenhorJehovah a esses ossos: Eis que Eu faço vir um espírito sobre vós, e vivereis; e porei nervos sobre vós, e farei subir carne sobre vós, e estenderei sobre vós pele, e porei em vós um espírito. e vivereis, e sabereis que eu sou Jehovah” (37:1, 4‑6).

[2]  Quando visto do céu, o proprium do homem aparece inteiramente como alguma coisa óssea, inanimada e muito disforme, portanto morta em si mesma. Mas, vivificado pelo Senhor, mostra‑se como carne. Pois o proprium do homem não é outra coisa senão o que é morto em si mesmo, ainda que lhe pareça ser alguma coisa e, de fato, como se fosse tudo. Tudo o que vive nele, vive pela vida do Senhor, a qual, se fosse retirada, ele cairia morto como uma pedra, pois ele é só um órgão de vida; mas tal é o órgão, tal é a afeição da vida. Somente o Senhor tem um proprium: pelo proprium Ele redimiu o homem e pelo proprium Ele salva o homem. O proprium do Senhor é a Vida; pelo proprium do Senhor é vivificado o proprium do homem, que é morto em si. O proprium do Senhor é também significado por estas palavras do Senhor em Lucas:

“Um espírito não tem carne e ossos como Me vedes ter” (24: 39,40).

É significado também pelo fato de que “o osso do cordeiro pascoal não seria quebrado” (Êx. 12:46).

150.        O estado do homem quando está no proprium ou quando crê viver por si mesmo é comparado a um sono profundo, e até era chamado sono profundo pelos antigos. Na Palavra, é dito que o espírito de um sono profundo foi derramado sobre eles [Isaías 29:10] e dormiram. Que o proprium do homem seja morto em si, ou ele não tenha vida alguma por si mesmo, isto foi mostrado no mundo dos espíritos a um tal ponto, que os espíritos maus — que nada mais amam senão o proprium, e insistem obstinadamente que vivem por si mesmos — foram convencidos por viva experiência e reconheceram que não vivem por si mesmos. [2] Foi‑me concedido, já há alguns anos, saber mais do que qualquer outro como se dá o caso com o proprium do homem, isto é, que não tenho pensado a menor coisa por mim mesmo, e me foi dado perceber claramente que toda ideia do pensamento influía, e, algumas vezes, de que maneira e de onde ela influía. Por isso, o homem que crê que vive por si mesmo está no falso, e isso pelo fato de que aquele que crê que vive por si mesmo, apropria‑se de todo mal e falso, dos quais ele nunca se apropriaria se cresse como as coisas são.

151.        Vers. 22: “E JehovahDeus edificou a costela, que tomou do homem, em mulher, e a trouxe para o homem.” Por “edificar” é significado erguer o que caiu; por “costela” um proprium não vivificado; por “mulher” um proprium vivificado pelo Senhor; por “trazer para o homem”, que um proprium lhe foi dado. Como a descendência dessa Igreja não quis ser homem celeste como o foram seus pais, mas quis conduzir‑se a si mesma, e, assim, ambicionava um proprium, este lhe foi concedido, mas vivificado pelo Senhor. Por isso, o proprium é chamado “mulher” e, depois, “esposa”.

152.        Qualquer um que reflita apenas levemente pode saber que a mulher não veio da costela do varão, e que estas palavras envolvem mais arcanos do que alguém jamais soube até hoje. E que o proprium seja significado pela mulher, pode‑se saber por isto, que a mulher é que foi enganada, pois nada jamais engana o homem a não ser o proprium ou, o que é a mesma coisa, o amor de si e do mundo.

153.        Diz‑se “costela edificada em mulher”, mas não que a mulher foi criada ou formada ou feita, como precedentemente, onde se tratou da regeneração. Que tenha sido dito “edificada” a causa vem de que “edificar” significa erguer aquilo que havia caído. Na Palavra ocorre de modo semelhante onde “edificar” se diz dos males, “erigir” se diz dos falsos, e “renovar” se diz de uns e outros, como em Isaías:

“Edificarão as devastações da eternidade, as primeiras desolações erigirão, e renovarão as cidades da devastação, as desolações de geração e geração” (61:4);

as “devastações”, aqui e em outros lugares, designam os males; as “desolações”, os falsos; àqueles se aplica o vocábulo “edificar” e a estes, “erigir”, como em outro lugar também nos profetas, onde esta relação é  cuidadosamente observada. Em Jeremias:

“Ainda te edificarei, para que sejas edificada, ó virgem de Israel” (31:4).

154.        Nada de mal e falso pode jamais existir que não seja o proprium e proveniente do proprium, pois o proprium do homem é o mal mesmo, donde o homem nada é senão o mal e o falso. Isto se tornou evidente para mim pelo fato de que os propria, quando se apresentam à vista no mundo dos espíritos, aparecem tão disformes, que é impossível figurar‑se algo mais disforme, com diversidade segundo a natureza do proprium, de sorte que aquele a quem os seus propria se apresentam à vista têm horror de si mesmos e querem fugir como de um diabo. Mas, ao contrário, os propria que foram vivificados pelo Senhor aparecem belos e formosos, com variedade segundo a vida à qual o celeste do Senhor pode ser aplicado. E, na verdade, os que foram dotados de caridade, ou foram por ela vivificados, aparecem como meninos e meninas com faces formosíssimas; e os que o foram pela inocência aparecem como criancinhas nuas adornadas de vários modos, cingidas com grinaldas de flores à volta do peito, com diademas em torno de suas cabeças, vivendo e brincando numa aura diamantina, com a percepção de uma felicidade que vem dos íntimos.

155.        Estas palavras, que “a costela foi edificada em mulher”, encerram mais coisas intimamente ocultas do que jamais se poderia saber pela letra. Porque a Palavra do Senhor é tal que nos íntimos se refere ao Senhor mesmo e ao Seu Reino, de onde procede toda a vida da Palavra. Aqui, semelhantemente, há o casamento celeste que é referido nos íntimos. O casamento celeste é tal que está no proprium, e um proprium vivificado pelo Senhor é chamado Noiva do Senhor e Esposa. O proprium assim vivificado pelo Senhor tem a percepção do bem do amor e do vero da fé; assim, tem toda sabedoria e inteligência conjuntas com uma felicidade inefável. Mas a qualidade desse proprium vivificado que se chama Noiva e Esposa do Senhor não pode ser descrita em poucas palavras. Dir‑se‑á somente que os anjos percebem que vivem pelo Senhor e, quando não refletem, não sabem outra coisa senão que vivem por si. Mas há uma afeição geral tal que, quando eles se afastam do bem do amor e do vero da fé, mesmo na mínima coisa, percebem uma mudança. Por isso, estão em sua paz e felicidade, que é inefável, quando estão na percepção geral de que vivem pelo Senhor. É este proprium que também se entende em Jeremias, onde se diz:

“Criou Jehovah algo novo na terra: uma mulher cercará um varão” (31:22);

aqui também, é o casamento celeste que é significado; pela “mulher” é significado um proprium vivificado pelo Senhor; “cercar” se diz a respeito da mulher, pois o proprium é tal que cerca (ou circunda), como a costela tornada carne circunda o coração.

156.        Vers. 23: “E disse o homem: Esta, agora, é osso dos meus ossos, e carne da minha carne; por causa disso será chamada esposa, porque do varão foi tomada”. “Osso dos meus ossos, e carne da minha carne” significa o proprium do homem externo; “osso” o proprium não tão vivificado; “carne”, o proprium vivificado; “varão”, porém, significa o homem interno que, como é ligado ao homem externo — como será dito no versículo seguinte — esse proprium, que antes era “mulher”, é aqui chamado “esposa”; “esta, agora” significa que se tornou assim, porque o estado foi mudado.

157.        Como “osso dos ossos e carne da carne” significava o proprium do homem externo no qual está o interno, na antiguidade chamavam‑se “osso dos ossos” e “carne da carne” a todos os que podiam ser chamados proprium, quer fossem da mesma casa ou da mesma família, ou entre si relacionados por algum parentesco, como Jacob e Labão:

“Verdadeiramente, meu osso e minha carne és tu” (Gên. 29:14).

Abimelech, dirigindo‑se aos irmãos de sua mãe e à família da casa do pai de sua mãe, disse:

“Recordai‑vos que eu sou osso vosso e carne vossa” (Juízes. 9:1-3).

Também as tribos de Israel, falando de si mesmas, a David:

“Eis‑nos aqui, nós somos osso teu e carne tua” (II Sam. 5:1).

158.        Que “varão” signifique o interno do homem ou, o que é a mesma coisa, o inteligente e o sábio, vê‑se em Isaías:

“Eu olho, e nenhum varão, e dentre eles nenhum conselheiro” (41:28),

isto é, não há sábios e inteligentes. Em Jeremias:

“Correi pelas praças de Jerusalém, e vede... se achais um varão, se há um que faça o juízo, que busque a verdade” (5:1);

“o que faz juízo” se diz do sábio, e “o que busca a verdade” se diz do inteligente.

159.        Mas não se percebe facilmente como são essas coisas, a não ser que se saiba qual é o estado do homem celeste. O estado do homem celeste é tal que o homem interno é distinto do externo, e mesmo a ponto de ele perceber as coisas que são do interno e as que são do externo, e de que maneira o externo é governado pelo Senhor por meio do interno. Todavia, o estado dessa descendência foi tão mudado por ter ela desejado um proprium, que é do homem externo, que não percebia mais que o homem interno fosse distinto do externo, mas acreditava que o interno fosse um com o externo, pois tal se torna a percepção quando se deseja um proprium.

160.        Vers. 24: “Por isso deixará o varão seu pai e sua mãe, e ligar-se‑á à sua esposa, e serão uma [só] carne”. “Deixar pai e mãe” é o homem interno, pois é o interno que concebe e pare o externo; “ligar‑se à esposa” é que o interno esteja no externo; “em uma [só] carne” é que estejam ali juntos. E como antes o interno era espírito e pelo interno o externo, agora se tornaram “carne”. Assim a vida celeste e espiritual foi associada a um proprium como se fossem um.

161.        Essa descendência da Igreja Antiquíssima não era má, mas ainda boa. E, como desejava viver no homem externo ou no proprium, este lhe foi dado pelo Senhor, mas, por misericórdia, foi‑lhe insinuado o celeste espiritual. Não se pode saber de que maneira o interno e o externo fazem um ou de que maneira aparecem como um, a não ser que se conheça o influxo de um no outro. Só para que se tenha uma ideia, seja, por exemplo, a ação: se nela não houver a caridade ou o amor e a fé, e nestes, o Senhor, a ação não é uma ação que se possa chamar obra da caridade ou fruto da fé.

162.        Todas as leis do vero e da retidão fluem de princípios celestes ou da ordem da vida do homem celeste, pois todo o céu é um homem celeste nisto, que só o Senhor é o Homem Celeste e é Tudo em todas e cada uma das coisas do céu e do homem celeste. Daí é que elas se chamam celestes. Porque toda lei do vero e da retidão, principalmente a lei dos casamentos, descende de princípios celestes, ou da ordem da vida do homem celeste. Há um casamento celeste do qual e segundo o qual serão todos os casamentos nas terras. Esse casamento é tal que há Um só Senhor e um só céu, ou uma só Igreja cuja cabeça é o Senhor. Daí vem a lei dos casamentos, que serão entre um varão e uma esposa. E, quando os casamentos são assim, representam o casamento celeste e são um exemplar do homem celeste. Essa lei foi não só revelada aos varões da Igreja Antiquíssima, mas também inscrita no seu homem interno. Por isso o varão tinha, então, uma só esposa e constituía uma só casa. Todavia, quando seus descendentes deixaram de ser homens internos e se tornaram externos, então tomaram várias esposas. [2] Como os varões da Igreja Antiquíssima representaram, por seus casamentos, o casamento celeste, o amor conjugal era para eles como o céu e a felicidade celeste. Quando, porém, a Igreja declinou, eles não percebiam mais a felicidade no amor conjugal, mas no prazer com várias esposas, prazer que é do homem externo. Isso foi o que o Senhor chamou “dureza de coração”, razão pela qual foi‑lhes permitido, por Moisés, tomar várias esposas, como o Senhor Mesmo ensina:

“Por causa da dureza de vossos corações Moisés vos escreveu este preceito; mas desde o início da criação Deus os fez macho e fêmea; por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe, e se ligará à sua esposa, serão os dois uma só carne, pelo que não são mais dois, mas uma só carne. Por isso, o que Deus conjungiu, o homem não separará” (Mc. 10:5‑9).

163.        Vers. 25: “E estavam ambos nus, o homem e a esposa dele, e não se envergonhavam”. Que “estavam nus e não se envergonhavam” significa que eram inocentes, a saber, que o Senhor tinha insinuado a inocência no proprium deles para que este não fosse desagradável.

164.        Como foi dito, o proprium do homem não é outra coisa senão o mal, e, quando se mostra à vista, é muito disforme. Todavia, quando a inocência e a caridade são insinuadas pelo Senhor no proprium, este se mostra bom e formoso, conforme as coisas que foram ditas no n.º 154. Caridade e inocência são coisas que não só desculpam o proprium, ou o mal e o falso no homem, mas o anulam, por assim dizer. É como qualquer um pode ver pelas crianças: quando elas se amam mutuamente e aos pais, e, ao mesmo tempo a inocência infantil brilha, então os males e falsos mesmos não só não se mostram, mas também são agradáveis. Daí se pode saber que ninguém pode ser admitido no céu a não ser que tenha alguma inocência. É como o Senhor disse:

“Deixai vir a Mim as criancinhas e não as impeçais; das tais é o reino de Deus. Amém vos digo: quem quer que não recebe o reino de Deus como uma criancinha, não entrará nele. Tomando‑as pois nos braços, impôs ‑lhes a mão e as abençoou” (Mc. 10:14‑16).

165.        Que a “nudez de que não se envergonhavam” signifique a inocência, vê‑se claramente pelas coisas que se seguem; quando eles se afastaram da integridade e da inocência, então se envergonharam da nudez e ela lhes pareceu opróbrio, pelo que se esconderam. Também pelas coisas que são representadas no mundo dos espíritos igualmente se pode ver que a nudez de que não se envergonhavam significa a inocência. Com efeito, quando os espíritos querem se desculpar e provar que não são culpados, mostram‑se nus, para atestarem inocência. Mas isto se pode ver principalmente pelo fato de que os inocentes estão no céu, os quais se mostram como criancinhas nuas e, segundo a espécie de inocência, cingidos de grinaldas. Todavia, os que não estão tanto na inocência mostram‑se cobertos de vestidos tão graciosos e luzentes que seriam tomados por seda diamantina, tal como os anjos que foram vistos algumas vezes pelos profetas.

166.        Estas são as coisas que a Palavra contém neste capítulo, mas as que foram expostas são poucas. E, como se trata do homem celeste, que hoje quase ninguém conhece, estas poucas coisas não podem deixar de parecer um tanto obscuras.

167.        Mas, se alguém soubesse quantos arcanos estão contidos em cada versículo, ficaria espantado. São tantos os arcanos ali contidos que seria impossível contá‑los. Isso se manifesta muito pouco na letra. Para se dizer em poucas palavras: no mundo dos espíritos as palavras, como estão no sentido da letra, são representadas de modo vivo, em uma ordem admirável; pois o mundo dos espíritos é representativo, e tudo o que é representado de modo vivo é percebido no outro céu pelos espíritos angélicos quanto às mesmas particularidades das coisas representadas. e tudo o que é percebido pelos espíritos angélicos é percebido pelos anjos do terceiro céu de forma plena e abundante, em ideias angélicas inexprimíveis e, até, segundo o beneplácito do Senhor, com uma variedade indefinida. Tal é a Palavra do Senhor.

 

 

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A Queda do Homem (Parte I)
E disse a serpente à mulher: Morrendo não morrereis. Aula gratuita!

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A queda do homem
Primeira parte
 

C. R. Nobre

 

E a serpente era mais astuta do que toda fera do campo que Jehovah Deus fez. E [ela] disse à mulher: Assim disse Deus: Não comereis de toda árvore do jardim?E disse a mulher à serpente: Do fruto da árvore do jardim comeremos;E do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem toqueis nele, para que disso não morrais.

E disse a serpente à mulher: Morrendo não morrereis.Porque Deus sabe que no dia em que comerdes dele serão abertos os vossos olhos e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.

E viu a mulher que a árvore era boa para comer, e que era apetecível aos olhos, e desejável era a árvore para dar inteligência; e tomou de seu fruto e comeu. E deu também ao seu varão com ela, e [ele] comeu.

E foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e coseram folha de figueira, e fizeram cintas para si.

 

Chegamos ao terceiro capítulo do livro do Gênesis, a história da queda do homem, uma das mais conhecidas da Bíblia. Muitos cristãos, em sua simplicidade de entendimento, têm entendidoesse relato literalmente:que a serpente era capaz de falar, tinha astúcia e, numa conversa, enganou a mulher eela levou o homem a infringir a ordem Divina.Mas o bom senso derivado de uma análisecrítica independente há de enxergar aqui, sim, um relato simbólico e não histórico, assim como é o caso com os capítulos anteriores do Gênesis.

Até existe uma corrente teológica contemporânea chamada barthiana, baseada na filosofia de Karl Barth, um teólogo suíço falecido em 1968, que vê a história de Adão como uma lenda, ou uma mera figura, mas essa visão barthiana é considerada uma heresia pela teologia cristã tradicional.

No entanto, o que parece mais absurdo? Acreditar que existe uma alegoria Divina nesse relato?Ou acreditar que uma cobra falasse, que tivesse astúcia a ponto de enganar a mulher e seu marido?Eque Deus, sabendo que a serpente era assim, não teria impedido que ela estorvasse a obra prima da criação, o homem no paraíso?

Sobre isso, lemos na última obra publicada de Swedenborg, A Verdadeira Religião Cristã, 469, o seguinte: “Hoje, quem quer que seja interiormente sábio pode perceber ou conjecturar, que as coisas que foram ditas sobre Adão e sobre sua esposa envolvem espiritualidades que ninguém até ao presente conheceu, porque o sentido espiritual da Palavra não foi descoberto antes deste momento. Quem é que não pode entrever que Jehovah não teria colocado em um Jardim duas árvores, e uma delas como cilada, senão para uma certa representação espiritual?...”

Então, mais uma vez, vejamos qual é a mensagem interior que está revestida nos símbolos aí, conforme aprendemos nos Arcanos Celestes.

Já vimos que os animais mencionados na Palavra significam elementos da vontade e do entendimento humanos. Os animais em geral significam as diversas afeições, isto é, desejos, sentimentos e sensações, ou capacidade de sentir. Por outro lado, as aves, répteis e peixes significam pensamentos, raciocínios, reflexões, ou a capacidade de pensar. No caso aqui, a protagonista é a serpente, um réptil, palavra que vem de repto, rastejar; aquilo que rasteja. Então, por causa dessa característica, de rastejar, a serpente significa a faculdade mais elementar ou mais “baixa” do pensamento, que é o raciocínio ou a capacidade de raciocinar. O chão ou o pó onde elarasteja é nível mais inferior da mente externa, aonde chegam asimpressões vindas pelos sentidos físicos.

As impressões e informações percebidas pelossentidos corpóreos são as mais básicas, mais elementares e as primeiras que o ser humano percebe. A criança começa a aprender pelos sentidos, quando toca, vê, leva à boca, sente e experimenta. Por essas impressões e experiências sensuaiselase comunica com o mundo e recebe as informações que irão aperfeiçoá-la. Assim é que o indivíduo a princípio é instruído, e depois sobe do nível corporal ou animal para o nível natural de sua mente.

O fato de a serpente falar, portanto, significa que o raciocínio instruipelos sentidos. Mas os sentidos são limitados ao nível rasteiro em que está, o nível da mente externa e corporal. E o raciocínio não é mauem si, pois é um processo natural do entendimento ou uma faculdade humana. Inclusive, nos primeiros tempos dos antiquíssimos, o raciocínio era uma espécie circunspeção, ou introspecção, só que era esclarecidopor uma revelação interna (vide AC 197).

Contudo,o raciocínio pelos sentidos começa a ser um problema quando permanece como a única forma de instrução, isto é, quando a pessoa se habitua a concluirsomente pelas coisas que vêm dos sentidos, e pior, quando crê que somente elas são verdadeiras. Nesse caso, a serpente está fazendo o papel de instruir, mas, também, o de iludir e seduzir. Porque o homem foi criado como um ser natural e espiritual ao mesmo tempo, mas as coisas vitais para o homem são espirituais, pois são elas que permanecerão depois da vida do corpo, e elas estão acima da análise e do julgamento dos sentidos.

Para citar um único exemplode como o raciocínio pelos sentidos pode iludir o entendimento: a aparência é que o sol se levanta e se põe todos os dias, girando ao redor da Terra. Enquanto a humanidade raciocinou por essa aparência dos sentidos, permaneceu iludida sobre como de fato é o sistema solar.Por causa desse hábito de raciocinar e tirar conclusões só pelo que pode ver e sentir com o corpo, a pessoa passa a descrer das coisas que estão acima e além do que é material, pois o raciocínio pelos sentidos não pode de modo algum perceber as coisas que são da fé (Vide Mateus 16:23).

Então, a serpente dessa história é nociva porque ela significa o raciocínio pelo sensual que afaga, lisonjeia e seduz o ego dohomem com a ilusão de que eleé algo por si mesmo e que tem sabedoria por si mesmo, tal como o Criador. E mais, que ele até pode prescindir da crença em um Criador e considerar-se vivopor si mesmo e uma deidade por si mesmo.

“Os antiquíssimos “chamavam de “serpentes” as coisas sensuais do homem, porque, como as serpentes estão próximas da terra, também as coisas sensuais estão próximas do corpo; daí chamavam de “veneno de serpente” aos raciocínios pelos sensuais sobre os mistérios da fé, e aos próprios raciocinadores chamavam de “serpentes”. Porque estes se entregam muito aos raciocínios pelas coisas do sentido ou pelas coisas visíveis como as que são terrestres, corpóreas, mundanas e naturais, é dito que “a serpente era mais astuta do que toda fera do campo” (AC 195).

Conforme a pessoa cresce e amadurece, ela se eleva do corporal para o natural, e, por conseguinte, a um nível um pouco mais acima dos sentidos. Daí ela percebe que há um mundo mais abstrato, por assim dizer, que não é dependente da impressão dos sentidos. Ela também percebeque às vezes os seus sentidos a enganam e fazem que ela perceba as coisas diferentemente do que de fato são. Depois, conforme a pessoa é instruída nas verdades Divinas e ama o bem, o seu homem interno ou espiritual se abre eelaentende que não pode confiarcegamente nos sentidos, que são limitados ao mundo material.

No relato de Gênesis, está-se tratando de outra descendência do povo antiquíssimo. Na primeira fase eles foram representados por um Homem no jardim do Éden. Na segunda fase, pelo desejo que eles tiveram de ter um proprium, que foi simbolizado por uma mulher. Na terceira, eles começaram a se desviar da instrução Divina e começaram “a crer somente naquilo que compreendessem por meio dos sentidos; o seu sensual é representado pela “serpente”; o amor de si ou o proprium é representado pela “mulher” e o racional pelo “varão”.(AC 191)

O raciocínio a partir das coisas materiais começa a desviar o homem quando instila o veneno da dúvida. A serpente começou com uma pergunta capciosa à mulher, e nessa pergunta jádistorcendo o que Deus havia dito: “E [ela] disse à mulher: Assim disse DEUS: Não comereis de toda árvore do jardim?”Ora, Deus nunca disse que não comessem de toda árvore, mas que não comessem da árvore do conhecimento do bem e do mal. De todas as demais árvores eles podiam comer. “E disse a mulher à serpente: Do fruto da árvore do jardim comeremos; e do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse DEUS: Não comereis dele, nem toqueis nele, para que disso não morrais.”

“O “fruto da árvore do jardim” é o bem e o vero que lhes tinham sido revelados desde a Igreja Antiquíssima; o “fruto da árvore que está no meio do jardim, do qual não comeriam”, é o bem e o vero da fé, sobre os quais não deviam instruir-se por si mesmos; “não tocar nele” é que não pensassem no bem e vero da fé por si mesmos ou pelos sentidos e pelos conhecimentos; que “daí morreriam” é que, assim, pereceria a fé ou toda sabedoria e inteligência.”

Os Arcanos nos chamam a atenção para o fato de que, antes, no capítulo 2:9, a árvore que estava no meio do jardim era a árvore de vidas, porque ela representava o amor e a fé que procede do amor plantados na vontade do homem. Agora, porém, no capítulo 3:3, a árvore que está no meio do jardim é a árvore da qual não deviam comer e nem mesmo tocar, porque essa árvore agora representa a fé, e comer dela significava instruir-se nos assuntos da fé por si mesmo, pelos sentidos.

Quando há na pessoa uma tendência para sobrevalorizar o seu ego, o raciocínio pelos sentidos logo fornece os motivos para isso. Depois, o racional, deixando-se seduzir pelo proprium, inventa as razões pelas quais se corrobora a grandeza. Osraciocínios instilam dúvidas e falsidades que levam à negação de Deus, das Leis Divinas e da religião.

Essa voz da serpente, insinuada todo dia, lisonjeia o ego humano, o proprium.A ideia de que se é sábio por si próprio é, de fato, muito atraente para o ego, e satisfaz a vaidade. Esse afago ao propriumestá representado na reação da mulher à voz da serpente:“E viu a mulher que a árvore era boa para comer, e que era apetecível aos olhos, e desejável era a árvore para dar inteligência; e tomou de seu fruto e comeu. E deu também ao seu varão com ela, e [ele] comeu.” “Boa para comer” significa a cobiça; “apetecível aos olhos”, a fantasia; “desejável para dar inteligência”, a volúpia. Estas coisas são do proprium ou da “mulher”. Pelo “varão, que comeu”, é significado o racional, que consentiu”. O fato de o varão também comer é que o racional também foi persuadido. É quando a pessoa busca argumentações “racionais”, filosóficas e científicas que se prestam mais para glorificar o homem em detrimento de Deus.

“Quem é sensual, ou quem crê só nos sentidos nega que o espírito existe, porque não o vê; afirma que o espírito nada é, dizendo: “Pois não o sinto; o que vejo e toco, isto sei que existe”. ... Assim ele nega que o espírito existe. Os filósofos, que querem ser mais engenhosos do que os outros, falam do espírito em termos que eles mesmos não conhecem, por estarem em contestação sobre esses termos. Afirmam não ser aplicável ao espírito um só vocábulo que tire alguma coisa do material, do orgânico ou da extensão. Assim subtraem o espírito de suas ideias, de sorte que este se dissipa para eles e se torna nada. [3] Os mais sensatos, porém, até dizem que o espírito é o pensamento. Mas, quando raciocinam sobre o pensamento, como eles o separam do que é substancial, acabam concluindo que deve dissipar-se, quando o corpo expira. Assim, todos os que raciocinam pelas coisas dos sentidos, pelos conhecimentos e pelas coisas filosóficas negam que o espírito existe; e, quando o negam, não creem em coisa alguma do que se diz sobre o espírito e as coisas espirituais.”“Hoje é ainda pior, porque há não só os que em nada creem exceto se virem e sentirem, mas há, também, os que se confirmam por meio de conhecimentos ignorados pelos antiquíssimos e, assim, se cegam muito mais.” (196).

A restauração da fé cristã passa, portanto, pelo conhecimento a Palavra Divina tal como é em seu seio, conhecimento pelo qual o entendimento pode ser elevado acima dasideias dos sentidos, que são ilusórias.

“E disse a serpente à mulher: Morrendo não morrereis. Porque DEUS sabe que no dia em que comerdes dele serão abertos os vossos olhos e sereis como DEUS, sabendo o bem e o mal.” “Se eles comessem do fruto da árvore seriam abertos os seus olhos” significa que, se examinassem pelos sensuais e pelos conhecimentos as coisas que são da fé, veriam claramente se as coisas eram ou não assim. Que “seriam como DEUS, sabendo o bem e o mal” significa que se agissem assim, por si mesmos, seriam como DEUS e poderiam guiar-se a si próprios.

A serpente mentia e contraditava o que Deus havia falado. Por mais incrível que pareça, a mulher deu ouvidos a uma criatura astuta e ignorou a instrução d’Aquele que havia criado todas as coisas, inclusive o jardim e as coisas magnificas que havia ali. A mulher não percebeu ou não deu importância ao fato de que a serpente mentia e distorcia as palavras Divinas. E, além disso, a serpente imputou a Deus um motivo ruim a Deus, dizendo que a proibição de comerem do fruto era para que não fossem iguais a Deus. Apesar de tudo, a mulher deu crédito à voz da serpente.

Se tudo isso parece absurdo naquelas circunstâncias, numa alegoria, não é menos absurdo hoje, quando o homem se deixa levar pelos raciocínios baseados meramente na observação da matéria, e põe em dúvida o que lhe chega pela revelação Divina. Os raciocínios bem alinhavados e bem sedimentados nos fatos materiais faz com que o homem pareça inteligente, afagam o seu ego, seu proprium. Afinal, quem não busca ser inteligente por si mesmo, por suas próprias convicções e experiências? Afinal, esse é o fruto da árvore de que a vaidade humana se nutre, da árvore que é “boa para comer ...apetecível aos olhos, e desejável ... para dar inteligência” (207).

O resultado dessa desobediência do ser humano veremosem detalhes na próxima palestra, mas, já aqui, vemos que a primeira constatação que eles tiveram foi bem desagradável. Porque, diferentemente do que a serpente falou, eles não se tornaram como Deus. A única diferença que notaram foi que estavam nus, e sentiram vergonha da sua nudez. Isto representa a perda completa da inocência em que se achavam no começo. “E foram abertos os olhos deambos, e conheceram que estavam nus”.  “Que os olhos foram abertos” significa que, por um ditame interior, conheceram e reconheceram que estavam “nus”, isto é, que não estavam mais na inocência como antes, mas no mal.” Ao invés de se tornarem como Deus, descobriram que eram, de fato, maus.

                “Diz-se que estavam “nus” porque se entregaram ao proprium, pois os que se entregam ao proprium ou a si mesmos nada mais têm da inteligência e da sabedoria, ou da fé. Assim, estão descobertos de vero e bem e por isso estão no mal.”

                A maior parte das pessoas no cristianismo crê no relato da queda do homem literalmente. Não faz mal que creiam assim, se não puderem julgar e elevar sua compreensão a um enfoque diferente. Porque todos os relatos de eventos nas Escrituras são como vasos para serem preenchidas quando se aprender a sua significação espiritual, quando a pessoa atingir a mentalidade adequada; e se isto não acontecer em vida, acontecerá com certeza no mundo espiritual, porque, como vimos, o terceiro estado dos que morrem e entram no mundo espiritual é o estado de instrução, quando as ideias errôneas são removidas, e as pessoas aprendem e recebem ensinamentos adequados ao amor celeste. Esses ensinamentos são como uma vestimenta de bodas, que a pessoa recebe antes de entrar em sua sociedade celeste.

                Por isso, sendo como vasos de verdades internas e celestes, esses relatos literais, por mais simples que pareçam, devem, contudo, ser ensinados assim como estão na Bíblia às pessoas cujo entendimento não pode ser elevar acima dos sentidos, pois, para uma mente simples e infantil, é a maneira como podem ser recebidos os vasos que na vida futura serão preenchidos pelas verdades celestes.

                Se hoje podemos ter nosso entendimento elevado a ponto de podermos compreender além e acima do sentido literal, é uma dádiva de Deus, um privilégio pelo qual somos gratos a Ele.


 

Arcanos Celestes, 190-215

Gênesis
Capítulo Terceiro
 

1.      E a serpente era mais astuta do que toda fera do campo que Jehovah Deus fez. E [ela] disse à mulher: Assim disse Deus: Não comereis de toda árvore do jardim?

2.      E disse a mulher à serpente: Do fruto da árvore do jardim comeremos;

3.      E do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem toqueis nele, para que disso não morrais.

4.      E disse a serpente à mulher: Morrendo não morrereis.

5.      Porque Deus sabe que no dia em que comerdes dele serão abertos os vossos olhos e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.

6.      E viu a mulher que a árvore era boa para comer, e que era apetecível aos olhos, e desejável era a árvore para dar inteligência; e tomou de seu fruto e comeu. E deu também ao seu varão com ela, e [ele] comeu.

7.      E foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e coseram folha de figueira, e fizeram cintas para si.

Conteúdo
 

190.          Trata-se do Terceiro Estado da Igreja Antiquíssima, que ambicionava o proprium até a ponto de amá-lo.

191.          Porque, pelo amor de si ou o proprium, eles então começavam a crer somente naquilo que compreendessem por meio dos sentidos, o seu sensual é representado pela “serpente”; o amor de si ou o proprium é representado pela “mulher” e o racional pelo “varão”.

192.          Por essa razão, a serpente ou o sensual persuadiu a mulher para que sondasse as coisas que são da fé no Senhor, se eram ou não assim, o que é significado por “comer da árvore da ciência”; e que o racional do homem tenha consentido, isto é significado pelo fato de que “o varão comeu”; vers. 1-6.

193.          Mas eles perceberam que estavam no mal, por esse resíduo de percepção, que é significado por isto, que “os olhos foram abertos” e que “ouviram a voz de Jehovah”, vers. 7 e 8; pela “folha de figueira com que fizeram cintas para si”, vers. 7., e depois pela vergonha ou pelo ato de se esconderem “no meio da árvore do jardim”, vers. 8 e 9, como também pelo reconhecimento e pela confissão, vers. 10-13, é evidente que permaneceu neles a bondade natural.

Sentido Interno
 

194.          Vers. 1: “E a serpente era mais astuta do que toda fera do campo que JehovahDeus fez. E [ela] disse à mulher: Assim disse Deus: Não comereis de toda árvore do jardim?”Pela “serpente” se entende aqui o sensual do homem, em que ele confia; pela “fera do campo”, aqui, como antes, se entende toda afeição do homem externo; pela “mulher”, o proprium; que a serpente tenha dito: “Assim disse Deus: Não comereis de toda árvore?” significa que, a princípio, eles tinham estado em dúvida. Trata-se da terceira descendência da Igreja Antiquíssima, que começou a não crer nas coisas reveladas a não ser que vissem e sentissem que elas assim eram. Aqui e no versículo logo seguinte se descreve o primeiro estado deles, que era um estado dubitativo.

195.          Os antiquíssimos não apenas comparavam às bestas e às aves todas as coisas que estavam no homem, mas até as chamavam assim. Tal era a linguagem deles, a qual se manteve na Igreja Antiga de após o dilúvio e foi conservada igualmente nos Profetas. Chamavam de “serpentes” as coisas sensuais do homem, porque, como as serpentes estão próximas da terra, também as coisas sensuais estão próximas do corpo; daí chamavam de “veneno de serpente” aos raciocínios pelos sensuais sobre os mistérios da fé, e aos próprios raciocinadores chamavam de “serpentes”. Porque estes se entregam muito aos raciocínios pelas coisas do sentido ou pelas coisas visíveis como as que são terrestres, corpóreas, mundanas e naturais, é dito que “a serpente era mais astuta do que toda fera do campo” . [2]Diz-se semelhantemente em David:

“Aguçam a sua língua como serpente, o veneno da áspide está sob os lábios deles” (Sal. 140:3),

onde se trata daqueles que seduzem os homens por meio dos raciocínios. No mesmo:

“...Andam errados desde o útero, falando mentiras. Têm veneno semelhante ao veneno de serpente. Como a venenosa áspide surda tapa o seu ouvido para não ouvir a voz dos que murmuram, dos que se associam às sociedades de sábios” (58:3 a 5);

aqui são chamados “venenos de serpente” os raciocínios que são tais que nem mesmo ouvem o que é sábio ou a voz dos que sabem. Daí ter havido entre os antigos esta locução, que “a serpente tapa o ouvido”. Em Amós:

“Como se aquele que chega à casa apoiasse sua mão na parede e uma serpente o mordesse. Porventura não será de trevas o dia de Jehovah e não de luz? e de escuridão, e não haverá esplendor nele?” (5:19,20);

a “mão na parede” é o próprio poder e a confiança nas coisas dos sentidos, de onde resulta a cegueira que é descrita. [3] Em Jeremias:

“A voz do Egito irá como de uma serpente, porque com força eles irão, e virão a ela com machados, como rachadores de lenha. Cortam a sua floresta, dito de Jehovah, porque não será investigada, pois foram multiplicados mais do que o gafanhoto, e não têm número. Será envergonhada a filha do Egito; será entregue nas mãos do povo do norte” (46:20,22 a 24).

“Egito” é o raciocínio sobre as coisas Divinas pelas coisas sensuais e científicas; os raciocínios são chamados “voz de serpente”, e a cegueira decorrente daí é significada pelo “povo do norte”. Em Jó:

“Veneno de áspides ele sugará, língua de víbora o matará; não verá os ribeiros, as correntes dos rios de mel e manteiga” (20:16,17);

“rios de mel e manteiga” são as coisas espirituais e celestes, que não serão vistas pelos raciocinadores; os raciocínios são chamados “veneno de áspides e língua de víbora”. Abaixo, nos versículos 14 e 15, serão vistas mais coisas sobre a serpente.

196.          Na antiguidade, foram denominados serpentes aqueles que tiveram confiança mais nas coisas dos sentidos do que nas coisas reveladas. Hoje é ainda pior, porque há não só os que em nada creem exceto se virem e sentirem, mas há, também, os que se confirmam por meio de conhecimentos ignorados pelos antiquíssimos e, assim, se cegam muito mais. Para que se saiba de que modo os que concluem sobre as coisas celestes por meio das coisas dos sentidos, dos conhecimentos e das coisas filosóficas se cegam a ponto de, depois, não mais verem ou ouvirem coisa alguma, e serem não só serpentes surdas mas até serpentes voadoras, que são mais perniciosas, de que também se trata na Palavra, seja, para exemplo, o que eles creem a respeito do espírito. [2]Quem é sensual, ou quem crê só nos sentidos nega que o espírito existe, porque não o vê; afirma que o espírito nada é, dizendo: “Pois não o sinto; o que vejo e toco, isto sei que existe”. Quem é científico, ou quem conclui pelos conhecimentos diz: “Que é o espírito senão talvez um sopro, ou um calor, ou alguma coisa que se deduz de sua ciência, que na morte se dissipa? Acaso os animais também não têm corpo, sentidos, um análogo de razão? e dizem que eles morrerão e o homem viverá!” Assim ele nega que o espírito existe. Os filósofos, que querem ser mais engenhosos do que os outros, falam do espírito em termos que eles mesmos não conhecem, por estarem em contestação sobre esses termos. Afirmam não ser aplicável ao espírito um só vocábulo que tire alguma coisa do material, do orgânico ou da extensão. Assim subtraem o espírito de suas ideias, de sorte que este se dissipa para eles e se torna nada. [3]       Os mais sensatos, porém, até dizem que o espírito é o pensamento. Mas, quando raciocinam sobre o pensamento, como eles o separam do que é substancial, acabam concluindo que deve dissipar-se, quando o corpo expira. Assim, todos os que raciocinam pelas coisas dos sentidos, pelos conhecimentos e pelas coisas filosóficas negam que o espírito existe; e, quando o negam, não creem em coisa alguma do que se diz sobre o espírito e as coisas espirituais. Mas, ao contrário, se os simples de coração são interrogados, dizem que sabem que o espírito existe porque o Senhor disse que eles viveriam após a morte. Estes não extinguem o seu racional, mas vivificam-no pela Palavra do Senhor.

197.          Entre os antiquíssimos, que foram homens celestes, pela “serpente” era significada a circunspecção. Assim era semelhantemente significado o sensual pelo qual se faziam circunspectos, para que não fossem prejudicados pelos males. É o que se vê pelas palavras do Senhor aos discípulos:

“Eis, Eu vos envio como ovelhas no meio de lobos; sede, pois, prudentes como as serpentes e simples como as pombas” (Mt. 10:16)”;

depois, também, pela “serpente de bronze” que foi erigida no deserto, pela qual é significado o Sensual do Senhor, que é, Ele só, Homem Celeste, e Quem somente tem a circunspecção e provê para todos. Por isso, os que olharam para Ele foram preservados.

198.          Vers. 2 e 3: “E disse a mulher à serpente: Do fruto da árvore do jardim comeremos; e do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem toqueis nele, para que disso não morrais.” O “fruto da árvore do jardim” é o bem e o vero que lhes tinham sido revelados desde a Igreja Antiquíssima; o “fruto da árvore que está no meio do jardim, do qual não comeriam”, é o bem e o vero da fé, sobre os quais não deviam instruir-se por si mesmos; “não tocar nele” é que não pensassem no bem e vero da fé por si mesmos ou pelos sentidos e pelos conhecimentos; que “daí morreriam” é que, assim, pereceria a fé ou toda sabedoria e inteligência.

199.          Que o “fruto da árvore, do qual não comeriam”, signifique o bem e o vero da fé que lhes foram revelados desde a Igreja Antiquíssima, ou as cognições da fé, pode-se ver por isto, que é dito que eles comeriam do “fruto da árvore do jardim” e não “da árvore do jardim”, como fora dito anteriormente, onde se tratou do homem celeste ou da Igreja Antiquíssima, cap. 2, vers. 16. A “árvore do jardim”, como foi dito, significa a percepção que é do bem e do vero; o bem e vero daí derivado é aqui chamado “fruto”. A mesma significação de fruto ocorre muitas vezes na Palavra.

200.          Aqui se diz que a árvore da ciência estava no meio do jardim, enquanto anteriormente, no cap. 2, vers. 9, se diz que é a árvore de vidas que está no meio do jardim e não a árvore da ciência. Isto é porque o “meio do jardim” significa o íntimo, e o homem celeste ou o da Igreja Antiquíssima era árvore de vidas, que é o amor e daí a fé. Mas desse homem que se pode chamar celeste espiritual, ou dessa posteridade, o seu “meio do jardim” ou seu íntimo era a fé. Isso não pode ser descrito mais amplamente, porque hoje se ignora inteiramente de que qualidade foram aqueles que viveram nesse tempo antiquíssimo. Sua índole era absolutamente diversa da que existe hoje em alguém. Essa índole, só para que se tenha uma ideia, era tal que pelo bem eles conheciam o vero, ou pelo amor sabiam o que pertence à fé. Quando, todavia, essa geração expirou, sucedeu outra que tinha uma índole absolutamente diversa da deles, a saber, que não era pelo bem que se conhecia o vero, ou pelo amor às coisas que fossem da fé, mas que pelo vero conhecia-se o bem, ou pelas coisas que pertencem às cognições da fé conheciam-se as que são do amor; e, na maioria deles, quase não havia mais coisa alguma além do que sabiam. Tal mudança se deu após o dilúvio, para que o mundo não perecesse.

201.          Como, pois, uma índole tal qual a que era dos antiquíssimos de antes do dilúvio não existe e não se encontra mais hoje, não se pode expor facilmente à compreensão o que essas palavras envolvem no sentido genuíno. São coisas muito conhecidas no céu, pois os anjos e os espíritos angélicos que são chamados celestes, são de índole semelhante à dos antiquíssimos regenerados de antes do dilúvio. Os anjos e os espíritos angélicos que se chamam espirituais são, todavia, de índole semelhante à dos que foram regenerados após o dilúvio, aqueles e estes com uma variedade indefinida.

202.          A Igreja Antiquíssima, que era o homem celeste, era tal que não só “não comia da árvore da ciência”, isto é, não se instruía sobre a fé pelas coisas sensuais e pelos conhecimentos, mas sequer lhes era permitido “tocar naquela árvore”, isto é, pensar pelos sensuais e pelos conhecimentos em alguma coisa que fosse da fé, para que não caíssem da vida celeste na vida espiritual, e, assim, por diante. Tal é também a vida dos anjos celestes: os dentre eles que são mais intimamente celestes sequer admitem que se mencione a fé ou alguma coisa que derive algo do espiritual. E, se for mencionada por outros, em lugar da fé percebem o amor, com diferença só conhecida por eles. Assim, derivam do amor e da caridade tudo o que é da fé. Ainda menos suportam ouvir alguma coisa racional e de nenhum modo alguma coisa do conhecimento da fé. Porque têm do Senhor a percepção, através do amor, do que é bom e verdadeiro. Pela percepção, sabem imediatamente se tal coisa é assim ou não. Por isso, quando se diz alguma coisa sobre a fé, eles respondem somente que isso é assim ou que não é assim, porque o percebem do Senhor. É isto que essas palavras do Senhor significam, em Mateus:

“Seja o vosso falar: Sim, sim; não, não; o que passa disto procede do mal” (5:37).

Isto é, então, o que vem a ser o fato de não lhes ser permitido sequer tocar no fruto da árvore da ciência, pois, se o tocassem, estariam no mal ou daí morreriam. Além disso, os anjos celestes, como os outros, falam entre si sobre vários assuntos, mas numa linguagem celeste, formada e derivada do amor, a qual é mais inefável do que a linguagem dos anjos espirituais.

203.          Os anjos espirituais, porém, falam sobre a fé, e até confirmam as coisas que são da fé pelas coisas intelectuais, racionais e científicas, mas nunca concluem por elas sobre a fé. Os que concluem assim estão no mal. Porque eles também têm percepção dada pelo Senhor de todas as coisas que são da fé, mas não uma percepção tal como a dos anjos celestes. A percepção dos anjos espirituais é uma certa consciência que é vivificada pelo Senhor, e se mostra como a percepção do celeste, mas não é celeste: é apenas a percepção espiritual.

204.          Vers. 4 e 5: “E disse a serpente à mulher: Morrendo não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que comerdes dele serão abertos os vossos olhos e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.” “Se eles comessem do fruto da árvore seriam abertos os seus olhos” significa que, se examinassem pelos sensuais e pelos conhecimentos as coisas que são da fé, veriam claramente se as coisas eram ou não assim. Que “seriam como Deus, sabendo o bem e o mal” significa que se agissem assim, por si mesmos, seriam como Deus e poderiam guiar-se a si próprios.

205.          Cada versículo contém um estado peculiar ou uma mudança de estado na Igreja. Os versículos iniciais contêm o estado em que eles ainda percebiam ser ilícito, ainda que para isso se inclinassem. Os versículos 4 e 5, que eles começaram a duvidar se não lhes era lícito, pois que veriam se eram verdadeiras as coisas ouvidas dos antigos e, assim, os olhos seriam abertos. Finalmente, como o amor de si começou a reinar neles, concluíram que poderiam guiar-se a si mesmos e, assim, ser semelhantes ao Senhor. O amor de si tem essa característica de querer ser guiado não pelo Senhor, mas por si mesmo; e quando se é guiado por si mesmo, as coisas dos sentidos e dos conhecimentos são consultadas quanto ao que se deve crer.

206.          Quais são os indivíduos que mais creem ter os olhos abertos e saber, como Deus, o que é o bem e o mal, senão os que amam a si próprios e são ao mesmo tempo versados nas coisas do mundo? Mas quem é mais cego? Basta apenas consultá-los para que se veja que não sabem e ainda menos creem que existe o espírito. Ignoram inteiramente o que é a vida espiritual e celeste, nem reconhecem a vida eterna, pois creem que morrerão como os animais. Não reconhecem de modo algum o Senhor, mas veneram somente a si próprios e a natureza. Os que querem falar prudentemente dizem que algum Ser supremo, que eles não sabem quem é, governa todas as coisas. [2] São esses os seus princípios, que eles confirmam entre si de muitos modos pelas coisas sensuais e dos conhecimentos. Se ousassem, eles o fariam mesmo perante o universo. Esses, posto que queiram ser reconhecidos como deuses ou como os mais sábios, se fossem indagados se sabem o que é não-proprium, responderiam que é o não-ser, e nada seriam se fossem privados do proprium. Se fossem indagados o que é viver pelo Senhor, pensariam que é uma coisa fantasiosa. Se fossem interrogados se sabem o que é a consciência, diriam que nada mais é que alguma coisa imaginária, que pode servir para manter o povo em vínculos. Se fossem interrogados se sabem o que é a percepção, não fariam outra coisa senão zombar, e a chamariam de alguma coisa entusiástica. Assim é a sabedoria deles; assim têm “olhos abertos” e, assim, são “deuses”. Partem desses princípios, os quais julgam ser mais claros que o dia, e por eles avançam e raciocinam sobre os mistérios da fé. Que resulta daí senão um abismo de escuridão? Esses, mais do que os outros, são as serpentes que seduzem o mundo. Contudo, essa descendência da Igreja Antiquíssima ainda não era assim. A descendência que se tornou tal é tratada nos versículos 14 e 19 deste capítulo.

207. Vers. 6: “E viu a mulher que a árvore era boa para comer, e que era apetecível aos olhos, e desejável era a árvore para dar inteligência; e tomou de seu fruto e comeu. E deu também ao seu varão com ela, e [ele] comeu.”“Boa para comer” significa a cobiça; “apetecível aos olhos”, a fantasia; “desejável para dar inteligência”, a volúpia. Estas coisas são do proprium ou da “mulher”. Pelo “varão, que comeu”, é significado o racional, que consentiu (como será visto no n.º 265).

208.          Esta foi a quarta descendência da Igreja Antiquíssima, que se deixou seduzir pelo amor próprio e não quis crer nas coisas reveladas a não ser que as visse confirmadas pelas coisas dos sentidos e do conhecimento.

209.          Os termos aqui empregados, tais como “que a árvore era boa para comer”, “apetecível aos olhos”, “desejável para dar inteligência”, são tais como os que foram aplicáveis à índole dos que viveram naquele tempo antiquíssimo. Eles se referem especificamente à vontade, pois da vontade brotavam os males deles. Onde, na Palavra, se trata dos pós-diluvianos são empregados termos tais que não se referem desse modo à vontade, mas ao entendimento. Porque os antiquíssimos tinham o vero derivado do bem, mas aqueles, ou os pós-diluvianos, tinham o bem derivado do vero.

210.          Para que se saiba o que é o proprium: o proprium do homem é, todo, o mal e o falso de que estão cheios o amor de si e do mundo. E, os que estão no proprium,creem, não pelo Senhor ou pela Palavra, mas por si mesmos. Acham que o que não compreendem pelos sentidos e conhecimentos nada é. Daí resulta que se tornam nada mais que o mal e o falso, e, assim, consideram pervertidamente todas as coisas: as que são más, veem-nas como boas, as que são boas, como más; as que são falsas, como verdadeiras, e as que são verdadeiras, como falsas; as que existem, eles pensam que são nada, e as que nada são, pensam que são tudo. Ao ódio chamam amor; à escuridão, luz; à morte, vida, e vice-versa. Na Palavra, esses são chamados “coxos e cegos”. Isto é, então, o proprium do homem, que é, em si, infernal e condenado.

211.          Vers. 7: “E foram abertos os olhos deambos, e conheceram que estavam nus”.  “Que os olhos foram abertos” significa que, por um ditame interior, conheceram e reconheceram que estavam “nus”, isto é, que não estavam mais na inocência como antes, mas no mal.

212.          Que “os olhos serem abertos” signifique um ditame vindo do interior, vê-se por meio de expressões semelhantes na Palavra, como aquelas de Bileam [Balaão] em que ele fala a respeito de si mesmo: porque tinha visões, chamava-se “varão de olhos abertos” (Núm. 24:3,4); e pelas de Jonathan: quando provou do favo de mel e do interior lhe foi ditado que isso era mal, foi dito que “seus olhos viram”, de sorte que foram iluminados para que visse o que não sabia (I Sam. 14:27, 29). Além destes exemplos, os “olhos” são muitas vezes tomados pelo entendimento, assim, por um ditame interior daí proveniente; como em David:

“Ilumina os meus olhos, para que eu não adormeça na morte” (Sal. 13:3),

em lugar do entendimento. Em Ezequiel:

“Que [têm] olhos para ver e não veem” (12:2),

em lugar dos que não querem entender; em Isaías:

“Cobre os olhos deles para que não vejam com os seus olhos” (6:10),

em lugar dos que se cegam para que não entendam. Moisés disse ao povo:

“Jehovah não vos deu um coração para conhecer, e olhos para ver, e ouvidos para ouvir” (Deut. 29:4);

o “coração” está em lugar da vontade; os “olhos”, do entendimento. Em Isaías foi dito a respeito do Senhor “que Ele haveria de abrir os olhos aos cegos” (62:7) e, no mesmo profeta:

“Dentre a escuridão, e dentre as trevas, os olhos dos cegos verão” (29:18).

213.          Que “conhecer que estavam nus” signifique que conheceram e reconheceram que não estavam mais na inocência como antes, mas no mal, vê-se pelo último versículo do capítulo precedente, onde se disse: “E estavam ambos nus, o homem e a esposa dele, e não se envergonhavam”. Daí se vê que “não se envergonhar por estarem nus” significa que estavam inocentes. O contrário é significado quando se envergonham, como aqui, por “terem costurado folhas de figueira e terem se ocultado”. Com efeito, sem a inocência a nudez se torna opróbrio e escândalo, porque são conscientes de si mesmos, que pensam o mal. daí vem que a nudez é tomada pelo opróbrio e pelo mal, na Palavra, e atribuída à Igreja pervertida, como em Ezequiel:

“Que estaria nua e descoberta, e manchada do seu sangue” (16:7,22);

no mesmo:

“Deixam-na nua e descoberta, para que seja revelada a nudez” (23:29);

emJoão:

“Aconselho-te que compres... vestimenta branca, para que te vistas, e não seja manifestada a vergonha de tua nudez” (Apoc. 3:18);

e sobre o último dia:

“Bem-aventurado o que vigia, e guarda a sua vestimenta para que não ande nu e não se veja a sua vergonha” (Apoc. 16:15);

noDeuteronômio:

“Se o varão achar na esposa uma nudez qualquer, escreva-lhe carta de repúdio” (24:1);

também por isso foi mandado a Aarão e a seus filhos

“que tivessem calções de linho quando subissem ao altar e para ministrarem, a fim de cobrirem a carne da nudez, para que levassem iniquidade e morressem” (Êx. 28:42,43).

214.          Diz-se que estavam “nus” porque se entregaram ao proprium, pois os que se entregam ao proprium ou a si mesmos nada mais têm da inteligência e da sabedoria, ou da fé. Assim, estão descobertos de vero e bem e por isso estão no mal.

215.          Que o proprium não seja outra coisa senão o mal e o falso, é o que daí também pôde ser manifesto a mim pelo fato de que tudo o que os espíritos falavam por si mesmos era o mal e o falso, e isso a ponto de que, quando apenas me era dado saber que falavam por si mesmos, eu logo sabia que era falso, ainda que, quando falavam, estivessem numa persuasão tão forte de que era verdadeiro que em nada duvidavam. O homem que está no proprium é semelhante a eles. Da mesma forma, foi dado perceber que todos os que começaram a raciocinar sobre as coisas que são da vida espiritual e celeste, ou que são da fé, duvidavam e até negavam, pois raciocinar sobre a fé é duvidar e negar. E, como é por si mesmos ou pelo proprium, resultam meras falsidades, nas quais eles caem, por conseguinte em um abismo de trevas, isto é, de falsidades. Quando estão nesse abismo, o menor escrúpulo prevalece sobre mil verdades; é como um grão de pó que, caindo na pupila do olho, faz que não se veja o universo e tudo o que está no universo. Assim o Senhor fala sobre eles, em Isaías:

“Ai dos que são sábios aos seus próprios olhos, e inteligentes perante suas faces” (5:21);

e, no mesmo:

“Tua sabedoria, e tua ciência, ela te desviou, e disseste em teu coração: Eu [sou], e ninguém mais além de mim. e virá sobre ti um mal cuja origem ignoras, e cairá sobre ti uma destruição [tal], que não poderás reparar, e virá sobre ti repentinamente uma devastação que não conheces” (47:10,11);

emJeremias:

“Todo homem se tornou estúpido pela ciência; envergonhou-se todo fundidor de imagem de escultura, porque a mentira é a sua imagem de fundição, nem há espírito nelas” (51:17);

a “imagem de escultura” é tomada pelo falso que é do proprium, a “imagem de fundição”, pelo mal que é do proprium.

 

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A Queda do Homem (Parte II)
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A queda do homem
Segunda parte
 

C. R. Nobre

 

 

          E ouviram a voz de Jehovah Deus passando no jardim, na viração do dia. E o homem se escondeu, e a esposa dele, da face de Jehovah Deus, no meio da árvore do jardim.

          E clamou Jehovah Deus ao homem, e lhe disse: Onde tu estás?

          E disse: Tua voz ouvi no jardim e temi, porque eu estou nu, e me escondi.

          E disse: Quem te deu a saber que tu estás nu? Ou não comeste da árvore de que te ordenei que não comesses dela?

          E disse o homem: A mulher, que deste [para estar] comigo, ela me deu da árvore, e comi.

          E disse Jehovah Deus à mulher: Por que fizeste isso? E disse a mulher: A serpente me enganou, e comi.

          E disse Jehovah Deus à serpente: Porquanto fizeste isto, maldita tu [serás] mais do que toda besta, e mais do que toda fera do campo. Sobre teu ventre andarás, e pó comerás todos os dias de tua vida.

          E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre tua semente e a semente dela; Ele te pisará a cabeça, e tu Lhe ferirás o calcanhar.

 

Na palestra anterior, vimos como essa história, no sentido espiritual, não trata, de fato, de homem, mulher, serpente ou fruto fisicamente, mas da quarta descendência do povo antiquíssimo, e de como aquele povo se deixou iludir pelas ilusões dos sentidos. Eles desejaram ser sábios por sua própria inteligência e desprezaram a real sabedoria que vem de Deus.

Enquantoa humanidade estava na integridade, foi representada por Adão; a sua sabedoria angélica foidescrita pelo Jardim, suas árvores, rios e pedras preciosas;o pleno autoconhecimento que tinham a respeito de si mesmos foi representado pelo fato de Adão dar nome a todos os animais, porque os animais representam as afeições da vontade; as aves representam as coisas intelectuais que eles tinham; e mesmo quando declinaram um pouco daquela integridade primitiva e quiseram ter um proprium, simbolizado pela mulher, eles sabiam exatamente que esse proprium erauma vida como se fosse sua, à parte da vida Divina.

Mas, por causa desse proprium, ou o seu ego, aquele povo começou a se voltar cada vez mais para si mesmos e foram finalmente atraídos e traídos pelos enganos dos sentidos. O amor de si desejou ser sábio por si mesmo, pelos conhecimentos dos sentidos, pelas ilusões corporais e terrestres, e achou que podia ser tão sábio quanto Deus. E o resultado foi que, em vez de serem como Deus, descobriram que estavam despidos, isto é, desprovidos de toda verdade e todo bem que tiveram antes. Os seus olhos se abriram, mas não para uma sabedoria Divina, como a serpente dissera, mas para a baixeza da condição humana quando age contra a Ordem de Deus.

Lemos que, na viração do dia, o Senhor passa pelo Jardim. Adão ouve a sua voz, tem medo e se esconde no meio da árvore do jardim, envergonhado, porque estava nu. O Senhor chama por ele e pergunta: “Onde estás?” A viração do dia é o período de sombra, da mudança que acontece, o declínio para a quarta descendência daquele povo ou da Igreja Antiquíssima.  Adão ouvir a voz de Deus significa que aquele povo ainda tinha um resto de percepção, que mais tarde se tonaria a consciência. É na consciência que Deus nos fala hoje. Mas esse resíduo de percepção se tornou quase nada, pois Adão, na sua tolice, tentou se esconder de Deus, esquecendo de que Deus é onisciente e onipresente.

Ele se escondeu no meio da árvore do Jardim. Isto significa que aquela geração, quando percebeu o ditame de Deus,reconheceu que estava no mal e tentou se ocultaratrás do bem natural, isto é, a bondade civil e moral, que é o verniz da vida em sociedade que usamos para que nossas reais mazelas espirituais não apareçam. A bondade natural pode até ser um anteparo que esconde o caráter pecaminoso do ego, mas é somente uma capa com a qual tentamos cobrir nossa real natureza.

A voz do Senhor é esse aviso que ouvimos na consciência, quando reconhecemos que tivemos um comportamento reprovável, uma ação egoística, uma atitude soberba, uma arrogância ou um desdém pelo nosso próximo; enfim, um pecado contra Deus. O Senhor bem sabe o que fizemos e porque o fizemos. Mas, Ele nos chama, “Onde tu estás?”, para que, pela introspecção ou autoexame, reconheçamos a indignidade de nossos atos e nos separemos deles.

Deus pergunta não porque Ele não sabe a resposta, mas para nos dar oportunidade denos examinarmos, vermos e reconhecermos os males e tomarmos a resolução firme de nos abstermos deles. Se fizermos isso, estaremos praticando a real penitência.Somente assim podemos melhorar nosso caráter e adquirir a vida espiritual. Porque a Palavra nos ensina que o pecado é a doença da alma. Lemos no Salmo 41:4: “Eu dizia: SENHOR, tem piedade de mim; sara a minha alma, porque pequei contra ti.” A penitência do mal é o remédio para a cura de nossas almas.

A inquirição do Senhor por meio da consciência nunca é para condenar. Ele põe o dedo em nossa ferida não para nos fazer sofrer, mas para curá-las. Adão se escondeu das faces de Jehovah, e os Arcanos falam que “Como as “faces do SENHOR” são a misericórdia, a paz e todo bem, vê-se que Ele nunca olha para pessoa alguma a não ser com misericórdia, e nunca desvia Sua face de alguém, mas é o homem que desvia a sua face quando está no mal. É como foi dito pelo SENHOR em Isaías:“São vossas iniquidades que fazem separação entre vós e vosso DEUS, e vossos pecados fazem ocultar de vós as faces” (59:2).Assim também aqui, que eles se “esconderam da face de JEHOVAH porque estavam nus”.

O Senhor faz outra pergunta a Adão: “Quem te fez saber que estavas nu? Comeste da árvore de que te ordenei que não comesses?”  Nessa hora, em vez de Adão admitir sua desobediência e fazer confissão, ele tenta se isentar da responsabilidade e lança a culpa, primeiro, diretamente na mulher e, depois, indiretamente, em Deus: “A mulher, que deste [para estar] comigo, ela me deu da árvore, e comi.”

Daí surgiu um padrão muito comum de comportamento do ser humano: não assumir responsabilidadepor seus erros e lançar a culpa nos outros. O mal que a pessoa pratica deliberadamente, ou o mal ativo, é resultante das concupiscências do amorde si ou do mundo. Mas admitir o mal é coisa que não agrada o ego. É a nudez de que se envergonha.É tendência natural do ser humano pôr a responsabilidade nos outros, na esposa, no marido, nos pais, nos amigos, na influência ruim do ambiente, nos mau tratos de que foi vítima na infância, nas circunstâncias da vida, no destino e até próprio Deus, que a fez assim e não de outra maneira

Todo ser humano tem inclinações hereditárias para o mal, o chamado mal hereditário, mas elas são somente tendências. Ninguém é condenado por causa das inclinações, porque ninguém escolhe a sua hereditariedade. Mas torna-se culpado se permitir que as inclinações hereditárias para o mal se transformem males ativos. Se meus pais e avós fizeram o mal, não significa que estou obrigado a fazer o mesmo. Isto está bem claro no livro do profeta Ezequiel 18:20: “A alma que pecar, essa morrerá; o filho não levará a maldade do pai, nem o pai levará a maldade do filho; a justiça do justo ficará sobre ele, e a impiedade do ímpio cairá sobre ele.”

A hereditariedade é somente uma base em que devo edificar minha própria personalidade. E existe também uma hereditariedade boa, ou uma disposição natural para o bem e que se chama bem natural (AC 6208, 8002), mas este é como a árvore em que Adão se esconde, e não tem vida espiritual em si, pois é um bem que o homem atribui a si mesmo.

“A mulher que Tu deste”... E acusa indiretamente o próprio Deus a pessoa que culpa o destino ou as circunstâncias como forças mais poderosas do que ela, contra as quais não pode lutar.  Maldizendo a sua “má sorte” ou o destino ela está, de fato, maldizendo a Deus, como se Ele fosse injusto com ela.

Mas, por que as pessoas, sob as mesmas circunstâncias adversas da vida, têm comportamentos e atitudes diferentes? Se fosse verdade que a hereditariedade prepondera, os irmãos não teriam, às vezes, caracteres e vidas tão diferentes. O fato é que as pessoas têm o livre arbítrio e, por isso, têm atitudes diferentes diante das mesmas situações, fraquezas e adversidades. Mas a resistência para superar as dificuldades vem, em primeiro lugar, do reconhecimento de sua invalidez e de sua fraqueza e, depois, da perseverança em buscar o auxílio Divino em oração, o socorro do Altíssimo. Porque as circunstâncias, as concupiscências e os males podem são mais fortes do que nós, porém Deus é mais forte do que tudo, e Ele está pronto para nos ajudar e fortalecer.

Infelizmente, na maioria das vezes, nós, filhos de Adão que somos, custamos a admitir nossa responsabilidade e nossa culpa. A culpa é sempre de algum outro, não minha.O correto seriaencararmos corajosamente as falhas de caráter que precisamos corrigir, os males que adoecem nossas almas, e nos humilharmos diante de Deus, pedindo o auxílio Divino que nos cura interiormente. Porém, é mais conveniente e mais fácil abafar a voz da consciência e não pensar mais no erro cometido.

Outros, quando ouvem a voz na consciência apontando um mal, procuram esconder sua nudez em técnicas de autoajuda que enaltecem somente o lado bom, as coisas positivas do indivíduo, sem nunca encarar o seu lado medonho. Focalizar o pensamento na própria bondade sem admitir a natureza pecaminosa é tentar, como Adão fez, se esconder da voz de Deus, no meio da árvore. Qualquer esforço que fizermos para nos convencermos de que somos bons, de que não temos males, é um tratamento equivocado do problema, poissó justifica e desculpa qualquer vício de caráter da pessoa, e assim a transforma, magicamente, de ré da própria consciência, em vítima. Enquanto não confessarmos nossos males diante de Deus, permaneceremos doentes, e qualquer abordagem que não seja uma humilde confissão é um paliativo para a cura da alma; é, de fato, somente cobrir com gaze um tumor maligno, por medo da cirurgia que pode removê-lo.

O Senhor não acusa ninguém, nem a ninguém imputa o mal. E nós também não devemos fazer isso. Mas é uma lei espiritual que cada mal traz consigo a sua pena. E se nós sentimos remorso pelo mal, isto vem do mal praticado e não de Deus. Por isso, se por um ladonão devemos acusar e condenar os outros, também não nos cabe aliviar  o remorso de consciênciados outros, inocentando-a do mal, ou dourando a pílula, por assim dizer. Pois a Palavra nos diz em Isaías 5:20: “Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal; que fazem da escuridade luz e da luz, escuridade; põem o amargo por doce e o doce, por amargo!”

A nossa única escapatória é, quando ouvirmos a voz de Deus na consciência: “Onde tu estás?”, devemos olhar para dentro de nós, reconhecer o mal, suplicar o auxílio o auxílio Divino para a verdadeira cura, como o salmista diz: “Sara a minha alma, porque pequei contra ti”.

Quando buscamos compreender a Palavra de Deus em seu sentido interno, o que estamos buscando é a verdade espiritual que nos ensinaclaramente sobre como é nossa constituição espiritual, e isto nos leva ao tão almejado autoconhecimento. Éa conscientização de nosso real ser, do nosso proprium, de quem nós somos e de quem Deus é.

Aprendemos queo racional está numa posição mais elevada em relação ao proprium e, por isso,tem uma visão mais clara a respeito do que esse proprium ou ego realmente é: são afeições, inclinações, desejose paixões; são meras emoções, que não enxergam, não pensam. Mas o racional vê, reconhece e discrimina o que esses sentimentos e tendências de fato são. E, não só isso: o racional esclarecido pode discernir entre as tendências recebidas por hereditariedade, por um lado, e, de outro lado, as afeições más, as cobiças, e osmales ativos que foram acrescentados pela prática.

O papel do entendimento deve ser, primeiro, o de perceber o desejo da cobiça preponderando no seu proprium e resistir, para que a cobiças não impere. O entendimento pode ver, corrigir e subjugar as concupiscências na vontade, e também pode identificar a insinuação do mal, a voz da serpente,iludindo os sentidos.É somente o racional esclarecido pelas verdades que pode desmentir as falsidades e ilusões dos sentidos que seduzem o proprium, para que este se rebele contra o seu Criador.

Lemos na carta de Tiago: “Ninguém, sendo tentado, diga: De Deus sou tentado; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e a ninguém tenta. Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência.  Depois, havendo a concupiscência concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, sendo consumado, gera a morte. (Tg 1:13-14).

Deus não tenta, não amaldiçoa, não castiga, não lança no inferno. A essência d’Ele é o amor. E Ele não age contra a sua essência. Mas é dito na Palavra que Deus amaldiçoa e castiga para que o homem aprenda reconheça que Deus governa todas as coisas, e, depois, quando for mais instruído na verdade, aprenda que o mal vem da criatura humana e não do Criador.

“E disse Jehovah Deus à serpente: Porquanto fizeste isto, maldita tu [serás] mais do que toda besta, e mais do que toda fera do campo. Sobre teu ventre andarás, e pó comerás todos os dias de tua vida.

“Qualquer um pode ver que JEHOVAH DEUS não teria Se dirigido a uma serpente, e não teria havido serpente alguma, nem que Ele Se dirigiu ao sensual que foi significado pela serpente, mas que essas expressões envolvem outra coisa, a saber, que eles perceberam que foram enganados pelos sentidos e, como tinham amado a si mesmos, tinham desejado saber se era verdadeiro o que tinham ouvido sobre o SENHOR e sobre a fé n`Ele, e, assim, é que quiseram crer pela primeira vez. O mal da Igreja ...é que as pessoas não creem no SENHOR ou na Palavra, mas em si mesmas e nos sentidos; daí não há fé alguma. E quando não há fé, não há nenhum amor ao próximo, e, assim, tudo é falso e mal.

Na Igreja Antiquíssima, antes da queda, os sentidos corporais eram instrumentos de elevação dos níveis superiores da mente, porque tudo que era percebido pelos sentidos no mundo ao redor servia de instrução acerca de coisas espirituais. Mas, depois da queda,as informações que chegampelos sentidos não recebem mais o influxo da percepção, mas se limitam a uma visão materialista das coisas. O homem acha que a verdade é aquilo que ele pode perceber pela visão e audição, e duvida de tudo o que não podeprovar pelos sentidos. Assim é que as informações dos sentidos, ou da serpente, se tornaram um empecilho para a fé, e por essa razão pela a serpente é amaldiçoada, isto é, que o nível sensual do indivíduo se desviou do celeste e se voltou para o corpóreo, que em si mesmo é morto. 

“A serpente “andaria sobre o ventre” é que o sensual não podia mais olhar para cima, para as coisas celestes, mas para baixo, para as coisas corporais e terrestres. Que “comeria pó todos os dias da vida” é que o sensual tornou-se tal que não podia viver senão das coisas corporais e terrestres, e, assim, tornou-se infernal.”

E agora vem a explicação do versículo 15: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre tua semente e a semente dela; Ele te pisará a cabeça, e tu Lhe ferirás o calcanhar”.  Esta é a primeira profecia a respeito da vinda do Senhor; a fé no Seu Humano é chamada a semente da mulher, e Que Ele pisaria na cabeça da serpente significa que só Ele poderia dominar o mal em geral e o amor de si em particular, e Ele domina o mal no homem que Se deixa regenerar pela Palavra.

Há muito mais que dizer a respeito das palavras que o Senhor dirigiu, primeiro à serpente, depois à mulher, e por último ao homem. No sentido literal, essas palavras parecem maldições, ou como se o Senhor os estivesse amaldiçoando e condenando. Mas, no sentido interno,essas palavras não são maldições, mas previsões. Porque a Divina Providência prevê o que o homem será e, então, provê todos os meios de que o homem necessita para reformado. Em vez de maldição, vemos aí, então a Providência e a Misericórdia Divinas atuando para resgatar o homem caído, provendo os meios, prometendo desde já que o mal seria subjugado quando Ele viesse ao mundo para esmagar a cabeça da serpente e resgatar o ser humano.

Mas teremos de dedicar mais tempo para estudarmos com o devido cuidado, com a atenção que o assunto merece, e, portanto, teremos mais uma palestra a respeito deste tema, a queda homem, e assim poderemos obter mais proveito em nosso estudo. Muito obrigado.


 

 

Arcanos Celestes, 216 – 260

216.          “E coseram folha de figueira, e fizeram cintas para si.”  “Coser folha” é desculpar-se; “figueira” é o bem natural”; “fazer cintas para si” é ser afetado de vergonha. Assim falavam os antiquíssimos, e, assim, descreveram essa posteridade da Igreja, a saber, em que a inocência que havia antes foi substituída pelo bem natural, pelo qual o mal deles era ocultado. E, como estavam no bem natural, por isso foram afetados de vergonha.

217.          Que a “vide” na Palavra signifique o bem espiritual e a “figueira” o bem natural, hoje se ignora completamente, porque o sentido interno da Palavra se perdeu. entretanto, em toda parte em que ocorrem essas palavras, significam ou envolvem tais idéias. Também nas parábolas que o Senhor pronunciou sobre a vinha e sobre a figueira; assim, em Mateus:

“Jesus, vendo uma figueira no caminho, veio a ela, mas nada achou nela senão folhas apenas; por isso lhe disse: Que doravante de ti não nasça fruto, para sempre; pelo que secou-se imediatamente a figueira” (21:19).

Aí se entende que nada do bem, sequer o natural, se achou na terra. Pela “vide” e pela “figueira” se entende coisa semelhante em Jeremias:

“Envergonharam-se os que fizeram abominação? Certamente não foram afetados de vergonha, e não souberam enrubescer-se... Por isso certamente os reunirei, disse Jehovah; não há uvas na vide nem figos na figueira, e a folha caiu” (8:12,13);

por isto é significado que pereceu todo bem, tanto o espiritual quanto o natural, porque eles eram tais que nem mesmo puderam ser afetados de vergonha, assim como hoje se dá com os que estão no mal: tão pouco se envergonham que até se jactam do mal. Em Oséias:

“Como uvas no deserto achei Israel; como primícia na figueira em seu começo vi vossos pais” (9:10).

E em Joel:

“Não temais, bestas dos meus campos, ...porque a árvore produzirá o seu fruto, a figueira e a vide darão seu vigor” (2:22);

a “vide” é o bem espiritual, a “figueira” o bem natural.

218.          Vers. 8: “E ouviram a voz de JehovahDeus passando no jardim, na viração do dia. E o homem se escondeu, e a esposa dele, da face de JehovahDeus, no meio da árvore do jardim.”Pela “voz de JehovahDeus passando no jardim” se entende o ditame que eles temiam. O ditame é o resíduo de percepção que tinham; pela “viração [aura] ou aragem [spiritum] do dia” é significado o tempo em que a Igreja antiquíssima tinha ainda um resíduo de percepção; “ocultar-se da face de JehovahDeus” é temer o ditame, como fazem os que são cônscios do mal; pelo “meio da árvore do jardim em que se ocultavam” é significado o bem natural; chama-se “meio” o que é íntimo; “árvore” é a percepção, como foi dito antes; mas porque havia pouca percepção, a árvore é mencionada no singular, como um resíduo.

219.          Que pela “voz de JehovahDeuspassando no jardim” se entenda o ditame que eles temiam, pode-se ver pela significação de “voz” na Palavra, onde a “voz de Jehovah” é tomada pela Palavra mesma, pela doutrina da fé, pela consciência ou aviso interno e também por toda censura que provém dela. Por isso os raios são chamados “vozes de Jehovah”, como em João:

“Então o anjo clamou com grande voz, como um leão que ruge, e, quando clamou, os sete trovões fizeram soar suas vozes” (Apoc. 10:3,4),

isto é, que eram então a voz externa e a interna. No mesmo:

“Nos dias da voz do sétimo anjo... se cumprirá o mistério de Deus (Apoc. 10:7).

Semelhantemente, em David:

“Cantai a Deus... salmodiai ao Senhor... a Aquele que cavalga sobre os céus dos céus de antiguidade. Eis, Ele dará sua voz, uma voz de força” (Sal. 68:32,33);

“os céus dos céus de antiguidade” é a sabedoria da Igreja Antiquíssima; “voz” é a revelação e também o ditame interno. No mesmo:

“A voz de Jehovah sobre as águas... a voz de Jehovah em poder; a voz de Jehovah em glória; a voz de Jehovah quebrando os cedros; ...a voz de Jehovah cortando as chamas de fogo; a voz de Jehovah faz tremer o deserto; ...a voz de Jehovah faz parir as cervas, e desnuda as matas” (Sal. 29:3-5, 7-9).

E em Isaías:

“Jehovah fará ouvir a excelência de sua voz ...porque pela voz de JehovahAsshur será abatido” (30:30,31).

220.          Pela “voz passando” se entende que lhes restava um resíduo de percepção, como se fosse para eles somente e quase não ouvida, o que também se vê pelo versículo seguinte, onde se diz que Jehovah clamou ao homem, bem como em Isaías:

“Voz do que clama no deserto... disse a voz: Clama” (40:3,6);

o “deserto” é a Igreja em que não há fé; a “voz do que clama” é o anúncio do Advento do Senhor e, em geral, todo anúncio de Seu Advento, como nos regenerados em que há o ditame.

221.          Que pela “viração (ou aragem) do dia” seja significado o tempo em que a Igreja Antiquíssima ainda tinha um resíduo de percepção, vê-se pela significação de “dia” e “noite”. Os antiquíssimos comparavam os estados da Igreja aos tempos do dia e da noite; aos tempos do dia quando ela ainda estava na luz; por isso aqui se diz “aragem ou viração do dia”, quando tinham algum resíduo de percepção pelo qual sabiam que tinham caído. O Senhor também chamou “dia” ao estado da fé, e “noite” ao estado de nenhuma fé; como em João:

“Cumpre-Me fazer as obras d`Aquele que Me enviou, enquanto é dia; a noite vem, quando ninguém pode trabalhar” (9:4).

É daí que, no capítulo primeiro, os estados da regeneração do homem são chamados “dias”.

222.          Que “ocultar-se da face de Jehovah” seja temer o ditame, como fazem os que são cônscios de seu mal, vê-se pela resposta deles, no vers. 10, onde se acham estas expressões: “Tua voz ouvi no jardim, e temi, porque estou nu”. As “faces de Jehovah” ou do Senhor são a misericórdia, a paz e todo bem, como se vê claramente pela bênção:

“Jehovah faça luzir as Suas faces sobre ti, e tenha misericórdia de ti; Jehovah levante Suas faces sobre ti, e te dê a paz” (Núm. 6:25,26),

e em David:

“Deus tenha misericórdia de nós e nos abençoe; faça luzir Suas faces sobre nós” (67:1),

e em outra passagem:

“Muitos dizem: quem nos fará ver o bem? Traze sobre nós a luz de Tuas faces, Jehovah” (Sal. 4:6,7).

Daí a misericórdia do Senhor ser chamada “o anjo das faces” em Isaías:

“As misericórdias de Jehovah farei lembrar ... retribui-lhes segundo as Suas misericórdias, e segundo a multidão de Suas misericórdias... e tornou-Se Salvador para eles; em toda angústia deles, nenhuma angústia, e o anjo de suas faces os salvou; por causa de seu amor e por causa de sua clemência Ele os redimiu” (63:7-9).

223.          Como as “faces do Senhor” são a misericórdia, a paz e todo bem, vê-se que Ele nunca olha para pessoa alguma a não ser com misericórdia, e nunca desvia Sua face de alguém, mas é o homem que desvia a sua face quando está no mal. É como foi dito pelo Senhor em Isaías:

“São vossas iniquidades que fazem separação entre vós e vosso Deus, e vossos pecados fazem ocultar de vós as faces” (59:2).

Assim também aqui, que eles se “esconderam da face de Jehovah porque estavam nus”.

224.          A misericórdia, a paz e todo bem ou “as faces de Jehovah” são as coisas que produzem o ditame naqueles que têm percepção e também nos que têm consciência, mas com diferença. E elas operam sempre com misericórdia, mas são recebidas segundo o estado em que o homem está. O estado desse homem ou dessa posteridade da Igreja Antiquíssima era do bem natural, e os que estão no bem natural são tais que se ocultam pelo temor e pela vergonha de estarem nus. Mas os que não estão em bem natural algum sequer se ocultam, porque não se envergonham. É destes que se trata em Jeremias 8:12,13 (vide acima, no n.º 217).

225.          Que “o meio da árvore do jardim” signifique o bem natural em que há alguma percepção, a qual se chama “árvore”, pode-se ver também pelo jardim em que estava o homem celeste, pois chama-se “jardim” tudo o que é bem e vero, com diferença segundo o homem que o cultiva. O bem não é bem a não ser que seu íntimo seja celeste, segundo o qual, ou pelo qual desde o Senhor, exista a percepção. Esse íntimo se chama “meio”, como também ocorre em outras passagens na Palavra.

226.          Vers. 9 e 10: “E clamou JehovahDeus ao homem, e lhe disse: Onde tu estás? E disse: Tua voz ouvi no jardim e temi, porque eu estou nu, e me escondi.”  Foi explicado anteriormente o que é “clamar”, o que é “voz no jardim” e por que eles “temeram por estarem nus e se esconderam”. Na Palavra é comum que primeiro se pergunte ao homem onde ele está e o que [faz], ainda que o Senhor conheça de antemão todas as coisas. Mas a razão da pergunta é para que o homem reconheça e confesse.

227.          Mas cumpre saber donde vêm a percepção, o ditame e a consciência. Como isso é inteiramente ignorado hoje, é permitido descrever alguma coisa a respeito. É a mais plena verdade que o homem é governado pelo Senhor através dos espíritos e anjos. Quando os maus espíritos começam a dominar, então os anjos operam para afastar os males e falsos; daí existe o combate. Esse combate é que se sente pela percepção, pelo ditame e pela consciência. Por esse modo, como também pelas tentações, o homem poderia saber claramente que há espíritos e anjos com ele, se não estivesse tão imerso nas coisas corpóreas a ponto de nada crer do que se diz a respeito de espíritos e de anjos. Por isso, se tais homens sentissem cem vezes os combates, diriam sempre que são fantasias e causados por alguma enfermidade da mente. Foi-me dado sentir esses combates milhares de vezes, quase continuamente e no espaço já de alguns anos, e daí ter uma sensação viva, sentindo, assim, quem eram esses espíritos, suas qualidades, onde estavam, quando se aproximavam e se afastavam; e falei com eles.

228.          Não se pode descrever quão apurada é a percepção dos anjos, quanto a se alguma coisa que é contra o vero da fé e o bem do amor se insinua ou não. Percebem mil vezes melhor do que o homem a qualidade do que se insinua e quando isso se dá; o homem mal sabe alguma coisa sobre isso. A mínima coisa do pensamento no homem é mais perceptível aos anjos que a maior. Isso é, de fato, incrível, mas é a mais plena verdade.

229.          Vers. 11 a 13: “E disse: Quem te deu a saber que tu estás nu? Ou não comeste da árvore de que te ordenei que não comesses dela? E disse o homem: A mulher, que deste [para estar] comigo, ela me deu da árvore, e comi. E disse JehovahDeus à mulher: Por que fizeste isso? E disse a mulher: A serpente me enganou, e comi.”  Pelo que foi explicado anteriormente se vê o que estas expressões significam, a saber, que o racional do homem deixou-se enganar pelo proprium que lhe era caro, ou pelo amor de si, a ponto de em nada crer a não ser no que visse e sentisse. Qualquer um pode ver que JehovahDeus não teria Se dirigido a uma serpente, e não teria havido serpente alguma, nem que Ele Se dirigiu ao sensual que foi significado pela serpente, mas que essas expressões envolvem outra coisa, a saber, que eles perceberam que foram enganados pelos sentidos e, como tinham amado a si mesmos, tinham desejado saber se era verdadeiro o que tinham ouvido sobre o Senhor e sobre a fé n`Ele, e, assim, é que quiseram crer pela primeira vez.

230.          O mal dominante dessa descendência era o amor de si e não tanto o amor do mundo ao mesmo tempo, como se dá hoje, pois viveram distinguidos em casas e famílias e não se inclinavam às riquezas.

231.          O mal da Igreja Antiquíssima, não só a que existiu antes do dilúvio, mas também o mal da Igreja Antiga que existiu após o dilúvio, e também o mal da Igreja Judaica, como depois o mal da Igreja nova ou dos gentios de após o Advento do Senhor, bem como o da Igreja de hoje, é que as pessoas não crêem no Senhor ou na Palavra, mas em si mesmas e nos sentidos; daí não há fé alguma. E quando não há fé, não há nenhum amor ao próximo, e, assim, tudo é falso e mal.

232.          Hoje é muito pior do que outrora, porque se pode confirmar a incredulidade dos sentidos por meio de conhecimentos ignorados pelos antigos. Daí haver uma escuridão tal que não se pode jamais descrever. Se o homem soubesse quanta escuridão vem daí, ficaria espantado.

233.          Explorar os mistérios da fé por meio dos conhecimentos é tão impossível quanto a um camelo entrar pelo furo de uma agulha. E tão impossível quanto a uma costela governar as fibrilas mais puras do peito e do coração. O sensual e os conhecimentos são, respectivamente, tão grosseiros e ainda mais grosseiros em relação ao espiritual e celeste. Quem quiser investigar apenas as coisas da natureza, que são inúmeras, mal desvenda uma; e, como se sabe, cai em falsidades enquanto investiga. O que será, então, se quiser examinar as coisas ocultas da vida espiritual e celeste, onde há dezenas de milhares para cada uma das que estão invisíveis na natureza? [2] Como ilustração, seja apenas este exemplo: O homem não pode de si mesmo fazer outras coisas senão o mal e o falso e se desviar do Senhor. Todavia, não é o homem que o faz, mas os maus espíritos que estão com ele; e nem os maus espíritos, mas o mal mesmo de que se apropriaram; e, sempre, é o homem que faz o mal e se desvia, e é sua culpa; e, todavia, não vive a não ser pelo Senhor. Por outro lado, o homem nunca pode de si mesmo praticar o bem e se converter ao Senhor, mas o faz pelos anjos; nem os anjos o podem, mas fazem-no somente pelo Senhor; e, sempre, o homem pode como de si mesmo fazer o bem e se converter ao Senhor. Que a coisa se passe assim, nunca os sentidos, os conhecimentos e a filosofia poderão compreender; se são consultados, eles as negam absolutamente, quando todavia são em si mesmas verdadeiras. Semelhantemente ocorre em todas as outras coisas. [3] Por aí se pode ver que aqueles que consultam as coisas dos sentidos e dos conhecimentos sobre o que devem crer precipitam-se não só em dúvidas, mas também na negação, isto é, na escuridão. E, quando estão na escuridão, estão também em todas as cobiças, pois, quando crêem o falso, também fazem o que é falso; e, quando crêem que não existe o espiritual e celeste, crêem que existe somente o corpóreo e mundano. Assim, amam tudo o que pertence a si mesmos e ao mundo, e daí é que do falso se originam as cobiças e os males.

ffffffff


 

 

 

 

Gênesis
CapítuloTerceiro
(Continuação)
 

14.    E disse Jehovah Deus à serpente: Porquanto fizeste isto, maldita tu [serás] mais do que toda besta, e mais do que toda fera do campo. Sobre teu ventre andarás, e pó comerás todos os dias de tua vida.

15.    E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre tua semente e a semente dela; Ele te pisará a cabeça, e tu Lhe ferirás o calcanhar.

16.    E à mulher disse: Multiplicando multiplicarei1 tua dor e tua concepção; com dor parirás filhos, e para teu varão [será] tua obediência, e este te dominará.

17.    E ao homem disse: Porquanto ouviste a voz de tua esposa, e comeste da árvore da qual te mandei dizendo: Não comerás dela, maldito será o humo por causa de ti. Em grande dor comerás dele todos os dias de tua vida.

18.    E espinho e cardo produzirá para ti, e comerás a erva do campo.

19.    No suor de teu rosto comerás pão, até que voltes para o humo, porque dele foste tomado. Porque tu és pó, e a pó voltarás.

 

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1  Literalmente do latim: Multiplicando multiplicabo. Vide comentário acima sobre a repetição enfática deste verbo.

Conteúdo
 

234.          É descrito o estado subsequente da Igreja até o dilúvio. E como a Igreja então se perdeu inteiramente, é predito que o Senhor há de vir ao mundo e há de salvar o gênero humano.

235.          Como eles não quiseram mais crer senão naquilo que apreendessem pelos sentidos, o sensual, que é a “serpente”, se amaldiçoou e se tornou infernal, vers. 14.

236.          Por consequência, para que todo homem não fosse precipitado no inferno, o Senhor prometeu que viria ao mundo, vers. 15.

237.          A Igreja é mais amplamente descrita pela “mulher”, que de tal maneira amou a si mesma ou ao proprium, que nada mais podia compreender do vero, ainda que a eles se tenha dado um racional que devia dominar, vers. 16.

238.          Então é descrita a qualidade do racional, que deu o consentimento e, assim, também se amaldiçoou e se tornou infernal, de modo que não mais tenha permanecido a razão, mas o raciocínio, ver. 17.

239.          Descrevem-se a maldição e a vastação deles, bem como sua natureza selvagem, vers. 17.

240.          Depois, a aversão por tudo o que é da fé e do amor; e assim, de homens que eram, tornaram-se não-homens, vers. 19.

Sentido Interno
 

241.          Os antiquíssimos, que eram celestes, eram tais que todas as coisas que viam no mundo e sobre a terra, de fato as viam, mas pensavam nas coisas celestes e Divinas que elas significavam ou representavam. A vista deles era somente um certo instrumental, e, assim, era, consequentemente, a natureza de sua linguagem. Pela sua própria experiência, qualquer um pode saber como teria sido isso. Com efeito, aquele que dirige a atenção para o sentido das palavras do que fala, de fato ouve as palavras, mas é como se as não ouvisse; apreende somente o sentido. E aquele que pensa mais profundamente, nem mesmo presta atenção ao sentido das palavras, mas às coisas mais universais do sentido. Mas essas descendências de que agora se trata não eram como os seus pais, quando viam as coisas mundanas e terrestres. Como amavam essas coisas, as tinham presentes em sua mente e pensavam sobre elas e, por elas, sobre as coisas celestes e Divinas. Assim, para eles o sensual começou a ser o principal e não o instrumental, como era para os seus pais. E, quando o terrestre e mundano se torna o principal, então, por este começam a raciocinar sobre as coisas celestes, e se cegam. Qualquer um pode saber também, pela própria experiência, que o caso é assim. Com efeito, aquele que não dirige a atenção ao sentido das palavras, mas às palavras, esse apreende pouco do sentido, menos do sentido geral e, às vezes, julga todas as coisas que o outro fala por uma única palavra, e até por um único ponto gramatical.

242.          Vers. 14: “E disse JehovahDeus à serpente: Porquanto fizeste isto, maldita tu [serás] mais do que toda besta, e mais do que toda fera do campo. Sobre teu ventre andarás, e pó comerás todos os dias de tua vida”.  “JehovahDeus disse à serpente” significa que eles perceberam ser o seu sensual a causa. Que a “serpente seria maldita mais do que toda besta e fera do campo” significa que o sensual se desviou do celeste e se voltou para o corpóreo, e, assim, se amaldiçoou. “Besta e fera do campo” significam, aqui como antes, as afeições. Que a serpente “andaria sobre o ventre” é que o sensual não podia mais olhar para cima, para as coisas celestes, mas para baixo, para as coisas corporais e terrestres. Que “comeria pó todos os dias da vida” é que o sensual tornou-se tal que não podia viver senão das coisas corporais e terrestres, e, assim, tornou-se infernal.

243.          No homem antiquíssimo celeste, as coisas do corpo eram tais que obedeciam e serviam ao homem interno deles, e com mais do que isso eles não se ocupavam. Mas, depois que eles começaram a amar a si próprios, preferiam as coisas dos sentidos às do homem interno; por isso elas foram separadas, tornaram-se corpóreas e, assim, condenadas.

244.          Que “JehovahDeus disse à serpente” signifique que perceberam que o sensual era a causa, foi mostrado anteriormente; por isso não se deterá nesses pontos.

245.          Que “disse à serpente: Maldita tu [serás] mais do que toda besta e mais do que toda fera do campo” signifique que o sensual se desviou do celeste e se voltou para o corpóreo, e, assim, tenha se condenado ou amaldiçoado, pode-se ver muito bem pelo sentido interno da Palavra. JehovahDeus ou o Senhor nunca amaldiçoa alguém, nunca Se encoleriza com alguém, nunca induz alguém em tentação, jamais castiga e ainda menos maldiz, mas é a turba diabólica que faz tais coisas, as quais nunca podem vir da Fonte de misericórdia, paz e bondade. Que, todavia, seja dito em várias passagens na Palavra que JehovahDeus não só desvia as faces, encoleriza-Se, castiga e tenta, como também que Ele mata e até amaldiçoa, a razão disso é para que as pessoas creiam que o Senhor governa e ordena todas e cada uma das coisas no universo, até o próprio mal, as penas e as tentações. E após terem recebido essa ideia mais geral, aprendem, em seguida, como Ele governa e ordena, e como Ele converte em bem o mal da pena e o mal da tentação. A ordem para se ensinar e se aprender na Palavra é começar pelas coisas mais gerais; por isso o sentido da letra é abundante dessas coisas mais gerais.

246.          Que a “besta e a fera do campo” signifiquem as afeições, pode-se ver pelas coisas que foram ditas anteriormente sobre a besta e a fera, nos nºs 45 e 46, às quais é lícito acrescentar o que está em David:

“Uma chuva de benevolências derramas, ó Deus; a herança Tua [em] sofrimento, Tu a confirmas; Tuas feras habitarão nela” (Sal. 68:9,10),

onde também a “fera” é a afeição do bem, porque habitará na herança de Deus. Que aqui, como também no capítulo 2, vers. 19 e 20, se diz “besta e fera do campo”, enquanto no capítulo 1, vers. 24 e 25 se disse “besta e fera da terra”, é porque se trata da Igreja ou do homem regenerado – porque “campo” é um vocábulo que se aplica à Igreja ou ao regenerado – ao passo que no capítulo primeiro se tratou da não-Igreja ou do homem que deve ser regenerado.

247.          Que “a serpente andaria sobre o ventre” seja que o sensual não podia mais olhar para cima, para as coisas celestes, como antes, mas para baixo, para as coisas corpóreas e terrestres, vê-se pelo seguinte: na antiguidade, pelo “ventre” eram significadas as coisas que estão próximas à terra; pelo “peito”, as que estão sobre a terra; e pela “cabeça”, as que são supremas. Assim, aqui, o sensual, que em si é o mais baixo do homem, porque se volta para o que é terrestre, é que “andaria sobre o ventre”. Isto também foi significado na Igreja Judaica pela prostração do ventre até à terra e pelo ato de se espalhar pó sobre a cabeça. Assim se diz em David:

“Por que escondes as Tuas faces, Te esqueces da nossa miséria, e da nossa opressão? Pois nossa alma se curvou até o pó, e nosso ventre apega-se à terra. Levanta-Te [em] nosso auxílio, e resgata-nos por causa de Tua misericórdia” (Sal. 44:24-26),

onde também se vê como o homem se apega ao “pó” e o seu “ventre à terra” quando se desvia da face de Jehovah. Também em Jonas, pelo ventre do grande peixe em que ele foi lançado são significados os inferiores da terra, como se vê pela profecia em seu livro:

“Do ventre do inferno clamei, Tu ouviste a minha voz” (2:2),

onde o “inferno” é a terra inferior.

248.          Por isso, quando o homem olhava as coisas celestes, dizia-se que andava ereto e que olhava para cima ou para a frente, o que é a mesma coisa. Quando, todavia, olhava as coisas corpóreas e terrestres, que estava encurvado para a terra e olhava para baixo ou para trás. Como no Levítico:

“Eu [sou] Jehovah vosso Deus, Que vos tirei da terra do Egito, para que não fôsseis seus escravos; e quebrei os vínculos de vosso jugo, e vos fiz andar eretos” (26:13);

emMiquéias:

“Não retirareis dali vossas cervizes e não andareis eretos” (2:3);

emJeremias:

“Um pecado Jerusalém pecou... por isso eles a desprezaram, porque viram a sua nudez; ela também gemeu, e se voltou para trás... Do alto enviou fogo em meus ossos... e me fez voltar para trás, fez-me assolada” (Lam. 1:8,13);

emIsaías:

“Jehovah teu Redentor... que faço tornar atrás os sábios e faço estúpida a ciência deles” (44:24,25).

249.          Que “comer pó todos os dias da vida” signifique que o sensual se tornou assim, e não podia viver por outra coisa senão o que é corpóreo e terrestre e, assim, infernal, vê-se também pela significação de “pó” na Palavra, como em Miquéias:

“Apascenta o Teu povo ... como nos dias da eternidade ... As nações verão e envergonhar-se-ão,  por causa de todo o seu poder ... lamberão o pó como a serpente, e como serpentes da terra, mover-se-ão para fora de seus encerramentos” (7:14,16,17);

“dias de eternidade” é a Igreja Antiquíssima; as “nações”, os que confiam no proprium, aos quais se atribui “lamber o pó como serpente”. Em David:

“Diante de Deus se encurvarão os bárbaros, e os seus inimigos lamberão o pó” (Sal. 72:9);

“bárbaros e inimigos” são aqueles que olham somente as coisas terrestres e mundanas. Em Isaías:

“Para as serpentes, pó será o pão” (65:25).

Como o “pó” significava aqueles que não olhavam as coisas espirituais e celestes, mas as corpóreas e terrestres, o Senhor ordenou aos discípulos que

“Se a cidade ou a casa não fosse digna, sacudissem o pó de seus pés” (Mt. 10:14).

O “pó” significa o que é condenado e infernal; sobre isto, serão vistas mais coisas no vers. 19.

250.          Vers. 15: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre tua semente e a semente dela; Ele te pisará a cabeça, e tu Lhe ferirás o calcanhar”.  Ninguém hoje ignora que esta é a primeira profecia do Advento do Senhorao mundo; isto se vê claramente, até pelas próprias palavras. Por aí e também pelos Profetas os judeus sabem que o Messias deve vir. Mas ninguém soube ainda o que se entende em particular pela serpente, pela mulher, pela semente da serpente, pela semente da mulher, pela cabeça da serpente que Ele pisará e pelo calcanhar que a serpente ferirá. Por isso, essas coisas devem ser expostas. Pela “serpente” se entende aqui todo mal em geral e o amor de si em particular; pela “mulher” se entende a Igreja; pela “semente de serpente”, toda infidelidade; pela “semente de mulher” a fé no Senhor; por “Ele”, o Senhor Mesmo; pela “cabeça de serpente” o domínio do mal em geral e do amor de si em particular; por “pisar”, o abatimento para que ande sobre o ventre e coma pó; pelo “calcanhar”, o ínfimo natural, como o corpóreo, que a serpente “ferirá”.

251.          Que pela “serpente” se entenda todo mal em geral e o amor de si em particular, é porque todo mal surgiu do sensual e depois do conhecimento, os quais foram significados no princípio pela “serpente”. Por isso ela agora significa o mal mesmo, qualquer que seja, e em particular o amor de si ou o ódio contra o próximo e o Senhor, o que é o mesmo que o amor de si. Esse mal ou ódio, porque é múltiplo e dividido em seus muitos gêneros e ainda maior número de espécies, é distinguido na Palavra pelos gêneros de serpentes, como pelas cobras, pelos basiliscos, pelas áspides, pelas cobras-de-sangue [haemorrheos], pelas présteres ou serpentes-de-fogo, pelas serpentes voadoras e pelas que se arrastam, e pelas víboras, portanto, segundo as diferenças de veneno, que é o ódio. Como em Isaías:

“Não te alegres tu, toda a Filístia, por ser quebrada a vara que te fere; porque da raiz da serpente sairá um basilisco, e de seu fruto uma serpente [prester] voadora” (14:29),

“raiz da serpente” é o sensual e o conhecimento; o “basilisco” é o mal e o falso daí proveniente; a “serpente [prester] voadora” é a cobiça que é do amor de si. E, no mesmo profeta, se fala de outro modo sobre as mesmas coisas, assim:

“Ovos de basiliscos chocam, e teias de aranha tecem; o que comer dos ovos deles morrerá, e quando são apertados, sai deles uma víbora” (59:5).

Essa serpente se chama, no Apocalipse, “grande dragão vermelho” e “serpente antiga”; depois:

“Diabo e satanás, que seduz todo o orbe das terras” (12:3,9;20:2).

Aqui e em outros lugares, pelo “diabo” nunca se entende algum diabo como chefe dos outros, mas toda a turba dos maus espíritos e o próprio mal.

252.          Que pela “mulher” se entenda a Igreja, pode-se ver pelo casamento celeste de que se falou acima, no n.º 155. O casamento celeste é tal que o céu, e, assim, a Igreja, é unido ao Senhor pelo proprium a tal ponto, que está no proprium, pois sem o proprium não há união. Quando o Senhor, por misericórdia, insinua nesse proprium a inocência, a paz e o bem, ele se mostra ainda como proprium, mas então é celeste e felicíssimo, como se vê acima, no n.º 164. Mas a qualidade do proprium celeste e angélico que vem do Senhor e a qualidade do proprium infernal e diabólico que vem de si mesmo ainda não podem ser descritas. A diferença é tal a que existe entre o céu e o inferno.

253.          Pelo proprium celeste e angélico, a Igreja na Palavra se chama “mulher”, como também “esposa” “virgem” e “filha”. Que ela se chame “mulher”, vê-se no Apocalipse:

“Uma mulher envolta pelo sol, e a lua sob os seus pés, e sobre a sua cabeça uma coroa de doze estrelas;... e que o dragão perseguiu a mulher que dará à luz um [filho] macho” (12:1,4,5,13);

onde pela “mulher” se entende a Igreja; pelo “sol” o amor; pela “lua” a fé; pelas “estrelas” as verdades da fé, como antes. Os maus espíritos odeiam essas coisas e as perseguem por todos os meios. Que ela se chame “mulher” e também “esposa”, vê-se em Isaías:

“Porque os teus Maridos e os teus Feitores, o Seu nome se chama JehovahZebaoth, o Santo de Israel, Deus de toda a terra; pois como à mulher abandonada e aflita de espírito, chamou-te Jehovah, e como esposa das adolescências” (54:5,6);

onde “Marido” e “Feitor” estão numa espécie de plural, porque há ao mesmo tempo o proprium; “mulher abandonada” e “esposa das adolescências” são, especificamente, a Igreja Antiga e a Antiquíssima. Semelhantemente em Malaquias:

“Jehovah foi testemunha entre ti e a esposa de tuas adolescências” (2:14).

Que ela se chame “esposa” e “noiva”, vê-se no Apocalipse:

“Vi a cidade santa, a [Nova] Jerusalém descendo de Deus pelo céu, preparada como a noiva adornada para seu marido... Vem, e mostrar-te-ei a noiva do Cordeiro, a esposa” (21:2,9).

Que ela se chame “virgem” e “filha” é comum nos Profetas.

254.          Que pela “semente da serpente” seja entendida toda infidelidade, vê-se pela significação da “serpente” que é todo mal. A semente é o que produz e é produzido, ou o que gera e é gerado. E, como aqui se trata da Igreja, é a infidelidade. Em Isaías, se fala da “semente dos maus”, “semente de adultério” e “semente da mentira”, onde se trata da Igreja Judaica pervertida:

“Ai da nação pecadora, do povo carregado de iniquidade, da semente dos maus, dos filhos destruidores; deixaram Jehovah, provocaram o Santo de Israel, desviaram-se para trás” (1:4).

Depois:

“Chegai-vos aqui, filhos da agoureira, semente de adultério... não nasceste da prevaricação, semente de mentira?” (Ibid. 57:3,4).

E:

“Foste lançado de teu sepulcro como broto abominável... porque tua terra corrompeste, teu povo mataste; a semente de maus não se nomeará para sempre” (14:19,20),

onde se trata da serpente ou do dragão, que aí se chama Lúcifer.

255.          Que pela “semente da mulher” se entenda a fé no Senhor, vê-se pela significação de “mulher”, que é a Igreja. Sua semente não é outra coisa senão a fé. É pela fé no Senhor que ela existe e se chama Igreja. Em Malaquias a fé é chamada “semente de Deus”:

“Jehovah foi testemunha entre ti e entre a esposa de tuas adolescências... e não fez Ele somente um, e o resto, espírito para ele? E quem há, um só, que busque a semente de Deus? Mas guardai-vos em vosso espírito, e contra a esposa de tuas adolescências não ajas tu perfidamente” (2:14,15),

onde a “esposa das adolescências” é a Igreja Antiga e Antiquíssima de cuja semente ou fé aí se trata. Em Isaías:

“Derramarei águas sobre o sedento, e correntes sobre a [terra] seca; derramarei [Meu] espírito sobre a tua semente, e Minha bênção sobre os descendentes de ti” (44:3);

onde também se trata da Igreja. No Apocalipse:

“Irou-se o dragão contra a mulher e foi fazer guerra aos restantes de sua semente, que guardavam os mandamentos de Deus e têm o testemunho de JesusCristo” (12:17);

e em David:

“Firmei uma aliança com o Meu Eleito, jurei a David, Meu servo: Para a eternidade estabelecerei a tua semente; ...e edificarei perpetuamente a tua semente, e o Seu trono como os dias dos céus; ...sua semente existirá na eternidade, e o seu trono como o sol perante Mim” (Sal. 89:3, 4, 29, 36),

onde por “David” se entende o Senhor, pelo “trono” o Seu reino, pelo “sol” o amor e pela “semente” a fé.

256.          Não somente a fé é chamada “semente de mulher”, mas também o Senhor Mesmo é chamado assim, tanto porque só Ele dá a fé e, assim, é a fé, quanto porque Lhe aprouve nascer, e até numa Igreja que caíra inteiramente no propriuminfernal e diabólico por causa do amor de si e do mundo. Ele fez isso por Seu Divino Poder, para unir o Proprium Divino Celeste ao proprium Humano em Sua Essência Humana, para que se fizessem Um n`Ele. Sem esta união, o mundo pereceria inteiramente. Como o Senhor é a “Semente de Mulher”, não se diz “aquilo” [a semente], mas “Ele”.

257.          Que pela “cabeça da serpente” se entenda o domínio do mal em geral e do amor de si em particular, pode-se ver pela sua natureza, que é tal que não só procura o domínio, mas também o domínio sobre todas as coisas da terra; e nem assim descansa, mas quer dominar sobre todas as coisas do céu; e nem mesmo assim, mas quer dominar sobre o Senhor; e, mesmo então, não descansaria. Eis o que está oculto em cada centelha do amor de si. Se apenas for favorecido e se lhe soltar o laço, perceberás que logo precipitará e crescerá até aquele ponto. Daí se vê como a “serpente” ou o mal do amor de si quer dominar; e a quem não pode dominar, ele odeia. Isto é a “cabeça da serpente” que se levanta e que o Senhor “pisa” e abaixa até à terra, para que “ande sobre o ventre e coma pó”, como foi dito no versículo imediatamente precedente. Em Isaías, assim se descreve a “serpente” ou o “dragão”, que se chama Lúcifer:

“Lúcifer, tu disseste em teu coração: aos céus subirei, sobre as estrelas de Deus exaltarei meu trono, e sentar-me-ei no monte da convenção, nos lados do norte. Subirei sobre os excelsos lugares da nuvem, tornar-me-ei igual ao Altíssimo. Entretanto, no inferno serás precipitado, para os lados da cova” (14:13,15).

A “serpente” ou “dragão” é descrita também no Apocalipse:

“Um dragão grande, vermelho, tendo sete cabeças e dez chifres, e sobre as suas cabeças muitos diademas ... mas foi precipitado na terra” (12:3,9),

onde se descreve o quanto ele levantou a cabeça. Em David:

“Dito de Jehovah ao Meu Senhor: Assenta-Te à Minha direita, até que Eu ponha os Teus inimigos por escabelo de Teus pés. O cetro de Tua força Jehovah enviará de Sião ... Ele julgará as nações, encheu de cadáveres, esmagou a cabeça sobre muita terra; da torrente no caminho beberá, por isso exaltará a cabeça” (Sal. 110:1, 2, 6, 7).

258.          Que por “pisar” ou esmagar se entenda o abaixamento “para que ande sobre o ventre e coma pó”, vê-se agora e pelo versículo precedente. Semelhantemente também em Isaías:

“Jehovah abateu os que habitavam o alto; a cidade exaltada Ele humilhará até à terra, derribá-la-á até o pó, o pé a pisará” (26:5,6).

Depois:

“Abaterá na terra com a mão; com os pés a calcarão, coroa do orgulho” (28:2,3).

259.          Que pelo calcanhar seja entendido o ínfimo natural ou o corpóreo, não se pode sabê-lo a menos que se saiba de que maneira os antiquíssimos consideravam as coisas que estão no homem. As suas coisas celestes e espirituais referiam à cabeça e à face; as que existiam por elas, como a caridade e a misericórdia, referiam ao peito; mas as naturais, aos pés, e as naturais mais inferiores à planta dos pés; as naturais ínfimas e as corpóreas, ao calcanhar. Eles não só as referiam a essas partes, mas também as chamavam assim.  As coisas ínfimas da razão ou as dos conhecimentos foram também entendidas pelas coisas que Jacob profetizou a respeito de Dan:

“Dan será uma serpente no caminho, uma áspide na vereda, que morde os calcanhares do cavalo, e seu cavaleiro cai por detrás” (Gên. 49:17).

E pelas que estão em David:

“A iniquidade de meus calcanhares me cercou” (Sal. 49:6).

Semelhantemente ao que se diz de Jacob, quando saiu [do útero],

“Que sua mão segurou o calcanhar de Esaú, e daí se chamou Jacob” (Gên. 25:26).

O nome “Jacob” vem de “calcanhar”, porque a Igreja Judaica, significada por “Jacob”, feriria o calcanhar. A serpente pode ferir apenas as coisas ínfimas naturais, mas não pode — exceto se for uma espécie de víbora — ferir as coisas naturais interiores no homem, ainda menos as espirituais e muito menos ainda as celestes; essas, o Senhor conserva e as oculta, sem que o homem o saiba. As coisas que o Senhor oculta se chamam “relíquias” na Palavra. Mas de que maneira a “serpente” destruiu essa parte ínfima nos antediluvianos pelo sensual e pelo amor de si; de que maneira a destruiu nos judeus pelas coisas sensuais, pelas tradições e frivolidades, e pelo amor de si e do mundo; e de que maneira hoje destrói e tem destruído pelas coisas sensuais, pelas coisas do conhecimento e filosóficas, e, ao mesmo tempo, pelos mesmos amores, na sequência se dirá, pela Divina misericórdia do Senhor.

260.          Por aí se vê que foi revelado à Igreja daquele tempo que o Senhor viria ao mundo e Ele os salvaria.

 

 

 

 

 

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Terceira parte
 

C. R. Nobre

 

Nesta série de conferências temos estudado a história da Criação no livro de Gênesis à luz da explicação de seu sentido espiritual, conforme nos foi exposto na obra “Arcanos Celestes”, de Emanuel Swedenborg.

Vimos aqui, muito superficialmente, o simbolismo que está contido nos relatos bíblicos, simbolismo esse a que chamamos de correspondências, nas quais cada ser, cada objeto ou cada evento mencionado no sentido literal significa algum elemento na dimensão espiritual.

Foi assim que soubemos que o relato da criação do universo significa, no sentido espiritual, a criação do homem espiritual, ou sua regeneração pelo Senhor.

Vimos que a história do homem criado, Adão, e posto para cultivar um jardim em Éden,significa espiritualmente a descrição de como era a natureza e a vida da humanidade nos tempos antiquíssimos neste planeta, sua sabedoria e sua evolução, desde o nível corporal em que nasciam até o nível celeste a que chegavam ainda no mundo natural, e então entravam no mundo espiritual.

Esse era o tempo que os filósofos antigos chamaram de Idade de Ouro do ser humano; sua sabedoria é representada no Gênesis pelos rios e pelas pedras preciosas do jardim; suas afeições e pensamentos são os animais a que o homem deu nomes e os répteis e as aves.

Depois de algum tempo, não sabemos se milhares ou milhões de anos, aquelaspessoas começaram a se desviar do seu estado original; eles quiseramter a sensação de que tinham uma vida propriamente sua, à parte da vida que fluía do Divino. E Deus atendeu esse desejo, fazendo que eles tivessem a sensação de que a vida estivesse neles. Isto foi representado pela mulher, que então representa o proprium ou o ego humano. É esse proprium que dá a sensação de que a vida é inerente ao ser humano. A partir daí, Adão passa a representar, no Gênesis, o lado intelectual ou racional e a mulher representa o lado voluntário ou emocional da mente.

Esta é, então, a segunda fase da vida dos antiquíssimos ou, da Igreja Antiquíssima, porque a história da criação e da humanidade é contada na Bíblia do ponto de vista religioso e não do ponto de vista histórico, antropológicoou geológico.

Numa terceira fase, aquela sensação de vida própria, representada pela mulher, se deixa levar cada vez pelas impressões dos sentidos físicos, e pelos raciocínios formulados a partir dos sentidos, que são representados pela serpente. O desejo que o ser humano teve de se instruir e ser sábio por si mesmo, pelos sentidos do corpo e não pela revelação Divina, foi representado pela sedução da serpente e pelo ato consecutivo de se comer da árvore do conhecimento do bem e do mal.

O modo de instrução por meio dos sentidos acaba prevalecendo, pois isto agrada o ego humano; o racional dá seu consentimento e, como consequência disso,a humanidade perde a sabedoria celeste; sua vida consciente passa a rastejar no plano materialda vida, que é o plano dos sentidos corporais; por isso vivemos pelos sentidos, nos sentidos e para satisfazer os sentidos, o que é relativamente a morte espiritual. 

A humanidade nesta Terra se encontra atualmente nesse estado, porque quer nutrir e desenvolver sua mente apenas pela instrução do intelecto a partir dos sentidos corporais. Toda a ciência humana está fundamentada nos objetos e fenômenos que podem ser observados, medidos, contados, numerados e assim por diante. “Científico”, para nós, é sinônimodo que está em conformidade com os sentidos. O homem pensa que, pela ciência, tem os olhos abertos, segundo a falsa promessa da serpente, e acha que sua sabedoria pode prescindir da revelação do Criador.

Umas poucas pessoas, pelo fato de buscarem a verdade em sua religião, ainda têm um resíduo de percepção, que é consciência, e as verdades de sua fé fazem com que elas percebam a realidade espiritual, e essa realidade é que nós, humanos, diante do Criador, estamos de fato nus, isto é, por nós mesmos estamos desprovidos de sabedoria e, por conseguinte, da verdadeira vida. Quando nos tornamos cientes de nossa condição, de nudez, de cegueira, procuramos cultivar a bondade natural, num esforço de aliviar nossa consciência e nos ocultar do juízo Divino. E é nesse ponto que a voz misericordiosa de Deus nos encontra e nos pergunta onde estamos e o que temos feito de nossas vidas.

Deus dirige Sua palavra primeiramente ao nível dos sentidos da mente humana.Ele diz que a serpente se arrastaria sobre o ventre e comeria pó, significando que os sentidos humanos estariam presos às ilusões materiais e se alimentaria do pó do conhecimento, das trivialidades que são as instruções do mundo, o pó, comparadas à verdade espiritual, que é a Rocha. Mas ele diz, também, que as ilusões dos sentidos não triunfariam para sempre sobre vida humana, pois Ele viria ao mundo e assumiria um Humano natural pela concepção virgem de uma mulher, Ele, a Semente de mulher, a Verdade que se fez carne, subjugaria as falsidades dos sentidos, o que é representado por esmagara cabeça da serpente.

“E à mulher disse: Multiplicarei grandemente tua dor e tua concepção; com dor parirás filhos, e para teu varão [será] tua obediência, e este te dominará”. 

No sentido literal, essas palavras parecem ser de condenação ou maldição. Mas as aparentes maldições feitas à serpente, à mulher e ao homem, são, de fato, somente previsões do que a vida lhes traria, como resultante de suas próprias ações. É dito que o Senhor multiplica a dor do ser humano porque assim é a aparência que temos: atribuímos à ação Divina toda contingência acima de nosso controle. Masjá vimos que isto é uma aparência, e que essa aparência serve, no início, para que a pessoa creia que Deus governa todas as coisas, antes que ela aprenda que o bem vem de Deus, mas o mal vem da natureza humana caída.

“Pela “mulher”, agora, é significada a Igreja, por causa do proprium que ela amou; por “multiplicando multiplicarei a dor” é significada a luta e, pela luta, a ansiedade; pela “concepção” é significado todo o pensamento; pelos “filhos que pariria com dor” são significados os veros que, assim, produziria; pelo “varão”, aqui como anteriormente, é significado o racional ao qual ela deve obedecer e que dominará.” (261)

“Por essas palavras não se entende que as mulheres devem parir os filhos em dor, mas pela ‘mulher’ se entende a igreja, que, de celeste, tornou-se natural; isto significa ‘comer da árvore da ciência’. Que o homem da igreja dificilmente possa ser regenerado pelos veros e pela vida segundo os veros, e que deve sofrer tentações para que os veros sejam implantados e conjuntos ao bem é significado por ‘ser multiplicada a dor e a concepção’ e por ‘em dor parirá filhos’; a ‘concepção’ significa a recepção do vero que procede do bem, e ‘parir filhos’ significa produzir os veros pelo casamento do vero e do bem.

“Uma vez que o homem natural tem concupiscências pelo amor de si e do mundo, e essas não podem ser removidas senão pelos veros, por isso se diz que ‘para o varão será sua obediência e ele a dominará’; pelo ‘varão’ é significado, aqui como em outras passagens na Palavra, o vero da igreja. Que o homem seja reformado e regenerado pelo vero e pela vida segundo os veros é o que se mostrou acima. Por essas explicações pode-se ver agora que por ‘concepção’, ‘parto’, ‘nascimentos’ e ‘gerações’ na Palavra são significados a concepção, o parto, os nascimentos e as gerações espirituais.

Quando os sentidos corporais governam, a pessoa fica exposta aos ataques dos maus espíritos, e são eles que lhe inspiram dúvida, descrença, desânimo, inércia, letargia e, mais ainda, resistência a toda instrução nas verdades espirituais, e rejeição a toda mudança que a instrução lhe sugere. A resistência por parte dos maus espíritos é que faz ser tão difícil abandonarmos um mal hábito, um vício ou um pecado. Essa dificuldade que temos de deixar de fazer o que é mal e gerar em nós algo de bom é essa dor e a luta que nosso voluntário tem, como se fosse o parto da mulher: “multiplicarei grandemente a dor quanto à concepção e quanto ao parto dos filhos”. É dor do processo pelo qual a verdade passa para se tornar bem na ação. (263)

Que o “varão” dominará significa que nosso racional deverá ter o controle do voluntário, e nosso voluntário deve estar sujeito ao racional. Porque, como já vimos aqui, é pelo racional que nós, seres humanos masculinos e femininos, podemos ser elevados acima de nosso proprium, a fim de dirigir o voluntário, pois este é, em si, cego, mudo e irracional. Nosso voluntário ésomente um acúmulo de desejos eemoções, cobiças e sentimentos, e, no que diz respeito ao voluntário o ser humano não se distingue dos animais irracionais.

“E ao homem disse: Porquanto ouviste a voz de tua esposa, e comeste da árvore da qual te mandei dizendo: Não comerás dela, maldito será o humo por causa de ti. Em grande dor comerás dele todos os dias de tua vida”.

O homem externo é chamado “humo” porque é nele que sãoimplantadas as sementes do bem e da verdade. Quando o homem se desviou da vida da ordem, ele se separou do seu interno, e assim se amaldiçoou, pois a vida material em si mesmo é morta e maldita, se for separada da espiritual. Se a dor da mulher representou a dificuldade para fazer o bem, a dor do homem, aqui, é a dificuldade para entender a verdade.

A “grande dor” com que comeria do humo significa, agora, a dor do racional para obter a vida espiritual, porque os maus espíritos que então se acham presentes com o homem se opõem a qualquer esforço que ele fizer para melhorar sua vida. “Os maus espíritos então governam o seu homem externo e os anjos o interno, do qual resta tão pouco que os anjos mal podem dali tomar alguma coisa com que defendê-lo; daí a miséria e a ansiedade.”

Esse sofrimento mental resulta de um combate espiritual entre o céu e o inferno, os anjos e os maus espíritos. Os maus espíritos atacam e os anjos defendem. A batalha se passa na mente do homem;é sobre quem dominará ali, os males que procedem do inferno ou os bens que vêm de Deus pelos céus. O homem sente esse combate como ansiedades e dores de consciência, porque ele crê que os males vêm dele,são a sua vida, a qual ele corre o risco de perder.

Por aí se vê que nem todos sentem esse tipo de sofrimento. Nem todos comem do humo com grande dor. Porque só sofrem os combates de tentação aqueles que têm adquirido alguma consciência e estão sendo regenerados pelo Senhor.

Por exemplo: a pessoa pratica um mal ou se lembra de um mal que praticou no passado e sente vergonha ou remorso por ter feito aquilo. Não vergonha por ter sido por acaso descoberta ou apanhada em flagrante, mas porque hoje crê que aquele mal foi um pecado contra Deus. Então, se, ao lembrar, ela sente pesar, remorso ou vergonha, etem desejo sincero de não repetir aquele feito, por ser um pecado contra Deus, isto é um bom sinal, embora a pessoa sofra em sua consciência,porqueé somente a consciência formada pelas verdades que faz com que a pessoa sinta tristeza pelos pecados. Essa é tristeza diante de Deus que o apóstolo Paulo fala em 2Co. 7:10. Esse sofrimento é, no fim, benéfico. Portanto, comer do humo com grande dor é, portanto, uma bênção, porque, apesar da dor de consciência, a transformação advinda da penitência alimenta o espírito.

Os que não estão sendo regenerados, e que não têm essa dor, são descritos nos Arcanos:

“Os homens mortos raramente sentem tal miséria e ansiedade, porque não são mais homens, ainda que se achem homens mais do que os outros. Pois eles não sabem mais do que os brutos o que é o espiritual e celeste e o que é a vida eterna; semelhantemente, olham para baixo, para as coisas terrestres, ou então para trás, para as mundanas. Somente favorecem o proprium e entregam-se às inclinações naturais [genio] e aos sentidos, com inteiro consentimento do racional. E, como são mortos, não sustentariam luta alguma ou tentação. Se lhes acontecesse alguma tentação, seria tão mais grave que não poderiam sobreviver, e, assim, se amaldiçoariam ainda mais e se precipitariam em condenação infernal ainda mais profunda. Por isso são poupados até que tenham passado à outra vida, onde não podem mais morrer por tentação ou por miséria alguma. Então, sustentam gravíssimas tentações que são semelhantemente significadas por estas palavras: “maldito o humo; em grande dor comerás dele”.

“E espinho e cardo produzirá para ti, e comerás a erva do campo”.  O “espinho e cardo” também representa o estado de maldição e a devastação e “comer erva do campo” é a condição do homem natural quando entregue aos prazeres do corpo e dos sentidos e está separado do espiritual. Ele é fera porque em seu voluntário há as mesmas cobiças e apetites que têm os animais. A única diferença é que ele tem um racional pelo qual pode ser elevado acima dos sentidos e do proprium. Mas, enquanto seu homem interno n]ao receber a vida que flui do Senhor pelas verdades e bens, essa vida corporal do homem se chama morte, e o homem é chamado “morto”, na Palavra.

 “No suor de teu rosto comerás pão, até que voltes para o humo, porque dele foste tomado. Porque tu és pó, e ao pó voltarás.” “Comer pão no suor do rosto” significa ser averso ao que é celeste; “voltar ao humo de que foi tomado” é voltar ao homem externo tal qual era antes da regeneração; “que és pó e ao pó voltarás” é ser condenado e infernal. (275)

Que “comer pão no suor do rosto” signifique ser averso ao que é celeste, pode-se ver pela significação de “pão”. Pelo “pão” se entende todo espiritual e celeste, que é a comida angélica; se os anjos fossem privados dela, não viveriam, assim como o homem se fosse privado do pão ou da comida. O celeste e espiritual no céu também correspondem ao pão nas terras e também são representados pelo pão, como se vê em muitas passagens. (276)

“Comer pão do suor do rosto”, que no sentido da letra parece maldição Divina, é interpretado por alguns como o trabalho, que, no caso, é visto como maldição. Mas é evidente que o trabalho só é tido como maldição para quem presta trabalho escravo, ou para quem não gosta do que faz ou para quem não é afeito ao trabalho. Porque, se nós amamos aquilo que fazemos, o trabalho não é pesado, mas feito com prazer, com satisfação. E o trabalho honesto que prestamos deve ser visto como uma oportunidade que Deus nos dá de sermos úteis, portanto, uma bênção.

Este é o sentido interno. Quem se atém à letra não apreende outra coisa senão que o homem devia obter do humo o pão para si pelo trabalho ou suor do rosto. Mas aqui pelo “homem” não se entende um homem, mas a Igreja Antiquíssima, nem pelo “humo” o humo, nem pelo “pão” o pão, nem pelo “jardim” um jardim, mas as coisas que são celestes e espirituais, como já foi suficientemente mostrado.(277).      

“Que por “voltar ao humo de que foi tomado” seja significado que a Igreja voltaria ao homem externo tal qual era antes da regeneração, vê-se por isso, que o “humo” significa o homem externo, como foi dito antes.E que o “pó” signifique o que é condenado e infernal, vê-se também pelas coisas que foram ditas sobre a serpente, que, como foi amaldiçoada, se disse que “comeria pó”. Além das coisas que foram mostradas sobre a significação do pó, podem-se acrescentar as que estão em David:

“Perante Jehovah se curvarão todos os que descem ao pó, e cuja alma Ele não vivificou” (Sal. 22:29).

E em outro lugar:

“Escondes a Tua face, ficam perturbados; retiras o seu fôlego [spiritum], eles expiram e voltam ao seu pó” (Sal. 104:29),

isto é, que “expiram” ou morrem quando se desviam da face do Senhor, e, assim, “voltam ao pó”, isto é, tornam-se condenados e infernais.(AC 278).       


 

261.          Vers. 16: “E à mulher disse: Multiplicarei grandemente tua dor e tua concepção; com dor parirás filhos, e para teu varão [será] tua obediência, e este te dominará”.  Pela “mulher”, agora, é significada a Igreja, por causa do proprium que ela amou; por “multiplicando multiplicarei a dor” é significada a luta e, pela luta, a ansiedade; pela “concepção” é significado todo o pensamento; pelos “filhos que pariria com dor” são significados os veros que, assim, produziria; pelo “varão”, aqui como anteriormente, é significado o racional ao qual ela deve obedecer e que dominará.

262.          Que pela “mulher” seja significada a Igreja, foi dito anteriormente. Aqui, é a Igreja pervertida pelo proprium que antes foi significado pela mulher, porque se trata da descendência da Igreja Antiquíssima que se pervertera.

263.          Quando, pois, o sensual se desvia ou se amaldiçoa, segue-se que os maus espíritos começam a combater com vigor e os anjos que estão no homem começam a se esforçar; por isso a luta é descrita desta maneira, por “multiplicarei grandemente a dor quanto à concepção e quanto ao parto dos filhos”, isto é, quanto aos pensamentos e às produções do vero.

264.          Que “a concepção e o parto dos filhos” não sejam tomados na Palavra de outro modo senão no sentido espiritual, a saber, que a “concepção” é o pensamento e a imaginação [figmentum] do coração, e “filhos” são os veros, pode-se ver por estas expressões que estão em Oséias:

“... Efraim, como ave voará a glória deles, desde o parto, não só do útero, mas também da concepção. Ainda que tenham criado seus filhos, contudo os desfilharei, para que não sejam homem; porque também, ai deles! pois que me retirarei deles” (9:11,12),

onde “Efraim” significa os inteligentes ou a inteligência do vero, e “filhos” os próprios veros. É semelhante à outra passagem a respeito de Efraim ou do inteligente que se tornou insensato:

“Dores da parturiente lhe vieram; ele [é] um filho não sábio, porque a tempo ele não estará na fenda da madre dos filhos” (13:13).

E em Isaías:

“Envergonha-te, ó Sidon, porque disse o mar, a fortificação do mar, dizendo: Não tive dor de parto, nem pari, nem criei jovens, nem fiz crescer meninas. Como com a notícia do Egito, haverá dor de parto segundo a notícia de Tiro” (23:4,5);

onde “Sidon” é aqueles que estiveram nas cognições da fé e as perderam pelos conhecimentos, e, por conseguinte, se tornaram estéreis. [2]E no mesmo profeta:

“Antes que tivesse dor de parto, ela pariu; e antes que lhe viesse a dor, deu à luz um macho. Quem ouviu tal coisa? Quem viu coisa igual? Acaso teve a terra dor de parto num só dia? ... E não farei parir? disse Jehovah; Eu, que faço parir, porventura fecharei [o útero]? disse o teu Deus” (66:7-9),

onde se trata da regeneração e os “filhos” significam, semelhantemente, os veros da fé. Os bens e veros, por serem as concepções e os partos do casamento celeste, são chamados “filhos” também pelo Senhor, em Mateus:

“Quem semeia a boa semente é o Filho do Homem, o campo é o mundo, mas a semente são os filhos do reino” (13:37,38);

e os bens e veros da fé salvífica se chamam “filhos de Abraham” (João 8:39), pois a “semente” é a fé, como foi dito no n.º 255; por isso os “filhos”, que são da semente, são os bens e veros da fé. Daí vem também que o Senhor, por Ser a Semente Mesma, chamou-Se Filho do Homem, isto é, a fé da Igreja.

265.          Que pelo “varão” seja significado o racional, vê-se pelo versículo 6 deste capítulo, onde se diz que “a mulher deu ao seu varão com ela, e [ele] comeu”, significando que o racional deu o consentimento; e vê-se também pelas coisas que foram mostradas sobre o varão no n.º 158, onde se entende, por ele, o sábio e inteligente. Aqui, porém, como a sabedoria e a inteligência se perderam por terem eles comido da árvore da ciência, o varão significa o racional, porque não restava outra coisa. Com efeito, o racional é uma imitação da inteligência ou sua semelhança, por assim dizer.

266.          Como toda lei e todo preceito existe pelo celeste e espiritual como de seu verdadeiro princípio, segue-se que, assim, é também com esta lei, que é a dos casamentos, a saber, que a esposa, visto que age pela cobiça que é do proprium e não pela razão, como o varão age, esteja sob a prudência do varão.

267.          Vers. 17. “E ao homem disse: Porquanto ouviste a voz de tua esposa, e comeste da árvore da qual te mandei dizendo: Não comerás dela, maldito será o humo por causa de ti. Em grande dor comerás dele todos os dias de tua vida”.  Pelo “homem, que ouviua voz de sua esposa” é significado o varão ou o racional, que deu o consentimento; e como o racional consentiu, também se desviou ou se amaldiçoou, e, por esta razão, todo o homem externo, coisas que são significadas por “maldito o humo por causa de ti”. O estado miserável de sua vida futura é significado por “em grande dor comerás dele”, e mesmo até o fim dessa Igreja, que é “todos os dias de tua vida”.

268.          Que o “humo” signifique o homem externo, pode-se ver pelo que foi dito anteriormente a respeito da “terra”, do “humo” e do “campo”. Quando o homem é regenerado, não se chama mais “terra”, mas “humo”, porque nele são implantadas sementes celestes. Também é comparado ao humo e chamado “humo” em várias passagens na Palavra. É no homem externo, ou em sua afeição e memória, que são implantadas as sementes do bem e do vero, e não no homem interno, porque no interno não há coisa alguma própria do homem, mas no externo. No interno estão os bens e veros que, quando parecem não estar mais presentes, então o homem é externo ou corpóreo; ainda que estejam ocultos no interno pelo Senhor, o homem não o sabe, pois não se mostram a não ser quando o externo morre, por assim dizer, como costuma acontecer nas tentações, nos infortúnios, nas doenças e na hora da morte. O racional também pertence ao homem externo (n.º 118) e é em si mesmo uma espécie de intermediário entre o interno e o externo, pois o interno opera pelo racional no corpóreo externo. Quando, todavia, o racional consente, então ele separa o externo do interno a tal ponto que não se sabe mais que existe um interno nem, por conseguinte, o que é a inteligência e a sabedoria que são do interno.

269.          Que JehovahDeus ou o Senhor não tenha amaldiçoado o “humo” ou o homem externo, mas que o homem externo é que se desviou ou se separou do interno e, assim, se amaldiçoou, vê-se pelo que foi mostrado anteriormente no n.º 245.

270.          Que “comer do humo em grande dor” signifique um estado miserável de vida, vê-se pelas coisas que precederam e que se seguem, além do que “comer”, no sentido interno, é viver. E, depois, pelo fato de que uma tal vida é consequência de os maus espíritos começarem a lutar e os anjos que estão no homem começarem a se esforçar. E ainda mais depois, quando os maus espíritos começam a dominar. Os maus espíritos então governam o seu homem externo e os anjos o interno, do qual resta tão pouco que os anjos mal podem dali tomar alguma coisa com que defendê-lo; daí a miséria e a ansiedade. Os homens mortos raramente sentem tal miséria e ansiedade, porque não são mais homens, ainda que se achem homens mais do que os outros. Pois eles não sabem mais do que os brutos o que é o espiritual e celeste e o que é a vida eterna; semelhantemente, olham para baixo, para as coisas terrestres, ou então para trás, para as mundanas. Somente favorecem o proprium e entregam-se às inclinações naturais [genio] e aos sentidos, com inteiro consentimento do racional. E, como são mortos, não sustentariam luta alguma ou tentação. Se lhes acontecesse alguma tentação, seria tão mais grave que não poderiam sobreviver, e, assim, se amaldiçoariam ainda mais e se precipitariam em condenação infernal ainda mais profunda. Por isso são poupados até que tenham passado à outra vida, onde não podem mais morrer por tentação ou por miséria alguma. Então, sustentam gravíssimas tentações que são semelhantemente significadas por estas palavras: “maldito o humo; em grande dor comerás dele”.

271.          Que os “dias da vida” signifiquem o fim dos dias da Igreja, sabe-se por isto, que aqui se trata não de um homem em particular, mas da Igreja e de seu estado. O fim dos dias da Igreja era o tempo do dilúvio.

272.          Vers. 18. “E espinho e cardo produzirá para ti, e comerás a erva do campo”.  Pelo “espinho e cardo” se entende a maldição e a devastação; “comer erva do campo” significa que viveria como fera. O homem vive como fera quando o interno é separado do externo, de sorte que aquele não opera neste a não ser do modo mais geral. Pois o homem é um homem por ter um homem interno que lhe vem do Senhor. O homem, todavia, é uma fera por ter um externo que, separado do interno, em si mesmo não é outra coisa senão uma fera. Há nele uma semelhante natureza, semelhantes cobiças, semelhantes apetites, semelhantes fantasias e semelhantes sensações; as formas orgânicas são também semelhantes. Que, contudo, ele possa raciocinar, e, como lhe parece, astutamente, isto ele tem da substância espiritual pela qual a vida do Senhor pode influir. Mas essa vida é pervertida nele e se torna vida do mal, que é a morte. Daí ele se chama morto.

273.          Que “espinho e cardo” signifiquem maldição e devastação, vê-se pelo fato de a colheita e árvore de fruto significarem coisas opostas, que são as bênçãos e as multiplicações. Que o espinho, o cardo, a silva [sentis], a sarça [vepris] e a urtiga signifiquem tais coisas, vê-se pela Palavra, como em Oséias:

“Eis que eles se foram por causa da devastação; o Egito os congregará, Moph [Mênfis] os sepultará, o desejável de sua prata; urtiga os herdará; silva haverá em suas tendas” (9:6);

onde “Egito e Moph [Mênfis]” são aqueles que por si mesmos e por seus conhecimentos querem instruir-se sobre as coisas Divinas. No mesmo profeta:

“Serão destruídos os lugares altos de Aven, pecado de Israel; o espinho e o cardo subirão sobre seus altares” (10:8),

onde “os lugares altos de Aven” são o amor de si, “espinho e cardo sobre os altares” é a profanação. Em Isaías:

“Batem nos peitos por causa dos campos do desejo, por causa da vide frutuosa; no humo do Meu povo cresce o espinho dos silvados” (32:12,13).

E em Ezequiel:

“Não haverá mais na casa de Israel a silva que pique, nem espinho que causa dor, de todos os seus arredores” (28:24).

274.          Que “comer a erva do campo” ou o pasto agreste seja viver como fera, vê-se em Daniel, onde se trata de Nebuchadenezzar:

“Dentre os homens te tirarão, e com a besta do campo será tua habitação; far-te-ão comer erva como os bois, e sete tempos passarão sobre ti” (4:32).

E em Isaías:

“Não ouviste que desde muito tempo Eu fiz isto, desde os dias de antiguidade, e isto formei? Agora o trouxe, e será para devastar em montões as trincheiras, as cidades fortificadas; e seus habitantes, de mãos caídas se consternaram e se envergonharam; tornaram-se erva do campo e legume da erva, feno dos telhados e campo crestado antes da colheita” (37:26,27).

Aqui se explica o que significam a “erva do campo”, o “legume da erva, o feno dos telhados e o campo crestado”, pois aqui se trata do tempo antediluviano, que se entende por “desde muito tempo” e por “dias de antiguidade”.

275.          Vers. 19: “No suor de teu rosto comerás pão, até que voltes para o humo, porque dele foste tomado. Porque tu és pó, e ao pó voltarás.” “Comer pão no suor do rosto” significa ser averso ao que é celeste; “voltar ao humo de que foi tomado” é voltar ao homem externo tal qual era antes da regeneração; “que és pó e ao pó voltarás” é ser condenado e infernal.

276.          Que “comer pão no suor do rosto” signifique ser averso ao que é celeste, pode-se ver pela significação de “pão”. Pelo “pão” se entende todo espiritual e celeste, que é a comida angélica; se os anjos fossem privados dela, não viveriam, assim como o homem se fosse privado do pão ou da comida. O celeste e espiritual no céu também correspondem ao pão nas terras e também são representados pelo pão, como se vê em muitas passagens. O Senhor é o Pão, porque d`Ele vem todo celeste e espiritual. Ele mesmo o ensina em João:

“Eis o Pão que desceu do céu... Quem comer deste pão viverá eternamente” (6:58).

Por isso também o pão e o vinho são símbolos na Santa Ceia. O celeste foi representado também pelo maná. Que o celeste e espiritual seja a comida angélica, vê-se também por estas palavras do Senhor:

“Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mt. 4:4),

isto é, da vida do Senhor, da qual procede todo celeste e espiritual. [2]A última descendência da Igreja Antiquíssima, que viveu pouco antes do dilúvio, de que se trata aqui, estava de tal modo perdida e imersa nos sensuais e corpóreos que eles não queriam ouvir o que era a verdade da fé e o que era o Senhor que viria para os salvar. E, quando, se lhes mencionavam essas coisas, tinham-lhes aversão. Essa aversão é descrita por “comer pão no suor do rosto”. O mesmo sucedeu com os judeus, que, como eram tais que não reconheciam as coisas celestes, não quiseram outro Messias senão um mundano. Assim, não puderam deixar de ter aversão pelo maná, porque era a representação do Senhor e de chamá-lo pão vil; por isso foram mandadas serpentes sobre eles (Núm. 21:5, 6). Além disso, as coisas celestes que lhes causavam angústia, miséria e lágrimas eram chamadas por eles de pão de angústia, pão de miséria e pão de lágrimas. As coisas que lhes causavam aversão se chamam aqui “pão do suor do rosto”.

277.          Este é o sentido interno. Quem se atém à letra não apreende outra coisa senão que o homem devia obter do humo o pão para si pelo trabalho ou suor do rosto. Mas aqui pelo “homem” não se entende um homem, mas a Igreja Antiquíssima, nem pelo “humo” o humo, nem pelo “pão” o pão, nem pelo “jardim” um jardim, mas as coisas que são celestes e espirituais, como já foi suficientemente mostrado.

278.          Que por “voltar ao humo de que foi tomado” seja significado que a Igreja voltaria ao homem externo tal qual era antes da regeneração, vê-se por isso, que o “humo” significa o homem externo, como foi dito antes.  E que o “pó” signifique o que é condenado e infernal, vê-se também pelas coisas que foram ditas sobre a serpente, que, como foi amaldiçoada, se disse que “comeria pó”. além das coisas que foram mostradas sobre a significação do pó, podem-se acrescentar as que estão em David:

“Perante Jehovah se curvarão todos os que descem ao pó, e cuja alma Ele não vivificou” (Sal. 22:29).

E em outro lugar:

“Escondes a Tua face, ficam perturbados; retiras o seu fôlego [spiritum], eles expiram e voltam ao seu pó” (Sal. 104:29),

isto é, que “expiram” ou morrem quando se desviam da face do Senhor, e, assim, “voltam ao pó”, isto é, tornam-se condenados e infernais.

279.          Todos esses versículos agora tomados em série envolvem que o sensual se desviou do celeste: vers. 14; que o Senhor virá ao mundo e que o unirá: vers. 15; que o homem externo, tendo-se desviado, daí há um combate: vers. 16; que daí há miséria: vers. 17; que daí há condenação, vers. 18; que, finalmente, daí há o inferno: vers. 19. Essas coisas sucederam nessa Igreja desde a quarta descendência até o dilúvio.

 

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C. R. Nobre

1.      E o homem conheceu Havah, sua esposa, e ela concebeu e pariu a Cain; e disse: Adquiri um varão, Jehovah.

2.      E de novo pariu a seu irmão, Abel; e Abel foi pastor de rebanho, e Cain foi cultivador do humo.

3.      E aconteceu, ao fim de dias, que Cain trouxe do fruto do humo em oferta a Jehovah.

4.      E Abel trouxe,também ele, dos primogênitos de seu rebanho, e de sua gordura. E Jehovah olhou para Abel e para a sua oferta.

5.      E para Cain e para a sua oferta não olhou; e acendeu-se muito a ira em Cain, e decaíram suas faces.

6.      E disse Jehovah a Cain: Por que se acendeu a ira em ti? e por que decaíram tuas faces?

7.      Se fizeres bem, não haverá elevação? E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta; e para ti é o desejo dele, e tu dominas sobre ele.

8.      E falou Cain a Abel, seu irmão; e sucedeu,como estivessem no campo, que se levantou Cain contra Abel seu irmão, e o matou.

9.      E disse Jehovah a Cain: Onde está Abel, teu irmão? E disse: Não sei. Acaso sou eu guardador do meu irmão?

10.    E disse: Que fizeste? A voz dos sangues do teu irmão está clamando a Mim desde o humo.

11.    E agora, maldito és tu desde o humo, que abriu a sua boca, recebendo os sangues do teu irmão da tua mão.

12.    Quando cultivares o humo, não te dará mais a sua força; errante e fugitivo serás na terra.

13.    E disse Cain a Jehovah: Grande demais é a minha iniquidade para que seja tirada.

14.    Eis, lançaste-me hoje de sobre as faces do humo; e de Tuas faces serei oculto, e serei errante e fugitivo na terra; e será que, todo aquele que me achar, me matará.

15.    E disse-lhe Jehovah: Por isso, todo aquele que matar Cain sete vezes será vingado. E Jehovah pôs um sinal em Cain, para que o não ferisse quem o achasse.

16.    E saiu Cain de diante das faces de Jehovah, e habitou na terra de Nod, para o oriente do Éden.

 

E chegamos hoje a uma das histórias mais conhecidas e, também, menos compreendidas da Bíblia: a história de Cain e Abel.

Após serem expulsos do Jardim do Éden, o homem e sua esposa tiveram dois filhos: o primogênito foi chamado Cain, e o segundo, Abel.Cainse tornou lavrador, eAbel,pastor de ovelhas.

Certo dia, Cain traz ao Senhor, como oferta, o fruto da terra; e Abel também traz sua oferta, as primícias e a gordura do seu rebanho.É dito que Deus olhou para a oferta de Abel, mas não para a de Cain. Por causa disso, Cain fica triste e com raiva. Deus o repreende por causa dessa reação. Mas parece que não adianta, e Cainvai e se vinga disso, matando o irmão. Por causa desse primeiro homicídio, Deus condena Cain pelo sangue derramado. Cain admite sua culpa e admite também que qualquer um que o encontrasse poderia matá-lo. Mas Deus põe uma marca em Cain, para que não o matassem. E Cain vai para outra terra, ao oriente do Éden. Lá ele conhece sua mulher, tem um filho, Enoque, e constrói uma cidade.

Vamos considerar, a princípio, somente o que está expressamente escrito no Gênesis. O primogênito é lavrador e vem fazer sua oferenda a Deus do fruto de seu trabalho, e oferece aquilo que tem. Essa éa sua ação de graças, o seu culto. Em seguida vem seu irmão, trazendo a Deus o melhor do seu rebanho. Mas a oferta de Cain é rejeitada por Deus, e a de Abel é aceita.Essa rejeição provoca tanto ódio em Cain que o leva a cometer o fratricídio.

A nossa pergunta é: por que Deus teria rejeitado a oferta de Cain? O texto nunca diz por quê. Pode-se deduzir pela continuação, quando Deus diz a Cain: “Se fizeres bem”, maso texto não aponta especificamente algum mal que Cain tenha praticado.E sem uma informação clara do motivo por trás dessa rejeição da oferta de Cain,não podemos ver uma relação de causa e efeito. O que Cain teria feito? Tudo o que se pode fazer daí é conjeturar e especular.

Pois bem. Dessa especulação surgiram duas linhas de raciocínio. A primeira, que parece lógica, é que algum pecadoCainteria praticado, para ser rejeitado. Já a segunda linha de pensamento que não aponta paraum eventual pecado em Cain, e, explica a sua rejeição com uma tese ou doutrina que evoca a soberania de Deus. Segundo essa tese, Deus é soberano, no sentido de que Ele faz o que quer: prefere um e rejeita outro. Simples assim. Em Sua soberania Ele não dá explicação ou satisfação de suas preferências.

Essedogma da soberania Divinavem a sero fundamentode outro doutrinal, o da predestinação. Segundo essa outra doutrina, Deus temos Seus filhos preferidos, que serão salvos e conduzidos à felicidade eterna, não importa o que façam. Mesmo que façam o mal. Porque dizem que: “uma vez salvos, para sempre salvos”.

E Deus tem outros filhos que já nascem rejeitados, e condenados ao inferno, também não importam o que façam. Segundo o dogma predestinatário, a pessoa nasce com seu destino selado, e seu destino cumprirá, seja para o céu, seja para o inferno. E convém lembrar que essa doutrina não surgiu do nada, mas foi engenhosamente fundamentada em pontos pinçados do Velho e Novo Testamentos, como o de Êxodo 33:19, onde Deus fala a Moisés: “Farei passar toda a minha bondade diante de ti e te proclamarei o nome do SENHOR; terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia e me compadecerei de quem eu me compadecer.”

Mas, que conceito cruel é esse! Porque atribui a Deus um caráter parcial e desumano.Um Deus que rejeita a adoração de um, sem motivo, e prefere a de outro! Quem pode ver nisso alguma justiça Divina? Quem pode ver ao menos o amor paterno? Porque um pai bom quer o bem de todos os seus filhos indiferentemente, e não elege um e despreza o outro. Mesmo os animais amam, defendem e protegem as suas crias sem mostrar preferência por uns e rejeição por outros.

Obviamente, essa doutrina não foi criada com o propósito de se atribuir a Deus esse caráter de parcialidade. Acredito até que foi formulada de boa fé, porque, as pessoas que a formularam simplesmente não viam no sentido literal uma explicação satisfatória para certas situações, como esta, da rejeição de Cain, e elaboraram de sua própria mente a teoria que lhes parecia lógica para preencher a lacuna. Nós não temos tempo para entrar no exame desse dogma da predestinação agora, mas a própria letra da Palavra, vista em algumas passagens, contradita essa doutrina, mostrando que Deus ama a todos, maus e bons, justos e injustos; e que o ser humano tem o livre arbítrio para escolher seu próprio destino.

Graças à bondade Divina, temos visto que as aparentes estranhezas da letra da Palavra se devem ao sentido espiritual ali encerrado. Esse sentido está envolto em tipos e símbolos da letra, e é a revelação desse sentido que nos abre o entendimento para umaexplicação clara do que é a genuína mensagem da Palavra.

Os Arcanos Celestes nos ensinam que nem Cain nem Abel foram pessoas, mas símbolos. Nesse teatro Divino é representada a natureza humana e a sua relação com o Criador. E nesse drama, “Cain” representa a fé, e “Abel”, a caridade. Em resumo, a história é a seguinte:

“A Igreja Antiquíssima tinha, pelo amor, a fé no SENHOR; mas surgiram aqueles que separaram a fé do amor; a doutrina da fé separada do amor chamou-se “Cain”; a caridade, que é o amor para com o próximo, chamou-se “Abel”. O culto de ambos é descrito: a fé separada é descrita pela “oferta de Cain”; e a caridade pela “oferta de Abel”; o culto procedente da caridade foi aceito, mas não o da fé separada. O estado daqueles que estavam na fé separada tornou-se mal; isso é descrito pela “ira acesa” e por “decair as faces de Cain”. ...A caridade foi extinta naqueles que separaram a fé e preferiram esta à caridade; isto se descreve por “Cain, que matou seu irmão Abel”. (AC 324, 328).

Então, Cain, o filho primogênito, é a fé da igreja, porque a fé é a primeira coisa que forma e constitui a Igreja na pessoa. A crença vem primeiro; a fé nasce antes, como a Luz do primeiro dia, porque sem a luz da fé é impossível saber o que é o bem e o mal.

EAbel é um representativo da caridade ou amor ao próximo. A caridade nasce depois da fé, porque primeiro se deve aprender a verdade da fé, e quando a fé é posta em prática, existe caridade.

A fé existe por causa da caridade, como seu propósito e sua razão de ser, e não vice-versa. A fé é o meio, a caridade é o fim. Então, a fé vem para ensinar como se deve viver, e a vida de acordo com a fé é a caridade, que é o fruto que Deus quer ver no homem. A fé é a semente, e a caridade é o fruto que nasce da semente. Sem a caridade o homem é como a árvore sem fruto.

Mas, conquanto a fé seja a primeira no tempo, ela não é, jamais, a primeira em importância. A caridade é a mais importante. A fé é o primeiro que deve se tornar derradeiro, e a caridade é a derradeira que deve se tornar primeira.

“Para que serve a fé, ou o conhecimento, a cognição e a doutrina da fé, senão paraque o homem se torne como ela ensina? A coisa principal que ela ensina é a caridade — Marcos 12:28-35, Mateus 22:34-39; esta é o fim de todas as coisas a que [a fé] se refere. Se isso não se realiza, o que é ciência ou a doutrina, a não ser alguma coisa nula?” (AC 344)

Em vista disso, não precisamos especular sobre qual teria sido o erro de Cain. E, muito mais importante do que isso, na ausência de um suposto pecado de Cain, não precisamos admitir o conceito de um Deus caprichoso e parcial.

Segundo a explicação espiritual desse relato, podemos compreender que as duas coisas são fundamentaisna Igreja: a fé e a caridade. Esses dois elementos devem estar juntos. Porque, quando a fé está separada da caridade, o culto que a pessoa presta a é um culto somente de palavras, louvores e celebrações, isto é, pelo entendimento apenas, pelas coisas intelectuais e pela fé. É a adoraçãode boca, que não é aceita por Deus, porque vem da fé, só. É a oferta de Cain, o fruto que vem da terra, porque, como vimos no primeiro capítulo, a terra significa o homem externo ou a mente externa. “Que pelo “fruto do humo” se entendam as obras da fé sem a caridade, é evidente também pelo que se segue. Com efeito, as obras da fé sem a caridade são obras de uma fé nula, mortas em si mesmas, pois são apenas do homem externo.” (AC 348)

A mensagem, portanto, que está encerrada no simbolismo desses dois irmãos é que a adoração a Deus não é legítima se proceder somente da crença, das palavras, sem a parte prática, daobediência ao que a fé ensina. O que Deus quer ver na criatura humana são ações vividas e praticadas em prol do semelhante, visando o bem comum.

Em qualquer função que a pessoa exerce na sociedade humana, ela pode e devecumprir suas obrigações tendo em mente o benefício do próximo. Esse é o uso que cada um tem, e quando cada um beneficia o outro, todos são beneficiados.  Quando pensa no bem do próximo e se propõe a ser útil a ele, a primeira coisa é não fazer-lhe mal, ou, como se diz, não fazer aos outros aquilo que não quer que os outros lhe façam. E isto já é a primeira parte de amarmos o próximo, mesmo quando não o conhecemos e não temos afinidade com ele.

O que seria a sociedade humana se cada um se esforçasse por não prejudicar o próximo, em primeiro lugar, e, depois, em fazer-lhe bem? É utópica uma sociedade assim? Neste mundo, sim, mas não no céu,onde a sociedade celeste consiste de homens e mulheres, que, quando viveram neste mundo, fizeram disso seu princípio de vida. Por causa disso é que o céu é chamado Reino dos Usos. Aliás, esse é o tipo de comportamento define bem o homem da igreja, o futuro cidadão do céu, já aqui no mundo, como o Senhor Jesus falou: “Nisto conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (João 13:35).

A oferta de Abel, trazida das primícias do rebanho, é a adoração a Deus a partir da vontade, ou da vida. “Que “JEHOVAH olhou para Abel e para sua oferta” significa que as coisas da caridade e todo o culto dela derivado foram agradáveis ao SENHOR. Caridade significa o amor para com o próximo e a misericórdia. Com efeito, quem ama o próximo como a si mesmo também tem misericórdia dele quando padece, como teria de si próprio.” (AC 350).

Em sua primeira carta aos Coríntios, Paulo disse: “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estas três; mas a maior destas é a caridade.” (1Co. 13:13). Mas, quando a ordem é invertida, e a fé se torna maior, ela aniquila a caridade. É Cain matando Abel.

Porque a fé é entender, enquanto a caridade é sentir. A fé pertence ao entendimento, mas a caridade pertence à vontade. A fé, quando está sozinha, não implica em misericórdia, compaixão, paciência, perdão. Esta é a fé que está só por fora, como a fé dos fariseus, cuja crença estava somente nos externos, enquanto os interiores estavam cheios de corrupção e imundície.

A fé que tem supremacia extingue a caridade, e a caridadeextinta é representada no texto pela “voz dos sangues”; a doutrina pervertida da fé em primeiro lugar é a “maldição desde o humo”; e a falsidade que procede daí é o pensamento “errante e fugitivo na terra” (ver AC 330).

Como a oferta de Cain representa esse culto somente do entendimento ou só dos rituais e de palavras, por isso Deus lhe disse: “Se fizeres bem, não haverá elevação?”, isto é, se a fé conduzir à prática na vida, ela será sublimada, resultando em caridade, mas nunca se não for acompanhada das ações da vida.

A fé, como semente lançada no solo fértil, germina, cresce e dá fruto, que é a caridade. Na caridade está a semente de nova fé. Há uma conjunção e uma propagação perpétua de fé e caridade, e as duas fazem uma só quando a caridade tem a primazia. E quando a caridade está em primeiro plano, as diferenças de crença não causam desunião, mas, a  variedade das igrejas e das sociedades celestes.

Deus disse mais a Cain: “Se não fizeres bem, o pecado jaz à porta”. Lemos nos Arcanos que “isto significa que “se não quiseres o bem, não há caridade, mas o mal”. Que o “pecado”, quando “jaz a porta”, seja o mal que está pronto e quer entrar, qualquer um pode ver. Com efeito, quando não há caridade, há falta de misericórdia e ódio, por conseguinte todo mal. O pecado é tomado em geral pelo diabo e sua turba, que está pronto quando o homem está sem caridade. A única coisa que afugenta da porta o diabo e sua turba é o amor ao SENHOR e para com o próximo.”

“...Para ti é o desejo dele, e tu dominas sobre ele”. Isso significa que a caridade quer estar na fé, mas não pode, porque a fé quer dominá-la, o que é contra a ordem. Enquanto a fé quiser dominar, não há fé; mas, quando a caridade domina, então há fé, porque o principal da fé é a caridade, como foi mostrado anteriormente. A caridade pode ser comparada à chama, que é a coisa essencial do calor e da luz, pois dela procedem calor e luz. A fé separada pode ser comparada à luz que, quando está sem o calor da chama, é luz, na verdade, mas uma luz de inverno sob a qual tudo entorpece e morre.” (AC 363 - 365)

O campo, onde Cain mata Abel, é a doutrina que estabelece dogmas afirmando que a fé, só, salva. “Sola fide.” Daí a caridade perece inevitavelmente, porque é muito conveniente apenas saber e crer, sem se esforçar para obedecer. É muito atraente para o comodismo humano acreditar que basta ter fé para que seja salvo, sem a renúncia dos males do amor de si e do mundo. Essa é a doutrina que se chama “Cain”. Porque, “tendo separado a fé do amor, também a separou da caridade, que é filha do amor. É assim que aqueles que foram chamados “Cain” fizeram a fé ser essencial acima do amor. E como viviam assim, sem amor, confirmaram-se tanto no amor de si quanto na imaginação daí proveniente.” (AC 362).

Quando Cain é questionado por Deus sobre seu mal, ele diz que então seria errante e fugitivo, e que qualquer um que o encontrasse o mataria. Mas Deus não consentiu, e pôs uma marca em Cain, para que ele não fosse morto. Isto se explica assim: a fé, mesmo separada da caridade, ainda assim deve ser preservada e não deve ser aniquilada, pois ela é necessária, já que é por meio dela que a caridade pode existir.

Cain vai para outra terra, conhece sua mulher, tem um filho e edifica uma cidade. No entendimento literal do texto, isto seria impossível, pois não haveria outros seres humanos além de Adão, Eva e Cain – Abel já estava morto. Portanto, não haveria esposa para Cain e não haveria como ou para que ele edificar uma cidade. Somente depois é que se diz que nasceram outros dois filhos para Adão e Eva, e eles foram chamados Sete e Enos.

Mas Cain conhecer a esposa, gerar um filho e edificar uma cidade significa que a doutrina da fé, só, gerou outra heresia significada pelo filho e pela cidade com o mesmo nome do filho. (AC 399). “Assim, as expressões que se seguem são concepções e partos semelhantes, tanto de Igrejas quanto de heresias, das quais se instituía uma genealogia, pois as coisas são semelhantes; de uma heresia formada nascem muitas.” (AC 400).

“E o homem conheceu ainda a sua esposa, e ela pariu um filho, e chamou seu nome Sheth: Porque DEUS me repôs outra semente em lugar de Abel, porque o matou Cain”.  Pelo “homem” e sua “esposa” é entendida aqui uma Igreja nova; por seu “filho”, cujo nome ela chamou “Sheth”, é significada uma fé nova pela qual há a caridade; por “DEUS repor uma outra semente em lugar de Abel, porque o matou Cain” é significado que a caridade, que Cain separou e extinguiu, é concedida agora pelo SENHOR a essa Igreja.” (AC 434)

E assim prossegue a saga humana, a relação do homem com o seu Criador, desde a sua formação como Igreja Antiquíssima, na história da criação, no capítulo primeiro, passando por sua ascensão e sua queda, até o seu degredo do Éden, do estado primitivo de integridade. Depois vem a história de sua descendência, ou das igrejas que sucederam,que está representada na genealogia que segue no final do capítulo 4 e no capítulo 5, até o último estado daquela igreja, a Antiquíssima, quando o acúmulo de falsidades chegou ao ponto de invadir e aniquilar a vida espiritual da humanidade, falsidades essas que foram representadas pelas águas do dilúvio.

Dá-se, então, uma miraculosa providência Divina, que reorganiza a mente dos restantes daquela raça, e preserva as afeiçõesali, o que foi representado pela construção da arca e a preservação dos animais nela. Essa providência Divina possibilitou a restauração e renovaçãodo gênero humano, com o estabelecimento da Igreja Antiga.

Mas isto se verá na história do dilúvio, a qual, se o Senhor nos permitir, pretendemos abordar aqui nas semanas seguintes. Muito obrigado.


 

324.          Trata-se das doutrinas separadas da Igreja, ou das heresias, e, depois, de uma Igreja nova que foi suscitada, chamada “Enosh”.

325.          A Igreja Antiquíssima tinha, pelo amor, a fé no Senhor; mas surgiram aqueles que separaram a fé do amor; a doutrina da fé separada do amor chamou-se “Cain”; a caridade, que é o amor para com o próximo, chamou-se “Abel”, vers. 1, 2.

326.          O culto de ambos é descrito: a fé separada é descrita pela “oferta de Cain”; e a caridade pela “oferta de Abel”, vers. 3, 4; e que o culto procedente da caridade foi aceito, mas não o da fé separada, vers. 4, 5.

327.          O estado daqueles que estavam na fé separada tornou-se em mal; isso é descrito pela “ira acesa” e por “decair as faces de Cain”, vers. 5, 6.

328.          E que pela caridade se conhece a natureza da fé; e a caridade quer estar com a fé, se a fé não se faz principal e não se eleva acima da caridade, vers. 7.

329.          Que a caridade se extinguiu naqueles que separaram a fé e preferiram esta à caridade; isto se descreve por “Cain, que matou seu irmão Abel”, vers. 8, 9.

330.          A caridade extinta se chama “voz dos sangues”, vers. 10; a doutrina pervertida, “maldição desde o humo”, vers. 11; o falso e o mal daí derivado é “errante e fugitivo na terra”, vers. 12; e como se desviaram do Senhor, havia perigo de morte eterna, vers. 13; como, porém, era pela fé que a caridade seria depois implantada, era um sacrilégio violá-la, o que é descrito por “um sinal posto em Cain”, vers. 15; e removê-la do lugar onde antes estivera é “habitar para o oriente do Éden”, vers. 16.

331.          Essa heresia, então ampliada, chamou-se Hanoch, vers. 17.

332.          As heresias que daí surgiram são também designadas pelos seus nomes; dentre elas, na última, que se chama “Lamech”, nada mais restou da fé, vers.  18.

333.          Nasce, então, uma nova Igreja, a qual é entendida por “Adah e Zillah” e descrita pelos filhos delas, “Jabal, Jubal e Tubal-cain”; as coisas celestes da Igreja, por “Jabal”; as espirituais por “Jubal”; as naturais por “Tubal-cain”, vers. 19-22.

334.          Que essa Igreja nasceu quando se extinguiu tudo o que pertence à fé e à caridade e quando foi violado o que havia de mais santo. Isso é descrito nos vers. 23 e 24.

335.          Faz-se um sumário das coisas: após a fé separada, que é “Cain”, ter extinguido a caridade, o Senhor deu uma nova fé pela qual a caridade era implantada; essa fé é “Sheth”, vers. 25.

336.          A caridade implantada pela fé se chama “Enosh”, ou “outro homem”, que é o nome dessa Igreja. Vers. 26.

Sentido Interno
 

337.          Como aqui se trata da degeneração da Igreja Antiquíssima, ou da falsificação da doutrina, e, consequentemente, das heresias e seitas sob o nome de Cain e seus descendentes, cumpre saber que de maneira alguma se pode entender como a doutrina foi falsificada, ou quais foram as heresias ou seitas daquela Igreja, a não ser que se conheça bem a natureza da verdadeira Igreja; daí se poderá reconhecê-lo. Falou-se bastante, no que já foi tratado, a respeito da Igreja Antiquíssima, e foi mostrado que ela foi um homem celeste e não reconheceu outra fé senão a que fosse do amor ao Senhor e para com o próximo. Por esse amor recebiam do Senhor a fé ou a percepção de todas as coisas que eram da fé. Por isso, nem gostavam de nomear a fé, para não separá-la do amor, como foi mostrado anteriormente nos nºs 200 a 203. [2] Tal é o homem celeste. E que ele seja assim, é o que foi descrito por meio de representativos também em David onde se trata do Senhor, Que é chamado “Rei”, e do homem celeste, que é chamado “filho do Rei”:

“Dá Teus juízos ao Rei, e Tua justiça ao filho do Rei;... os montes trarão paz ao povo, e as colinas em justiça;... Temer-Te-ão com o sol, e às faces da lua na geração das gerações... Em seus dias florescerá o justo, e haverá muita paz, até que não haja mais a lua” (Salmo 72:1, 3, 5, 7);

pelo “sol” é significado o amor; pela “lua”, a fé; pelos “montes e colinas”, a Igreja Antiquíssima; pela “geração de gerações”, a Igreja pós-diluviana; diz-se “até que não haja mais a lua” porque a fé será o amor; (ver também as coisas que estão Isaías 30:26). [3] Tal foi a Igreja Antiquíssima e tal a doutrina; mas hoje é inteiramente diferente, pois hoje a fé precede. Mas pela fé a caridade é concedida pelo Senhor, e, então, a caridade se torna o principal. Por isso, segue-se que a doutrina foi falsificada no tempo antiquíssimo, quando fizeram confissão da fé e, assim, separaram a fé do amor. Os que falsificaram assim a doutrina, ou separaram a fé do amor, ou confessaram a fé somente, foram então chamados “Cain”, e isso era uma heresia enorme entre eles.

338.          Vers. 1: “E o homem conheceu Havah, sua esposa, e ela concebeu e pariu a Cain; e disse: Adquiri um varão Jehovah.”Pelo “homem e Havah sua esposa” é significada a Igreja Antiquíssima, como se sabe. Sua primeira prole ou seu primogênito é a fé, que aqui se chama “Cain”; que tenha dito: “Adquiri varão Jehovah” significa que, naqueles que foram chamados Cain, a fé foi conhecida e reconhecida como coisa por si.

339.          Nos três capítulos precedentes foi suficientemente mostrado que o “homem e sua esposa” significam a Igreja Antiquíssima, de sorte que não se pode duvidar. E, porque o “homem e sua esposa” é a Igreja Antiquíssima, vê-se daí que sua concepção e parto não foi outra coisa. Era costume dos antiquíssimos atribuir nomes e pelos nomes significarem coisas, e, assim, estabelecerem uma genealogia; com efeito, as coisas que pertencem à Igreja também se relatam de modo semelhante. Uma é concebida e nasce de outra, e tem-se como que uma geração. Por isso é comum, na Palavra, chamar as coisas que são da Igreja de “concepção, parto, prole, crianças, jovens, pequenos, filhos, filhas, jovens” e, assim, por diante. As obras proféticas estão repletas de tais expressões.

340.          Que a expressão “disse: Adquiri um varão, Jehovah” signifique que a fé naqueles que foram chamados Cain era uma coisa conhecida e reconhecida por si, vê-se pelas coisas que foram ditas no começo deste capítulo. Anteriormente ignoravam, por assim dizer, o que é a fé, porque tinham a percepção de todas as coisas que eram da fé. Quando, todavia, começaram a fazer uma doutrina distinta a respeito da fé, então extraíam as coisas das quais tinham percepção, e as reduziam a doutrina, e chamavam-na “Adquiri um varão, Jehovah”, como se tivessem descoberto alguma coisa nova. Assim, o que fora inscrito no coração tornou-se um fato do conhecimento. Antigamente se dava um nome a tudo o que era novo e, assim, explicavam as coisas que os nomes encerravam. Por exemplo, o que Ismael significa, que é “Jehovah ouviu sua miséria” (Gên. 16:11); Reuben, que “Jehovah viu minha miséria” (Gên. 29:32); Simeon, que “Jehovah ouviu que eu era menos amada” (Ibid. vers. 33); Jehudah, “desta vez confessarei Jehovah”, (Ibid. vers. 35). O altar edificado por Moisés chamou-se “Jehovah estandarte” (Êx. 17:15). Aqui, a doutrina mesma da fé é chamada “Adquiri um varão, Jehovah” ou Cain.

341.          Vers. 2: “E de novo pariu a seu irmão, Abel; e Abel foi pastor de rebanho, e Cain foi cultivador do humo”.  O outro parto da Igreja é a caridade, que é significada por “Abel” e “irmão”; “pastor de rebanho” é o que exerce o bem da caridade; “cultivador do humo” é o que está sem caridade por causa da fé separada do amor, fé que é nula.

342.          Que o segundo parto da Igreja seja a caridade, pode-se ver pelas coisas que a Igreja concebe e pare, que não são outra coisa senão a fé e a caridade. Coisas semelhantes foram significadas pelos primeiros partos de Léa, por Jacob, a saber, por “Reuben” foi significada a fé, por “Simeon”, a fé em ação, por “Levi”, a caridade — Gên. 29:32-34. Por isso também a tribo de Levi recebeu o sacerdócio e representou o pastor do rebanho. Porque a caridade é o segundo parto da Igreja, é chamada “irmão” e designada “Abel”.

343.          Que “pastor de rebanho” seja aquele que exerce o bem da caridade, qualquer um pode sabê-lo, pois isso é usual na Palavra do Antigo e do Novo Testamentos; quem conduz e ensina é chamado “pastor”; os que são conduzidos e ensinados são chamados “rebanho”; quem não conduz ao bem da caridade e quem não ensina o bem da caridade não é um verdadeiro pastor; e não é conduzido ao bem e não aprende o bem não é rebanho. Que o pastor e o rebanho signifiquem essas coisas, é, na verdade, supérfluo confirmar pela Palavra, mas sejam vistos estes exemplos que estão em Isaías:

“O Senhor dará a chuva de tua semente, de que semeias o humo, e o pão da colheita do humo... apascentará teu gado naquele dia em prado largo” (30:23);

onde o “pão da colheita do humo” é a caridade. No mesmo:

“O SenhorJehovih, como um Pastor, apascentará Seu rebanho; em Seu braço recolherá os cordeiros, e Seu regaço os levará; as prenhas suavemente conduzirá” (40:11).

Em David:

“Ó Pastor de Israel, dá ouvidos, que conduzes a José como um rebanho; que Te assentas entre os querubins, resplandece” (Salmo 80:1).

Em Jeremias:

“A uma [mulher] formosa e delicada fiz semelhante a filha de Sião; para ela virão pastores, e seus rebanhos fixarão tendas perto dela, em redor; apascentarão cada um em seu espaço” (6:2, 3).

Em Ezequiel:

“Disse o SenhorJehovih: Multiplicá-los-ei como rebanho de homens, como rebanho dos santificadores, como rebanho de Jerusalém, em seus tempos fixados; assim as cidades desertas estarão cheias de rebanho de homens” (36:37, 38).

Em Isaías:

“Todo o rebanho da Arábia será congregado para ti, os carneiros de Nebaioth te servirão” (60:7).

Os que conduzem o rebanho ao bem da caridade são “os que congregam o rebanho”; os que, todavia, não o conduzem ao bem da caridade são “os que dispersam”, pois toda congregação e união vem da caridade, e toda dispersão e desunião vem da falta de caridade.

344.          Para que serve a fé, ou o conhecimento, a cognição e a doutrina da fé, senão para que o homem se torne como ela ensina? A coisa principal que ela ensina é a caridade — Marcos 12:28-35, Mateus 22:34-39; esta é o fim de todas as coisas a que [a fé] se refere. Se isso não se realiza, o que é ciência ou a doutrina, a não ser alguma coisa nula?

345.          O que “cultiva o humo” é quem está sem a caridade, por mais que esteja numa fé separada do amor, fé essa que é nula. Isso se pode ver pelas coisas que se seguirão, que “Jehovah não olhou para a sua oferta” e que ele “matou seu irmão”, isto é, destruiu a caridade significada por “Abel”. “Cultivar o humo” se dizia daqueles que têm em vista as coisas corpóreas e terrestres, como se vê pelas coisas que foram ditas no capítulo 3, vers. 19 e 23, onde se diz que “o homem foi expulso do jardim do Éden para cultivar o humo”.

346.          Vers. 3: “E aconteceu, ao fim de dias, que Cain trouxe do fruto do humo em oferta a Jehovah.” Pelo “fim de dias” se entende a progressão do tempo; pelo “fruto do humo”, as obras da fé sem a caridade; pela “oferta a Jehovah”, o culto daí proveniente.

347.          Que pelo “fim dos dias” se entenda a progressão do tempo, qualquer um pode ver. Em seu começo, quando ainda estava em sua simplicidade, essa doutrina, que se chama “Cain”, não se mostrou tão desagradável como depois. Isso se vê pelo fato de eles terem chamado à prole “aquisição de um varão, Jehovah”. Assim, no começo a fé não era tão separada do amor como foi no “fim de dias” ou na progressão do tempo, como sucede a toda doutrina da verdadeira fé.

348.          Que pelo “fruto do humo” se entendam as obras da fé sem a caridade, é evidente também pelo que se segue. Com efeito, as obras da fé sem a caridade são obras de uma fé nula, mortas em si mesmas, pois são apenas do homem externo. Dessas obras assim se diz em Jeremias:

“Por que o caminho dos ímpios prospera? ...Plantaste-os, até se enraizaram; avançaram, até dão frutos. Tu estás perto da boca deles, mas longe de seus rins... até quando a terra lamentará, e a erva de todo o campo se secará? (12:1, 2, 4),

“perto da boca, mas longe dos rins” estão os que se acham na fé separada da caridade, dos quais se diz que a “terra lamenta”. Eles também se chamam “fruto das obras”, no mesmo:

“Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperado. Quem o conhece? Eu, Jehovah, que sondo o coração, que provo os rins, e para dar a cada um segundo os seus caminhos, segundo o fruto das suas obras” (17:9, 10).

Em Miquéias:

“A terra estará em desolação por causa de seus habitantes, pelo fruto de suas obras” (7:13).

Mas que esse fruto é um fruto nulo, ou que é obra morta, e que tal fruto perece como também a raiz, vê-se em Amós:

“Destruí os amorreus diante deles, cuja altura era como a altura dos cedros, e que era forte como o carvalho; todavia destruí seu fruto por cima, e as suas raízes por baixo” (2:9);

em David:

“Seu fruto destruirás da terra, e sua semente dentre os filhos dos homens” (Salmo 21:10).

As obras de caridade, porém, são vivas, das quais se diz que “fazem sair as raízes em baixo” e “produzem fruto em cima”, como em Isaías:

“O resto da casa de Jehudah que escapou lançará raiz para baixo, e dará fruto para cima” (37:31);

“dar fruto para cima” é agir pela caridade; tal fruto se chama “fruto de excelência” no mesmo profeta:

“Naquele dia, o renovo de Jehovah estará em honra e em glória, e o fruto da terra em excelência e ornamento para os de Israel que escaparem” (4:2),

e é o “fruto da salvação”, como é chamado no mesmo:

“Destilai, ó céus, de cima! e os éteres fluam justiça! abra-se a terra, e produzam fruto da salvação, e a justiça germine juntamente! Eu, Jehovah, criarei isto” (45:8).

349.          Que pela “oferta” seja entendido o culto, pode-se ver pelos representativos na Igreja Judaica, na qual, todos os sacrifícios, tanto as primícias da terra e todos os seus frutos, como as oblações dos primogênitos, chamavam-se “ofertas” [munera], nas quais consistia o culto. E, como todas elas representavam coisas celestes e se referiam ao Senhor, por essas ofertas era significado o culto verdadeiro, como pode ser do conhecimento de qualquer um. Pois o que é o representativo sem a coisa que ele representa, e o que é o externo sem o interno, senão um ídolo, coisa que é morta? O externo vive pelos internos, ou pelo Senhor por meio dos internos. Daí se vê que as ofertas de todas as Igrejas representativas significam o culto do Senhor. Tratar-se-á de cada uma delas na sequência, pela Divina misericórdia do Senhor.  Que pelas ofertas em geral se entenda o culto, pode-se ver em várias passagens nos Profetas, como em Malaquias:

“Quem suportará o dia de Sua vinda?... Ele se assentará, fundindo e afinando a prata, e purificará os filhos de Levi; e os limpará como o ouro e como a prata, e oferecerão a Jehovah ofertas em justiça. Então a oferta de Jehudah e de Jerusalém será suave a Jehovah como nos dias da eternidade e como nos anos antigos” (3:2, 3, 4).

A “oferta em justiça” é o interno que os “filhos de Levi” ou os que adoram com santidade oferecem; os “dias de eternidade” são a Igreja Antiquíssima; os “dias antigos”, a Igreja Antiga. Em Ezequiel:

“No monte de Minha santidade, no monte da altura de Israel... eles Me honrarão, toda a casa de Israel, toda esta terra. Ali Eu lhes serei propício, e ali demandarei vossas oblações, e as primícias de vossas ofertas em todas as vossas santificações” (20:40);

“oblações e primícias de ofertas em santificações” são, semelhantemente, as obras da caridade santificadas pelo Senhor. Em Sofonias:

“Dalém dos rios da Etiópia os Meus adoradores... farão vir a Minha oferta” (3:10);

“Etiópia” são os que possuem as coisas celestes, que são o amor, a caridade e as obras da caridade.

350.          Vers. 4: “E Abel trouxe, também ele, dos primogênitos de seu rebanho, e de sua gordura. E Jehovah olhou para Abel e para a sua oferta.”Aqui como antes, por “Abel” é significada a caridade; pelos “primogênitos do rebanho”, o santo que pertence ao Senhor, só; pela “gordura” o celeste mesmo, que também pertence ao Senhor; que “Jehovah olhou para Abel e para sua oferta” significa que as coisas da caridade e todo o culto dela derivado foram agradáveis ao Senhor.

351.          Que “Abel” signifique a caridade, foi mostrado anteriormente. Caridade significa o amor para com o próximo e a misericórdia. Com efeito, quem ama o próximo como a si mesmo também tem misericórdia dele quando padece, como teria de si próprio.

352.          Que pelos “primogênitos do rebanho” seja significado o que pertence só ao Senhor, pode-se ver pelos primogênitos na Igreja representativa, que eram todos coisas santas, porque diziam respeito ao Senhor, Que é o único Primogênito. O amor, e daí a fé, é o primogênito. Todo amor pertence ao Senhor, e não há amor algum que seja do homem; por isso o Senhor é o único Primogênito. Isso foi representado nas Igrejas antigas pelos “primogênitos do homem e da besta, que eram santificados a Jehovah” — Êxodo 13:2, 12, 15. E a tribo de Levi, que significa, no sentido interno, o amor, nascida depois de Reuben e Simeon, que significam, no sentido interno, a fé, foi aceita em lugar de todos os primogênitos e se tornou sacerdotal (Números 3:40-46; 8:14-20). Sobre o Senhor, que é o Primogênito de todos quanto à Sua Essência Humana, assim se diz em David:

“Ele Me invocará: Tu és Meu Pai, Meu Deus, e Rocha da Minha salvação; também Eu o farei Primogênito, alto sobre os reis da terra” (Salmo 89:26, 27).

E em João:

“JesusCristo, Primogênito dentre os mortos, e Príncipe dos reis da terra” (Apoc. 1:5).

Observa que os primogênitos do culto significam o Senhor, mas os primogênitos da Igreja significam a fé.

353.          A “gordura” significa o celeste mesmo, que pertence também ao Senhor. O celeste é tudo o que é do amor; a fé é também celeste, quando procede do amor. A caridade é o celeste; todo bem da caridade é o celeste. Todas essas coisas foram representadas pelas gorduras nos sacrifícios, e mesmo, de um modo especial, pela gordura que está sobre o fígado ou o retículo, pela gordura sobre os rins, pela gordura que cobre os intestinos e pela que está sobre os intestinos. Essas gorduras eram santas e eram queimadas sobre o altar (Êx. 29:13, 22; Lev. 3:3, 4, 14; 4: 8, 9, 19, 26, 31, 35; 8:16, 25); por isso eram chamadas “pão [de oferta] por fogo em repouso a Jehovah” (Lev. 3:15, 16). E por esta razão era proibido ao povo judaico comer gorduras de animais, o que se chamou “estatutos de eternidade nas gerações” (Lev. 3:17; 7:23, 25). A causa é que aquela Igreja era tal que não reconhecia as coisas internas, e ainda menos as celestes. [2]                   Que a gordura signifique as coisas celestes e os bens da caridade, vê-se nos Profetas, como em Isaías:

“Por que pesais a prata para o que não é pão, e vosso trabalho para o que não sacia? Ouvi-Me atentamente, e comei do bom, para que se deleite com a gordura vossa alma” (55:2);

emJeremias:

“Encherei a alma dos sacerdotes de gordura, e Meu povo se fartará dos Meus bens” (31:14).

Vê-se claramente que aí não se entende a gordura, mas o bem celeste-espiritual. Em David:

“Estão cheios da gordura de Tua casa, e na torrente de Tuas delícias os sacias, porque Contigo está o manancial de vidas; na Tua luz vemos a luz” (Salmo 36:8, 9),

onde “gordura e manancial de vidas” é o celeste, que é do amor; “torrente das delícias e luz” é o espiritual, que é da fé daí proveniente. No mesmo:

“De tutano [adipe] e de gordura se fartará a minha alma, e com lábios de cânticos minha boca louvará” (Salmo 63:5),

onde “gordura”, semelhantemente, é o celeste, “lábios de cânticos” o espiritual. Vê-se claramente que é o celeste porque se diz que “alma se fartará”. As mesmas primícias, que eram os primogênitos da terra, eram por isso chamadas “gordura” (Núm. 18:12). Como as coisas celestes existem em gêneros inumeráveis e, em ainda mais inumeráveis espécies, são em geral assim descritas no cântico que Moisés cantou diante do povo:

“Manteiga de vacas, e leite de rebanho, com a gordura dos cordeiros e dos carneiros, dos filhos de Bashan, e dos bodes, com a gordura dos rins do trigo. E o sangue de uvas beberás, o vinho puro” (Deut. 32:14).

Nunca alguém pode saber o que estas coisas significam a não ser pelo sentido interno. Sem o sentido interno, ninguém pode saber o que querem dizer “manteiga de vacas”, “leite do rebanho”, “gordura dos cordeiros”, “gordura dos carneiros e dos bodes”, “filhos de Bashan”, “gordura dos rins do trigo” e “sangue das uvas”. Sem o sentido interno, seriam palavras e nada mais que isso, quando, na verdade, todas e cada uma das coisas significam gêneros e espécies de coisas celestes.

354.          “Jehovah olhou para Abel, e para sua oferta” significa que as coisas da caridade e de todo culto daí proveniente foram agradáveis ao Senhor. Isso foi explicado anteriormente, tanto o que significa “Abel” como o que significa a “oferta”.

355.          Vers. 5: “E para Cain e para a sua oferta não olhou; e acendeu-se muito a ira em Cain, e decaíram suas faces.”Por “Cain”, como foi dito, é significada a fé separada do amor ou uma doutrina tal que a fé possa ser separada; pela “sua oferta para a qual [Jehovah] não olhou é significada, como anteriormente, que seu culto não foi aceito; pela “ira que se acendeu em Cain” e pelas “faces que decaíram” é significado que se mudaram seus interiores; pela “ira” que se acendeu, a caridade, e pelas “faces” os interiores, que se dizem “caírem” quando são mudados.

356.          Mostrou-se anteriormente que “Cain” significa a fé separada do amor, ou a doutrina tal que a fé possa ser separada; e, em seguida, mostrou-se que a “oferta para a qual não olhou” significa que seu culto não foi aceito.

357.          Pela “ira que se acendeu em Cain” é significado que a caridade se retirou. Isso se pode ver na sequência, onde se diz que “matou o irmão Abel”, por quem é significada a caridade. A ira é uma afeição geral resultante de tudo o que contraria o amor próprio e suas cobiças. Isso se percebe claramente no mundo dos maus espíritos, pois existe lá uma ira geral contra o Senhor, pois não estão em caridade alguma, mas nos ódios. Tudo o que não favorece o amor próprio e do mundo excita uma contrariedade que se manifesta pela ira. Na Palavra, muitas vezes se atribui a Jehovah a ira, a cólera e o furor, mas essas coisas são do homem, e são atribuídas a Jehovah porque, assim, parece, pela razão de que se falou anteriormente. Assim, em David:

“E enviou sobre eles a ira de Suas narinas, e cólera, e furor, e angústia, e imissão de anjos maus; pesou a vereda à ira, não poupou da morte a alma deles” (Salmo 78:49, 50).

Não que Jehovah jamais “envie ira sobre alguém”, mas que eles mesmos a atraem sobre si; nem anjos maus, como foi dito, mas que o homem os chamam a si; por esta razão se acrescenta que Ele “pesa a vereda à ira, e não poupa da morte a alma deles”. Por isso, em Isaías:

“A Jehovah ele virá, e serão envergonhados todos os que se encolerizaram contra Ele” (45:24).

Daí se vê que a “ira” significa os males, ou, o que é o mesmo, o afastar-se da caridade.

358.          Por “decair as faces” é significado que os interiores foram mudados; isso se vê também pela significação da “face” e pela significação de “decair”. Entre os antigos, a face significava os internos, porque os internos brilham na face. Nos tempos antiquíssimos, as pessoas eram tais que a face concordava inteiramente com os internos, de sorte que qualquer poderia, pela face, ver qual era a natureza do ânimo ou da mente de outro. Consideravam como coisa anormal mostrar na face uma coisa e pensar outra diferente. A dissimulação e o engano eram então abomináveis. Por isso, pela “face” significavam os internos. Quando a caridade brilhava na face, então se dizia que as “faces se elevavam”. Quando, porém, sucedia o contrário, então se dizia as “faces decaíam”. Por isso também se atribui ao Senhor que Ele “eleva as faces sobre o homem” como na bênção em Números 6:26 e no Salmo 4:6, que significa que o Senhor dá a caridade ao homem. Em Jeremias se vê o que é “decair as faces”:

“Não farei decair Minha face para convosco, pois que sou misericordioso, diz Jehovah” (3:12);

a “face de Jehovah” é a misericórdia; quando Ele “eleva a face” sobre alguém é que Ele, pela misericórdia, lhe dá a caridade. O contrário é quando “faz cair a face”, isto é, quando a face do homem decai.

359.          Vers. 6: “E disse Jehovah a Cain: Por que se acendeu a ira em ti? e por que decaíram tuas faces?”“Que Jehovah disse a Cain” é que a consciência falou; “acender-se a ira” e “caírem as faces” significa, como antes, que a caridade se retirou e que os interiores foram mudados.

360.          Não há necessidade de confirmação para mostrar que a expressão “Jehovah disse a Cain” significa que a consciência falou; já se explicou passagem semelhante anteriormente.

361.          Vers. 7: “Se fizeres bem, não haverá elevação?E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta; e para ti é o desejo dele, e tu dominas sobre ele.” “Se fizeres bem, não haverá elevação?” significa que, se bem-quiseres, a caridade estará contigo; “se não fizeres o bem, o pecado jaz à porta” significa que, se não quiseres o bem, não haverá caridade, mas o mal; “para ti é o desejo dele, e tu dominas sobre ele” significa que a caridade quer estar em ti, mas não o pode, porque desejas dominar sobre ela.

362.          Aqui se descreve a doutrina da fé que se chama “Cain”. Esta, tendo separado a fé do amor, também a separou da caridade, que é filha do amor. Onde quer que haja alguma Igreja, aí haverá heresias, em razão de que, quando se pensa a respeito de um só artigo da fé, faz-se dele a coisa principal. Pois o pensamento do homem é tal que, quando dirige a atenção para alguma coisa, ele a põe antes de uma outra, mormente quando a imaginação a reivindica como seu próprio achado e quando o amor de si e do mundo insuflam; então, não há coisa alguma que não pareça concordar e confirmar, a ponto de quase jurar que, assim, é, quando, todavia, a coisa é falsa. É assim que aqueles que foram chamados “Cain” fizeram a fé ser essencial acima do amor. E como viviam assim, sem amor, confirmaram-se tanto no amor de si quanto na imaginação daí proveniente.

363.          Pela sua descrição nesse versículo, vê-se a natureza da doutrina da fé que se chamou “Cain”. Pela sequência desse versículo vê-se que a caridade teria podido ser adjunta à fé, mas de maneira tal que a caridade dominasse e não a fé. Por isso se diz primeiro: “Se fizeres bem, haverá elevação”, pelo que é significado que, se bem-quiseres, a caridade pode estar presente. “Bem-fazer”, no sentido interno, significa bem-querer, pois fazer o bem provém de querer o bem. Antigamente, a ação e a vontade faziam uma só coisa; pela ação se percebia a vontade, porque nada havia de dissimulado. Que a “elevação” signifique que a caridade estivesse presente, vê-se pelas coisas que foram ditas anteriormente a respeito das faces, isto é, que “elevar as faces” é ter caridade, e “decair as faces” é o contrário.

364.          A segunda parte era: “Se não fizeres bem, o pecado jaz à porta”; isto significa que “se não quiseres o bem, não há caridade, mas o mal”. Que o “pecado”, quando “jaz a porta”, seja o mal que está pronto e quer entrar, qualquer um pode ver. Com efeito, quando não há caridade, há imisericórdia e ódio, por conseguinte todo mal. O pecado é tomado em geral pelo diabo e sua turba, que está pronto quando o homem está sem caridade. A única coisa que afugenta da porta o diabo e sua turba é o amor ao Senhor e para com o próximo.

365.          A terceira é que “para ti é o desejo dele, e tu dominas sobre ele”. Isso significa que a caridade quer estar na fé, mas não pode, porque a fé quer dominá-la, o que é contra a ordem. Enquanto a fé quiser dominar, não há fé; mas, quando a caridade domina, então há fé, porque o principal da fé é a caridade, como foi mostrado anteriormente. A caridade pode ser comparada à chama, que é a coisa essencial do calor e da luz, pois dela procedem calor e luz. A fé separada pode ser comparada à luz que, quando está sem o calor da chama, é luz, na verdade, mas uma luz de inverno sob a qual tudo entorpece e morre.

366.          Vers. 8: “E falou Cain a Abel, seu irmão; e sucedeu, como estivessem no campo, que se levantou Cain contra Abel seu irmão, e o matou.” Que “Cain tenha falado a Abel” significa um lapso de tempo; por “Cain” é significada a fé separada do amor, como se disse; por “Abel”, a caridade, que é irmã da fé, razão porque ambas são aqui chamadas irmãs; o “campo” significa tudo o que é da doutrina; que “Cain se tenha levantado contra Abel, seu irmão, e o tenha matado”, significa que a fé separada extinguiu a caridade.

367.          Não há necessidade de confirmação destas significações por coisas semelhantes da Palavra. Mostrar-se-á apenas que a caridade é a “irmã” da fé e que o “campo” significa tudo o que é da doutrina. Que a caridade seja irmã da fé, qualquer um pode ver pela natureza ou essência da fé. A fraternidade delas foi também representada por Esaú e Jacob; por isso também houve o litígio sobre a primogenitura e, daí, o domínio. Foi também representada por Farés e Será, filhos de Tamar e Jehudah, em Gênesis 38:28 -30, onde também se trata da primogenitura. Foi representada também por Efraim e Manassés, em Gênesis 48:13, 14, tratando, semelhantemente, da primogenitura e do domínio dela proveniente; assim também por outros. Pois uma e outra, caridade e fé, são filhas da Igreja. A fé se chama “varão”, como acontece a Cain no versículo 1 deste capítulo; a caridade se chama “irmão”, como em Isaías 19:2, Jeremias 13:14 e outros lugares. A união da fé e da caridade se chama “aliança de irmãos” em Amós 1:9. O que é representado por Cain e Abel foi semelhantemente representado por Jacob e Esaú, como foi dito. Que Jacob quis também derrotar [supplantare] a Esaú, vê-se também em Oséias:

“...Para visitar a Jacob sobre os seus caminhos, segundo as suas obras o retribuirá. No útero enganou a seu irmão...” (12:3, 4).

Mas que Esaú, ou a caridade representada por Esaú, finalmente dominaria, vê-se pela predição profética de Isaque, o pai:

“Sobre tua espada viverás, e a teu irmão servirás; e sucederá, quando dominares, que rejeitarás o seu jugo de cima de teu pescoço” (Gên. 27:40);

ou, o que é a mesma coisa, que a Igreja nova ou dos gentios é representada por “Esaú”, e a Igreja Judaica por “Jacob”. Por isso se diz tantas vezes que reconheceriam os gentios como irmãos. São também chamados “irmãos”. Foram também chamados “irmãos” todos os que estavam, pela caridade, na Igreja dos gentios ou Primitiva. Os que ouvem a Palavra e a cumprem são também chamados “irmãos” pelo Senhor, em Lucas 8:21. Os “que ouvem” são aqueles que têm a fé, os “que cumprem” são os que têm a caridade. Mas os que ouvem ou que afirmam ter a fé, e não cumprem ou não têm caridade, não são irmãos, pois o Senhor os assemelha a “insensatos” (Mateus 7:24, 26).

368.          Que o “campo” signifique a doutrina, por conseguinte tudo o que pertence à doutrina sobre a fé e a caridade, vê-se na Palavra. Em Jeremias:

“Ó, Minha montanha no campo! os teus recursos, todos os teus tesouros darei por presa” (17:3),

onde “campo” é a doutrina, “recursos e tesouros” são as riquezas espirituais da fé ou as que são da doutrina da fé. No mesmo:

“Acaso se esquecerá da pedra do campo a neve do Líbano?” (18:14).

De Sião se diz que ela será “lavrada como um campo” quando não existir mais a doutrina da fé (Jeremias 26:18; Miquéias 3:12). Em Ezequiel:

“Tomou da semente da terra, e a lançou num campo de sementes” (17:5),

onde se trata da Igreja e de sua fé, pois a doutrina se chama “campo” por causa da semente. No mesmo:

“E saibam todas as árvores do campo que Eu, Jehovah, humilho a árvore elevada” (17:24).

Em Joel:

“O campo foi devastado, o humo chora, porque o trigo foi devastado, secou-se o mosto, o óleo se enfraqueceu; os lavradores se envergonharam... a colheita do campo pereceu... todas as árvores do campo se secaram” (1:10-12),

onde o “campo” é a doutrina, as “árvores” são os conhecimentos e os “lavradores” são os que cultivam. Em David:

“O campo exultará, e tudo o que há nele; então todas as árvores da floresta cantarão” (Salmo 96:12).

O campo não pode exultar, nem as árvores da floresta cantar, mas trata-se de coisas que estão no homem, que são as cognições da fé. Em Jeremias:

“Até quando a terra lamentará,e a erva de todo o campo estará ressequida?” (12:4).

Do mesmo modo, nem a terra nem a erva do campo podem lamentar, mas trata-se do que está no homem e foi devastado. Semelhantemente, em Isaías:

“As montanhas e as colinas retumbarão em cântico perante vós, e todas as árvores do campo baterão palmas” (55:12).

O Senhor também, quando predisse a consumação do século, chamou de “campo” a doutrina da fé:

“Dois estarão no campo, um será tomado e o outro deixado” (Mateus 24:40, Lucas 17:36),

onde se entende, pelo “campo”, a doutrina da fé, tanto a falsa quanto a verdadeira, como aqui. Como o “campo” é a doutrina, tudo o que recebe alguma semente da fé também se chama “campo”, tanto o homem como a Igreja e o mundo.

369.          Daí resulta agora a significação destas expressões: “como estivessem no campo”, e “Cain levantou-se contra Abel seu irmão, e o matou”, a saber, que, conquanto uma e outra, tanto a fé quanto a caridade, fossem provenientes da doutrina da fé, a fé separada do amor não podia deixar de desprezar a caridade e, assim, extingui-la. É como costuma acontecer hoje com os que afirmam que a fé, só, salva, mesmo quando não se faz obra alguma da caridade. Assim, por esta suposição extinguem a caridade, quando, todavia, sabem e confessam de boca que a fé não é salvífica se não há amor.

370.          Vers. 9: “E disse Jehovah a Cain: Onde está Abel, teu irmão? E disse: Não sei. Acaso sou eu guardião do meu irmão?” “Jehovah disse a Cain” significa uma certa faculdade perceptiva vinda do interior a qual ditava a respeito da caridade ou “o irmão Abel”; “Disse: Não sei. Acaso sou eu guardião do meu irmão?” significa que fez pouco caso da caridade, a quem não queria servir; por conseguinte, que rejeitou completamente tudo o que era da caridade. Tal se tornou a doutrina deles.

371.          Por “Jehovah falando” os antiquíssimos significavam a percepção, pois sabiam que o Senhor era Quem lhes dava o perceber. Essa percepção não podia durar senão enquanto o amor fosse o principal; quando cessou o amor ao Senhor, e, assim, para com o próximo, a percepção pereceu; e tanto quanto o amor permaneceu, assim houve percepção. Esse perceptivo era peculiar à Igreja Antiquíssima. Mas depois que a fé foi separada do amor, como nos que vieram após o dilúvio, e que a caridade era dada por meio da fé, foi substituído pela consciência, que também dita, mas de outro modo. Dela se falará na sequência, pela Divina misericórdia do Senhor. Na Palavra, quando a consciência dita, diz‑se semelhantemente que Jehovah fala, porque a consciência é formada pelas coisas reveladas e pelas cognições provenientes da Palavra; e, quando a Palavra diz ou dita, é o Senhor quem o diz. Por isso, nada é mais comum do que se dizer, mesmo hoje, que o Senhor fala, quando se trata de coisa da consciência ou da fé.

372.          “Ser guardião” significa servir, como os guardas da porta e os guardas do limiar na Igreja Judaica. Diz‑se da fé que ela é a guardiã da caridade, porque deve servi‑la. Mas, segundo os princípios dessa doutrina, a fé é que devia dominar, como se diz no versículo 7.

373.          Vers. 10: “E disse: Que fizeste? A voz dos sangues do teu irmão está clamando a Mim desde o humo.” A “voz dos sangues do irmão” significa a violência praticada contra a caridade; que “os sangues clamam” significa a culpabilidade; o “humo” é o cisma ou a heresia.

374.          Que “a voz dos sangues” signifique a violência praticada contra a caridade, vê‑se por muitas passagens na Palavra, onde a “voz” é tomada por tudo o que acusa, e “sangue” por todo pecado, principalmente, pelo ódio, pois aquele que tem ódio ao irmão em seu coração o mata,como o Senhor o ensina:

“Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás, mas quem matar será réu de juízo; Eu porém vos digo que quem se encolerizar contra seu irmão temerariamente será réu de juízo; e quem disser ao seu irmão: Raka[1], será réu de sinédrio; e quem lhe disser: Tolo, será réu da gehena[2] de fogo” (Mt. 5:21, 22).

Por estas palavras se entendem os graus do ódio. O ódio é contrário à caridade, e mata, se não com a mão, ao menos em intenção, e de todo modo possível. São apenas os vínculos externos que impedem de se fazê-lo com a mão; por isso todo ódio é de sangue, como em Jeremias:

“...Em que fazes bom o teu caminho para buscares o amor?... Até nas tuas orlas se achou o sangue das almas dos pobres inocentes (2:33, 34).

[2] E, porque o ódio é o “sangue”, toda iniquidade é sangue, pois o ódio é a origem de toda iniquidade; como em Oséias:

“...O perjurar, e o mentir, e o matar, e o furtar, e o adulterar; cometem homicídios; e os sangues contra os sangue. Por causa disso a terra lamentará, e definharão todos os que nela ahabitam” (4:2, 3).

e em Ezequiel:

“Não julgarás a cidade de sangues, e não lhe farás conhecer todas as suas abominações?... Cidade que derrama o sangue no meio dela... pelo teu sangue, que derramaste, tu te tornaste culpada”... (22:2-4, 6, 9),

onde se trata da falta de compaixão. No mesmo:

“A terra está cheia do juízo dos sangues, e a cidade está cheia de violência” (7:23);

e em Jeremias:

“Por causa dos pecados dos profetas de Jerusalém, das iniquidades dos seus sacerdotes, os que derramam no meio dela o sangue dos justos, vagam cegos nas praças, foram contaminados com o sangue” (Lam. 4:13, 14);

em Isaías:

“Quando o Senhor tiver lavado as impurezas das filhas de Sião, e limpado os sangues de Jerusalém do meio dela, com espírito de justiça e com espírito de inflamação” (4:4):

nomesmo:

“As palmas de vossas mãos foram contaminadas no sangue, e os vossos dedos na iniquidade” (59:3);

em Ezequiel:

“Passei por ti, e te vi pisada em teus sangues, e te disse: Em teus sangues vive; e te disse: Em teus sangues vive” (16:6, 22);

onde se trata das abominações de Jerusalém, que são nomeadas “sangues”. A falta de compaixão e o ódio dos últimos tempos são descritos também pelo “sangue” no Apocalipse (16:3, 4). Se dizem “sangues”, no plural, porque todas as coisas iníquas e abomináveis brotam do ódio, assim como todas as coisas boas e santas brotam do amor. Pois aquele que tem ódio ao próximo, matá-lo-ia se o pudesse, e o faria de qualquer maneira possível. Isso é fazer-lhe violência, a qual é aqui propriamente significada pela “voz dos sangues”.

375.          “Voz que clama” e “voz de clamor” é uma expressão habitual na Palavra, e se aplica a cada coisa que se refere a algum ruído, tumulto, hostilidade e até a um acontecimento feliz, como em Êxodo 32:, 17, 18; Sofonias 1:9, 10; Isaías 65:19; Jeremias 48:3; aqui significando o que acusa.

376.          Daí se segue agora que “os sangues clamam” significa a culpabilidade, pois os que usam de violência fazem-se culpados, como em David:

“O mal matará o ímpio, e os que odeiam os justos far-se-ão culpados” (Salmo 34:21);

em Ezequiel:

“Ó cidade, pelo sangue que derramaste tu te tornaste culpada” (22:4).

377.          Que o “humo” signifique aqui o cisma ou a heresia, vê-se pelo fato de o “campo” significar a doutrina; por essa razão, o “humo”, em que está o campo, é o cisma. O homem mesmo é o “humo” como também o “campo”, pois é nele que essas coisas são semeadas. Porque o homem tem a sua qualidade determinada pelas coisas que nele foram semeadas: é bom e verdadeiro pelos bens e pelos veros, e é mau e falso pelos males e falsidades, Quem está em alguma doutrina, por ela é designado; os que estão nas cisões ou heresias são por estas designados. Assim, aqui, o “humo” é tomado pelos cismas ou heresias que estão no homem.

378.          Vers. 11: “E agora, maldito és tu desde o humo, que abriu a sua boca, recebendo os sangues do teu irmão da tua mão”. “Maldito és tu desde o humo” significa que se desviou pelo cisma; “que abriu a sua boca” significa que ensinou; “recebendo os sangues de teu irmão da tua mão” é que fez violência à caridade, que ele extinguiu.

379.          Que sejam essas as coisas significadas, vê-se pelo que precede; e que “maldito” signifique desviado, também foi mostrado antes, no n. 245, pois as iniquidades e abominações, ou os ódios, são as coisas que desviam o homem para que olhe somente para baixo, para as coisas corporais e terrestres, e, assim, para as coisas que são do inferno. Isso sucede, quando a caridade é exilada e extinta, porque, então, se rompe o vínculo entre o Senhor e o homem. Somente a caridade, o amor e a misericórdia fazem conjunção, e nunca a fé sem a caridade, porque tal fé é nula, é um mero conhecimento tal qual a turba diabólica pode ter e pela qual eles podem enganar dolosamente os probos e imitar anjos de luz. É como às vezes têm por costume fazer os pregadores mais perversos, até com zelo que imita a piedade, embora nada esteja menos neles do que aquilo que pronunciam pela boca. Pode existir alguém tão debilitado do juízo a ponto de crer que só a fé da memória, ou só o pensamento dela derivado, possa prover algo, quando qualquer um sabe, pela própria experiência, que ninguém dá valor às palavras e aprovações de outro, sejam quais forem, quando estas não procedem da vontade ou intenção? É a vontade e a intenção que fazem que sejam agradáveis, e conjungem uma à outra. Querer é o próprio homem, e não pensar e falar o que não se quer; do querer ele tira a natureza e a índole, porque o querer o afeta. Se, todavia, o homem pensa no bem, então a essência da fé ou a caridade está no pensamento, porque nele há o bem querer. Se, porém, pensa no bem e vive no mal, não pode jamais ser outra coisa senão o querer mal; por isso a fé é nula.

380.          Vers. 12: “Quando cultivares o humo, não te dará mais a sua força; errante e fugitivo serás na terra”. “Cultivar o humo” significa desenvolver esse cisma ou essa heresia; “não mais te dar a sua força” significa ser estéril; “ser errante e fugitivo na terra” é não saber o que é o vero e o bem.

381.          Que “cultivar o humo” seja desenvolver esse cisma ou essa heresia, vê-se pela significação de “humo”, da qual se tratou há pouco; que “não dar mais a sua força” signifique ser estéril é evidente pela consequência e pelas próprias palavras, e também por isso, que, aqueles que professam a fé sem a caridade, não professam fé alguma, como foi dito.

382.          Que “ser errante e fugitivo na terra” signifique não saber o que é o vero e o bem, vê-se pela significação, na Palavra, de “vagar” e “fugir”, como em Jeremias:

“Os profetas e os sacerdotes vagam cegos nas ruas, estão contaminados de sangue; as [coisas] que eles não podem tocar, tocam-nas com as vestimentas” (Lam. 4:13, 14);

onde os “profetas” são os que ensinam, “sacerdotes” são os que vivem segundo as coisas ensinadas e “vagar cego nas ruas” é não saber o que é o bem e o vero. [2] Em Amós:

“Parte do campo recebeu chuva, e parte do campo, em que não choveu, secou-se. Pelo que duas ou três cidades vaguearão para uma cidade para beberem águas, e não ficarão saciadas” (4:7, 8),

onde “parte do campo sobre a qual houve chuva” é a doutrina da fé procedente da caridade; a “parte ou gleba do campo em que não choveu” é a doutrina da fé sem a caridade; “vagar para beber águas” é semelhantemente procurar o que é verdadeiro. [3] Em Oséias:

“Foi ferido Efraim, e a raiz deles se secou; eles não darão fruto... Meu Deus os rejeitará, porque não O escutaram, e serão errantes entre as nações” (9:16, 17).

“Efraim” está em lugar da inteligência do vero ou a fé, por ser o primogênito de José; a “raiz que se secou” está em lugar da caridade, que não pode dar fruto; “errar entre as nações” é não conhecer o vero e o bem. [4]               Em Jeremias:

“Subi contra a Arábia, e devastai os filhos do oriente. Fugi, errai muito; na profundeza se precipitaram para habitar os habitantes de Hazor” (49:28, 30);

A “Arábia” e os “filhos do oriente” são a posse das riquezas celestes, ou seja, das coisas que são do amor, a respeito das quais, quando são devastadas, se diz “fugir e errar” ou ser fugitivo e errante, quando nada fazem de bem. E dos “habitantes de Hazor”, ou os que possuem as riquezas espirituais, que são as coisas da fé, se diz “precipitar-se na profundeza” ou perecer. Em Isaías:

“Todos os teus principais erram juntos; pelo arco foram ligados; para longe fugiram” (22:3),

onde se trata do vale da visão ou da ilusão de que a fé pode existir sem a caridade. Daí vem que, no versículo 14 seguinte, se diz que é “errante e fugitivo”, ou, que nada sabe do vero e do bem, aquele que confessa a fé separada da caridade.

383.          Vers. 13: “E disse Cain a Jehovah: Grande demais é a minha iniquidade para que seja tirada”. “Cain disse a Jehovah” significa uma certa confissão de que se está no mal, por uma certa dor interna; “grande demais a iniquidade para que seja tirada” significa o desespero resultante.

384.          Daí se vê que restava ainda algum bem em Cain. Mas que todo bem da caridade tenha perecido depois, vê-se por Lamech, de quem se trata nos versículos 19, 23 e 24.

385.          Vers. 14: “Eis, lançaste-me hoje de sobre as faces do humo; e de Tuas faces serei oculto, e serei errante e fugitivo na terra; e será que, todo aquele que me achar, me matará”. “Ser lançado de sobre as faces do humo” significa ser separado de todo vero da Igreja; “ser oculto de Tuas faces” significa ser separado de todo bem da fé proveniente do amor; “ser errante e fugitivo na terra” é não saber o que é vero e o bem; “todo aquele que o achar o matará” é que todo mal e falso o destruirá.

386.          Que “ser lançado de sobre as faces do humo” signifique ser separado de todo o vero da Igreja, vê-se pela significação de “humo”, que, no sentido genuíno, é a Igreja ou o homem da Igreja, por conseguinte tudo o que a Igreja professa, como foi dito antes. Do sujeito depende o atributo. Por isso também, o que professa mal a fé, ou professa um cisma ou heresia, também se chama “humo”. “Ser lançado de sobre as faces do humo” é, por conseguinte, não estar mais no vero da Igreja.

387.          Que “ser oculto de Tuas faces” signifique ser separado de todo o bem da fé proveniente do amor, vê-se pela significação das “faces de Jehovah”. As “faces de Jehovah” são,como foi dito antes, a misericórdia, da qual procedem todos os bens da fé proveniente do amor; por isso os bens da fé são aqui significados pelas “faces”.

388.          “Ser errante e fugitivo na terra” é, como antes, não saber o que é o vero e o bem.

389.          Daí se segue que “todo aquele que o achar o matará” é que todo o mal e o falso o destruirá. Com efeito, a coisa se passa assim: quando o homem se priva da caridade, então, se separa do Senhor; é a caridade, só, ou o amor para com o próximo e a misericórdia que conjunge o homem ao Senhor. Sem a caridade há a disjunção; quando há a disjunção, ele fica entregue a si mesmo ou ao seu proprium; tudo o que então pensa é o falso e tudo o que quer é o mal; são estas as coisas que matam o homem, ou fazem que ele nada tenha de vida.

390.          Aqueles que se acham no falso e no mal estão num contínuo terror de serem mortos; é o que se descreve em Moisés:

“E será vossa terra a desolação, e as vossas cidades assolação... [E quanto aos] restantes de vós, introduzirei moleza no coração deles, nas terras dos seus inimigos, e o som de uma folha agitada os perseguirá, e fugirão a fuga da espada, e cairão sem ninguém os perseguir; e atropelará cada um a seu irmão como diante da espada, e sem que ninguém os persiga” (Lev. 26:33, 36 e 37).

Em Isaías:

“Os pérfidos agem com perfídia, e com perfídia de pérfidos obram perfidamente..[3] E será que, aquele que fugir da voz do pavor cairá na cova; e o que subir do meio da cova será colhido no laço; ...pesada será sobre ela a sua prevaricação; por isso cairá e não mais se erguerá” (24:16-20).

Em Jeremias:

“Eis, trarei sobre ti o pavor... de todos os teus arredores;vós sereis expulsos, cada um sobre sua face, sem quem congregue o errante” (49:5).

Em Isaías:

“...Sobre cavalo fugiremos; portanto fugireis. E: Sobre [cavalos] velozes cavalgaremos; por isso os que vos perseguem serão mais velozes. Um milhar diante da ameaça de um, e diante da ameaça de cinco vós fugireis”. (30: 16, 17).

Aqui e em outras partes na Palavra se descrevem os que estão no falso e no mal, os quais fogem e temem ser mortos. Há neles um temor em relação a todos, porque ninguém os protege. Todo aquele que está no mal e no falso tem ódio ao próximo, pelo que cada um deseja matar o outro.

391.          Que aqueles que estão no falso e no mal temem a todos, é o que se pode saber muito bem pelo que se passa com os maus espíritos na outra vida. Os que se privaram de toda a caridade andam errantes e são fugidios. A qualquer parte que vão, a quaisquer sociedades, estas logo percebem, à sua chegada, qual é sua qualidade; tal percepção existe na outra vida. Elas não somente os expulsam mas também os punem severamente, e estariam dispostos até a matá-los, se o pudessem. Os maus espíritos se comprazem sobretudo em se punirem e atormentarem uns aos outros; é nisto que consiste seu maior prazer. E, o que é ainda um arcano, o falso e o mal mesmos são a causa, pois aquilo que se deseja a outro recai sobre si mesmo, porque o falso e o mal têm consigo o castigo do falso e do mal, por conseguinte, o temor do castigo.

392.          Vers. 15: “E disse-lhe Jehovah: Por isso, todo aquele que matar Cain sete vezes será vingado. E Jehovah pôs um sinal em Cain, para que o não ferisse quem o achasse”. “Todo aquele que matar Cain sete vezes será vingado” significa que fazer violência à fé assim separada seria fazê-lo ao que é sagrado; “Jehovah” pôs um sinal em Cain, para que o não ferissem” é que  o Senhor distinguiu essa fé de um modo singular para que fosse conservada.

393.          Antes de se explicar o que essas coisas significam no sentido interno, cumpre saber de que modo a coisa se passa com a fé. A Igreja Antiquíssima era tal que não reconhecia fé alguma a não ser a que vem do amor, a ponto de que eles não queriam sequer nomear a fé, pois todas as coisas pertinentes à fé percebiam pelo amor que procede do Senhor. São assim também os anjos celestes, de quem se falou anteriormente. Como, porém, foi previsto que o gênero humano não poderia permanecer em tal estado e que separariam a fé do amor procedente do Senhor, e pela fé fariam uma doutrina singular, foi também provido para que [a fé] fosse separada, mas de tal sorte que, pela fé, ou pelas cognições da fé, recebessem do Senhor a caridade, de modo que a cognição ou audição precedesse, e pela cognição ou audição o Senhor lhes desse a caridade, isto é, com o amor ao próximo e a misericórdia. Essa caridade não só seria inseparável da fé, mas também constituiria o principal da fé. Assim, em lugar da percepção que existiu na Igreja Antiquíssima, sucedeu a consciência, que, sendo adquirida pela fé adjunta à caridade, ditaria não o que é o vero, mas se algo é verdadeiro, e isso porque o Senhor falou na Palavra. Tais se tornaram as Igrejas, em sua maior parte, após o dilúvio; tal era a Igreja primitiva ou a primeira Igreja de após o Advento do Senhor. É nisso que os anjos espirituais se distinguem dos anjos celestes.

394.          Ora, como isso foi previsto e provido para que o gênero humano não perecesse de morte eterna, aqui se diz que “ninguém violasse Cain”, por quem é significada a fé separada, e que “foi posto nele um sinal”, isto é, que o Senhor a distinguiu de modo singular para que fosse conservada. Essas coisas são arcanos que até agora não tinham sido revelados, e são elas a que o Senhor Se referia pelas palavras que pronunciou sobre o casamento e sobre os eunucos, em Mateus:

“Há eunucos que desde o ventre da mãe nasceram tais; e há eunucos que foram feitos eunucos pelos homens; e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por causa do reino de Deus; quem pode compreender, compreenda” (19:12).

“Eunucos” se dizem dos que estão no casamento celeste; “desde o ventre nascidos”, dos que são como os anjos celestes; “feitos pelos homens”, os que são como os anjos espirituais; “que a si mesmos se fizeram”, como os espíritos angélicos, que não agem tanto pela caridade mas pela obediência.

395.          Que “todo aquele que matar Cain será vingado sete vezes” signifique que fazer violência à fé assim separada seria fazê-lo ao que é sagrado, vê-se pela significação de “Cain”, que é a fé separada, e pela significação de “sete”, que é o sagrado. O número septenário foi considerado santo, como se sabe, por causa dos seis dias da criação, e o sétimo, que é o homem celeste, no qual há paz, o descanso, o sábado. Daí ocorrer tantas vezes o número septenário nos ritos da Igreja Judaica e em toda parte ser considerado santo. Os tempos, por conseguinte, se distinguiam em sete, tanto os seus grandes intervalos quanto os pequenos, e se chamavam “semanas”, como os grandes intervalos dos tempos para a vinda do Messias (Daniel 9:24, 25); e o tempo de sete anos chamado semana por Labão e Jacob (Gênesis 29:27, 28). Por isso, onde quer que ocorra o número septenário, ele é tomado pelo que é santo ou sagrado, como em David:

“Sete vezes ao dia Te louvo” (Sal. 119:164);

em Isaías:

“Será a luz da luz como a luz do sol, e a luz do sol será sétupla, como a luz de sete dias” (30:26),

onde o “sol” é o amor e a “lua” a fé procedente do amor, a qual será como o amor. [2] Assim como os tempos da regeneração do homem foram distintos em seis, antes do sétimo ou homem celeste, assim também os tempos da devastação, até não restar coisa alguma celeste. É isso que foi representado pelos muitos cativeiros dos judeus e pelo último, na Babilônia, que foi de sete séculos [4] ou setenta anos. E algumas vezes é dito que a terra descansaria os seus sábados. E também por Nebuchadenezzar, em Daniel:

“Seu coração de homem será mudado, e um coração de besta lhe será dado até que sete tempos passem sobre ele” (4:16, 25, 32).

Sobre a devastação dos últimos tempos, em João:

“Vi outro sinal no céu, grande e admirável: sete anjos tendo as sete últimas pragas” (Apoc. 15:1, 6, 7).

É dito que:

“Pisarão a cidade santa quarenta e dois meses, ou seis vezes sete” (Ibid. 11:2).

“Vi um livro [escrito] por dentro e por detrás, selado com sete selos” (Ibid. 5:1).

Daí é que a severidade e o acréscimo das penas se exprimiam pelo número septenário, como em Moisés:

“Se, depois disto, não Me obedecerdes, ainda vos castigarei ao sétuplo, por causa de vossos pecados” (Lev. 26:18, 21, 24 e 28) .

Em David:

“Torna aos nossos vizinhos o sétuplo em seu regaço” (Sal. 79.12).

Pelo fato de que era um sacrilégio fazer violência à fé, pois que, como foi dito, ela seria útil, daí ser dito que “ao sétuplo será vingado aquele que matar Cain”.

396.          Que “Jehovah tenha posto um sinal em Cain, para que ninguém o ferisse” signifique que o Senhor distinguiu a fé de um modo singular para que fosse conservada, vê-se pela significação de “sinal” e “pôr um sinal” em alguém, que é distinguir, como em Ezequiel:

“Disse Jehovah: Passa pelo meio da cidade, pelo meio de Jerusalém, e marca com um sinal as testas dos varões que gemem e suspiram sobre todas as abominações” (9:4),

onde “marcar as testas” não significa fazer um sinal ou um traço nas testas, mas distingui-los dos outros. Semelhantemente, em João:

“Que causassem dano... aos homens que não tivessem o sinal de Deus nas testas” (Apoc. 9:4),

onde “ter o sinal” é, também, distinguir. [2] No mesmo livro, o sinal também é chamado marca [character]:

“Fazer uma marca na mão e na testa” (14:9)

As coisas significadas por estas expressões eram representadas na Igreja Judaica pela ligação do preceito maior e principal na mão e na testa, de que se trata em Moisés:

“Ouve, ó Israel, Jehovah nosso Deus é um só Jehovah; amarás Jehovah teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças; ...e ligarás estas [palavras] por sinal na tua mão, e que sejam como testeira entre teus olhos” (Deut. 6:4, 5 e 8; 11:13, 18),

pelo que era representado que deviam considerar o preceito sobre o amor acima de todos os outros preceitos. Daí é evidente o que significa o sinal na mão e na testa. [3] Em Isaías:

“[O tempo] vem para congregar todas as nações e línguas; e virão, e verão a Minha glória; e porei neles um sinal” (66:18, 19);

e em David:

“Torna-Te para mim, e tem misericórdia de mim; dá Tua força ao Teu servo, e salva o filho de Tua serva. Faze comigo um sinal para o bem, e que o vejam aqueles que me odeiam, e fiquem envergonhados” (Sal. 86:16, 17).

Por estas explicações, pode-se ver agora o que é o “sinal”. Por isso ninguém deve imaginar que algum sinal tenha sido posto em alguém chamado Cain, porque o sentido interno da Palavra envolve coisas inteiramente diferentes das do sentido da letra.

397.          Vers. 16: “E saiu Cain de diante das faces de Jehovah, e habitou na terra de Nod, para o oriente do Éden”. “Saiu Cain de diante das faces de Jehovah” significa que foi separado do bem da fé proveniente do amor; “habitou na terra de Nod” é estar fora do vero e do bem; “para o oriente do Éden” é perto da mente intelectual, onde antes havia o amor.

398.          Que “sair de diante das faces de Jehovah” signifique ser separado do bem da fé do amor, vide no versículo 14 acima; que “tenha habitado na terra de Nod” signifique estar fora do vero e do bem, vê-se pela significação da palavra “Nod”, que é ser errante e fugitivo; e que “ser errante e fugitivo” é ser privado do vero e do bem, vide também acima; que “para o oriente do Éden” seja perto da mente intelectual, onde antes reinava o amor, e também perto da mente racional, onde antes reinava a caridade, vê-se pelas coisas que foram ditas anteriormente sobre a significação de “oriente do Éden”, a saber, que o “Oriente” é o Senhor e “Éden” é o amor. Nos varões da Igreja antiquíssima, a mente, constituída pela vontade e pelo entendimento, era uma só. Com efeito, a vontade nela era tudo, de sorte que o entendimento pertencia à vontade, e isso porque não se fazia distinção entre o amor que é da vontade e a fé que é do entendimento, porque o amor era tudo e a fé era do amor. Mas, depois que a fé foi separada do amor - de sorte que, naqueles que foram chamados Cain, não reinava mais vontade alguma, e como o entendimento reinava em lugar da vontade, ou a fé em lugar do amor-foi dito que “habitou para o oriente do Éden”. Pois, como se disse há pouco, a fé foi distinta, ou, “foi posto um sinal” para que fosse conservada para uso do gênero humano.

399.          Vers. 17: “E Cain conheceu sua esposa, e concebeu, e pariu Hanoch[Enoque]. E sucedeu que edificou uma cidade, e chamou o nome da cidade segundo o nome de seu filho Hanoch”. “Que Cain tenha conhecido sua esposa, e tenha concebido e parido Hanoch” significa que esse cisma ou heresia produziu de si mesma uma outra, que foi chamada Hanoch; pela “cidade edificada” é significado todo doutrinal e herético daí; como o cisma ou heresia foi chamado Hanoch, é dito que o “nome da cidade se chamou segundo o nome do filho, Hanoch”.

400.          Que “Cain tenha conhecido sua esposa, tenha concebido e parido Hanoch” signifique que esse cisma ou heresia produziu de si mesma uma outra, é o que se segue claramente pelas coisas precedentes e, também, pelo versículo primeiro, a saber, que “o Homem e Havah sua esposa geraram Cain”.  Assim, as expressões que se seguem são concepções e partos semelhantes, tanto de Igrejas quanto de heresias, das quais se instituía uma genealogia, pois as coisas são semelhantes; de uma heresia formada nascem muitas.

401.          Que a heresia e todo o seu doutrinal ou herético tenha sido chamado Hanoch, isto também se vê um pouco pelo nome, que significa a instrução daí começada ou iniciada.

402.          Que pela “cidade edificada” seja significado todo doutrinal e herético daí proveniente, vê-se pela Palavra em toda parte em que ocorre o nome de alguma cidade. Ali, em parte alguma a cidade é significada, mas alguma espécie de doutrinal ou herético, porque os anjos ignoram inteiramente o que é a cidade ou algum nome de cidade, nem podem em momento algum ter idéia de cidade, pois estão nas idéias espirituais e celestes, como foi mostrado antes, mas percebem apenas o que elas significam. Assim, pela “cidade santa”, que também se chama a “santa Jerusalém”, não entendem outra coisa senão o reino do Senhor no universal ou qualquer um em particular em que está o reino do Senhor. Entendem coisas semelhantes pela “cidade ou monte de Sião”: pelo monte, o celeste da fé e pela cidade, o espiritual da fé. [2] O celeste e espiritual mesmo é descrito também pelas cidades, palácios, casas, muros, alicerces dos muros, antemuros, portas e ferrolhos, e, no meio, o templo, como em Ezequiel 48, no Apocalipse21:15 ao fim. É chamado a “Santa Jerusalém” no mesmo, Vers. 2 e 10; em Jeremias 31:38. Em David, “Cidade de Deus, o santo dos habitáculos do Altíssimo (Salmo 46:5); em Ezequiel, chamado “Cidade, Jehovah ali” (47:35). Em Isaías se diz dela:

“Filhos de estrangeiros edificarão os teus muros... curvar-se-ão às solas de teus pés todos os que te rejeitam, e chamar-te-ão Cidade de Jehovah, Sião do Santo de Israel” (60:10, 14).

Em Zacarias, Jerusalém é chamada “cidade da verdade” e “monte de Sião, monte da santidade” (8:3) onde “cidade da verdade ou Jerusalém” significa as coisas espirituais da fé, e “monte da santidade ou de Sião” as celestes da fé. Como as coisas celestes e espirituais da fé foram representadas pela cidade, assim todas as coisas doutrinais foram significadas pelas “cidades de Jehudah e de Israel”,as quais também, quando nomeadas, significam algum doutrinal em particular. Mas qual é esse doutrinal, ninguém pode saber, a não ser pelo sentido interno. [3] Como pelas “cidades” são significadas as coisas doutrinais, também pelas cidades são significadas as coisas heréticas, e, quando nomeadas, também significam algum herético em particular. Somente então se pode ver, pelas passagens que se seguem, que a “cidade” significa em geral o doutrinal ou herético. Em Isaías:

“Naquele dia, haverá cinco cidades na terra do Egito, falando com o lábio de Canaan e jurando JehovahZebaoth; uma será chamada a cidade de Ceres” (19:18),

onde se trata do conhecimento das coisas espirituais e celestes no tempo do Advento do Senhor. No mesmo:

“Cheia de tumultos, cidade tumultuosa, cidade exultante” (22:1, 2),

onde se trata do vale da visão ou da ilusão. Em Jeremias:

“As cidades do sul foram fechadas, ninguém há que as abra” (13:19),

onde se trata daqueles que estão no “sul” ou na luz da verdade e a extinguem. No mesmo:

“Cogitou Jehovah em destruir o muro da filha de Sião, fez em luto o antemuro e o muro, ao mesmo tempo foram enfraquecidos; suas portas foram derribadas em terra; destruiu e quebrou os seus ferrolhos” (Lam. 2:8, 9),

onde qualquer um pode ver que pelo “muro”, pelo “antemuro”, pelas “portas” pelos “ferrolhos” não se entendem outra coisa a não ser doutrinais. Semelhantemente, em Isaías:

“Será cantado este cântico na terra de Jehudah, cidade forte para nós; a salvação estabelecerá muros e antemuro. Abri vós as portas para que entre a nação justa, que guarda a fidelidade” (26:1, 2).

No mesmo:

“Exaltar-Te-ei, confessarei Teu Nome... Fizeste da cidade um montão, da cidade fortificada uma ruína; o palácio dos estrangeiros da cidade não se reedificará jamais. Por causa disso, um povo forte Te honrará, a cidade das nações temíveis te temerá [timebunt]” (25:1, 3);

Nem aí se trata de cidade alguma. Na profecia de Bileam [Balaão]:

“Edom será por herança... e dominará de Jacob, e fará destruir o que restar da cidade” (Núm. 24:18, 19),

onde qualquer um pode ver que “cidade” não significa cidade. Em Isaías:

“Foi quebrada a cidade da vaidade; toda casa foi fechada, para que não entre o clamor por causa do vinho nas ruas” (24:10, 11),

onde a “cidade da vaidade” está em lugar das vaidades da doutrina; “ruas”, aqui e em outras passagens, significam as coisas que são da cidade, sejam falsas ou verdadeiras. Em João:

“Quando o sétimo anjo derramou a taça... rompeu-se a cidade grande em três partes, e as cidades das nações caíram” (Apoc. 16:19).

Que a “cidade grande” seja o herético e que a “cidade das nações” seja o mesmo, qualquer um pode ver. Também é explicado que a cidade grande é a mulher que João viu (Apoc. 17:18). Que a “mulher” seja uma tal Igreja, mostrou-se anteriormente.

403.          Por estas explicações, vê-se o que “cidade” significa. Mas, como todas as coisas estão em forma de histórias, não se pode ver outras coisas senão as que se acham no sentido da letra, isto é, que uma cidade foi edificada por Cain e chamada Hanoch, embora, pelo sentido da letra, também se devesse refletir se a terra estaria povoada, visto que Cain foi o primogênito de Adam. A série histórica tem consigo essa característica. Mas, como foi dito anteriormente, era costume entre os antiquíssimos dispor todas as coisas sob tipos representativos em forma de história, o que lhes era sumamente deleitável, porque, assim, tudo lhes parecia dotado de vida.

 



[1]     Termo hebraico que significa “vazio”.
[2]     Termo hebraico usado como sinônimo de inferno.
 
[3]     Perfidiperfideagunt, etperfidiaperfidorumperfidefaciunt...
[4]     Vide observação no parágrafo 433, a saber, que um século (ou uma era), na Palavra, tem duração de dez anos.

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O Dilúvio, parte 1

Os pré-diluvianos

C. R. Nobre

 

O capítulo 6 de Gênesis trata do Dilúvio.

Na história do dilúvio, nós nos deparamos com a mesma condição que se aplicouaos capítulos anteriores, isto é, todas as pessoas, todos os seres, objetos, eventos que são mencionados nestes relatos são tipos meramente representativos, e não pessoas, coisas e fatos reais.

Conforme já dissemos, todas as coisas mencionadasnos primeiros onze capítulos de Gênesis são somente símbolos ou tipos correspondenciais, quando elementos do mundo natural são utilizadosa fim de representar a realidade espiritual de uma formaacessível à compreensão humana. São como vasos que contêm, por suas representações, verdades espirituais. Nisto a natureza é como um espelho refletindo arcanos do céu, num sistema de codificação coerente e uniforme em toda a Palavra, até o Apocalipse.

Sendo assim, para que possamos entender o que foi o dilúvio nolivro de Gênesis, precisamos conhecer a significação da água.

Já dissemos aqui que as águas, em seus diversos estados e segundo os seus acúmulos, significam as verdades naturais ou os conhecimentos naturais verdadeiros, tais como são entendidos na própria letra da Palavra, sem necessidade de interpretação. Assim, ondevirmos a água ser citadaem qualquer passagem daPalavra, podemos saber que está em lugar da verdade natural.

A água tem essa significação por várias razões; por exemplo, assim como a água fresca sacia a sede, também o ensino da verdade sacia o nosso desejo de saber.

A água lava as impurezas do corpo, assim como as verdades purificam os pensamentos da mente.

A água nos rios, fluindo e banhando a terra, é a instrução dos conhecimentos que dá a fertilidade o entendimento.

A água acumulada nos mares é o acúmulo de conhecimentos na memória.

A evaporação da água pelo calor é o processo pelo qual a verdade, quando é amada e posta em prática da vida, é sublimada, elevada ao nosso homem interiore forma nossa consciência.

As águas acumuladas nas nuvens são as verdades adquiridas pelo amor à verdade e que agora se tornam o conjunto de princípiosque seguimos na vida,os quais chamamos de consciência.

E a água que cai como chuva, completando o ciclo que dá vida à terra, é a voz da consciência, que é um tipo de ensinamento interior ou uma percepção tácita do que é justo e correto fazer, que vem das verdades uma vez aprendidas, mesmo quando não nos lembrarmos exatamente delas.

A figura que vemos frequentemente nas histórias da Palavra, de uma mulher tirando a água do poço, é a representação de quando, pela afeição [a mulher] de conhecer a verdade, a pessoa examina a Palavra [o poço] em busca de ensinamentos que tragam respostas para a vida.

E assim por diante em muitas outras relações.

Mas existe também um sentido negativo nas correspondências, e nesse sentido as águas significam as falsidades. Pois as águas também levam à morte e destruição, por afogamento, por enchente ou por contaminação. Realmente, averdade que é dita ou ensinada com um propósito do mal deixa de ser verdade e se torna falsidade, mesmo se for verdade extraídada letra da Palavra. Assim as verdades, embora sejam verdades em si, tornam-se falsidades. Aliás, esse é um debate antigo da filosofia e da teologia:se a verdade pronunciada por um diabo é verdade ou falsidade.

A verdade se torna falsidade quando é proferidacom intenção de ferir ou lesar alguém.

Torna-se falsidade quando é ditapela metade com o fim de se ter razão ou vencer um debate, ignorando-se a outra parte dela que talvez levasse a uma conclusão oposta.

Torna-se falsidade quando os conhecimentos são usados para persuadir ou subjugar os outros, forçando-os a mudarem de posição, crença ou partido não por convicção própria, mas por terem sido persuadidos pela eloquência.

Torna-se falsidade quando de propósito a ampliamos a fim de causarmos mais impacto.

Torna-se falsidade quando usamos ensinamentos da Bíblia para incutir nos ouvintes o medo do castigo e da fúria Divina, e assim convertê-los pelo temor e não pelo livre segundo a razão.

Torna-se falsidade quando é pregada com o fim de exercer domínio sobre as suas almas humanas, por amor de si, do domínio e ou das riquezas.

Nessas e em muitas outras circunstâncias, a verdade ensinada é como a água servida num copo sujo. A verdade é prostituída quando se alia ao propósito de enganar, ou à cobiça de dominar, ou qualquer intenção má. Porque assim como as verdades libertam, as falsidades cativam, sufocam e roubama liberdade, condição necessária para que a vida espiritualse desenvolva.

É umalei da Divina Providência que o homem aja “pelo livre segundo a razão” e, nas coisas espirituais,não seja constrangido a crer, de maneira alguma,nem por ninguém, porque a fé que é imposta por meio de persuasão, pelo temor ou por quaisquer artifícios de convencimento, sufoca o livre e exclui a razão.

A perversão da verdade e o acúmulo de falsidades foi dilúvio que sobreveiono fimda Igreja Antiquíssima. Um dilúvio não de águas, mas de falsidades, de persuasões tão medonhas que sufocaram o entendimento e a raça humana antiquíssima expirou, espiritualmente falando.

Mas, antes de conhecermos com mais detalhes essa forma de dilúvio, vamos examinar as circunstâncias que a precederam e que levaram a isso, no capítulo 5.

No sentido literal, o capítulo 5 é uma mera genealogia, começando de Adão, no versículo 1, até Noé, versículo 32. É somente uma lista de nomes de pessoase as suas idades: Adão, Seth, Enosh, Kenan, Mahalalel, Jared, Hanoch, Methushelah, Lamech e Noé.No sentido interno, essa genealogia descreveas gerações da igreja ou de religiosidades do gênero humano naquela era, desde a Igreja Antiquíssima.

Adão era a Igreja Antiquíssima mesma, que era celeste em sua natureza. Os dois primeiros filhos, Cain e Abel, não aparecem na genealogia, porque eles representavam, respectivamente,a fé e a caridade da Igreja chamada Adão. Portanto, a primeira geração, ou a igreja que veio depois, é representada por Sheth. Ele é a segunda dispensação da Igreja Antiquíssima, que agora não era tão celeste.

“Uma terceira Igreja foi denominada Enosh; uma quarta Igreja, Kenan; uma quinta Igreja, Mahalalel; uma sexta Igreja, Jared; uma sétima Igreja, Hanoch; uma oitava Igreja, Methushelah; uma nona Igreja foi denominada Lamech.”

A característica principal (AC 483) que distinguia essasigrejas era a percepção e as diferenças de percepção a respeito das coisas celestes. As pessoas da primeira igreja antiquíssima tinham percepção e sabedoria celeste, porque suas mentes estavam abertas para o céu. A instrução deles vinha do Senhor por meio dos anjos, com os quais elas falavam, por terem a mesma respiração.

Mas, à medida que as pessoas foram se voltando para si mesmas e as gerações foram se sucedendo, as cobiças pelas coisas terrenas, corporais e naturais começaram a ocupar a sua vontade e elas começaram a usar os conhecimentos vindos das percepções para desculpar e justificar suas cobiças, e a verdade conjunta à cobiça se torna falsidade.

Houve uma crescente degradação das percepções, por estarem associadas às cobiças. E éessa sucessão de perversões que se descreve aqui pelos nomes dos descendentes e suas idades. Os nomes são as doutrinas e os números a sua qualidade.

No decorrer do tempo, o ser humano “imergiu os bens e veros da fé em horrendas cobiças, até a ponto de quase não restar mais “relíquia” alguma neles. E, quando se tornaram tais, foram por si mesmos sufocados, por assim dizer”. As relíquias, conforme vimos no estudo do primeiro dia da criação, são aqueles primeiros ensinamentos e as primeiras afeições boas, que a pessoa adquire em estados de inocência, e que o Senhor guarda na mente e no coração, como tesouros, para serem evocados e lembrados na vida adulta e, por essas afeições, a pessoa ser novamente levada a reviver a inocência dos primeiros anos.

Na última dispensação daquela raça, que foi o povo ou a igreja nomeada Lamech, não havia sobrado coisa alguma da percepção que havia na Igreja Antiquíssima. (AC 527). “Lamech” era, portanto, um estado espiritual completamente devastado quanto ao bem e à verdade. Os pré-diluvianos chamados Lamech“eram tais que, no fim, quase não tinham relíquias, em razão de serem de um gênio tal que se imbuíam de persuasões medonhas e abomináveis a respeito de tudo o que se lhes apresentava e caía no pensamento, de sorte que não queriam recuar em coisa alguma dessas persuasões; e, de fato, foram tão levados pelo amor de si, que se julgavam deuses, e divino tudo o que pensavam. Persuasão de uma natureza assim nunca existiu antes nem depois em nação alguma, pois é letal e sufocante.” (AC 562).

Houve, então, uma conjunção perversa entre os ensinamentos herdados dos antepassados e às cobiças que invadiram a vontade. Isto é assim descrito em Gênesis 6:

1.  E aconteceu que começou o homem a se multiplicar sobre as faces do humo; e nasceram-lhes filhas.2.E viram os filhos de Deus as filhas do homem, que elas [eram] boas, e tomaram para si esposas de todas as que escolhiam.

Os ‘filhos de Deus’ são os conhecimentos ou percepções da verdade, e as ‘filhas do homem’ são as cobiças que então reinavam naquelas pessoas, que então conjungiram suas cobiças aos doutrinais da fé, e assim se confirmavam nos males e falsos (AC 555). Em outras palavras, os ensinamentos mais elevados da sabedoria angélica de antes era agora usados para confirmar todogênero de cobiças do mal, “os filhos de Deus tomando as filhas do homem como esposas” numa espécie deligação infernal.

Os Arcanos dizem que eles “mergulharam os veros da Igreja, que são santos, em suas cobiças e, assim, os conspurcaram. Daí também confirmaram seus princípios de forma por demais persuasiva. De que modo isso acontece, cada um pode julgar, por si e pelos outros: os que se persuadem a respeito de alguma coisa confirmam-se nisso por tudo o que imaginam ser verdadeiro, e até pelas coisas que estão na Palavra do Senhor. Pois, quando se detêm nos princípios firmados e nas persuasões, fazem que todas as coisas os favoreçam e deem assentimento; e, quanto mais se amam, mais se confirmam.” “Daí se vê o que significa “os filhos de DEUS viram as filhas do homem, que eram boas, e tomaram para si esposas de todas as que escolhiam”. (AC 570).

É óbvio que o Senhor não estava indiferente àquela degeneração. Ao contrário, desde o momento do primeiro declínio, que foi aquela palavra que Ele proferiu à serpente no Éden, em Gênesis 3: 15, Ele já estava intervindo para moderar o declínio espiritual da humanidade. O modo como ele faria isso está descrito no versículo 3:

3.E disse Jehovah: Não acusará Meu espírito ao homem para sempre; pois que ele é carne; e serão os dias seus cento e vinte anos.

“Não acusará Meu espírito ao homem para sempre” significa que o homem não seria mais conduzido da mesma maneira; “pois que ele é carne” significa ‘porque se tornou corpóreo’; “e serão os dias seus cento e vinte anos” significa que lhe deviam ser concedidas relíquias da fé; e, também, é uma predição a respeito da Igreja futura.” (AC 572).

Essa mudança no modo como Ele conduziria o homem será vista na continuação do capítulo 6. Lemos nos Escritos de Swedenborg que essa mudança consistiria numa profunda reformada raça humana, desde a mente espiritual, com a separação que seria feita entre a vontade e o entendimento, até à constituição fisiológica do indivíduo, com a separação entre cérebro e cerebelo e, também, a substituição da respiração interna por uma externa.

Essas mudanças aconteceram na humanidade representada por Noé, de sorte que Noé é o remanescente do povo antediluviano e, ao mesmo tempo, a raça renovada ou uma igreja nova do povo pós diluviano. A Igreja antediluviana era celeste, e a pós-diluviana, representada por Noé, é espiritual.

Veremos que a construção da arca de Noé eos detalhes de sua estrutura éuma representação espiritual da nova formação e da nova estruturação da mente espiritual, dos pós-diluvianos, como somos até hoje. Os animais que são postos na arca para serem preservados representam as afeições humanas que Deus preservou no coração e na mente do homem.As águas sobre as quais a arca flutua são as falsidades em que as pessoas se sufocaram espiritualmente. E a flutuação da arca é a faculdade que o ser humano passou a ter, a partir daquela era, de poder se elevar, quanto ao entendimento como se destacado da vontade, acima de suas próprias cobiças, vê-las abaixo de si e, se quiser, dominá-las.

Mas, voltando às circunstâncias precedentes ao dilúvio, elascontinuam a ser descritas nos versículos seguintes:

“4.Havia nefilins na terra naqueles dias, e ainda mais depois que entraram os filhos de Deus às filhas do homem, e geraram para eles. Eles [eram] varões fortes, que desde o século [foram] varões de fama.”

No sentido espiritual, os “nefilins”, ou gigantes, foramaquelesantiquíssimos que se elevaram a si mesmos pela persuasão de que eram melhores, mais poderosos e mais sábios do que outros, ao mesmo tempo que desprezaram as coisas Divinas. “São chamados “varões fortes” por causa do amor de si” AC 580.

Esses nefilins, quando morreram e entraram no mundo espiritual, exalavam uma esfera tão venenosa e tão sufocante que arrebatava até o pensamento dos demais espíritos (AC 581). Por isso, quando o Senhor veio ao mundo, eles encerrou esses nefilins em regiões inferiores, de onde não podem obsedar mais as mentes humanas. É por isso que aquelas possessões demoníacas citadas nos Evangelhos cessaram quando o Senhor veio ao mundo e redimiu a raça humana. As possessões hoje só ocorrem no nível da mente e se a pessoa der oportunidade ou se houver alguma enfermidade mental que a rompa a proteção.

5.E viu Jehovah que se tinha multiplicado o mal do homem na terra; e toda imagem dos pensamentos de seu coração [era] somente o mal todo dia.

O mal do homem multiplicado na terra significa que a vontade do bem desaparecia.  “A imagem dos pensamentos do coração era somente o mal todo dia” significa que não havia mais“a percepção do bem e do vero, em razão deterem imergido os doutrinais da fé em suas horrendas cobiças. Quando isso foi feito, toda percepção pereceu, e em lugar da percepção sucedeu uma medonha persuasão ou fantasia obstinadíssima e mortífera que também foi a causa de sua extinção e sufocação. Essa persuasão letal é significada aqui pela “imagem dos pensamentos do coração”

6.E arrependeu-Se Jehovah de ter feito o homem na terra; e doeu-se-Lhe até o Seu coração.

Ao contrário do que parece, essas palavras significam a misericórdia.  Isto se vê (587) “pelo fato de que JEHOVAH nunca se arrepende, porque prevê todas e cada uma das coisas desde a eternidade. E quando fez o homem, isto é, quando o criou de novo e aperfeiçoou para que se tornasse celeste, também previu que ele se tornaria tal no decorrer do tempo; e, como previu queassim seria, Ele não podia Se arrepender. Isto se vê claramente em Samuel:

“Samuel disse: O Invencível de Israel não mente, e não Se arrepende, porque não é homem para que possa Se arrepender” (I Sam 15:29);

e em Moisés:

“DEUS não é um homem para que minta, e filho do homem para que Se arrependa. Porventura Ele diria e não o faria? ou falaria e não o confirmaria?” (Núm. 23:19).

Mas “arrepender-se” significa ter misericórdia. “Que seja atribuído ao SENHOR o fato de ter-Se “arrependido e doído até o coração” é porque, assim, parece como inerente a toda misericórdia humana. Por isso, aqui está conforme a aparência, como se fala muitas vezes em outros lugares na Palavra. “Ninguém pode saber o que é a misericórdia do SENHOR, porque ela transcende infinitamente todo entendimento do homem. Mas o homem conhece o que é a misericórdia do homem, que é arrependimento e dor. E, a não ser que o homem obtenha alguma ideia da misericórdia por meio de outra afeição cuja qualidade conheça, não pode pensar outra coisa nem ser instruído. Esta é a razão pela qual propriedades humanas são muitas vezes predicadas a JEHOVAH ou aos atributos do SENHOR, tais como, que JEHOVAH ou o SENHOR castiga, induz em tentação, condena e Se enfurece, quando todavia Ele jamais castiga a ninguém, não induz pessoa alguma à tentação, nem condena jamais a alguém, e nunca Se enfurece. Por isso, uma vez que tais coisas são atribuídas aoSENHOR, segue-se que também o arrependimento e a dor são atribuídos (a Ele), pois a predicação de um é seguida pela predicação do outro, como se vê claramente por estes lugares na Palavra.” (AC 588).      

7.E disse Jehovah: Destruirei o homem, que criei, de sobre as faces do humo, desde o homem até a besta, até o réptil, e até a ave dos céus, porque Me arrependi de os haver feito.

““Destruirei o homem”, significa que o homem se extinguiria; “que criei, de sobre as faces do humo”, significa o homem da posteridade da Igreja Antiquíssima; “desde o homem até a besta, e até o réptil” é que tudo o que é da vontade o extinguiria; “até a ave dos céus” é tudo o que é do entendimento ou do pensamento; “porque Me arrependo de os haver feito” significa, como antes, a comiseração.”

É evidente que isto é dito do ponto de vista humano. Ocorre o seguinte: quando o homem comete um crime e é condenado, parece-lhe que a condenação vem da justiça, enquanto, a verdade é que a condenação lhe veio do crime que ele praticou. Aliás, é uma lei espiritual que cada mal traz consigo sua pena, se não neste mundo, com certeza na vida eterna. Por isso é que, quando o homem fez o mal e destruiu-se a si mesmo pelo mal, pareceu-lhe que Deus é que o destruía, quando, de fato, o homem mesmo havia se destruído.

Outra evidência de que essas palavras eram só uma aparência é o fato de aqui o Senhor dizer que iria destruir “desde o homem até a besta, até o réptil, e até a ave dos céus”, mas, na continuação, vê-se que Ele não destruiu, mas, ao contrário, preservou na arca tanto o homem quanto a bestas e ave dos céus.

Mas aí já começamos a entrar na história de Noé, da construção da arca, da flutuação dela sobre o dilúvio e da preservação dos animais e aves que foram introduzidos nela. Esta será a segunda parte da história do dilúvio, na próxima semana. Muito obrigado.

 

(Não estou anexando aqui o texto dos Arcanos Celestes porque são muitas páginas. Sugiro a leitura dessa parte no próprio livro).

 

 

 

 

 

 

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C. R. Nobre

Gênesis, capítulo 6

 

9.      Estas [são] as natividades de Noach; Noach, varão justo, íntegro foi em suas gerações; com Deus andou Noach.

10.   E gerou Noach três filhos, Shem, Cham e Jafé.

11.   E a terra foi corrompida diante de Deus; e a terra foi cheia de violência.

12.   E viu Deus a terra, e eis, foi corrompida, porque toda carne corrompeu o caminho seu sobre a terra.

13.   E disse Deus a Noach: O fim de toda carne veio diante de Mim, porque a terra está cheia de violência pelas faces deles. E eis, Eu os destruo com a terra.

14.   Faze para ti uma arca de madeiras de gofer[1]; compartimentos farás na arca, e a betumarás por dentro e por fora com betume.

15.   E, assim, a farás: De trezentos côvados o comprimento da arca, cinquenta côvados a sua largura, e trinta côvados a sua altura.

16.   Uma janela farás para a arca, e a um côvado a terminarás de cima; e uma porta para a arca no lado dela porás; com ínfimos, segundos e terceiros a farás.

17.   E Eu, eis que Eu trago um dilúvio de águas sobre a terra, para destruir toda carne, em que há espírito de vidas, de sob os céus. Tudo o que há na terra expirará.

18.   E estabelecerei Minha aliança contigo; e entrarás na arca, tu e teus filhos, e tua esposa, e as esposas de teus filhos contigo.

19.   E de todo vivente, de toda carne, pares de todos farás entrar na arca para ser vivificado contigo; macho e fêmea serão.

20.   Da ave, segundo a sua espécie, e da besta, segundo a sua espécie, de todo réptil do humo segundo a sua espécie, pares de todos entrarão para ti, para serem vivificados.

21.   E tu, toma para ti de toda comida que se come, e ajunta para ti, e será para ti e para eles por comida.

22.   E fez Noach segundo tudo o que lhe mandou Deus, assim o fez.

 

 

 

Na semana passada começamos a estudar a história do dilúvio explicada nos Arcanos Celestes.

No capítulo 5 de Gênesis vimosuma genealogia desde Adão até Noé, genealogia essa que não é, de fato, geração de pessoas, mas as etapas da degradação espiritual da raça humana pré-diluviana, pois a percepção da sabedoria angélica foi gradativamente desvirtuada até desaparecer na geração representada por Lamech.

E também falamos que quando a verdade é desvirtuada para acobertar ou justificar o mal, ela se torna falsidade. E daconjunção entre falsidade e mal nascem outras falsidades e outros males, num acúmulo imenso, que é representado pelo dilúvio na terra, a mente natural do homem.

No capítulo 6, Noé também não é uma pessoa, mas uma parteda humanidade que ainda tinha alguma relíquia, isto é, algum entendimento da verdade e vontade do bem. Por isso eles podiam ser reformados e regenerados. E é a regeneração delesque é representada pela construção da arca e a preservação deles durante o dilúvio.

Quando lemos os relatos de Gênesis sobre o dilúvio, só podemos ter uma dastrês posições:

·         aprimeira, como céticos, considerar tudo aquilo uma ficção antiga e, portanto, irrelevante;

·         asegunda, como fiéis judeus e cristão, crer no que está dito literalmente, ainda que algumas coisas pareçam inexplicáveis à razão;

·         ea terceira, como é ensinada nos Escritos de Swedenborg, é que esses relatos são parábolas ou alegorias, que trazem uma mensagem interior em sua simbologia. 

Deixando de lado a primeira posição, dos céticos, examinemos a segunda posição, dos que creem, mas não entendem, e, portanto, não têm como responder aos ataques de sua fé na Palavra de Deus.

Como os cristãos tradicionais, cremos que aPalavra foi divinamente inspirada. Mas, além disso, cremos também que a Palavra foi escrita em forma de parábolas e alegorias, para se adaptar à compreensão de todos e em todas as épocas, para que cada um a entendesse conforme a sua capacidade.Por isso, a terceira posição é, sem dúvida, a mais sensata, pois não nos obriga a ter fé cega. Pelo contrário, a fé nas Escrituras é fortalecida quando vemos a Sabedoria Divina se revelar na letra. Por que agora nos é permitido entrar com o entendimento nos mistérios da fé.

Na geração atual, enquanto o conhecimento humano se multiplica exponencialmente, o entendimentodo cristianismo sobre a Palavra Divina permanece nomesmoobscurantismo de séculos passados. E esse entendimento fundamentalista, essa compreensão simplista da Bíblia, não satisfaz as mentesque desejam ser esclarecidas racionalmente. Isto se deve a queuma fé cegaé compatível com a ignorância mais do quecom a razão.

De uma compreensãoliteralistados relatos do dilúvio quase nenhum proveito se pode tirar.Que proveito há em saber que Noé viveu 500 anos, sem filhos, e depois viveu mais 450 anos? O que isso acrescenta à nossa vida?

E por que alguém viveria tantos anos, 969 anos, como Matusalém, 950 anos, Noé? E, se se deve entender que os anos são como os nossos, é curioso que Noé, se viveu 950 anos, ele morreu quando o patriarca Abrahão já estava com 60 anos. E, no entanto, na história de Abrahão nada se diz sobre esse antepassado tão célebre, que Abrahão poderia inclusive ter conhecido se Noe fosse de fato uma pessoa de carne e osso.

Outro dado curioso, tomando-se literalmente as datas, pouco mais de 100 anos após o fim do dilúvio, ao qual sobreviveram somente quatro casais, já existiaoimenso império assírio, cujo exército era composto de centenas de milharesde soldados, e se estendia a várias nações. Como isto foi possível em pouco mais de3 gerações?

Isto sem falar da civilização hindu, com seus livros sagrados, e da chinesa, cuja história remonta a tempos bem anteriores ao tempo estimado do dilúvio em Gênesis.É sabido que várias mitologias antigas falam de um dilúvio, mas esse que é descrito em Gênesis teria sido universal e teria feito perecer toda a humanidade num período relativamente recente da história humana.

Também lemos sobre o dilúvio que “todos os altos montes que havia debaixo de todo o céu foram cobertos. Quinze côvados acima prevaleceram as águas; e os montes foram cobertos.” Se temos de entender literalmente, isto incluiria até o monte Everest, 15 côvados acima deste. Que dizer, as águas do dilúvio teriam chegado a 9km de alturaem todo o planeta e nesse nível se mantiveram durante um ano. O que seria das espécies vegetaisque ficaram submersas, sujeitas a tanta pressão e durante tanto tempo?

A própria arca, um barco com 198 metros de comprimento ou dois quarteirões aproximadamente, 33 metros de largura, como uma rua larga, e 19 metros de altura, como poderia conter tantos animais e aves de todas as espécies, 4 de cada, da maioria, e 14 de cada dos animais chamados limpos e das aves, além de alimento por um ano para todos.

Só de aves são conhecidas 18 mil espécies no mundo, o que daria252.000 aves, fora as que foram extintas desde o dilúvio. E o que dizer das espécies animais endêmicas, como as da Austrália e outras ilhas, como vieram até a arca? Tudo isso seria algo fisicamente impossível. Sem contar o fato de, numa embarcação tão lotada de animais, houvesse somente uma janela, posta a 66 centímetros do teto, e uma porta que Deus fechou por fora.

Mas, o que pretendemos com esses argumentos? Obviamente,não queremos lançar descrédito sobre a letra da Palavra de Deus. Mas queremos questionar, sim, a validade de uma compreensão literal, simplista e até infantil daquilo que é claramente uma alegoria, que encerra em si uma mensagem Divina. Então, não é a Palavra que se deve questionar, mas a compreensão cega que se tem da mensagem dela. Porque a própria letra da Palavra já dá sinais de que o dilúvio não foi fato histórico, mas uma aparência de verdade, foi simbólico. E isto fica claro quando notamos o que parece ser uma contradição na própria letra.

Porque em Gênesisé dito que tudo o que havia na terra expirou; portanto, isso incluiria aqueles gigantes pré-diluvianos, os nefilins, citados no capítulo 5. Mas, quando lemos o livro histórico dos Números 13:33, que agora trata, sim,eventos históricos reais, vemos que os espias de Israel encontraram descendentes daqueles nefilins vivendo em Canaan: “Também vimos ali gigantes, filhos de Anaque, descendentes dos gigantes; e éramos aos nossos olhos como gafanhotos e assim também éramos aos seus olhos.”Só por essa aparente contradição já deveríamos concluir que, como na Palavra de Deus não há contradições, então,ao menos uma das afirmações precisa ser vista como representação da verdade, e não como verdade literal.

Damos graças a Deus que, no tempo propício, quando a humanidade chegou à idade da razão, o Senhor revelou o sentido espiritual da Palavra e, por essa revelação, ficamos sabendo que essa primeira parte de Gênesis, até o capítulo 11, é meramente parabólica.

E quando tomamos conhecimento da mensagem interna por trás da alegoria, podemos conhecer as etapas, os modos e os processos de transformação e de melhoria de nossa mente, nosso renascimento espiritual, o que nos proporciona a conscientização a respeito de nosso ser e de podermos alcançar a verdadeira realização na eternidade.

Os primeiros onze capítulos de Gênesis faziam parte de uma Palavra antiga, que era toda simbólica e cujos livros são citados no Antigo Testamento. E Moisés, que escreveu ou ditou o livro de Gênesis, pode ter copiado essa primeira porção de livros que teria encontrado na casa de seu sogro, Jetro ou Reuel, pois o sogro era sacerdote da Igreja Antiga na terra de Midiã, e Moisés morou quarenta anos com o sogro antes de ser chamado para liderar o êxodo do povo de Israel.

Na explicação do sentido interno do dilúvio, da arca, etc., os Arcanos Celestes nos apresentam uma profusão de ensinamentos sobre a regeneração do homem da igreja espiritual, da raça humana pós-diluviana. E essa profusão é tão grande que a história de Noé se estende por quatro capítulos de Gênesis, e o sentido espiritual contido ali é explicado emmais de 200 páginas da primeira edição latina dos Arcanos Celestes. Portanto, o que podemos comentar aqui é somente um vislumbre muito superficialdo significado espiritual do dilúvio.

Já foi dito que o povo ou a igreja chamada Noé foia transição entre a raça antiquíssima e a antiga. Os três filhos de Noé, “Shem, Cham e Jafé”, são três gêneros de doutrina, três ramificações distintas daquela religiosidade.

Todo o processo envolvendo a construção da arca e a preservação dos seres viventes durante o dilúvio representa, em resumo, que o indivíduo daquela dispensação seria regenerado de maneira diferente que a homem antiquíssimo. Porque no povo pós-diluvianohouve uma mutação, tanto espiritual quanto natural, chegando até ao nível físico.

A estrutura da arca, suas dimensões e sua construção são símbolos da reestruturação que se faria da mente humana. A preservação nela dos seres viventes é a preservação das afeições e dos conhecimentos, encerrados na vontade e no entendimento do homem,nesse processo de regeneração espiritual. A flutuação da arca sobre as águas é superação das tentações, porque a regeneração espiritual só se efetua por meio de resistência e combate aos falsos e males.

Desse modo a Providência Divina conservou o ser humano em condições de receber a vida espiritual, como um resgate, em face da inundação de falsidades e cobiças que tinha aniquilado o povo antiquíssimo.  Porque, como vimos, esse povo antiquíssimohavia chegado a um ponto tal de corrupção da vontade, que seus interiores se fecharam e não podiam mais ter comunicação com o céu. Por conseguinte, não podiam mais ser instruídospor meio de percepções, como os primeiros antiquíssimos. Então, a partir de Noé, eles teriam de ser informados e conduzidos de outra maneira, por uma via externa, através dos sentidos (AC 609).

Assim, a “arca” é a mente desse homem mutante ou dessa igreja nova. Elafoi construída conforme as recomendações de Deus, com certas dimensões, feita de determinada madeira, com compartimentos etrês andares, além de uma janela e uma porta. Cada um desses aspectos é explicado nos Arcanos, mas aquicomentaremos somente alguns.

Os compartimentos representam as duas partes da mente, avontade e o entendimento, pois no ser humano pós-diluviano o voluntário seria separado do intelectual, ao passo que essas duas faculdades constituíam uma só no povo antiquíssimo. Então, a partir da raça noética, o homem seria reformado primeiro quanto à parte intelectual; daí, pelo entendimento da verdade, ele receberia a caridade na vontade. Essa separação é que possibilita a mente ser elevada até à luz do céu e lá entender verdades espirituais, separadamente da vontade, isto é, ainda que a vontade estivessepresa no plano das coisas corpóreas e das cobiças, e não desejassese elevar acima disso.

Lemos nos Arcanos (641): “Essas duas partes, entendimento e vontade são tão distintas no homem que nada há de mais distinto. Isso me foi dado saber também pelo fato de que as coisas intelectuais dos espíritos e anjos influem na parte esquerda da cabeça ou cérebro, mas as voluntárias,na direita; é o mesmo quanto à face. Quando os espíritos angélicos influem, é como se auras suavíssimas influíssem com brandura. Mas, quando os espíritos maus influem, é como uma inundação, por assim dizer, na parte esquerda do cérebro com fantasias e persuasões medonhas, e na direita com cobiças. O influxo deles é como se fosse uma inundação de fantasias e de cobiças.”

A separação entre vontade e entendimento foi tão profunda que, na dispensação noética, a função do cérebro também se tornou destacada da função do cerebelo. E os Arcanos Celestes entram no campo da fisiologia ou anatomia a fim de descreveras funçõesseparadas dos dois cérebros. Também a respiração, que antes era interna, semelhante à dos anjos, mudou-se para uma respiração externa, quase como a que temos hoje. Resumindo o que é dito a esse respeito, somos informados de que a índole da igreja chama Noé se tornou inteiramente diferente da índole da Antiquíssima.

Os números das medidas de comprimento, largura e altura, 300, 50 e 30, são meros representativos, como em toda parte da Palavra onde ocorrem, e significam a qualidade do sujeito ou do objeto em questão. Aqui, as medidas se referem às relíquias de bem e verdade que ainda restavam no homem: o comprimento significa a qualidade da santidade; a largura a qualidade da verdade; e a altura a qualidade do bem, significando que essas relíquias espirituais eram poucas.

A janela, que ficava a um côvado de cima, significa o entendimento iluminado pela verdade espiritual.O vocábulo usado no hebraico para “janela” é o mesmo que “luz”, portanto, é a luz que vem do céu ao entendimento. E a porta ao lado significa a audição. “Dá-se com o ouvido em relação aos órgãos sensoriais internos do mesmo modo que uma porta ao lado, ou uma janela acima”. A audição pertence ao entendimento.

Os três andares da arca, chamados ínfimos, segundos e terceiros, são os três níveis da mente, no seu lado intelectual, os quais são: as coisas dos conhecimentos, as racionais e as intelectuais. “O ínfimo deles é o conhecimento; o médio é o racional; o supremo é o intelectual. Esses graus são tão distintos entre si que nunca são confundidos. Mas isso o homem ignora, pois ele põe a vida somente nos conhecimentos e nas coisas dos sentidos. E, quando se apega a isso, nem sequer pode saber que o racional é distinto do conhecimento, e ainda menos do intelectual, quando, todavia, o caso é que o SENHOR, pelo intelectual no homem, influi em seu racional, e pelo racional nos conhecimentos da memória e, daí, na vida dos sentidos, a visão e a audição. Esse é o influxo verdadeiro e essa é a verdadeira interação da alma com o corpo”.

Sem o influxo de vida do SENHOR nas coisas intelectuais no homem... não pode existir vida alguma no homem. E, ainda que o homem esteja nos falsos e males, há, contudo, influxo de vida do SENHOR por meios das coisas voluntárias e intelectuais. Mas as coisas que influem são recebidas na parte racional, segundo a sua forma, e fazem que o homem possa raciocinar, possa refletir, possa entender o que é o vero e o bem.

Vers. 17: “E Eu, eis que Eu trago um dilúvio de águas sobre a terra, para destruir toda carne, em que há espírito de vidas, de sob os céus. Tudo o que há na terra expirará”.  Aqui se diz que o Senhor traria isso porque esse é um modo comum na Palavra, de as coisas serem ditas como parecem ao homem, e a aparência é que punição do mal vem de Deus e não do homem mesmo, como consequência de seus próprios atos e escolhas.

Vers. 18: “E estabelecerei Minha aliança contigo; e entrarás na arca, tu e teus filhos, e tua esposa, e as esposas de teus filhos contigo”. “Estabelecer aliança” significa que seria regenerado; “que ele entrasse na arca, e os seus filhos, e as esposas de seus filhos” significa que seria salvo; os “filhos” são os veros, as “esposas” são os bens. (663).        

Aqui se mencionam “filhos e esposas”, porque “esposas” são os bens que foram adjuntos aos veros. Porquanto nenhum vero pode jamais ser produzido, se não tiver seu bem ou prazer de onde proceda. No bem e no prazer está a vida, mas não no vero, a não ser a que ele tira do bem e do prazer. Daí o vero é formado e germinado. (668).    

Vers. 19: “E de todo vivente, de toda carne, pares de todos, farás entrar na arca para serem vivificados contigo; macho e fêmea serão”.

“Pela “alma vivente”, na Palavra, é significado todo animal em geral, qualquer que seja.... Aqui, porém, porque imediatamente se lhe acrescenta “de toda carne”, são significadas as coisas que são do entendimento, pela razão de que se falou antes, a saber, que o homem dessa Igreja seria regenerado primeiro quanto às coisas intelectuais. Por isso, também, no versículo seguinte se nomeia primeiro a “ave”, que significa as coisas do entendimento ou racionais, e, a seguir, trata-se das “bestas”, que são as coisas da vontade. A “carne” significa em particular o corpóreo que pertence à vontade.” (669, 670).        

“Quanto ao que se diz, “a ave segundo a sua espécie, a besta segundo a sua espécie, e o réptil segundo a sua espécie”, cumpre saber que, em cada homem, há inúmeros gêneros de coisas do entendimento e da vontade, e, ainda mais, inumeráveis espécies, as quais são distintíssimas entre si, ainda que o homem o ignore.Mas, na regeneração o SENHOR extrai todas e cada uma dessas coisas em sua ordem, e as separa e dispõe, para que possam ser dirigidas para os veros e bens e conjungidos a eles. (675, 676).

Vers. 22: “E fez Noach segundo tudo o que lhe mandou DEUS, assim o fez”. E quando vem o aguaceiro da chuva, a água sobe e a arca flutua por mais 300 dias, representando que a mente do homem que está sendo regenerado suporta e vence as tentações espirituais, porque o Senhor dispõe todas as coisas em sua vontade e seu entendimento, donde se processa a regeneração e o homem nasce de novo, espiritualmente. (682).       

Mas, como eu disse, esse processo todo é exposto em riqueza de detalhes nos Arcanos Celestes. Aqui tivemos somente uma breve noção de como o Senhor conduz a reforma e a regeneração do homem de índole espiritual, semelhante ao povo Noé, como somos nós hoje.

Espero que estes comentários tenham servido para lançarmos um novo olhar sobre o relato literal do livro de Gênesis e de toda a Bíblia, voltando nossa atenção para o sentido interno, onde se encontra a verdade genuína. Por isso, eu recomendo a leitura, ou o melhor, o estudo dosEscritos, dos Arcanos Celestes e outros, a fim de alcançarmos um entendimento cada vez mais esclarecido sobre as coisas de Deus.

Muito obrigado.

 



[1]    “Gopher” é transliteração de nome hebraico que Swedenborg conserva no latim, mas que alguns traduzem como cipreste.

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C. R. Nobre

 

“A palavra do SENHOR, que veio a Jeremias, dizendo: 

Levanta-te e desce à casa do oleiro, e lá te farei ouvir as minhas palavras. 

E desci à casa do oleiro, e eis que ele estava fazendo a sua obra sobre as rodas. 

Como o vaso que ele fazia de barro se quebrou na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme o que pareceu bem aos seus olhos fazer. 

Então, veio a mim a palavra do SENHOR, dizendo: 

Não poderei eu fazer de vós como fez este oleiro, ó casa de Israel? -- diz o SENHOR; eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel. (Jeremias 18:1 a 6).

 

Um dos arcanos revelados nos Escritos de Swedenborg é a chamada doutrina dos graus, assunto de nossa apresentação de hoje.

Veremos que há dois tipos de graus em todas as coisasexistentes: os graus contínuos e os graus não contínuos, ou discretos. E veremos em que eles consistem individualmente e em que se diferenciam.

O conhecimento da doutrina dos graus é da maior importância, pois “quem não sabe como se dá com a ordem Divina quanto aos graus não pode compreender de que maneira os céus são distintos, nem o que é o homem interno e externo”.

Essa ciência dos graus é como uma chave com que se abrem as causas das coisas. Sem essa abertura, os objetos e sujeitos do universo natural e espiritual não se mostram em sua real natureza.

Do conhecimento dos graus depende o conhecimento dos estadosde reforma e regeneração do homem, porque o processo do nascer de novo é a abertura dos graus interiores da mente em determinada ordem.

Esse conhecimento nos ajuda a compreender o influxo procedente do Senhor através dos céus até os homens; e sem entender o influxo só podemos perceber os efeitos das coisas, mas não as suas verdadeiras causas.

Vejamos, então, em que consistem esses graus. Primeiramente,o que são os graus contínuos.

Graus contínuos são os graus de aumento ou diminuição da coisa. Por exemplo, aumento ou diminuição de luminosidade, desde a claridade até a escuridão;o esplendor da luz é o grau máximo e,conforme ela diminui de intensidade, muda-se em obscuridade e, finalmente, em escuridão. Toda a escala, da luz até a escuridão, é observável, pois progride continuamente, sem interrupção em suas fases. O aumento ou a diminuição da luz está em graus contínuos.

Em graus contínuos está, também, a atmosfera, quando se torna mais densa ou mais rarefeita conforme a altitude varia. Também são contínuos os graus de calor, do mais frio para o mais quente, e vice-versa. Também em graus contínuos está a variação de espessura dos materiais, do mais delgado para o mais espesso, e assim por diante. Toda progressão que pode ser vista, percebida e medida num mesmo plano está em graus contínuos, que por isso são chamados também de graus de largura. O que determina a gradação é, portanto, a distância entre seus pontos extremos.Isto conhecido no mundo.

Mas os graus discretos ainda eram desconhecidos quando Swedenborg escreveu: “Que eu saiba, até o presente não se teve qualquer conhecimento dos graus discretos ou de altura... e, entretanto,coisa alguma do que concerne à causa pode se mostrar em sua verdade sem o conhecimento dos graus de um e outro gênero; ... o propósito deste opúsculo é que todas as causas sejam desvendadas, e por elas se vejam os efeitos, e assim sejam dissipadas as trevas em que está o homem da Igreja a respeito de Deus e do Senhor, e em geral a respeito dos Divinos que são chamados espirituais”.

Quase todo mundo, ao ouvir falar de coisas interiores e exteriores do indivíduo, ou de suas coisas superiores e inferiores, pensaem uma ligação comume contínua entre essas duas áreas, isto é, que os inferiores estão ligadosaos superiores por contiguidade, ou, que o espiritual é um natural mais puro. Mas não é assim. As coisas interiores e superiores não são contínuas nem estão contíguas, mas se relacionam em graus discretos. A única relação entre elas é por influxo e correspondência.

Vejamos um exemplo de graus discretos. Quando um artistavai pintar um quadro, primeiro ele cria em sua mente a imagem que irá pintar. A intenção e a imaginação de sua arte estão no plano mental, no primeiro grau discreto. Daí, quando pega os pincéis e começa a trabalhar, ele está transferindo aquela sua imagem mental para o esforço dos músculos da mão, e estaé dirigida pela mente em conformidade com a ideia já formadaali. Temos aí, portanto, o segundo grau discreto, o esforço na mão. E quando o artista termina sua obra, a tela pintada retratará a ideia que estava na intenção da mente e que, pelo movimento da mão, se manifestou na tinta sobre a tela.

Temos, portanto, que a imaginação, no plano mental, o esforço muscular, no plano corpóreo para produzi-la e a arte pronta, o material, são coisas homogêneas entre si. Assim, esses três planos se relatam em graus discretos, um correspondendo ao outro ou um produzindo o outro.

Se fôssemos considerar somente o último grau, veríamosapenasa combinação de pigmentos químicos da tinta na superfície da tela, porque esse último grau é o único visível e tangível. Mas, normalmente, nem prestamos atenção à tela e a tinta em si, mas à imagem que o artista representou ou à ideia que ele quis transmitir. E vamos além, pois julgamos a habilidade ou o talento do artista no esforço que ele empregou para executar o trabalho.

Isto quer dizer que, sem qualquer reflexão sobre isso, o que fazemos normalmente é, de fato,contemplar três níveis de coisas homogêneas que estão juntas na última da série discreta: 1- a imagem mental, 2 - o esforço nos músculos e 3 - a tela, embora somente esta, a parte material estejade fato visível.

Esta é uma relação entre o agente ouprodutor, o meio pelo que produz, e o produto acabado.Um é formado pelo outro e as coisas que são assim formadas se relacionam de maneira discreta com as causas formadoras (AC 6326, 6465). Os elementos de uma relação discreta de graus são derivados um do outro, em série, como o fim, a causa e o efeito. O fim, ou propósito, produz a causa, e a causa produz o efeito. E isto se efetua por graus discretos. De fato, todas as causas estão no mundo espiritual, enquanto tudo no mundo natural é mero efeito.

Tomamos o exemplo do artista, mas a Palavra nos traz um exemplo mais significativo, que é o do Oleiro e o vaso de barro. O Oleiro é o Amor de Deus; os Seus propósitos estãona açãoda Divina Providência; e o barrosomosnós.

Antes de nos criar,Deus, por Sua previdência ou Onisciência, já previu o que nós seríamos, ou melhor, o que escolheríamos ser, no gozo do livre arbítrio. Então, por sua Providência Ele proveu os meios pelos quais Ele podesempre nos conduzir auma vida eterna feliz. Quaisquer que sejam nossas escolhas, Ele põe atalhos para o céu em nosso caminho, se quisermos tomar esses atalhos, e isso sem sentirmos a menor compulsão da Providência. E, se nos submetermos aos Seus desígnios, no processo de regeneração Ele nos irá moldando, como o Oleiro molda o barro, fazendo de nós um vaso, um utensílio útil a nós mesmos e aos outros, talvez precariamente neste mundo, masplenamente na vida eterna.

Todas e cada uma das coisas nos dois planos da criação, mundo espiritual e mundo natural, coexistem segundo os graus discretos e, ao mesmo tempo, segundo os graus contínuos. Nessa relação de graus discretos, também chamados de graus de altura, estão os três céus entre si, assim como o amor e sabedoria nos anjos e as faculdades interiores da mente do homem, conforme veremos abaixo.

Voltando à ideia do artista e de seu quadro. Dissemos que, quando vemos uma pintura, também vemos, ao mesmo tempo, a habilidade e a imaginação do autor na obra acabada. Isto é exemplo de um princípio, a saber, que o primeiro grau está presente interiormente em tudo e em todas as coisas dos graus seguintes. É como se um estivesse dentro do outro, mas sem ocupar lugar no espaço. A relação é tal que os graus íntimos estão nos médios e estes estão nos exteriores.

Vejamos a ilustração.

Lemos o seguinte na obra DES 39:

“Pois que os Graus de altura ou discretos estão em uma Ordem sucessiva, podem então ser comparados a uma coluna dividida em três degraus para subir e descer, no estágio superior da coluna há coisas muito perfeitas e muito belas; no estágio do meio, causas menos perfeitas e menos belas; e no mais baixo, coisas ainda menos perfeitas e menos belas. Mas a Ordem simultânea, que consiste em graus semelhantes, tem outra aparência; nesta, os supremos da Ordem sucessiva, que são como foi dito, muito perfeitos e muito belos estão no íntimo, os inferiores no meio, e os ínfimos no contorno; estão como em um sólido consistindo nestes três graus, no meio ou no centro do qual estão as partes mais sutis, em torno deste centro as partes menos sutis, e nos extremos que fazem o contorno as partes compostas daquelas e por conseguinte mais grosseiras; é como esta coluna, de que se acaba de falar, se achatando sobre um plano, da qual o supremo faz o íntimo, o médio faz o meio e o ínfimo faz o extremo.”

Quando usamos a referência “interior / intermediário / exterior”, estamos falando da ordem simultânea. E quando usamos a referência “superior / intermediário / inferior”, estamos falando da ordem sucessiva.

Na imagem A, os graus discretos estão na ordem sucessiva. E na imagem B, na ordem simultânea. A mudança é somente quanto ao ponto de vista, porque, se foram abatidos num plano, os interiores são os mesmos superiores, os intermediários continuam como tais, e os exteriores são os mesmos que os inferiores.

Na ordem sucessiva, os exteriores são a base e a sustentação dos seus homogêneos, os superiores. E na ordem simultânea, os exteriores contêm os demais. E é por isso que os exteriores são a base, a sustentação e o continente dos graus interiores ou superiores. Isto é mais bem exemplificado pela letra da Palavra.

O sentido da letra é a base, o continente e a sustentação do sentido espiritual e do sentido celeste. Os sentidos interiores da Palavra estão encerrados na letra como a alma e o espírito estão no corpo. A letra da Palavra é comparada a um estojo que guarda pedras preciosas joias. E as pedras preciosas, em toda parte em que são citadas no Antigo e Novo Testamento, representam, as verdades da letra. Portanto, assim como o valor de um estojo vem das pedras preciosas contidas nele, assim também a Palavra, no sentido literal: ela é santa por causa das verdades que ali se encerram. Porque, quando se trata dos graus discretos, o último grau é o complexo, o continente e a base dos graus anteriores.

Os graus são chamados discretos porque existem distintamente, como se não estivessem relacionados entre si, como se não houvesse intercessão ou transição entre si. Porque não se pode ver a relação entre eles a não ser por correspondência. Os três céus estão distintos por graus discretos ou de altura porque um está acima do outro, mas eles não se comunicam entre si a não serpor correspondência e pelo influxo que vem do Senhor e passa pelos céus em sua ordem até o mais baixo.

Agora, em cada um dos céus, existem também os graus contínuos, ou de largura. Os anjos que estão no meio ou no centro das sociedades celestes estão na luz da sabedoria, mas os que estão nas periferias até aos limites estão na sombra da sabedoria. Assim a sabedoria dos anjos decresce até à ignorância, como a luz decresce até à sombra, e isto se faz pelo contínuo.

Também os interiores da mentehumana estão dispostosem graus discretos. O homem pode estar no grau mais baixo, ou no segundo ou no supremo da mente segundo o grau de sua sabedoria. Se estiver somente no grau mais baixo, ou natural, o grau superior ficará fechado. Os graus da mente são abertos conforme o homem recebe do Senhor a sabedoria e vive de acordo com ela. Mas, enquanto está no mundo, na mente natural, o homem não pode perceber as aberturas dos graus superiores de sua mente;só as perceberá quando deixar a vida terrena. Enquanto está aqui, o homem só percebe os incrementos em graus contínuos ou de largura no seu entendimento.

Podemos ver uma relação de graus discretos também entre o corpo, o espírito e a alma humana. Quandoum anatomistaou legista examina o corpo humano sem vida, tudo o que ele vê são tecidos da matéria inerte. Não vê sequer as funções, que cessaram de existir naqueles órgãos. E por mais profundamente que examine, nunca verá o caráter ou os traços da personalidade do indivíduo que habitava naquele corpo, porque isto pertence ao espírito, e o espírito se relacionava com o corpo por grau discreto, e não por grau contínuo. E, também,quando o homem ressuscita no mundo espiritual, se alguém examinar detidamente o seu espírito, nunca verá a sua alma, que é a região superior do espírito, a morada de Deus no homem, morada que é inacessível ao próprio homem.

Dissemos acima que os graus discretos se relacionam entre si como o agente produtor e o que é produzido. Por esse motivo, na concepção do homem, a alma, o supremo, influi nos elementos mais puros da natureza no útero materno,que são os últimos dessa relação,e lá se reveste de um corpo. E quando o primeiro influi nos últimos, faz surgir os meios, que no caso é o espírito. Vemos isso na história da concepção do Senhor em Maria. Antes de o Senhor, como Jehovah, assumir o Humano tomado dos últimos da natureza, ainda não havia o Espírito Santo. Este, ou Consolador, só passou a existir plenamente quando o Senhor foi para o Pai, isto é, quando Seu Humano foi glorificado. Mas, desde o momento da concepção, já havia algo do Espírito Santo, procedendo da Alma Divina, o Pai, que gerava para Si o Humano em Maria. Por isso é que, quando Maria foi visitar sua prima, Elizabeth, o Espírito Santo moveu de alegria João, no sexto mês de gestação, ainda no útero de Elizabeth, e ela mesma foi também cheia do Espírito Santo. Depois, quando o Senhor nasceu, essa trindade de Corpo, Alma e Espírito estava no íntimo Humano, como Deus em Seu Templo, e quem via o Senhor via o Pai.

Foi dito que não existe comunicação direta entre os elementos que estão em diferentes graus discretos, mas influxo ou correspondência. Por isso os anjos de um céu não podem interagir diretamente com os de outro céu, e menos ainda o podem os anjos com o homem. “Mas o Senhor conjunge todos os céus por meio do influxo imediato e mediato. Pelo influxo imediato vindo de Si em todos os céus; e por um mediato, por meio de um céu no outro.”

Mas, ainda que os níveis do grau discreto pareçam estar dissociados ou desconexos entre si, “nada há de desconexo, porque o influxo Divino faz que exista conexão desde o primeiro até o último”. É como uma corrente em que alguns elos são invisíveis. Mas é absolutamente necessário que haja conexão discreta entre todos, dos primeiros com os intermediários, e destes com os últimos, caso contrário tudo se dissipa e perece, pois o influxo Divino pelos graus é que transmite a vida, desde Ele mesmo, através dos superiores, passado pelos meios, até os inferiores.

Na relação discreta de graus, ou de fim, causa e efeito, se acham também o amor, a sabedoria e o uso. “O amor é o fim, a sabedoria é a causa pela qual o amor age, e o uso é o efeito; e o uso é o complexo, o continente e a base da sabedoria e do amor”. Dá no mesmo dizer caridade, fé e boa obra, porque a caridade pertence ao amor, a fé é o receptáculo da sabedoria e a boa obra é o exercício do uso. Amor, sabedoria e uso são homogêneos, e, por conseguinte, caridade, fé e boa obra também o são. No uso ou nas obras que efetivamente se prestam estão reunidos o amor e a sabedoria, ou a fé e a caridade.

Outra série de homogêneos que tem a mesma relação é a afeição, o pensamento e a ação, ou, vontade, entendimento e prática.

Em resumo, em todas as coisas criadas em que há esse trino, de fim, causa e efeito, há uma relação discreta de graus, na qual os superiores estão presentes simultaneamente nos inferiores, e os inferiores são a base, o continente e a sustentação dos superiores. É por causa dessa ordem que entendemos o que o Senhor disse, que o reino de Deus está dentro de nós, e a igreja nas terras é a base dos céus. Por isso o Senhor provê para que na Terra exista pelo menos uma igreja onde a Palavra é lida e o Senhor é conhecido e adorado.

Há muitos outros exemplos que poderiam ser trazidos, mostrando a relação dos graus discretos nas coisas e nas causas das coisas, mas quem refletir adequadamente irá descobrir várias outras situações onde essa relação de graus discretos está presente.

Espero que os comentários e os exemplos aqui trazidos tenham servido para lançar luz sobre esse importante tema, que é abordado nas obras Céu e Inferno, Doutrina da Escritura Santa e, com mais abundante explicação, na Sabedoria Angélica sobre o Divino Amor e a Divina Sabedoria. Eu recomendo a leitura desses livros para que se tenha uma compreensão melhor deste assunto.

Muito obrigado.

 


 

Graus Discretos

 

ORDEM SUCESSIVA                                                       ORDEM SIMULTÂNEA

Na ordem simultânea, os graus são chamados

·         interior (ou íntimo, ou interno)

·         médio (ou intermediário) 

·         exterior (ou extremo, ou externo)

Também se chamam graus de largura
Aplicados

À Palavra:                           sentido da letra, sentido espiritual, sentido celeste

Aos céus:                            primeiro ou natural; segundo ou espiritual; terceiro ou celeste.

Ao ser humano:               - externo, racional , interno

                                               - corpo, espírito, alma

                                               - conhecimentos, racional, intelectual (os três andares da arca)

                                               - ação, pensamento, afeição

                                               - boa obra, fé, caridade

                                               etc., etc.

 

 
Na ordem sucessiva, os graus são chamados

·         superior (ou supremo)

·         médio (ou intermediário) e

·         inferior (ou ínfimo)

Também se chamam graus de altura.
 

 

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29ª. Videoconferência

 

Gênesis

Capítulo 11

1.         E foi toda a terra um só lábio, e as palavras [eram] uma só.

2.        E aconteceu, quando partiram estes do oriente, então encontraram um vale na terra de Shinar e habitaram aí.

3.         E disseram o varão ao seu companheiro: Eia, façamos tijolos e queimemo-los no fogo; e foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume foi para eles por barro.

4.         E disseram: Eia, edifiquemo-nos uma cidade e uma torre, e a cabeça dela [seja] no céu; e façamo-nos um nome, para que talvez não sejamos dispersados sobre as faces de toda a terra.

5.         E desceu Jehovah para ver a cidade e a torre que edificavam os filhos do homem.

6.         E disse Jehovah: Eis um só povo e um só lábio para todos eles e, por isso, o começo deles para fazer; e agora nada lhes será proibido de tudo que cogitarem fazer.

7.         Eia, desçamos e confundamos aí o lábio deles para que não ouçam, o varão o lábio do seu companheiro.

8.         E dispersou-os Jehovah daí sobre as faces de toda a terra; e cessaram de edificar a cidade.

9.         Por isso chamou o nome dela Babel, porque aí confundiu Jehovah o lábio de toda a terra; e daí os dispersou Jehovah sobre as faces de toda a terra.

 

No segundo semestre do ano passado tivemos a oportunidade de examinar aqui, em várias palestras, o significado espiritual existente nos relatos da criaçãono livro de Gênesis, segundo as explicações que nos são dadas nos Escritos teológicos de Swedenborg.

Convém lembrar quevemos Swedenborg apenas como o divulgador da existência desse simbolismo no texto nas Sagradas Escrituras. Ele não foi o revelador, nem quis chamar atenção alguma para si mesmo.Por isso, nós não o veneramos, mas o consideramos com a honra que merece todo fiel servidor do Senhor Jesus Cristo. Cremos que a revelação do sentido espiritual da Palavra só poderia serfeita pelo Senhor mesmo, conforme se vê no capítulo do Apocalipse que fala deum livro selado,cujos selos somente o Cordeiro de Deus pôde desatar.

Pela abertura desse livro selado, que é a letra da Palavra, ficamos sabendo que todos os relatos, do capítulo 1 até o 11do livro de Gênesis, não devem ser tomados ao pé da letra, pois são meramente simbólicos, segundo o que ficou demonstrado por diversas confirmações que apresentamos nas palestras anteriores.Portanto, o que temos alinão são fatos históricos, mas meras alegorias, isto é, descrições da realidade espiritual representadas por objetos e sujeitos do mundo natural, como tipos simbólicos. É uma realidade sendo espelhada na outra, para que possamos entender, pelas correspondências existentes entre elas, como é essa outra dimensão de nossa existência, coisa que, de outra maneira, permaneceria desconhecida para nós.

Agora, pois, chegando ao capítulo 11 do Gênesis, encontramos a história da torre de Babel.Note-se que Babel e Babilônia são um mesmo nome na língua hebraica, Bavel, ou confusão, em todo o Velho Testamento. Já no Novo Testamento foi usada a derivação grega, “Babilônia”. Por isso, quase tudo o que lemos no livro do Apocalipse, a respeito da Babilônia Destruída, aplica-se também ao que se diz em Gênesis sobre Babel.

Então, o relato da construção de uma cidade e uma torre, chamados Babel, os eventos, as pessoas e os lugares citados, não existiram, de fato, pois são representativos. Porém, da metade do capítulo 11 em diante, a partir deÉber, os nomes começam a ser de pessoas reais. Esses nomes são ainda representativos e significam coisas espirituais, como anteriormente, mas desse ponto em diante sãopessoas que existiram de fato, como é o caso deNaor, Terá, Abrão e outros citados ali no capítulo 11.

Aliás, falando da construção de uma cidade chamada Babel, temos no próprio texto uma evidência de que esse relato é apenas simbólico, porque, do contrário, se o considerarmos como fato histórico,estaremos diante de uma contradição, porque,se no capítulo 11 é dito que o povo construiu a cidade que levou esse nome, no capítulo anterior, 10, (vers. 10), “foi dito que Babel fora edificada por Ninrod”. Por isso, “Babel significa não uma cidade, mas uma coisa, e aqui, o culto cujos interiores são profanos enquanto os externos parecem santos”.

O versículo 1 diz que havia “em toda a terra um só lábio, e as palavras eram uma só”. Parece claro que não devemos ver nisso uma informação histórica sobre a origem dos diversos idiomas da humanidade, pois isso fugiria da finalidade dos relatos bíblicos. ‘Foi toda terra um só lábio, e as palavras um só’ significa que havia, em toda a parte, uma única doutrina no geral e no particular; o ‘lábio’ é a doutrina; a ‘terra’ é a igreja. ‘E as palavras [eram] uma só’ significa que a doutrina era uma só no particular”,explicam-nos os Arcanos Celestes.

O assunto aqui é a Igreja Antiga, que nessa ocasião estava espalhada por diversas regiões do globo, e a doutrina que era comum para todas as pessoas daquela Igreja eram os ensinamentos do amor ao próximo, ou amor mútuo e caridade. “O amor mútuo e a caridade fazem que todas as coisas sejam uma só, ainda que sejam variadas, pois de várias faz a unidade. Todos, seja quanto for o seu número (mesmo que de miríades e miríades), se estão na caridade, ou no amor mútuo, todos têm um único fim [ou propósito], a saber: o bem comum, o Reino do Senhor e o Senhor mesmo.” (AC 1285). Como o azeite dá liga à farinha de trigo, para se fazer o pão, assim o amor deve ou deveria ligar as diversas crenças, para constituírem uma só igreja diante de Deus.

O ensinamento sobre o amor a Deus e ao próximo deve ser o essencial daigreja, e aprática desse amor deve ser o essencial do indivíduo,  pois o amor ao próximo ou caridade é aquilo que Deus quer ver nas religiões e na vidadas pessoas. Se a caridade estiver em primeiro lugar, as diferenças das igrejas farão a beleza das variedades e não divergências.

Mas, como acontece em toda dispensação da igreja, também aquela Igreja Antiga, com o tempo, começou a se afastar da caridade. Essa mudança de estado é contada no versículo 2: “E aconteceu, quando partiram estes do oriente, então encontraram um vale na terra de Shinar e habitaram aí.” ‘Quando partiram estes do oriente’ significa quando eles se afastaram da caridade; o ‘oriente’ é a caridade proveniente do Senhor. ‘Encontraram um vale na terra de Shinar’ significa que o culto se tornava mais impuro e profano; ‘e habitaram aí’ significa a vida que daí resultou.”

Nós já tivemos a oportunidade de ver uma ocorrência semelhante a essa contada na história de Cain e Abel, que é a história da relação entre a fé e a caridade. Quando a igreja, que então era a Antiquíssima, começou a declinar, ela deixou de ver a caridade, representada por Abel, como principal, e passou a dar supremacia à fé, representada por Cain. E quando acontece isso, a fé deixa de se concentrar no próximo e passa a buscar o interesse próprio; assim a caridade é desprezada e perece, e se diz que a fé aniquila a caridade, ou Cain mata Abel.

Agora, na Igreja Antiga, pós-diluviana, uma degeneração semelhante acontece quando eles “partem do Oriente”. O ‘Oriente’, na Palavra, é o Senhor e a caridade; e eles foram para num vale, que, por ser um lugar baixo em oposição às montanhas, representa um estado de vida decaído,uma vida de impureza e profanação.

Um fato curioso para se notar: Quando foram habitar nesse vale, o que eles fizeram primeiro? A cidade e a torre? Não. Leiamos o versículo 3: “E disseram o varão ao seu companheiro: Eia, façamos tijolos e queimemo-los no fogo; e foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume foi para eles por barro.”Nota-se que no versículo 3 não se fala ainda da intenção de construírem a cidade e a torre. Isto só vai aparecerno versículo seguinte, 4. No 3,eles estão somente fabricando tijolos e os queimando bem, e juntando betume.

Parece óbvio notar isso, mas a ordem aqui é importante, porque cada palavra, e cada posição de uma palavra na frase, é importante no sentido interno. Portanto, parece haver aqui uma relação de causa e consequência. Primeiro, começaram a fazer tijolos; depois, resolveram construir.Ou, como elestinham tijolos e betume, por isso quiseram construir a cidade e a torre.Mas o começo foi afabricação de tijolos, queimando-os bem e substituindo com eles as pedras, como se diz: “E foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume foi para eles por barro.”

Vejamos mais claramente essa relação de pedra e tijolo, barro e betume. Em toda parte na Palavra, as pedras representam as verdades. As pedras preciosas são as verdades da letra da Palavra. O Senhor é chamado Rocha e Pedra de Israel. Na construção do altar, a ordem de Deus foi expressa, que usassem pedras inteiras, não cortadas a ferro (Deut. 27:5, 6), porque a pedra cortada representava verdades artificias, não genuínas, enquanto a pedra inteira, tal como sai da pedreira, é a verdade como é, não sujeita ao bel prazer da interpretação individual. Uma verdade assim, inteira, “bruta”, no bom sentido, e sólida,foi a declaração que Pedro fez: “Tu és Cristo, o Filho de Deus”, e o Senhor disse a ele: “Sobre esta pedra edificarei Minha igreja”

Já os tijolos, que eles usaram para substituir as pedras, representam as falsidades empregadas como se fossem verdades, adaptadas às conveniências de cada um. A verdade se torna falsidade quando é cortada, torcida ou moldada por algum interesse próprio. A vontade de modificar a verdade e deturpá-la é o calor com que se queima bem o tijolo fabricado, para que este adquira uma durezaque imita à da pedra. Esse calor vem do proprium do indivíduo, o amor de si.

As pessoas do vale de Shinar desprezaram as verdades e adotaram ideias falsas, princípios e pontos de vistas que mais lhes convinham. E também ignoraram o bem, a finalidade boa a que a verdade conduz, o bem do próximo. E, para ligar um conceito falso ao outro,tomaram o betume, que, por ser inflamável, representa a cobiça do amor de si.

Então, após estarem habituados a fabricar tijolos bem queimados, com que substituíram as pedras, e obtiveram o betume para substituir o barro, foi que as pessoas passaram para o estado seguinte: construir uma cidade, uma torre, cuja cabeça estivesse no céu, e erigir um nome, para não serem dispersos na terra. Começaram trocando as verdades por falsidades; depois, o bem pelo mal da cobiça; por fim, quiseram elevarem seu nome até o céu.

Essa sucessão de etapas nos deve fazer pensar sobre várias coisas. A principal é que nunca devemos perder de vista que o amor mútuo, o amor ao próximo, deve ser o fundamental da igreja dentro de cada um de nós. Se nos esquecermos de valorizar e praticar a caridade, estaremos nos afastando do Senhor, nosso Oriente, e descendo para habitar num vale de valores baixos, vãos e egoísticos.

Outra reflexão é que devemos ser leais à verdade, e não tentar mudá-la ou adaptá-la à nossa conveniência. Quer ela nos beneficie, quer não, é a verdade. Porque o Senhor disse: “Mas seja vosso falar, sim, sim; não, não; porque o que disto passa, do mal procede” (Mat. 5:37).

Devemos aprender a ser intransigentes quanto ao que é a verdade; devemos amar a verdade por causa da verdade mesma, e não pelo que ela pode nos trazer de bom, ou pelo que ela pode nos acarretar deruim. Porque, se a pessoa écondescendente com seus próprios motivos e razões, em detrimento da verdade, ela acabará fabricando os tijolos da verdade relativa, ajustada, acomodada, e então a verdadeé substituída pela falsidade mais conveniente aos interesses próprios.

No que se refere atrocar o barro por betume, sabemos que o barro, também chamado humo, significa na Palavra o bem, a matéria prima com a qual o Senhor forma o homem e o regenera. Por isso o Senhor é comparado ao Oleiro, e o homem é o barro nesse processo. “O ‘barro’ está no lugar do ...homem da igreja, homem que é formado; assim, está no lugar do bem da caridade por meio do qual há a formação de todo homem, isto é, a sua reforma e regeneração. Em Jeremias:“Do mesmo modo que o barro [está] na mão do oleiro, assim nós na tua mão, ó casa de Israel” (18: 6)” (AC 1300).

Já o betume, por ser sulfuroso e inflamável, representa os males das diversas cobiças, porque esses males, se acesos ou abrasados, podem causar a destruiçãodo humano por dentro, um incêndio tal que nunca se apaga (Marcos 9:46).  Portanto, o betume no lugar do barro é a intenção egoística por trás das ações. E essa intenção má se agrava e se torna em mal ativo e mal confirmado quando é justificada pelas falsidades, isto é, o betume e o tijolo ligados.

Eles tinham tijolos e betume, e por isso podiam fazer uma cidade e uma torre. A cidade, na Palavra, não significa uma cidade mesma, mas a doutrina de vida da pessoa, porque o modo de vida é ambiente espiritual de cada um. As casas são os estados de afeição, as ruas e estradas são os pensamentos que levam de uma morada a outra, de uma cidade a outra, e a cidade é o conjunto de ações e princípios da vida que se tem. Por isso as diversas cidades na Palavra representam as diversas doutrinas, sejam doutrinas sãs, sejam heréticas (AC 1306).

E a torre representa o culto de si próprio. “Há o culto de si próprio quando o próprio homem se eleva acima de um outro até que seja cultuado; por isso o amor de si, que é o fausto e a soberba, chama-se altivez, eminência, elevação, e é descrito por meio de todas as coisas que são elevadas, como em Isaías:“Os olhos da soberba do homem serão humilhados, e será rebaixada a altivez dos varões, e será exaltado JEHOVAH, só Ele nesse dia, pois o dia de JEHOVAH Zebaoth [virá] sobre todo soberbo e altivo e sobre todo elevado, e serão humilhados; e sobre todos os cedros do Líbano altos e elevados, e sobre todos os carvalhos de Bashan [Basã], e sobre todos os montes altos e sobre todas as colinas elevadas; e sobre toda torre alta e sobre toda muralha fortificada” (2: 11–18)”.Em suma, a torre representa a soberba, a altivez e o orgulho do ser humano, quando ele se põe acima de todos os outros e acima de tudo o mais.

Mas a torre que eles queriam construir tinha outra característica ainda: “que a cabeça dela estivesse no céu”. Isso representava que eles queriam alcançar dominação sobre as coisas que estão no céu (AC 1307). E, neste ponto, nos lembramos do que foi dito a respeito da Babilônia, no Apocalipse. “Assim como a altivez do povo em Babel, que queria erigir um nome até os céus, os reis babilônicos tiveram uma noção exacerbada da própria grandeza, ao ponto de se colocarem em lugar de Deus e acima das coisas de Deus. É isto, então, que o símbolo “Babilônia” caracteriza na Bíblia: “Por ‘Babilônia’ se entendem todos os que querem ter domínio pela religião. Dominar pela religião é dominar sobre as almas dos homens, assim, sobre a sua vida espiritual mesma por meio das coisas Divinas de sua religião. Todos os que têm a dominação por objetivo final e a religião por meio são a ‘Babilônia’ em geral” (JF 54).

“A torre ter o topo no céu” significa ter domínio sobre todas as coisas do céu e da terra. Esse é o desejo daqueles que amam a si mesmos mais do que ao Senhor e ao próximo. Desejam que todos se lhe submetam e tratam com rigor os que estão sob sua dependência. Os seus interesses estão acima de tudo. Todos os males resultantes desse exagerado amor de si, como ódios, vinganças, crueldades, adultérios são simbolizados por essa “torre cujo topo está no céu” (JLF)

É preciso que se diga que o desejo de dominarnão é, em si, um desejo mau. O amor de dominar depende da intenção por trás. Porque há dois gêneros de dominação: um é pelo amor de si, e outro pelo amor ao próximo. “Quem domina pelo amor para com o próximo quer o bem de todos e nada ama mais do que os usos, assim, servir aos outros (por servir aos outros se entende querer bem aos outros e prestar usos, seja à igreja, à pátria, à sociedade ou ao concidadão). Tal é o seu amor e tal é o prazer de seu coração. Esse, também, quanto mais é elevado às dignidades acima dos outros, mais se alegra, mas não por causa das dignidades, mas por causa dos usos que pode então prestar em abundância e num grau maior. Essa é a dominação nos céus.

“Quem, porém, domina pelo amor de si não quer bem algum a ninguém, mas a si somente. Os usos que presta são por causa da honra e da glória para si, que são para ele os únicos usos. Para ele, servir aos outros é com o fim de ser servido, honrado e com o fim de dominar. Ambiciona as dignidades não por causa dos bens que devem ser prestados à pátria e à igreja, mas para estar em eminência e glória e, assim, no prazer de seu coração.” (CI 564).

Mesmo pelo sentido literal, podemos concluir que o problema não foi a construção em si de uma cidade e uma torre, mas a ambição daqueles indivíduos, de fazer uma torre que chegasse até o céu e o nome deles prevalecesse, o que denota um grau extremo de soberba ou orgulho.

Lemos na continuação, vers. 5: “E desceu JEHOVAH para ver a cidade e a torre que os filhos do homem edificavam.” ‘Desceu JEHOVAH’ significa o juízo sobre eles; ‘para ver a cidade e a torre’ significa, a respeito disto, que eles tinham pervertido a doutrina e profanado o culto; ‘que os filhos do homem edificavam’ significa que eles tinham forjado para si.”

O Senhor é Onipresente, e não desce nem sobe de um lugar a outro, porque está em todos os lugares, inclusive fora dos lugares. Mas é dito que Ele desce para ver, no sentido literal, quando acontece o juízo, e o juízo de uma igreja ocorre quando o mal e a falsidade chegam ao seu ápice (AC 1311). “Todo mal tem limites até onde se lhe permite estender; quando ele se estende além dos limites, ele cai na ‘pena do mal’, isso no particular e no geral. A pena do mal é a que então se chama juízo; e porque parece, a princípio, assim como se o Senhor não visse ou notasse que existe o mal, pois quando o homem pratica o mal sem ser punido por isso, ele crê que o Senhor não se ocupa de tal; entretanto, quando sofre a sua pena, então afirma que o Senhor vê e até que o Senhor pune; por essa razão, segundo essas aparências, se disse que “JEHOVAH tinha descido para ver”.

E, no vers. 7: “Eia, desçamos e confundamos aí o lábio deles para que não ouçam, o varão o lábio do seu companheiro.” ‘Eia, desçamos’ significa que o juízo foi feito assim; ‘e confundamos aí o lábio deles’ significa que seja nulo o vero da doutrina; ‘para que não ouçam, o varão o lábio do seu companheiro’ significa que todos estão em desacordo”.

A confusão do lábio deles significa que a verdade da doutrina se tornou nada, ou meramente falsidade, porque o culto do ego substituiu o culto a Deus, e a luz se tornou treva. A confusão de línguas resultante daí representa a falta do amor mútuo, que causa a separação, o desentendimento e a desunião entre as pessoas.

“E dispersou-os JEHOVAH daí sobre as faces de toda a terra, e cessaram de edificar a cidade.”“Por isso chamou o nome dela Babel, porque aí confundiu JEHOVAH o lábio de toda a terra; e daí os dispersou JEHOVAH sobre as faces de toda a terra.” Foram dispersos porque sua linguagem não era mais entendida. Cada um tinha uma ideia própria, um interesse particular, porque se havia perdido o amor mútuo, a empatia, a compaixão entre as pessoas.

Mas, hoje também, cada um de nós corre o risco de desprezar a verdade pura em favor de princípios duvidosos; de ser levado pela natureza humana pecaminosa e edificar seu próprio sistema de vida, no qual se erguerá a torre da altivez, do amor de si, de orgulho da própria inteligência.

E é por isso que devemos nos voltar para os ensinamentos Divinos, porque assim podemos conhecer a verdade e, por conseguinte,conhecer melhor a nós mesmos;  podemos nos examinar e reconhecer nossas fraquezas e enganos, e então podemos suplicar ao Senhor o esclarecimento e o auxílio que nos conduzem a uma vida mais verdadeiramente humana. “Porque fomos criados para ser felizes, desde que pratiquemos o bem e vivamos de acordo com os ensinamentos da verdade”. (JLF)

 

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Obsessão Espiritual
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20/02/2021  - Videoconferência 30
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Obsessão espiritual
C. R. N.

 

‘Obsessão’ é a ação do verbo obsedar, que é, segundo o dicionário, “apoderar-se do espírito de; causar ideia fixa a... Do lat. Obsidére  'pôr-se diante de, obstar, pôr obstáculo, ... sitiar, ocupar, atacar, invadir, apoderar-se.'

Jesus expulsou muitos demônios, livrando as pessoas de obsessões, e também deu aos discípulos esse poder. Mas somente sete ou oito casos de obsessão são descritos em detalhes no Novo Testamento. Vejamos esses casos, não em ordem cronológica.

Primeiramente, de um homem numa província chamada Gadara. Ele vivia nos sepulcros, era tão feroz que ninguém podia passar por ali. (Marcos 5:2-15) “Porque muitas vezes fora amarrado com grilhões e cadeias, e as cadeias foram por ele feitas em pedaços, e os grilhões em migalhas; e ninguém o podia amansar. E sempre, dia e noite, andava clamando pelos montes e pelas sepulturas, e ferindo-se com pedras.” 

Quando viu Jesus, o mau espírito disse, pela boca daquele homem: “Que tenho eu contigo Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Esconjuro-te por Deus que não me atormentes.” Esse indivíduo era obsedado por uma legião de demônios que, ao serem expulsos, entraram numa vara de quase dois mil porcos, e estes se precipitaram no mar por um despenhadeiro.

Assim é o relato de Marcos e Lucas, mas o evangelho de Mateus fala que eram dois endemoninhados. A razão dessa diferença nos relatos deve estar no sentido espiritual.

Em Cafarnaum, a cidade onde Jesus residia, trouxeram a Ele um homem que era possuído por um demônio que o fazia ficar mudo. Quando Jesus expulsou o demônio, o homem falou. (Mateus  9:32-34)

Outro endemoninhado era mudo e também cego, e, sendo também liberto da obsessão, passou a falar e a ver. (Mateus 12:22-24).

Ainda em Cafarnaum, na sinagoga, estava ali um possesso por espíritos imundos, mas esse homem não era cego nem mudo, pois, vendo Jesus, os demônios falaram por ele:   “Ah, que temos contigo, Jesus Nazareno? Vieste a destruir-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus. E Jesus o repreendeu, dizendo: Cala-te, e sai dele! E o espírito imundo, despedaçando-o e clamando com grande voz, saiu dele.” (Marcos 1:21-28). Em Marcos lemos que o obsessor era um espírito imundo, mas em Lucas (Lucas 4:33), no relato desse mesmo episódio, lemos que era um demônio imundo. Então, como vemos aqui e veremos na sequência, os termos “espírito imundo”, “demônio” “demônio imundo” e “diabo” são usados indistintamente nos Evangelhos.

Também nas cidades litorâneas de Tiro e Sidon, uma mulher, não judia, mas cananeia, tinha uma filha “miseravelmente endemoninhada”. Ela suplicou que o Senhor tivesse misericórdia da filha. Jesus, a princípio, parecia não dar atenção aos rogos da mulher, mas isso talvez foi para que todos vissem a humildade e a grande fé daquela mulher estrangeira.  Por causa dessa fé, a sua filha ficou sã. (Mateus 15:21-28).

Houve outro jovem que desde a infância era cruelmente possuído por um espírito imundo, mudo e surdo. Quando o espírito o possuía, agitava o menino, lançava-o no fogo e na água, e o fazia sofrer muito, e o menino ia-se definhando. O pai o trouxe aos discípulos, mas estes não puderam expulsar aquele demônio. Jesus o expulsou e, depois, explicou aos discípulos que aquela casta de demônios só se expulsava com jejum e oração. (Marcos 9:14-29).

Em outro sábado, numa sinagoga, estava presente uma mulher que havia dezoito anos era possuída por um demônio que a fazia ficar curvada, sem poder se endireitar. Jesus expulsou aquele espírito de enfermidade e a mulher logo se endireitou e glorificava a Deus. (Lucas 13:10-13).

E houve muitos outros casos de obsessão e expulsão de demônios que não foram descritos em detalhes, como os casos de algumas mulheres que seguiam Jesus.

Lemos que muitos demônios, quando estavam sendo expulsos, clamavam, dizendo: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus, o Santo de Deus.” É curioso que os demônios reconheciam quem era Jesus e o temiam, ao passo que muitos judeus O não reconheciam nem temiam. Diferentemente de alguns que blasfemavam do Senhor, os demônios O temiam e tremiam na presença d’Ele. Por que isso?

O fato é que os maus espíritos, por estarem nos dois mundos, natural e espiritual ao mesmo tempo, viam, no mundo espiritual, as espantosas obras de Redenção que o Senhor estava então realizando ali, subjugando os infernos e ordenando os céus, e isso acontecia ao mesmo tempo em que expulsava demônios e curava pessoas na terra. Então, eles bem conheciam o poder Divino operando no Humano do Senhor.

Mas, de fato, os demônios declaravam que Jesus era o Cristo, o Filho de Deus, não por uma razão nobre, mas porque queriam estorvar a obra d’Ele no tempo. Pois, enquanto o Senhor ensinava e curava, Ele também glorificava o Humano em que habitava como em Seu templo, e esse processo era gradativo e só se completaria após a morte na cruz e a ressurreição. Durante esse processo, os discípulos e alguns dos judeus testemunhavam a grandeza de Suas obra e, desse modo, estavam gradativamente chegando a uma convicção racional e espontânea de que Aquele homem não era somente o carpinteiro de Cafarnaum, não somente um profeta, ou um rabi,  mas o próprio Messias, o Filho de Deus.

Os discípulos e o povo precisavam chegar a essa conclusão sem imposição e sem constrangimento à sua fé, porque uma fé constrangida não permanece. Sendo assim, quando os demônios declaravam em alta voz que Jesus era o Filho de Deus, eles não estavam sendo bonzinhos, mas tentando, diabolicamente, causar dúvida e escândalo naqueles que ainda tinham não tinham chegado a essa convicção a respeito de Jesus. Por isso o Senhor mandava que os espíritos se calassem. A confissão de boca daqueles espíritos imundos, era o exemplo de uma verdade que, em si, é verdade, mas torna-se falsidade porque é pronunciada com um propósito mau.

Jesus deu aos discípulos o poder de expulsar espíritos malignos, e os discípulos, sendo comissionados, saíram pelas cidades e vilas, pregando, curando e expulsando demônios, e voltaram alegres a Jesus, porque até os demônios se lhes sujeitavam.

E, depois da ressurreição, pouco antes de subir aos céus, Jesus ratificou essa outorga de poder aos discípulos sobre os espíritos infernais: “E estes sinais seguirão aos que crerem: Em meu nome lançarão fora os demônios...” (Marcos 16:17).

É interessante notar que até mesmo um que não era discípulo do Senhor teve poder para expulsar os demônios pelo nome de Jesus, como lemos em Lucas 9:49, 50:  “João, disse: Mestre, temos visto a um que em teu nome lançava fora os demônios, e lho proibimos, porque não te segue conosco. E Jesus lhe disse: Não lho proibais; porque quem não é contra nós, é por nós.”

Mas, por que os espíritos se apoderavam das pessoas? Não todos os espíritos faziam isso, mas somente os maus faziam isso, diga-se de passagem.  Porque, como lemos na obra Diário Espiritual (2659), “Os maus espíritos nada desejam com mais prazer do que governar completamente o homem, tanto os seus interiores quanto o corpo, especialmente. Assim se lhes parece retornar à vida do corpo, pois então supõem plenamente que retornaram (ao corpo).

Está claro, então, que naquele tempo era muito comum esse tipo de obsessão, quando os demônios se apoderavam fisicamente das pessoas, dos seus corpos e seus sentidos. Esta é a que se chama obsessão externa. Alguns demônios faziam as  pessoas ficarem cegas, outras surdas e outras mudas. No caso da mulher curada na sinagoga, durante dezoito anos um espírito curvara a coluna dela a tal ponto que ela não podia se endireitar. Crianças ou jovens e velhos eram indistintamente possuídos e atormentados. E muitos espíritos juntamente podiam se apoderar de um único corpo ao mesmo tempo, como nos casos da legião de demônios dos gadarenos, e de Maria Madalena, de quem foram expulsos sete demônios.

Uma das razões pelas quais o Senhor veio ao mundo e assumiu o Humano foi para efetuar a obra de redenção da humanidade, e essa obra consistiu em libertar os seres humano do poder dos espíritos demoníacos, poder esse que então havia chegado a tal ponto que eles infestavam o mundo espiritual e natural ao mesmo tempo, apoderando-se de humanos indefesos. Aquelas obsessões vistas no mundo eram apenas uma parte, uma amostra, da infestação que então empesteava o mundo espiritual. A expulsão de demônios que Ele fazia na terra de Canaan era, portanto, a representação visível da obra de subjugação e expulsão de sociedades de espíritos infernais que estavam ocupando as regiões celestiais.

Lemos na obra VRC 117 que a subjugação dos Infernos pode ser ilustrada “por comparações com um exército de bandidos ou de rebeldes que se apoderam de um reino ou de uma cidade e incendeiam as casas, despojam os habitantes de seus bens, partilham entre si o saque e em seguida se regozijam e se gloriam. E a redenção mesma pode ser ilustrada por comparação com um Rei justo que ataca esses bandidos com seu exército, passa uma parte a fio de espada, lança a outra nas prisões, lhes arrebata o saque e o restitui aos habitantes, depois restabelece a ordem no reino e o põe ao abrigo de uma invasão semelhante.”

A redenção foi o resgate da raça humana desse cativeiro dos infernos e a restauração de sua liberdade espiritual. E todos tendo sido resgatados, todos podiam então ser salvos. Por isso, redenção não deve ser confundida com salvação, pois enquanto a redenção é esse livramento e restauração da liberdade coletiva, a salvação é a obra semelhante efetuada no plano do indivíduo, quando ele se deixa resgatar de seus próprios males pelo Salvador. Todos fomos resgatados a fim de podermos escolher, em liberdade, se queremos em seguida ser salvos ou não.

Quando Ele subjugou os infernos, a obra de redenção foi cumprida e, consequentemente, a obsessão corporal cessou no mundo.

Mas os efeitos da redenção não foram imediatos, porque durante algum tempo continuou havendo algumas obsessões aqui e ali na Terra, conforme lemos no livro histórico dos Atos. Nesse livro, lemos que em Filipos, cidade da Macedônia, Paulo e Silas estavam anunciando o evangelho, e havia ali uma moça possuída por um espírito de adivinhação. Parece que essa moça era escrava ou criada de algumas pessoas, e os seus donos a usavam para fazer adivinhações e com isso tinham grande lucro. Durante muitos dias ela seguia os apóstolos por toda parte, dizendo:  “Estes homens, que nos anunciam o caminho da salvação, são servos do Deus Altíssimo.” Um dia, porém, Paulo se irritou com aquilo e ordenou ao espírito, em nome de Jesus, que saísse da moça, e na mesma hora ele saiu. (Atos 16:16-18).

Lembremos, também, que Jesus, pouco antes de sua ascensão, havia dito: “Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura.  Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado. E estes sinais seguirão aos que crerem: em meu nome, expulsarão demônios etc.” (Mar 16:15-17). Ora, Ele não mandaria que se expulsassem demônios se não houvesse mais demônios que expulsar. E vimos essa palavra se cumprir com os discípulos, especialmente com Pedro e Paulo, que ressuscitaram pessoas e, quanto a Paulo, os maus espíritos eram expulsos até pelo toque de peças de roupa que Paulo usava (vide Atos 19). Então, ao menos durante algum tempo, a possessão física por maus espíritos continuou na Terra, até cessar completamente.

O mesmo se deu, aliás, em relação às profecias. Porque Jesus disse “A Lei e os Profetas, até João” (Lucas 16:16), e daí se pode entender, literalmente, que as profecias duraram até João e cessaram nele. Porém, notemos que no dia de pentecostes, bem depois da morte de João, muitos profetizaram, em cumprimento da profecia de Joel. E o ofício de profeta continuou existindo na igreja primitiva, como o apóstolo  Filipe, de Cesaréia, que tinha quatro filhas que eram profetas (21:9), e também como o profeta Ágabo, que veio da Judéia para se encontrar com Paulo na mesma Cesaréia, e ali anunciou as coisas que aconteceriam ao apóstolo, se ele fosse a Jerusalém. E o parâmetro que temos para saber se o profeta fala por Deus foi dado em Deuteronômio 18:22: “Sabe que, quando esse profeta falar em nome do SENHOR, e a palavra dele se não cumprir, nem suceder, como profetizou, esta é palavra que o SENHOR não disse; com soberba, a falou o tal profeta; não tenhas temor dele.” E as profecias de Ágabo sobre Paulo de fato aconteceram.

Além disso, que a atuação de espíritos malignos tenha continuado ainda por algum tempo, é o que concluímos pela carta do apóstolo João, falando à igreja que não se deixassem desviar por espíritos enganadores: “Nisto conhecereis o espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; E todo espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; e tal é o espírito do Anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e já agora está no mundo.” (1 João 4:2, 3).

Pelo fato de ainda persistirem as obsessões, havia também alguns exorcistas ambulantes, judeus que saíam expulsando demônios em nome de Jesus. Mas nem todos os seus exorcismos eram bem sucedidos. Certa vez, na cidade de Éfeso, deu-se uma situação constrangedora. Havia ali um chefe dos sacerdotes chamado Ceva, que tinha sete filhos. E esses moços foram expulsar um demônio, dizendo:  “Esconjuro-vos por Jesus, a quem Paulo prega”, mandando que o espírito saísse. Mas o espírito maligno, respondendo, disse: “Jesus eu conheço, e Paulo bem sei quem é; mas vós, quem sois? E, saltando neles o homem que tinha o espírito maligno e dominando dois, pôde mais do que eles; de tal maneira que, nus e feridos, fugiram daquela casa. E foi isto notório a todos os que habitavam em Éfeso, tanto judeus como gregos.” (Atos 19:11-17).

 Mas, enfim, gradativamente os efeitos das obras de Redenção Divina se fizeram sentir no mundo, e essas atuações malignas ficaram mais esparsas e raras, porque as sociedades infernais que atuavam por meio de espíritos intermediários agora estavam encerradas, como profetizou o salmista sobre a obra redentora do Senhor, dizendo: “Tu subiste ao alto, levaste cativo o cativeiro, recebeste dons para os homens e até para os rebeldes, para que o SENHOR Deus habitasse entre eles.” (Salmo 68:18). E Paulo, em sua carta aos Efésios (4:9), explicou esse: “Ora, isto - ele subiu - que é, senão que também, antes, tinha descido às partes mais baixas da terra?”, falando de até onde o Senhor desceu, no mundo espiritual, para combater os infernos e subjuga-los. 

Portanto, depois do tempo da Igreja primitiva, dos apóstolos, e especialmente hoje, esse tipo de obsessão não existe mais. Um espírito maligno não pode mais se apoderar do corpo e dos sentidos de uma pessoa, como antigamente. A obsessão externa não existe mais hoje em dia.

Eu sei que alguém poderia me questionar, chamando a atenção para os casos de expulsão de demônios que se veem comumente, sobretudo nas igrejas pentecostais. Mas é evidente que essas ocorrências que se veem nos cultos e na TV são bem diferentes daquelas obsessões externas que havia no passado. O que acontece hoje é apenas no plano mental. De modo geral, são pessoas simples, crédulas, que são facilmente sugestionáveis, e elas acreditam sinceramente quando alguém lhes diz que estão possuídas por maus espíritos, e se submetem a um pretenso exorcismo. Muitas vezes, essas pessoas ficam tão persuadidas de que estão mesmo possessas que até imitam as obsessões do passado, falando e agindo como diabos.

Mas a diferença principal é que a pessoa assim persuadida ainda mantém o controle de sua mente e pode, sempre que quiser, deixar essa persuasão, pois não está presa como os possessos da antiguidade.  Trata-se somente de uma submissão mental que, infelizmente, é explorada por ignorância ou por outros interesses.

Todavia, o que hoje existe é, sim, a obsessão interna.

Os maus espíritos não podem mais dominar o natural, mas podem atuar na mente do indivíduo, e fazem isso “rompendo todas as restrições internas, que são as afeições pelo que é bom e verdadeiro, direito e justo; o temor da lei de Deus e um sentido de vergonha em prejudicar a sociedade e ao país, quando a pessoa passa a fazer isso desbragadamente, esta está obsedada por espíritos malignos”. "Muitos hoje são possuídos por esses espíritos; pois há atualmente obsessões interiores (da vida do pensamento e das afeições do homem), mas não como obsessões exteriores de antes." ( AC 4793).

“Eles pervertem os bens e os veros e os inflamam com um certo fogo de cobiça e de persuasão, de sorte que o homem não sabe outra coisa, senão que ele está em uma semelhante cobiça e em uma semelhante persuasão.” AC 1820 [3]

Hoje, os espíritos malignos não podem causar cegueira física, mas podem, pelas falsidades insinuadas, fazer com que a pessoa queira ser cega espiritualmente falando, quando fecha os olhos para não compreender o que é justo, verdadeiro e honesto.

Não podem mais causar surdez física, mas podem fazer com que a pessoa se torne refratária aos ensinos da Palavra, e não dê dar ouvidos ao que o Senhor lhe diz.

Não podem atirar uma pessoa na água e no fogo, mas podem influir nas volúpias e incendiar as paixões da pessoa, e podem inundar o entendimento dela com falsidades.

Não podem mais curvar a coluna de ninguém, mas podem atrofiar o espírito de uma pessoa, voltando-o somente para as coisas baixas, egoísticas e mundanas, sem erguer o entendimento para as coisas do céu.

A obsessão interna acontece quando a pessoa se entrega a cobiças e falsidades sem qualquer restrição de consciência, quando se rende sem resistência alguma a sentimentos obscenos, criminosos, desejando tais coisas e praticando-as em espírito, ainda que as não pratique no corpo.

Aprendemos que existem dois tipos de vínculo para o procedimento do indivíduo: os vínculos internos  e os vínculos externos. Os vínculos interno são os de consciência, e por eles a pessoa se abstém dos males por causa de motivos da religião, isto é, por serem contra as leis de Deus e contra o amor ao próximo. Os Dez Mandamentos estabelecem esses vínculos internos no nosso espírito. Então, quando alguém se abstém do mal por causa desses vínculos internos, ela efetivamente deixa de fazê-lo no corpo e no espírito.

Já os vínculos externos se referem à vida na sociedade e são meramente do corpo, como o receio de ser castigado, ou de perder a reputação, a fonte de ganho no mundo ou a posição na sociedade. São restrições que se referem somente à vida no mundo. Se a pessoa tiver somente os vínculos externos, ainda que ela se abstenha dos males na aparência externa, ela, não obstante, os pratica sempre e continuamente em seu espírito.

E se essa prática do mal no pensamento e na intenção se tornar um hábito, ela se torna como que viciada naquele mal e escravizada por algum mau espírito. Porque cada mal está ligado a uma sociedade infernal, da qual procede, por isso, a prática desenfreada e irrestrita do mal, mesmo que seja só interiormente, na vontade e no pensamento, associa a pessoa aos espíritos malignos daquela sociedade específica, e ela se torna interiormente obsedada por eles.

A obsessão interior, geralmente, acontece sem que a pessoa ou o espírito tenha noção disso. A pessoa não sabe que está obsedada por um espírito infernal que fomenta aquele mal, nem o espírito sabe que está naquela pessoa. Ambos compartilham o mesmo mal por uma relação discreta. Mas, quando a pessoa morre e entra no mundo espiritual, então ela vê a sociedade com a qual esteve ligada mais constantemente aqui, ou celeste ou infernal. E se ela se deixou obsedar pelos espíritos maus, com quem ela desenvolveu uma afinidade inconsciente, ela se sentirá em casa entre eles.

Sabemos que, assim como os vícios, há males que são mais difíceis de serem evitados, outros não tanto, dependendo da tendência hereditária ou do grau de enraizamento pela prática. Mas todo mal, uma vez reconhecido como tal, pode ser renegado, combatido e vencido, pelo poder que o Senhor proporciona. E existe uma fórmula simples para se fazer isso: basta que, quando a pessoa perceber o mal no pensamento e na vontade, dizer: “Eu quero isso, e tendo para isso; mas, como é um pecado contra Deus, não o farei”. Essa atitude fortalece os vínculos internos e depura a consciência.

Resistir ao mal, a penitência, pode ser difícil no começo, mas a persistência em se abster faz com o poder do mal vá gradativamente diminuindo, porque, à medida que o mal é combatido na vontade e no pensamento, o Senhor agirá de dentro, nas raízes do mal, a fim enfraquecer a sua influência danosa. Com o tempo, aquele determinado mal, que era como um vício e  uma atração poderosa, como prazer da vida, sem o qual não se poderia viver, esse mal uma dia não será mais tão atraente; depois, parecerá um tanto desagradável; por fim, será algo que causa aversão, e a pessoa que foi liberta da obsessão daquele mal sentirá nojo, vergonha e horror, só de pensar que um dia foi subjugada àquilo. Este é o fim da obsessão interior.

Os apóstolos Tiago e Pedro já alertavam aos cristãos primitivos sobre o perigo dessa obsessão da mente, admoestando: “Sujeitai-vos, pois, a Deus. Resisti ao diabo, e ele fugirá de vós. (Tiago 4:7). “Sede sóbrios, vigiai, porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar” (1 Pedro 5:8).

O perigo é real, mas, com a misericórdia do nosso Senhor, que veio ao mundo para ser nosso Redentor e Salvador, Jesus Cristo, temos a liberdade de resistir e de cooperamos com Ele na nossa libertação, nossa redenção individual.  E, uma vez libertos de toda obsessão interior, devemos perseverar na vida de fé, dando passos firmes no caminho de nossa transformação espiritual. 

 

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